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Terça 7 de Maio de 2024

Internacional

DIREITOS HUMANOS

Condenados a prisão perpétua 12 ex-militares da Ditadura argentina

24 Oct 2011   |   comentários

No dia 27 de outubro de 2011, o Tribunal Federal da Argentina condenou 12 ex-militares da Marinha à prisão perpétua pelos crimes que cometeram durante o regime militar que se instaurou entre 1976 e 1983. Os agentes condenados eram da ESMA (Escola de Mecânica da Armada), famoso centro de detenção e extermínio, responsável pelo assassinato e desaparecimento de pelo menos 5 mil pessoas e a apropriação de vários bebês, entregues para família de militares ou colaboradores depois que suas mães eram mortas.

Dentre os agentes condenados está Alfredo Astiz, o “anjo loiro da morte” que ficou conhecido por ter se infiltrado em 1977 na recém fundada associação das Mães da Praça de Maio e organizado o seqüestro de três de suas fundadoras e mais 9 militantes dos direitos humanos. Todos foram torturados e assassinados nos muitos “voos da morte”, em que presos amarrados eram atirados ao mar de aviões.

Dentre os advogados de acusação deste julgamento, que durou 22 meses e teve seu veredito transmitido ao vivo pelos principais canais de TV da Argentina, encontrava-se Myriam Bregman, membro do CeProDH(Centro de Profissionais pelos Direitos Humanos) e Justicia Ya (Justiça Já) e militante do PTS (Partido dos Trabalhadores Socialistas), organização irmã da Ler-qi na Argentina, quem junto a Luis Bonomi foi advogada de acusação pelo assassinato do escritor Rodolfo Wash.

A seguir, divulgamos uma entrevista de Bregman prestada ao site do PTS logo após o veredito:

O que significa para você este veredito?

Este julgamento chega depois de muitos anos de luta. Sofreu todos os obstáculos colocados pelas leis de impunidade. Muitos dos fatos que aqui se julgam são fatos que inclusive foram julgados e analisados no Julgamento das Juntas e depois de 20 anos se volta a reiterar. É uma causa que se havia iniciado em 2007 contra o prefeito Febrés, mas antes que terminasse este foi envenenado com cianureto em seu local de detenção. Assim, chegar a esta instancia e conseguir prisão perpétua para estes repressores, muitos deles simbólicos como Astiz, o Tigre Acosta, Pernías, é para nós muito importante. Por suposto que as três absolvições nos deixam um sabor amargo no caso específico de Rodolfo Walsh (escritor argentino seqüestrado e assassinado pelos agentes da ESMA) e faz com que vejamos que é importante redobrarmos a luta por demonstrar que na ditadura participaram todos. Como os mesmos repressores o disseram aqui, foi uma participação institucional. Iremos apelar as absolvições.

Depois do veredito, o tribunal nomeia e reconhece a figura de genocídio gravitando neste julgamento. Como vocês receberam isso?

Todavia temos que esperar ao que resolve o tribunal, mas, a partir de hoje, já podemos dizer que o tribunal faz um reconhecimento de que os delitos cometidos na Argentina foram parte de um genocídio e que este genocídio se cometeu por motivos políticos. Este é muito importante porque é parte do que nós vínhamos sustentando desde há muitos anos, com algumas conquistas parciais como os que temos obtido nas sentenças de La Plata como outros a partir daquele primeiro pedido quase que solitário que fizemos no julgamento contra Etchecolatz. E agora que este tribunal fala de genocídio, além de não ter enquadrado cada fato em particular, demonstra que temos instalado um debate, que não é um debate só jurídico, porque o que queremos discutir é qual foi o processo político que se deu na Argentina entre 1976 a 1983.

Antes você dizia que houve absolvições.

As absolvições eram inacreditáveis. Absolver a Rolón, membro chave dos agentes da ESMA, que todo o tempo reivindicou os atos e que, inclusive, em meu caso particular, me aconselhou que abandonasse o discurso trotskista, que lhe fazia relembrar a 1917, e que com isso se conseguiam poucos votos! Também Astiz me aconselhou que não seguisse defendendo o direito ao aborto! Ou seja, gente que reivindica absolutamente o que fez, que tem conhecimento profundo dos fatos, que se cala, não diz o destino dos desaparecidos e que hoje resulta absolvido. A verdade é que cada vez que o tribunal nomeou a palavra absolvido era como que um silêncio recorresse a sala, porque ninguém podia acreditar que se trate de Rolón, de García Velazco, de Coronel, os três assassinos de Rodolfo Walsh absolvidos! O Coronel (que foi condenado pelo resto dos casos), que é um caso extremo, era membro do Exército e se ofereceu a atuar como agente na ESMA e para que não se o incrimine no caso Walsh disse que estava “perseguindo subversivos na fábrica Fate de San Fernando”. Tem uma naturalidade em reconhecer como atuavam na ditadura e a quem perseguiam, que ainda que neste caso seja mentira (já que efetivamente participou do assassinato de Walsh) foi assombroso o argumento que utilizou. O caso de García Velazco tem uma conotação especial para Patricia Walsh, para os familiares e amigos porque é nada mais nada menos que o que comandou o operativo de perseguição e seqüestro de Walsh.

Resulta chamativo que o maior centro clandestino do país, onde passaram 5.000 detidos desaparecidos, sejam nada mais que 18 os militares acusados.

É que este julgamento teve a particularidade de ser com 18 repressores, foi sofrendo cada vez mais fragmentações e não se julga a todos os genocidas que passaram pela ESMA, como na maioria destes julgamentos que se dão de forma absolutamente fragmentada. Neste momento não são muito mais de 60 os que estão processados em total pela causa ESMA; se fala de “Mega causa”, mas isso não quer dizer “mega acusados”, porque são bastante poucos, porque muitos desses acusados estão em liberdade, inclusive os que hoje receberam condenação, muitos deles hoje se foram a sua casa. Isto é notório. E também, como demonstramos em nossa alegação, a Armada participou em forma institucional, e de todos eles, a maior parte está impune, imaginem-se que só 60 estão processados. E 4.000 hoje, a ponto de começar o terceiro governo kirchnerista, estão em funções. Assim que temos que seguir mobilizados para que não sejam somente 18 os condenados, senão que se julgue ao conjunto da instituição que participou na ditadura para conseguir a total e definitiva condenação de todos pelo que são: genocidas.

CLIQUE AQUI para ver a matéria exibida no Jornal Nacional da última quinta sobre o julgamento.

Globo divulga no Jornal Nacional a condenção na Argentina aos 12 ex-militares, mas no Brasil faz parte do bloco reacionário contra a abertura dos arquivos da ditadura, a memória, a verdade, julgamento e o castigo aos milicos, policiais e empresários (incluindo o patrono da Globo Roberto Marinho) responsáveis pelos crimes da ditadura que seguem impunes. Com a conivência do PT, PCdoB, Lula, Dilma, CUT e o silêncio vergonhoso das correntes que se dizem de esquerda no PT e os intelectuais ditos "progressistas" como Marilena Chauí, Emir Sader etc. Que o exemplo da Argentina nos sirva de inspiração para uma grande campanha contra a impunidade aos lutadores, pela abertura de todos os arquivos da repressão policial e do Estado, pelo fim da lei da anistia de 1979 que protege os agentes da repressão e pelo julgamento e condenação de todos os torturadores.

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