Terça 30 de Abril de 2024

Juventude

A crise do sistema universitário brasileiro e o papel da Conlutas

05 Feb 2006   |   comentários

A explosão da crise financeira da PUC-SP, uma das mais importantes universidades privadas do país, revelou a situação de crise estrutural do sistema universitário privado. Uma crise de “superprodução” : muitas vagas para poucas pessoas que podem pagar o preço das mensalidades. A ameaça de demissão de dezenas de professores por parte da reitora Maura Véras e as ameaças de intervenção da Fundação São Paulo (verdadeira dona da PUC) caso a PUC não realize profundos cortes de gastos, mostram a verdade sobre o caráter “filantrópico” e destas instituições privadas e derrubam a farsa de sua suposta “democracia” interna. Depois de anos de desconto nos impostos apesar do brutal aumento de mensalidades e ainda recentemente contando com o favorecimento do governo federal pela via do ProUni a PUC está atacando o emprego de professores, depois de ter demitido vários funcionários, está perseguindo o movimento estudantil e realizando ataques aos bolsistas.

Ao mesmo tempo a política de privatizar e destruir a qualidade do ensino público segue a pleno vapor. O jornal Folha de São Paulo, num editorial de 31 de janeiro, com o titulo de “Receita Universitária” se referindo a greve dos professores das universidades federais, que já estão há dez anos sem reajuste, afirma “O problema é como equilibrar a pretensão por aumentos com outras demandas básicas da sociedade, que ultrapassam em muito os limites do já engessado Orçamento da União” . Exatamente. As demandas básicas da sociedade não cabem no restringido orçamento do governo. Por que? Por que o setor público (União, estados, municípios e empresas estatais) torrou R$ 157,145 bilhões, ou 8,13% do produto interno bruto (PIB), com pagamento de juros. Dinheiro que equivale a cerca de 3,5 vezes a soma do Orçamento destinado, ano passado, a Educação e Saúde, que ainda foi vítima de contingenciamento.

A situação de crise do ensino superior é clara. Durante toda à década de 90 a linha privatista do imperialismo foi aplicada estritamente pelo governo FHC. Era e é uma necessidade do capital internacional transformar a educação num mercado lucrativo e readequar os currículos às necessidades de formação de mão-de-obra barata e não de cientistas. O caminho para isso foi, de um lado impulsionar até o caos a formação de universidades particulares. De outro, reduzindo o orçamento público da educação para beneficiar os capital concentrando, destruindo a qualidade dos cursos que geram pouco lucro e privatizando a pesquisa em outros cursos através das fundações privadas e da transferência de patentes.

PT e capitalistas do ensino: unidos para enganar e roubar os trabalhadores

Durante a gestão do PSDB, a partir da LDB de 1996, as universidades públicas de maioria que eram passaram a ceder terreno para as universidades particulares. Entre 1993 e 2003 “houve um aumento de apenas 64% no número de vagas na universidade pública, diante de um crescimento de mais de quatro vezes no número de vagas nas instituições privadas.” Ao mesmo tempo, em 2003 o número de vagas oferecidas foi maior que o número de formandos no ensino médio: “foram 2 milhões de vagas nos processos seletivos em 2003, quando 1,8 milhão de estudantes terminaram a escola.” Porém, “o número de vagas sobrando nas universidades particulares chegou a 726 mil no ano passado, o que representa 42,2% do total oferecido no período.”

Aqui está a principal contradição do atual sistema universitário brasileiro: as universidades privadas, com o incentivo do governo do PSDB primeiro e agora o de Lula, aumentam cada vez mais o número de vagas e o valor da mensalidade, o que faz com que a maioria da população não tenha dinheiro para se matricular ou se o faz, fica inadimplente. Isso cria uma enorme crise para os donos das universidades particulares, fruto da pobreza da população e da sua sede infindável de lucro. Com o ProUni o governo Lula e o ministro da educação Tarso Genro pretendem salvar as universidades particulares da crise através da isenção de impostos e ao mesmo tempo apresentar as novas vagas criadas como uma grande concessão para o povo pobre e negro. Concessão que na verdade não passa de uma pequena migalha, já que atende a uma ultra-minoria dos trabalhadores, enquanto a maioria segue fora da universidade. Minoria que terá enormes dificuldades práticas para terminar os seus estudos por falta de dinheiro para os materiais e por em muitos casos trabalhar exaustivamente.

A política de Lula e a situação das universidades públicas

O governo Lula trata de continuar a obra dos tucanos. Como dissemos acima, numa ponta do ensino superior público, trata-se de destruir a qualidade do ensino e transformar a maioria dos cursos em cursos técnicos, que formem mão-de-obra barata; cursos pagos de preferencia. Na outra ponta do sistema se pretende conservar algumas universidades ou faculdades como bolsões de excelência, produtores de tecnologia para os grandes monopólios via o financiamento das fundações. Ao mesmo tempo, com o sistema de cotas e o ProUni o governo Lula pretende criar a ilusão de ascensão social entre os negros, aparecer como um governo que favorece os mais pobres e salvar os donos das escolas particulares.

O caso da Unesp em SP é simbólico para as públicas. Foram criadas mais de 5 mil novas vagas sem um centavo sequer de aumento no orçamento. Isso está levando está universidade a uma enorme crise financeira, com corte de gastos de 15% em todas as suas unidades e atrasos no pagamento de funcionários e professores. Como se não bastasse o que já foi feito, o governo de Alckmin afirma que as universidades recebem muito dinheiro para o que oferecem. Defende que ainda é possível ampliar as vagas sem aumentar as verbas, na USP, Unesp/Fatec e Unicamp. Isso vai fazer o sistema universitário público de SP chegar ao mesmo ponto catastrófico do sistema publico federal.

O projeto de Lula não é tão diferente. Avança nos pontos que levantamos acima de várias formas. Criando novas vagas com a qualidade muito reduzida e sem aumentos no orçamento. Inclusive começa a criar milhares de vagas “à distancia” , um enorme ataque à qualidade do ensino. Estimula as PPPs (Parceria público-privado). Aprova uma nova “lei de inovação tecnológica” para facilitar a entrada das fundações e a transferência de patentes do setor público para o privado. Mantém o exame das universidades com o objetivo de avaliá-las segundo critérios produtivistas e não de qualidade cientifica.

O papel da Conlutas na luta pelo ensino público

A greve da USP, Unesp/Fatec e Unicamp por mais verbas em 2005 e a greve salarial das universidades federais, mostram que existem condições para organizar uma luta nacional unificada em defesa da educação pública.

Durante toda a década de 90 a estratégia aplicada pelas direções cutistas e petistas foi evitar que as lutas económicas do conjunto do setor da educação se unificassem e avançassem para uma luta política superior contra o governo FHC. Política para a direção petista era só na época das eleições.

No ano passado, infelizmente, a luta nas federais e a luta nas estaduais paulistas não foram unificadas, nem sequer realizamos manifestações conjuntas. Esse ano a Conlutas necessita corrigir as suas falhas e colocar todo o seu peso nacional numa luta para unificar as campanhas salariais do setor da educação, impulsionar uma mobilização unificada por mais verbas em todas as universidades públicas e lançar a partir da PUC/SP uma ampla campanha em defesa da estatização das particulares sob controle da própria comunidade. Ligando essas lutas à necessidade do não pagamento das dividas interna e externa e de um imposto progressivo às grandes fortunas para atender às necessidades de saúde e educação da maioria da população, colocando ofensivamente a luta pelo fim do vestibular, pelo ingresso direto na universidade, pela melhoria do ensino médio e por jornadas de trabalho reduzidas para os trabalhadores e filhos de trabalhadores que estudam, será possível estender uma ponte de unificação com o conjunto da classe operária e desmascarar a demagogia da “inclusão social” do governo Lula.

Sem nenhuma ilusão de que setores burgueses poderão travar esta luta pela melhoria do ensino, temos que articular estas lutas com o conjunto de demandas dos trabalhadores, como a luta contra as demissões, por emprego para todos, por um salário mínimo que atenda as necessidades de uma família etc. Essa é a única forma de não ficarmos reféns, como muitas vezes acontece com o PSOL e o PSTU (portanto também com a Conlute e Conlutas) da estratégia impotente de um amplo setor de intelectuais de esquerda que vê a universidade como um possível motor do desenvolvimento capitalista no Brasil. Neste momento, onde se trata de defender a universidade pública dos ataques que ameaçam sua existência, é de importância vital a luta unificada com estes setores. Porém, não podemos deixar de colocar como a estratégia dos trabalhadores para a universidade não passa pela perspectiva de transformar o Brasil numa potencia capitalista, mas sim de conquistar nossa verdadeira independência política, económica e cultural através de uma revolução socialista. Portanto a perspectiva para a universidade deve ser de realizar um grande pacto operário-universitário, que como parte de uma série de transformações profundas em toda a sociedade, coloque o conhecimento produzido nas universidades à serviço dos trabalhadores e do povo e não à serviço dos grandes capitalistas.

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