Segunda 20 de Maio de 2024

ARGENTINA

Cristian Castillo do Partido dos Trabalhadores Socialistas

05 Aug 2008   |   comentários

A V Conferência da Fração Trotskista ’ Quarta Internacional, se reuniu esta semana com o pano de fundo do agravamento de uma crise capitalista que não é simplesmente norte-americana, mas internacional.

Vejam, companheiros, o que diz um artigo do jornal El País do Estado Espanhol: “A nuvem negra da recessão se estende de maneira contínua desde os Estados Unidos até a Europa. Os políticos estão preocupados e têm se negado a fixar uma data para a recuperação económica. É preciso ir esquecendo que o bom tempo chegaria na segunda metade de 2009. A tormenta financeira provocada pelas hipotecas de alto risco que estourou nos Estados Unidos em agosto do ano passado também tem contagiado inúmeros bancos europeus e começa a afetar a economia real.

Ninguém se atreve a prognosticar até onde afundará o barco” (El País, 25/07) (...) Desde que começou a crise, os países imperialistas já investiram centenas de bilhões de dólares para evitar quebras bancárias e de investidores (...) O capitalismo se mostra mais uma vez frente aos olhos de milhões como um sistema que socializa as perdas e privatiza os lucros.

Os últimos resgates foram os realizados pela Reserva Federal norte-americana há menos de 15 dias, com o banco centrado nas operações imobiliárias, o Indy Mac, e as companhias hipotecárias Fanny Mae e Freddy Mac. (...) Estas empresas possuem uma porção considerável dos 5,2 trilhões de dólares em títulos da dívida respaldados por estas duas gigantes. 10 vezes a dívida externa da América Latina. Na América do Norte, só existe um devedor maior: o Tesouro dos EUA (...) A crise afeta o conjunto da economia norte-americana e, em particular, a industria automobilística, onde os grandes monopólios que a controlam, como a Ford, a Chrysler e a General Motors, estão sofrendo grandes perdas e anunciam milhares de demissões (...)

Até agora, esta crise tem se expressado de forma desigual. Há países como os EUA, a Grã Bretanha e o Estado Espanhol, que já estão vivendo ou caminham para uma profunda recessão, enquanto que em outros ainda se mantém um crescimento importante. As matérias primas tiveram um aumento muito forte, em parte pela especulação, criando uma pressão inflacionária em todo o mundo e levando a rebeliões de fome nos países importadores de alimentos. Mas é preciso ter em mente que é provável que nos próximos meses vejamos a recessão se generalizar. (...) Como não esperar que o conjunto da economia internacional seja afetado por uma crise que surge no coração do capitalismo contemporâneo?

Companheiros: nós não somos adivinhos para profetizar os exatos ritmos nem o limite final que a crise em curso terá. Mas o que hoje já sabemos, e discutimos na Conferência, é que estamos diante (...) de novas e grandes turbulências económicas e políticas, que desmentem aqueles que imaginavam que a restauração capitalista na ex-União Soviética e na China, junto aos ataques neoliberais à classe operária, tivessem criado condições para o desenvolvimento de um novo grande ciclo de crescimento capitalista como o que se deu após a Segunda Guerra Mundial. O capitalismo se manteve nestes anos, mas a custa de incubar novas e maiores contradições que hoje estão explodindo. O sistema não pode evitar sua tendência a recorrentes catástrofes. E esta que estamos vivendo ameaça ser a mais importante desde 1929. (...)

Hoje, a crise económica é o elemento mais dinâmico que está ameaçando o equilíbrio capitalista dos últimos anos e levando a maiores disputas inter-estatais e a maiores enfrentamentos de classes. A FT tem que se preparar para intervir nesse novo cenário mais convulsivo. (...) Enquanto milhões não têm o que comer, ainda que a produção de alimentos represente o dobro do necessário para satisfazer as necessidades da população mundial, os monopólios dos alimentos enriquecem como nunca. É preciso lutar pela expropriação desses monopólios expoliadores da classe operária.

Junto à crise económica, estamos vivendo o fim da era Bush, que longe de cumprir o objetivo neo-conservador de garantir “um novo século americano” , provocou um aumento na decadência da hegemonia estadunidense, com o empantanamento de sua política no Iraque, a continuidade das convulsões políticas no Oriente Médio e a continuidade da guerra no Afeganistão.

Mas este debilitamento não quer dizer que o imperialismo não vai tomar novas medidas de agressão militar contra os povos do mundo. (...) Por isso neste ato queremos gritar bem forte: Fora as tropas imperialistas do Iraque, do Afeganistão e de todo Oriente Médio! Viva a resistência do povo palestino contra o Estado de Israel e o imperialismo!

O fato simbólico de que os EUA tenham que recorrer possivelmente como próximo presidente a um afro-americano, como Barack Obama (...) é expressão da profunda decadência do imperialismo norte-americano (...) Mas para além dos discursos de campanha, Obama é um homem que Wall Street considera claramente confiável para seus interesses e, antes mesmo de ganhar, tomou como própria grande parte da agenda da política externa de Bush, como o apoio a Israel contra o povo palestino, as ameaças contra o Irã e o apoio ao Plano Colómbia. (...)

Nos últimos anos, a classe operária se fortaleceu socialmente e em distintos setores tem mostrado uma renovada capacidade de luta no terreno económico (...). Mas esta relativa recomposição da ação sindical dos trabalhadores, não significa que tenham revertido as profundas derrotas sofridas sob o neoliberalismo. (...)

Nós, marxistas revolucionários, somos hoje uma pequena minoria, em meio a milhões de trabalhadores que não acreditam na possibilidade de superação deste sistema de exploração (...).

Nestes anos, a resistência social às políticas neoliberais produziram diversos tipos de movimentos, que vão desde amorfos reformismos até o renascimento de correntes, como o autonomismo, que sustentavam que era possível “mudar o mundo sem tomar o poder” e que, em certa medida, voltaram a colocar para nós marxistas discussões teóricas e estratégicas parecidas àquelas que já faziam Marx e Engels no Manifesto Comunista contra os socialistas e comunistas utópicos. O movimento antiglobalização, que surgiu em Seattle em 1999, foi uma mostra clara de todas estas tendências.
Em nosso continente se fortaleceram distintas variantes populistas, que conseguiram canalizar o descontentamento que se expressou nas grandes revoltas populares dos primeiros anos do século. Grande parte da esquerda mundial cedeu frente a estes fenómenos. (...)

Inclusive setores provenientes do trotskismo sustentavam que era hora de construir “frentes anti-neoliberais” ou partidos sem raízes na classe operária e sem delimitação estratégica entre reformistas e revolucionários. O que aconteceu com a Refundação Comunista da Itália, o partido apresentado como exemplo desta estratégia, mostra para onde leva esta política. A Refundação se integrou ao governo anti-operário e pró-imperialista de Prodi, perdeu sua ala esquerda e ficou sem representação parlamentar.

No Brasil, o Partido Socialismo e Liberdade, encabeçado por Heloísa Helena é um mero acordo eleitoral de conveniência, uma casca vazia de militância com um programa desenvolvimentista burguês (...). Na Venezuela, distintos setores trotskistas são parte de um mesmo partido com empresários e militares, o chavista PSUV. Que curioso que organizações que são fanaticamente chavistas na Venezuela, como o MST argentino, acabaram como seguidistas dos “esquálidos” ou gorilas argentinos apoiando a patronal agrária no recente conflito!

Não são organizações deste tipo que a classe operária precisa, mas sim verdadeiros partidos revolucionários de combate. Não é possível construir estas organizações somente intervindo nas lutas cotidianas. Junto a isto temos uma forte luta no terreno teórico e ideológico (...). E também participar em todos os processos em que a classe operária dê, ainda que seja, um passo adiante, no terreno de conquistar sua independência de classe.

As organizações que fazem parte da FT dizem com firmeza que é preciso lutar por partidos que tenham um claro programa revolucionário e, neste sentido, compartilhamos a política que defendem os companheiros do CRI na França de travar uma luta por uma estratégia deste tipo no processo de constituição do Novo Partido Anti-capitalista chamado pela LCR de Olivier Besancenot, cuja direção, como temos denunciado na revista Estratégia Internacional, quer formar um partido que não lute pelo poder operário nem pelo socialismo.

Há quase 70 anos, no dia 3 de dezembro de 1938, uma conferência reunida clandestinamente em Paris fundava a IV Internacional, cujo texto central é o chamado Programa de Transição (...).
Trotsky, pouco antes de seu assassinato, escrevia que “entre as vastas extensões de terras e as maravilhas da tecnologia, que além da terra conquistou os céus para o homem, a burguesia conseguiu converter nosso planeta em uma suja prisão” . Digam-me se estas palavras mantêm atualidade! Um dia desses lia justamente um texto de um famoso pintor, poeta e escritor britânico, John Berger, que dizia que se tivesse que contemplar com algum termo o mundo contemporâneo este seria o da prisão (...)
Trotsky escrevia aquelas linhas frente a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Nós não estamos hoje frente à perspectiva de uma guerra semelhante. (...) Mas, como dissemos no início, estamos vivendo uma crise económica de grandeza (...) Já em anos anteriores vimos como, em circunstâncias de crise, parte do programa transicional ganhava renovada atualidade ao ser tomando pelos trabalhadores em luta, como por exemplo na ocupação e produção sob controle operário da fábrica Zanon, e em outras fábricas ocupadas. Vimos o mesmo na Venezuela com a luta da Sanitários Maracay. E neste mesmo país a luta operária levou à nacionalização da SIDOR, a empresa controlada pelo grupo Techint. Aqui na Argentina, vimos também surgirem organizações militantes de desempregados que, a despeito de seus limites, expressaram a resistência ao flagelo do desemprego de massas e evitaram que aqueles que perdiam seus empregos fossem utilizados pela burguesia como fura-greves.

Greves, ocupações de fábricas, levantamentos pela fome,
insurreições locais, bloqueios de rodovias: veremos estas e outras formas da luta de classes se desenvolverem frente à crise. (...) Temos profunda confiança de que, nesta experiência, o programa trotskista novamente se fará carne em setores das massas e poderá mostrar uma alternativa ao conjunto dos explorados que permita tornar realidade a expropriação dos expropriadores, que é o único caminho para acabar com a barbárie capitalista.
Que estas lutas aconteçam, não depende de nós. Mas o que sim está a nosso alcance é forjar os dirigentes, quadros e militantes que possam confluir com o melhor da vanguarda operária, da juventude, com intelectuais e estudantes, para avançar na construção de partidos e de uma internacional revolucionários.

Neste caminho, saudamos a incorporação dos companheiros da Liga da Revolução Socialista como seção da FT na Costa Rica (...) Também queremos saudar o acordo com os companheiros do grupo CRI para se integrar como seção simpatizante na França. Num marco onde ao mesmo tempo que desenvolvemos uma intervenção comum em base aos acordos programáticos e políticos que temos, abordaremos alguns importantes temas sobre os quais ainda não temos acordo.

Para terminar, na Conferência colocamos três tipos de tarefas para todas as organizações da FT:

Aprofundar a formação teórica e política de nossas organizações, batalhando para recriar um marxismo vivo, que dê respostas aos desafios que a realidade nos coloca e que discuta com as principais teorias elaboradas pelas classes dominantes e pelos reformistas de distintas matizes.

Continuar com o desenvolvimento de nossas organizações no seio do movimento operário; tarefa que não somente enfrenta as perseguições patronais e da burocracia sindical, mas que, lamentavelmente, tem sido deixada de lado por grande parte da esquerda. E isto, companheiros, é crucial porque, frente ao desgaste dos governos nacionalistas ou populistas, estamos assistindo o fortalecimento de tendências de direita completamente reacionárias.

E se não construímos uma alternativa de independência de classe, esse descontentamento vai ser canalizado por essas variantes reacionárias e a classe operária vai sofrer novos golpes sobre suas costas.

Nos propusemos a redobrar a luta por partidos revolucionários e pela reconstrução da Quarta Internacional. Sabemos que esta tarefa é difícil e que não será de nenhuma forma o resultado de uma evolução de nossa organização, mas o produto de fusões e convergência com setores de outras tendências com que possamos confluir no curso da luta de classes. No mesmo sentido que colocou meu companheiro, José Montes, no terreno nacional para o PTS, insistimos no chamado a realizar campanhas comuns e um reagrupamento progressivo pela reconstrução da IV Internacional, dirigido às organizações que reivindicam a luta pela revolução operária e socialista, como a Liga Internacional de Trabalhadores, dirigida pelo PSTU brasileiro, e a CRCI, encabeçada pelo PO argentino.

Propomos encerrar este ato com as consignas que sintetizam as principais campanhas da FT:

Fora as tropas brasileiras, argentinas, uruguaias, chilenas e bolivianas do Haiti!

Abaixo à diretiva de retorno e todas as leis anti-imigrantes e xenófobas da UE!

Apoio à luta de Zanon sob controle operário por sua expropriação definitiva!

E, finalmente: realizar uma campanha pela reconstrução da IV Internacional, a 70 anos de sua fundação.

Viva a classe operária mundial!

Viva a IV Internacional e o Partido Mundial da Revolução Social!

O Partido de los Trabajadores Socialistas (PTS) é a organização irmã da LER-QI na Argentina, e também faz parte da Fração Trotskista - Quarta Internacional









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