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Internacional

EGITO

Egito: as mobilizações desafiam a repressão do governo

09 Dec 2013   |   comentários

O governo provisório cívico-militar egípcio promulgou nos últimos dias de novembro uma nova lei antidemocrática e repressiva. A lei “antiprotesto” (como é chamada pelos manifestantes) dita que toda reunião com mais de 10 pessoas deve ser autorizada pelo governo, fazendo de qualquer manifestação um ato ilegal.

O governo provisório cívico-militar egípcio promulgou nos últimos dias de novembro uma nova lei antidemocrática e repressiva. A lei “antiprotesto” (como é chamada pelos manifestantes) dita que toda reunião com mais de 10 pessoas deve ser autorizada pelo governo, fazendo de qualquer manifestação um ato ilegal. A primeira aplicação da lei foi a detenção de 21 mulheres e meninas que realizavam um cordão humano reclamando a volta a seu cargo do presidente destituído Morsi [1]. Pelas acusações que pesam contra elas (utilizar a violência contra as forças de segurança e destruição da propriedade) podem chegar a ser julgadas com 11 a 15 anos de prisão.

A lei “antiprotesto” despertou o rechaço de um amplo setor da sociedade que começou a se mobilizar contra a mesma. Os estudantes universitários, em particular na cidade do Cairo, são um dos setores à vanguarda em rechaçar esta lei. A resposta do governo não se fez esperar: um morto na repressão ao campus da universidade do Cairo, novos detidos por manifestarem-se, entre eles, importantes ativistas reconhecidos por seu papel na luta contra a ditadura de Mubarak.

O governo cívico militar segue os passos da ditadura de Mubarak

Quando as mobilizações de julho faziam cambalear o expresidente Morsi, o Exército deu um golpe de estado para evitar sua queda pelas mãos das manifestações de massas. Os militares, junto a seus sócios civis, expropriaram desta maneira a mobilização de milhões contra as políticas de ajuste autoritárias de Morsi, com o fim de impor uma saída reacionária à aguda crise política aberta. As primeiras medidas repressivas do Exército e do governo se dirigiram contra os partidários da Irmandade Muçulmana, que se mobilizavam pela restituição de Morsi em seu cargo. A repressão aos acampamentos, que culminaram em selvagens massacres e com milhares de mortos, foi a mostra cabal do reacionário avanço dos militares e sua tentativa de impor a ordem.
Estas primeiras medidas que buscaram afogar a sangue e fogo as manifestações contra o governo foram saudadas e apoiadas por setores da burguesia liberal e setores da vanguarda das mobilizações contra Morsi, como o movimento juvenil Tamarod (Rebelião), setores da burocracia sindical como Abu Aita (expresidente da federação de Sindicatos Independentes, que assumiu como Ministro do Trabalho), que, atrás do discurso de acabar co o autoritarismo de Morsi e da Irmandade Muçulmana, serviram para cobrir e legitimar as políticas reacionárias.

À repressão e declaração de ilegalidade à Irmandade Muçulmana seguiu-se a imposição de um estado de repressão e perseguição a todos os que se mobilizassem. O itinerário do governo, que prometia eleições em seis meses e uma nova constituição que reformasse os aspectos autoritários e teocráticos daquela votada durante o mandato de Morsi, era a fachada da política repressiva do Exército e seu governo títere, que buscava mudar a relação de forças imposta pela mobilização das massas desde a queda de Mubarak e assegurar seu papel controlando um terço da economia, dando continuidade ao “modelo” de exploração e aos acordos com o imperialismo.

A quase três anos da queda de Mubarak, o Exército com o general Al-Sisi à cabeça se parece cada vez mais com a velha ditadura que as massas derrubaram com a mobilização, moralizado depois de receber apoio do imperialismo ianque (em sua recente visita John Kerry confirmou o apoio ao governo e a continuidade da ajuda conjunta na luta contra o terrorismo) e da monarquia saudita.

As primeiras respostas à Lei “antiprotesto” e o ressurgir da mobilização juvenil

A 19 de novembro uma nova mobilização (em comemoração às jornadas que em 2011 enfrentavam as mobilizações com a junta militar que governava depois da queda de Mubarak) foi reprimida pelas forças de segurança, deixando um morto entre os manifestantes. Há poucos dias, eram encarceradas 21 mulheres e meninas, seguindo-se uma ordem de detenção a reconhecidos dirigentes e ativistas, tudo em base à nova lei “antiprotesto”. Desta vez, a tentativa repressiva do governo despertou um setor da juventude. Milhares de estudantes universitários do Cairo se mobilizaram para rechaçar a nova lei, enfrentando-se às forças armadas que assassinaram um estudante durante a repressão do campus universitário.

Depois de vários meses, a campanha do governo e do Exército centrada na luta contra o terrorismo para justificar a repressão começou a perder base na sociedade. Para expropriar as mobilizações contra Morsi as forças armadas haviam prometido terminar com o autoritarismo e o ajuste; pelo contrário, o atual governo é cada vez mais visto como um retorno à época de Mubarak.

Esta é a faísca que está incendiando novamente as mobilizações contra as leis repressivas, e já não são apenas dos partidários da Irmandade Muçulmana. Como se viu nos últimos dias, somaram-se setores da juventude estudantil. Junto a isto, setores do movimento operário começam a lutar por suas reivindicações, como sucede com os trabalhadores da Companhia Estatal do Ferro e do Aço do Egito, que começaram uma greve reivindicando salários atrasados e contra a perseguição a seus delegados, ou os trabalhadores da fábrica Asfour, que exigem a incorporação permanente de todos os contratados e terceirizados.

Estas novas mobilizações mostram que o intento contrarrevolucionário não conseguiu derrotar o processo aberto com a primavera árabe. Voltam a ressurgir as reivindicações colocadas em 2011 contra o ajuste econômico e a repressão.

Está colocado desenvolver a mobilização que hoje parte da denúncia aos massacres e à repressão do Exército e seus cúmplices civis, para transformá-las em uma luta para jogara abaixo o governo golpista cívico militar que está a serviço da burguesia e da continuidade da submissão ao imperialismo (como ficou demonstrado com a recente viagem de Kerry) e os acordos com Israel.

Para isto, é necessário avançar na unidade entre laicos e muçulmanos, defendendo um programa independente que parta de: Abaixo as leis repressivas! Fora o governo golpista e repressor dos militares e dos partidos liberais! Punição aos responsáveis pela repressão e os massacres!

Esta luta, longe de subordinar-se à política da Irmandade Muçulmana e de Morsi, que também governou para os capitalistas com planos de ajuste incluídos, deve retomar o caminho que abriram as grandes jornadas de 2011 que derrubaram o ditador Mubarak e encaminhar-se para a única saída para conquistar as demandas políticas e econômicas daquelas jornadas, um governo operário e popular.

[1Logo depois da publicação desta nota, o Tribunal egípcio revogou, em virtude do escândalo internacional, a pena às meninas, e reduziu para 1 ano o período de cárcere para as 14 mulheres manifestantes. O que em absoluto diminui o teor sumamente repressivo da nova legislação votada, uma vez que a lei "antiprotesto" ratificou a pena por manifestar-se, e garantiu o encarceramento das meninas e de quaisquer setores no caso de reincidência. NdT

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