Segunda 29 de Abril de 2024

Internacional

II Congresso do PTR – CcC: Em luta pela emergência do trotskismo no Chile

31 Jul 2012 | Por Christian Castillo e Fernando Scolnik, delegados da direção do PTS convidados para o II Congresso do PTR do Chile   |   comentários

No número anterior de La Verdad Obrera publicamos um balaço inicial do II Congresso do PTR – Classe contra Classe, realizado por Juan Valenzuela e Pablo Torres da direção dessa organização. Partindo do que está colocando lá, apresentamos a visão sobre o Congresso dos delegados do PTS que participaram como convidados.

Na reunião de coordenação da Fração Trotskista – Quarta Internacional realizada em agosto de 2011, o Chile havia sido definido como um dos eixos políticos a seguir por nossa corrente internacional, em função tanto do nível alcançado pela luta estudantil como por termos certo acúmulo de militantes nesse país. Nesse tempo fizemos uma importante colaboração internacionalista de distintos grupos da FT com os companheiros do PTR, que corresponde ao que acreditamos que deve ser a forma de atuar de uma tendência que luta pela reconstrução da Quarta Internacional como a nossa, que se diferencia entre outras coisas por sua luta intransigente pela independência de classe contra as diferentes variantes frente-populistas e de conciliação de classes e pela convicção que nenhuma corrente revolucionária pode se desenvolver sem uma ativa participação na luta de classes. Aproveitamos este informe como uma primeira expressão de uma seção do Jornal La Verdad Obrera que periodicamente se dedicará à vida de nossa organização internacional.

O II Congresso do PTR – CcC do Chile foi sem nenhuma dúvida um fato transcendente para toda nossa organização na Argentina e para o conjunto da FT–QI. Depois de um 2011 caracterizado pela nova e massiva emergência do movimento estudantil e outros fenômenos que expressaram o descontentamento operário e popular com o regime político e seus partidos (como os levantamentos em Magallanes e Aysén, este último já em 2012) há uma numerosa e estendida vanguarda juvenil que continua politicamente ativa. Ainda que não estejamos num processo de luta aberta como no ano passado, a última mobilização estudantil contou com a presença e 150 mil estudantes só em Santiago, capital do país. E também teve uma numerosa manifestação do movimento pela diversidade sexual, com exigência de prisão aos assassinos de Daniel Zamudio em primeiro lugar, na qual participaram 80 mil pessoas, também jovens em sua maioria, e outra de 50 mil pela legalização da maconha.

No caso, o movimento estudantil constitui o principal movimento de oposição política ao regime herdeiro de Pinochet, que se encontra defasado em relação às aspirações do movimento de massas. Esse anacronismo do regime, que inclui a crise da Concertación (aliança entre a Democracia Cristã, o Partido Socialista e outras correntes de centro-esquerda) como “partido de contenção” e o surgimento da geração da juventude “sem medo”, que continuam o feito iniciado pelos “pingüins”, em 2006, no enfrentamento a herança pinochetista e que possivelmente chegue ao questionamento da “subcontratação” (precarização) na juventude trabalhadora, dão bases objetivas para apostar na emergência de uma forte corrente trotskista no Chile. E mais ainda frente à continuidade da crise capitalista internacional.

No Chile, diferente da Argentina, com exceção do momento da constituição da Oposição de Esquerda quando esta tinha mais peso que o stalinismo, o trotskismo não teve organizações de certa relevância política, em boa medida devido à política de dissolução de grande parte do trotskismo no MIR, que teve historicamente um setor mais “trotskizante”. Na esquerda, o Partido Comunista constitui a força principal, enquanto que também tem peso uma tradição populista de esquerda (que nos ’70 encarnou o MIR e logo diversos grupos e coletivos) e, entre os estudantes, também o autonomismo e o anarquismo.

Os companheiros que hoje formam o PTR vêm fazendo um persistente trabalho de acumulação política de quadros e militantes que se voltou completamente para a luta estudantil. Editou 188 números de seu jornal Clase contra Clase – nome com que era conhecida a organização até o primeiro congresso realizado em novembro de 2010 (onde foi votado seu Manifesto Programático) – que sai com freqüência quinzenal (e saia semanalmente durante os momentos mais críticos do conflito estudantil). Também edita desde o ano passado a revista teórica “La Batalla”, da qual foram publicados dois números com diversos artigos de análises e polêmicas políticas de bom nível marxista.

Em anos anteriores editava a revista universitária “As armas da crítica”, a agrupação estudantil impulsionada pelos companheiros que foram pioneiros em colocar a bandeira de “educação gratuita”, quando o PC e os diversos grupos populistas se negavam a levantá-la, inclusive no começo do conflito. Há também elaborações sobre a histórica do Partido Comunista e sobre a história do trotskismo chileno, assim como sobre diversos marcos da história do movimento operário local e sobre o processo dos ’70 que culminou com o golpe contrarrevolucionário de Pinochet. Todo acúmulo da organização se colocou em jogo na luta estudantil, onde o PTR esteve presente em Santiago, Valparaíso, Temuco (ao sul do país), Arica e Antofagasta (no norte), uma cidade onde o grupo ganhou um peso muito importante, chegando a superar em algumas mobilizações a coluna das Juventudes Comunistas.

Os companheiros do PTR encabeçaram junto a ativistas independentes a experiência de autogestão educativa da escola A-90 em Santiago e estiveram a frente das barricadas e mobilizações. Também se destacaram pela denúncia que faziam da burocracia estudantil do Partido Comunista, que todo o tempo buscou conter a luta.

Um primeiro resultado desta intervenção ativa foi a fundação, no final de 2011, da Agrupação Combativa Revolucionária (ACR), onde a militância estudantil universitária e secundarista do PTR confluiu com dezenas de novos ativistas surgidos da luta estudantil. Nas eleições da Federação de Estudantes da Universidade de Santiago do Chile (a segunda em importância depois da Universidade do Chile) os companheiros impulsionaram a lista “Seguimos de Pé”, que obteve mais de 2 mil votos e o segundo lugar, superando a lista das Juventudes Comunistas, motivando declarações de políticos burgueses como Carlos Larraín de preocupação com o peso que está ganhando o trotskismo no Chile, e ganhando alcance na mídia local como uma alternativa no movimento estudantil tanto ao PC, como às diversas variantes populistas e autonomistas. Este peso conquistado pelo PTR na vanguarda estudantil contrasta com a esterilidade de distintos grupos que se dizem trotskista no país, e que não contam com nenhuma implantação real nem peso na vanguarda, a pesar do enorme fenômeno que foi (e é) a presença do movimento estudantil mais combativo da América Latina.

Com o refluxo da mobilização, a organização realizou um intenso trabalho de propaganda ideológica, tratando de ganhar o melhor da vanguarda para o programa e a estratégia do trotskismo. No congresso estiveram presentes uns 200 companheiros, expressão não só da força conquistada no movimento estudantil, mas também de um incipiente trabalho no movimento operário, tanto entre trabalhadores industriais e de serviços de Santiago como na mineração em Antofagasta, assim como a incorporação ao PTR de Zonyko, uma referência do hip hop de esquerda, cujos temas foram cantados por toda a vanguarda estudantil durante a luta do ano passado.

Um Congresso de grande deliberação política

Se algo caracterizou o desenvolvimento do II Congresso do PTR foi a apaixonante deliberação de toda a militância a respeito da melhor orientação a ter no período que há adiante, partindo do incremento da militância efetiva da organização em 60% a mais que quando do congresso de fundação, que foi apenas há 1 ano e meio atrás, com uma média de idade que não supera os 25 anos. No Congresso a delegação convidada da FT foi composta pelos dois companheiros do PTS e Marcelo Torres da LER-QI. Esta presença foi continuidade de viagens de delegações dos grupos da FT durante a luta estudantil (do Estado Espanhol, da Argentina, do Brasil, da Bolívia...) e de intercâmbios regulares sobre a orientação política, em particular logo após que a reunião de coordenação da FT, em agosto de 2011, definiu o Chile como uma de suas prioridades. Durante as discussões de preparação do congresso que realizamos em comum com a direção do PTR e a delegação de convidados chegamos à conclusão que a persistência de uma vanguarda juvenil (sobretudo entre os estudantes universitários e secundaristas, mas que impacta também setores da juventude trabalhadora) fazia necessário ter uma tática de agrupação na juventude, que permitisse aglutinar não só quem se convence da estratégia do trotskismo, mas também os companheiros que vem dando passos neste sentido mas que requerem mais tempo de discussão para se convencer do conjunto de nosso programa e estratégia.

Esta foi a importante conclusão do congresso, no sentido de que o grupo, apesar do que já tem acumulado e de seu próprio nome, não constitui ainda um “partido”, mas que, entretanto, é uma “liga de propaganda com traços de ação”, que não poderia se transformar num verdadeiro “partido” sem passar por distintas experiências de táticas transicionais. Mencionou-se, por exemplo, a experiência do trotskismo norte-americano na década de 30 que mal passou pela fundação da Liga Comunista da América e de dirigir a grande greve dos “teamsters” em Minneapolis em 1934, passou pela fusão no Workers Party com o grupo de Muste, depois ela experiência do entrismo no Partido Socialista e, logo após a fundação do SWP em 1938, foi aconselhado por Trotsky de levantar audaciosamente a moção de um “partido de trabalhadores” no seio dos sindicatos.

No curso do congresso chegou-se a conclusão que a melhor expressão da política de agrupação passava hoje pelo relançamento da Agrupação Combativa Revolucionária (ACR), na qual a militância trotskista jovem, estudantil e trabalhadora, fez uma experiência comum com dezenas de novos lutadores em cada cidade onde estamos presentes. Também foi sugerido propor aos companheiros independentes a incorporação da declaração programática da agrupação a proposta de lutar por um partido revolucionário da classe trabalhadora, de forma a realizar uma primeira delimitação política em relação ao populismo, ao autonomismo e ao anarquismo, que são as tendências com as quais estão em disputa os muito amplos setores que se encontram na esquerda do PC, setores estes que fizeram experiência com a direção conciliadora e burocrática durante a luta do ano passado. Em consonância com esta reflexão, uma das resoluções chave do Congresso foi decidir pela realização, daqui há um mês e meio, de plenárias regionais da ACR onde todos coincidam que era possível organizar numerosos companheiros. Deliberou também a realização de uma conferência especial para discutir a orientação a seguir no movimento operário, partindo de que o tempo limitado do congresso não permitiu o desenvolvimento mais que inicial dessa discussão.

Junto a isso, foi votado continuar com a “ofensiva ideológica” com as ideias do trotskismo, tomando a difusão das Obras Escolhidas de Trotsky e desenvolvendo outras iniciativas como seminários e debates em todo o país. Isto é crucial no Chile, onde a esquerda está moldada principalmente pelo PC e o populismo e suas concepções sobre o “poder popular”, oposto à política de lutar pela hegemonia operaria na luta por acabar com o regime herdeiro de Pinochet e impor um governo operário e popular.

Para todos os participantes, o II Congresso foi uma experiência política muito importante, onde se viu uma organização revolucionária deliberando apaixonadamente tanto sobre a situação internacional e nacional e, fundamentalmente, para se armar com uma orientação que lhe permita dar passos para fazer emergir a política do trotskismo no Chile. Para os companheiros da FT que participamos como convidados foi a satisfação de ver um grupo dinâmico que realizou uma discussão aberta e franca sobre as contradições que tem a própria organização (como as pressões a auto-proclamação ou sua composição social predominantemente estudantil) e ver uma nova geração de militantes e quadros trotskistas que se forjando ao calor de sua intervenção ativa na luta de classes do país andino.

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