Sexta 26 de Abril de 2024

Nacional

RECUPERAÇÃO ECONÔMICA E GREVES

Brasil: ‘modelo’... de exploração

25 Sep 2009   |   comentários

O presidente do Banco, Henrique Meirelles, declarou que “o Brasil é visto como modelo” e que “crescerá de forma sustentada” . Revistas como a Veja estampam capas anunciando um “mundo pós-crise” , destacando o país como quem “entrou por último na crise e saiu primeiro” . O governo Lula tem sido elogiado pelo Le Monde por definir que a crise seria apenas uma “marolinha” . Os burocratas sindicais da CUT, Força Sindical, CTB e Cia., desde o ano passado iludem os trabalhadores com a cantilena de que “não há crise” , e agora afinam seus violinos para tocar a cantiga de que a recuperação económica deve ser repartida, isto é, os patrões deveriam, bondosamente, conceder aos trabalhadores parte (mísera) dos seus grandes lucros auferidos desde que estourou a crise em setembro passado. Esses lucros patronais cresceram às custas de medidas governamentais que garantiram forte injeção de dinheiro aos bolsos dos capitalistas, via BNDES, Banco do Brasil, Caixa Económica Federal, isenção de impostos (IPI) e crédito a juros reduzidos para estimular o consumo.

De janeiro a setembro de 2008 a média diária de concessão de crédito foi de R$ 7,1 bilhões, enquanto em junho deste ano essa média atingiu R$ 7,3 bilhões. Automóveis e eletrodomésticos, principalmente, foram favorecidos por essas medidas e alcançaram níveis altos de vendas. No plano externo, com os juros mundiais em níveis próximos de zero, ou mesmo negativos, e a desvalorização do dólar, o Brasil, com juros básicos em 8,75% (dos mais altos do mundo), se apresentou como um porto seguro para o capital externo que buscava alta valorização no mundo pós-crise mundial, quebra de grandes bancos e recessão. Assim, o país pode manter reservas cambiais próximas a US$ 220 bi, ao custo de ter sua moeda supervalorizada em relação às demais moedas conversíveis (dólar e euro). Além de todas essas medidas e condições internas e externas, a economia não afundou numa recessão grave fundamentalmente pela liberdade que a patronal detinha e detém para demitir, precarizar os empregos e arrochar os salários e cortar direitos e conquistas.

Quando explodiu a crise, em 2008, os patrões se apressaram na chantagem de que os trabalhadores deveriam assumir sacrifícios, cortando salários e flexibilizando a jornada de trabalho em nome de “garantir os empregos” . Em dezembro passado os patrões eliminaram 655 mil postos de trabalho, principalmente no setor industrial. Além das centenas de acordos cortando salário. Grande parte dos que ficaram sem emprego foram os terceirizados e contratados. De lá pra cá os que mantiveram seus empregos tiveram sua renda diminuída e estão trabalhando sob ritmos extenuantes para garantir a retomada de produção. Nos últimos dias tanto governo como burocratas sindicais e imprensa burguesa fazem “festa” com os números divulgados de empregos para enganar que há criação de novos postos de trabalho. Uma grande operação para esconder que os 680.034 postos de trabalho criados de janeiro a agosto apenas compensam a destruição de empregos de dezembro. Os cerca de 240 mil empregos gerados em agosto não escondem que 1,2 milhão de pessoas foi demitida. Por trás desses números não há expansão dos empregos mas o mecanismo de rotatividade ’ demite-se um ou dois, depois admite-se um, fazendo este trabalhar por dois. Assim os lucros patronais são garantidos ou elevados. Mesmo consultores capitalistas como o economista Bernardo Wjuniski, a consultoria Tendências, alerta para “olhar com cautela os números” , pois “isso é recuperação, e não expansão” de empregos.
O aumento do nível de exploração capitalista se demonstra no rendimento médio mensal de trabalho do brasileiro, que aumentou meros 1,7% de 2007 para 2008, passando de R$ 1.019 para R$ 1.036, diante de 7,2% de 2005 para 2006 e 3,1% de 2006 para 2007 (Pnad 2008, IBGE). A desigualdade social é escandalosa: os 10% da população ocupada com rendimentos mais baixos ficaram em 2008 com míseros 1,2% do total de remunerações de trabalho (em 2007, 1,1%), enquanto os 10% com rendimentos mais elevados abocanharam 42,7% (43,3% em 2007). O próprio gerente de Pesquisa do IBGE, Cimar Azeredo, não esconde que a “melhora” dos rendimentos mais baixo (1,7%) se deveu não só ao cenário económico favorável, mas aos programas sociais do governo, como o Bolsa Família. Ou seja, a patronal ano a ano avança contra a renda dos trabalhadores, retirando daí a maior parte dos seus lucros.

Essa realidade desmente os burocratas sindicais que passaram todos esses meses enganando que não havia crise, ajudando os patrões seu plano de descarregar os efeitos da crise em nossas costas.

Recuperação precária e temporária

É inegável que os efeitos da crise mundial não se fizeram sentir com tanta força no país, em vista das medidas governamentais, das exportações de commodities, gastos governamentais e de índices inflacionários baixos ’ devido a depressão dos preços externos e internos, queda das importações, dentre outros fatores ’, o que alavancou a retomada da produção (em particular na indústria e construção civil) e do consumo. Porém, todas essas “vantagens” temporárias não definem um futuro de “crescimento sustentável” , como se ouve na propaganda do governo e da maioria dos capitalistas. A isenção de IPI, mesmo sendo mantida por mais alguns meses, tem vida curta, visto que afetará o equilíbrio fiscal deste ano, pois já cumula queda de 29% na arrecadação (R$ 6,5 bilhões a menos). A perda de arrecadação de IPI com a venda de automóveis alcançou 91% ’ apenas R$ 34 em janeiro, ante R$ 378 milhões no mesmo mês de 2008.
As exportações cresceram sustentadas nas vendas de commodities ’ minérios, grãos etc. ’ para a China. Contudo, os preços estão caindo, o que diminuirá o montante de capital alcançado. Fruto da crise mundial e da diminuição da produção industrial, as importações recuaram, e agora, para manter a recuperação e recompor estoques para aproveitar as vendas de final de ano, espera-se uma elevação dos valores importados. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) espera para o ano US$ 124 bilhões em importações (queda de 28% em relação a 2008) e US$ 146,2 bilhões em exportações (queda de 26,1%), gerando um superávit comercial de US$ 21,3 bilhões ’ o governo prevê U$ 23 bi ’, bem abaixo dos US$ 24,7 bi de 2008. Com esse baixo superávit comercial o governo terá mais dificuldades para trazer dinheiro externo, tão necessário para financiar a já altíssima dívida pública (R$ 1,3 trilhão), que consumiu R$ 414 bilhões em agosto, apenas em títulos vencidos que se não foram pagos tiveram que ser “rolados” , ou seja, recomprados (via títulos públicos) pelo governo, movimento que leva a dívida a aumentar mês a mês, mesmo com os juros mundiais na lona.

Não restará outro caminho além de emitir títulos públicos a juros elevados ’ os investidores exigirão mais rentabilidade para emprestar dinheiro ’, refletindo nas taxas básicas de juros internas, e em conseqüência atuando como freio na recuperação económica, não estando descartado um curso recessivo principalmente diante de choques externos ’ quebras de bancos e empresas, menor fluxo de capital estrangeiro, recessão em países compradores (China, EUA, Europa).

Este quadro estrutural nos leva a definir esta recuperação económica como precária (sem fundamentos sólidos) e temporária (sujeita às oscilações da crise mundial). O governo age febrilmente, inclusive com muita demagogia e propaganda, para postergar essa recuperação pelo menos até as eleições de 2010, surfando nessa onda para eleger sua candidata Dilma Rousseff. Não nos cansaremos de alertar os trabalhadores de que a crise capitalista mundial, que apresentará períodos de recuperação e novas quedas, ainda não mostrou seus piores efeitos, e não devemos nos deixar embriagar por falsos discursos de gente comprometida com os capitalistas e não com os trabalhadores e as massas oprimidas.

Greves mostram a mais importante recuperação: a retomada de lutas operárias

Como sempre, os trabalhadores enxergam nos momentos de recuperação económica uma oportunidade para recobrar suas forças e exercitar-se em lutas salariais para recuperar parte do que perderam, sabendo que a patronal pode ceder por necessitar manter o nível de atividade produtiva para garantir seus planos para os próximos meses. Esta recuperação económica tem permitido que grandes categorias, como os metalúrgicos, reapareçam na cena nacional mostrando sua potência em paralisar grandes indústrias como a Volkswagen, Toyota, GM, impondo mesmo contra os burocratas sindicais partes importantes de suas reivindicações. Essa retomada das lutas operárias, ainda que centrada na recomposição salarial, sem um programa ofensivo de defesa dos interesses de todos os trabalhadores e não apenas uma determinada categoria, que aponte para derrotar os planos capitalistas e impor as reivindicações às custas do lucro patronal e não, do sacrifício dos trabalhadores ’ efetivos mas, principalmente, terceirizados, contratados, precarizados ’, como as direções sindicais governistas e burocráticas (CUT, Força Sindical, CTB etc.) têm imposto nesses anos.

As direções sindicais combativas reunidas na Conlutas estão chamadas a encarar essa conjuntura e as perspectivas futuras preparando um verdadeiro plano de luta de toda a classe trabalhadora, independente de categoria ou data base, efetivos e terceirizados, para defender os empregos, barrar as demissões, reconquistar os postos de trabalho fechados nessa crise, repartir as horas de trabalho entre todos os que necessitam de emprego, reduzindo a jornada até garantir emprego para todos, recompor os salários em níveis dignos (salário mínimo do Dieese), defendendo um reajuste geral de salários para todos os trabalhadores do país (independente de categoria ou data base), tornar efetiva e séria a luta inadiável pela unidade de todos os trabalhadores, incorporando incondicionalmente a exigência de salários e direitos iguais a todos os terceirizados e precarizados, para fazer valer a nossa força no enfrentamento dos grandes inimigos ’ a patronal, os governantes, seus partidos e instituições.

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