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Sábado 4 de Maio de 2024

Nacional

RIO+20

A falácia do “capitalismo verde” não passa de um bom negócio

10 Jul 2012   |   comentários

O inevitável fracasso da Rio+20 ficou tão evidente que exerceu uma pressão até mesmo no Secretário Geral da ONU, Ban Ki-moon, que logo após o encerramento da cúpula chegou a dizer que “esperava um documento final mais ambicioso”, posição que mudou uma semana depois, em discurso na sede da ONU. Esse mesmo espírito de um “forçado balanço positivo” está evidente na declaração da presidente Dilma, quando classifica o texto “O futuro que queremos” como “o documento possível”, que tem sua fortaleza no “princípio do não retrocesso ambiental” (ideia que se refere à preservação das normas ambientais anteriormente estabelecidas). O fato é que as três principais decisões esperadas da Rio + 20 não foram aprovadas e os objetivos se reduziam a cada dia, inclusive com a prévia retirada da pauta “balanço desde a Eco 92”. Confirmando as expectativas que trabalhamos no texto anterior, este evento expressou de modo concentrado a agonia do capitalismo mundial em sua fase de decadência, como chamou Lênin, o imperialismo.

As três propostas centrais que acabaram não sendo aprovadas eram sobre a criação de um Conselho de Desenvolvimento Sustentável na ONU, metas do desenvolvimento sustentável e a criação de um fundo para financiamento do desenvolvimento sustentável nos países mais pobres. O conteúdo dessas propostas abarca dois principais temas, a “economia verde” e a “governança internacional do meio ambiente”. Em relação à economia verde, vemos como expressa a crise de valorização do capital, muito mais intensa nessa época de desenvolvimento capitalista (época do imperialismo), sendo que por meio da criação de uma “Bolsa Verde” busca-se atribuir valor aos chamados “bens comuns” (florestas nativas, o ar, a água etc.), normatizando a sua transformação em propriedade privada e criando um mercado financeiro no qual os títulos desses bens possam ser comercializados. Na prática, isso é a abertura de um mercado para a especulação financeira com a preservação ambiental, uma vez que os especuladores poderão comprar “títulos da Amazônia”, por exemplo, hoje por determinado preço, financiando ao governo a sua preservação, mas vendendo por preços muito mais elevados os mesmos títulos em outro momento, conforme avance o desmatamento e, assim, se valorize aquele trecho preservado da floresta.

Os debates em torno do tema da governança internacional do meio ambiente também expressam categoricamente outra característica do imperialismo, que é a contradição entre o desenvolvimento das forças produtivas e as fronteiras nacionais. Esse processo é analisado por Lênin do ponto de vista objetivo como o avanço das bases para a planificação da economia internacionalmente, com a ascensão dos monopólios e do capital financeiro que dominam e repartem o mundo entre si, com uma produção que rompe em sua própria cadeia as velhas fronteiras nacionais. É fato é que a natureza não tem fronteiras nacionais, sendo que necessariamente os impactos ambientais causados pela produção capitalista em determinado país integram um todo global e indivisível que repercute também em outros países. Desse ponto de vista, a produção do capitalismo mundializado somente aprofunda o inevitável: os problemas ambientais são problemas globais e, portanto, qualquer tentativa de resposta deve partir dessa escala. Ocorre justamente que, além dos conflitos de interesses particulares, das próprias multinacionais etc., durante a Rio + 20 as propostas esbarravam diretamente nas fronteiras dos interesses nacionais. Os choques sobre a proposta de criação de um fundo de financiamento do desenvolvimento sustentável para os países mais pobres (para além de questionarmos essa proposta em si mesma), a ser financiado pelos mais ricos, é um exemplo do caráter de classe burguês – e por isso mesmo utópico e reacionário – dos elementos de “coordenação” que os países capitalistas buscam desenvolver para gerenciar sua crise ambiental, revelando esse sistema como um dos principais entraves ao desenvolvimento humano.

A estratégia da Cúpula dos Povos não é uma alternativa

Por fim, ao encerramento do evento, foi organizada a partir da “Cúpula dos Povos” uma ampla marcha que denunciava a cúpula imperialista e sua incapacidade de se enfrentar seriamente com os problemas ambientais. Milhares de ambientalistas, movimento de atingidos por barragens, indígenas, sindicatos, estudantes em luta das federais etc. engrossaram a “Marcha dos Povos” no encerramento, além das várias marchas que aconteceram durante os dias anteriores. Consideramos progressista o sentimento anticapitalista que imbuía setores presentes nessa marcha, expressando demandas democráticas reais e sua contradição com as mazelas do capitalismo. Contudo, apesar desses aspectos progressistas, entendemos que a estratégia e o programa predominantes na Cúpula dos Povos permanecem nos marcos do reformismo, não contribuindo para qualquer avanço na luta independente dos trabalhadores e dos povos oprimidos e, por isso, consideramos um equívoco partidos como o PSTU, que vem do trotskismo, apenas reivindicar de conjunto a marcha, sem qualquer crítica a partir de uma perspectiva revolucionária que busque contribuir para o avanço dos ativistas mais sinceros.

O próprio desenvolvimento do movimento ambientalista não buscou construir sua luta em clara oposição ao capitalismo, sendo que para isso contou com a importante ajuda de toda a deturpação do marxismo feita pelo stalinismo (forma de degeneração burocrática da URSS), como coloca Gilson Dantas, no livro Natureza atormentada, marxismo e classe trabalhadora: “Tragicamente, com a degeneração da Revolução Russa, todo o movimento conservacionista da URSS, no final dos 30, estava completamente dizimado. A esta ecologia soviética dos 1920, a mais avançada do mundo [grifo nosso], seguiu-se Lissenko, com seus ataques ‘científicos’ à ecologia, à genética, ao conservacionismo ambiental, e por fim o dramático ecocídio de Stalin. O descarte da crítica ecológica virá com a afirmação da ‘meta suprema’ da sociedade burocrática soviética da produção pela produção: a dialética da crítica ecológica permanecerá obscura – menos, em parte, para Caudwell, para Bukharin, que continuariam por breve tempo escrevendo sobre o tema em um viés marxista revolucionário.” (p. 97, 2ª edição).

O fato é que, com o movimento ambientalista recebendo patrocínios das mesmas multinacionais que poluem e degradam – a Cúpula dos Povos é garantida por financiamento da “Fundação Ford” – para defender medidas paliativas que não atacam o cerne da questão (conforme desenvolvemos no texto anterior, a própria lógica da produção capitalista, alienada e alienante que separa o homem da natureza, causando uma “quebra metabólica” nessa relação). A única coisa que conquista na prática são reformas que cobrem com um discurso “de esquerda” a política hegemônica no Rio+20, ajudando a legitimá-lo e criando também novos nichos de mercado com as ONGs. A mesma contradição vemos em sua declaração final, quando em determinados momentos denuncia o capitalismo, mas em outros defende práticas coniventes com o mesmo (reformas), como “economias locais”, que seriam formas alternativas de organização da sociedade desenvolvidas paralela e internamente ao capitalismo, ou a “participação popular” e “gestão democrática” como modelos de atuação dentro do Estado burguês. Nesse marco, é apenas fraseologia de esquerda desprovida de qualquer seriedade a referência a um “dia mundial da greve geral”.

Por uma estratégia de independência de classe para enfrentar a questão ambiental

Qualquer luta consequente em defesa do meio ambiente deve adotar como estratégia a constituição da classe trabalhadora como um sujeito político independente da burguesia levantando essa como uma de suas bandeiras, atuando com os métodos próprios de sua natureza de classe, hegemonizando os demais setores explorados e oprimidos da sociedade que também são vítimas da degradação ambiental; tarefa que não pode se dar sem a luta política contra as direções reformistas da Cúpula dos Povos. Essa é a tarefa que deve levar adiante todos os setores que se reivindicam classistas e revolucionários, e para a qual chamamos os setores de ativistas honestos que acreditam que a questão ambiental deve ser encarada com os métodos da luta de classes.

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