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Juventude

DEBATE

“Repressão na ditadura e reorganização da esquerda” na calourada do IFCH/Unicamp

06 Apr 2012   |   comentários

Com Marcelo Ridenti, professor de sociologia da Unicamp, Alvaro Bianchi, professor de política da Unicamp e militante da PSTU e Val Lisboa, metroviário e dirigente da LER-QI, e cerca de 80 estudantes do IFCH, realizou-se o importante debate “repressão na ditadura e reorganização da esquerda” durante a calourada.

Enquanto militares comemoram o golpe e o governo Dilma segue em pacto tácito com a cúpula militar em sua tímida comissão da verdade, mascarando seu progressismo sem qualquer progresso, aqui pudemos debater diante de estudantes atentos e interessados as estratégias da esquerda de ontem e hoje com um balanço do golpe e da ditadura militar.

Val Lisboa abriu resgatando os processos que se davam na classe operária brasileira pré-golpe dando bastante ênfase na insubordinação do baixo escalão das forças armadas, principalmente da marinha, que abriam graves fissuras na hierarquia militar e se voltavam ao CGT (Comando Geral dos Trabalhadores) em busca de orientação e direção. Trata-se, em sua visão, de um importante fato que abriu precedentes no Brasil para que, ao lado das lutas operárias e dos levantes camponeses que percorriam o país contra as contradições aprofundadas pelo desenvolvimento capitalista, se abriu a hipótese do desenvolvimento de um processo revolucionário com elementos de tipo soviético (uma comparação com os sovietes de operários e soldados que se desenvolveram na Rússia). Assim, o golpe vem para barrar este processo, portanto, contra a classe operária e a possibilidade de hegemonia proletária, em sincronia com os processos revolucionários mundiais e, principalmente, a Revolução em Cuba, ao contrário de interessadas visões de que o golpe era um ataque à democracia burguesa.

Este balanço é chave para a discussão de dois pontos estratégicos: o papel do stalinismo enquanto direção que levou a classe operária à derrota em todos os processos revolucionários em escala internacional, e no Brasil o PCB, que inclusive dirigia o CGT com uma estratégia de aliança com uma utópica burguesia nacional-desenvolvimentista dirigente da “revolução democrática”, levou a classe operária à derrota diante do golpe de 1964; por outro lado a compreensão que se tornou dominante de que se tratava de um golpe contra a democracia levou e a falta de balanços estratégicos e das direções definiu a estratégia de toda a esquerda de derrubada da ditadura para a reconstrução da democracia burguesa, levando a uma adaptação de todas as organizações ao processo de transição pactuada e lenta que se deu no Brasil a partir de meados dos anos 1970, inclusive aceitando a Lei de Anistia que blindou todos os torturadores e mentores da ditadura.

Depois Val analisou os processos que se deram durante a ditadura com as duras greves operárias em 1967-1968, o elemento do movimento estudantil que ressurgiu aí como aliado estratégico da classe operária e todo o seu desdobramento com avanços e retrocessos que se deram ao longo de todo o período militar que culminou com o ascenso do fim da década de 1970 e início dos 1980, onde o “novo sindicalismo” surge não como coroamento deste processo, senão como desvio do mesmo, aproveitando as espetaculares derrotas dos processos de revolução política no Leste europeu (Polônia, centralmente) e das revoluções centro-americanas para hegemonizar a estratégia da “conquista da democracia”. Assim, o PT chamado pelos operários de Santo André que em 1977 chamavam a construção de um partido para tomar o poder, torna-se, nas mãos das direções burocráticas do novo sindicalismo (com papel preponderante de Lula) vai, com contradições, se tornando um partido para angariar espaço e se integrar à “democracia” burguesa.

Depois falou Marcelo Ridenti colocando que o golpe militar de 1964 era contra as reformas de base (“progressistas e profundas”, em suas palavras) de Jango que poderiam levar a transformações estruturais como, por exemplo, a reforma agrária. Depois fez todo um panorama da esquerda durante a ditadura que partia do PCB e seus rachas e chegava até às organizações trotskistas como POLOP e POR, dando ênfase à influência estratégica latino-americana que surgirá a partir da Revolução Cubana e do guevarismo que influenciou diversos setores da esquerda e causou rachas dentro dela. Neste sentido defendeu que a estratégia de toda a esquerda era sim revolucionária, por mais que fosse um processo que se desembocasse na democracia burguesa.

Questionado desde o plenário sobre o programa a respeito da verdade hoje defendeu que a Comissão da Verdade não bastava, mas que deveríamos aproveitá-la, mas que era necessário investigar os mortos e punir os responsáveis. E por fim, também respondendo a perguntas do plenário, defendeu que todas as estratégias colocadas na época da ditadura, do guevarismo ao trotskismo estavam hoje mortas, faziam parte de um passado inaplicável para a realidade contemporânea e que não sabia o que estaria por vir, mas estava certo que era algo distinto.

Marcelo Ridenti mostra, assim, a impotência prática do marxismo acadêmico, que aponto ao futuro um retumbante vazio e mata o marxismo retornando à escolástica da análise do passado como simples objeto. A tese XI de Marx, uma vez mais mostra seu vigor e atualidade diante não só dos filósofos de ontem, mas também de hoje.

Alvaro Bianchi falou por último, começou apresentando um incômodo, pois havia sido convidado como professor da Unicamp e não como militante partidário e que, portanto, falaria como professor e não militante. Disse ainda que a ditadura não era seu objeto de estudo e nem viveu o processo de luta contra a ditadura, que assim se limitaria a levantar algumas questões. Levantou o debate de que a verdadeira resistência da classe operária só se consolidou a partir de 1974 e que todo o resto era uma tímida resistência que daria base a esse processo posterior, com as oposições sindicais que começaram a surgir em São Paulo e em Minas Gerais. Sua fala deu bastante ênfase em dizer que a maior parte dos arquivos da ditadura estavam já abertos e disponíveis no Arquivo Edgard Leuenroth (AEL/Unicamp) e que era preciso estudá-los para um balanço mais sólido da ditadura. Por fim disse que a grande lição estratégica da esquerda frente a ditadura era que deveria ter políticas de massas e não só política para a vanguarda, como fez o guevarismo na época.

Por fim, Val Lisboa fechou o debate, dizendo que se sentia extremamente a vontade de falar para aquela juventude, pois queria conclamá-la para o presente e para o futuro. Partiu do atual momento histórico que estamos vivendo, a crise capitalista e os processos de luta de classes como na Primavera Árabe, na Grécia, Estado Espanhol, e se quiser até mesmo no Chile, e que para isso não precisaríamos de socialistas em geral (num país em que quase todos se declaram “socialistas”, incluindo Dilma, Lula, José Dirceu, Heloisa Helena, entre outros), mas de revolucionários estrategicamente armados do trotskismo (marxismo revolucionário) para levar a classe operária à insurreição e ao poder. Levantou a importância da intelectualidade e da juventude universitária para resgatar o marxismo esta estratégia, ligando-se à classe operária. Deste modo precisávamos mais que ocupar praças Tahir ou a estratégia de ocupar a praça dos Indignados no Estado Espanhol, pois toda essa energia das massas não é suficiente para tomar o poder e eliminar o capitalismo, e que era necessário construir um partido operário revolucionário que nos próximos momentos de ascenso da luta de classes possa levar a classe operária à vitória. A tarefa é agora olhar a história, tirar suas lições estratégicas mais profundas, analisar corretamente o presente, sem dogmatismo, compreender as movimentações intrínsecas a nosso período e apontar revolucionariamente para o futuro, a isso chamamos toda a juventude para que se apaixonem pela vida militante.

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