Quarta 1 de Maio de 2024

Internacional

O SETOR PÚBLICO SAI EM LUTA EM DEFESA DAS APOSENTADORIAS

Reino Unido: Greve histórica contra o ajuste Tatcherista de Cameron

12 Dec 2011   |   comentários

Quarta-feira passada, 2 milhões de trabalhadores do setor público aderiram a greve de 24 horas ao mesmo tempo que protagonizaram um "Dia de Ação" nas ruas em defesa de suas aposentadorias contra os planos de reforma do governo de coalizão conservador-liberal encabeçado pelo primeiro-ministro David Cameron.

Com um alto grau de adesão se tratou da maior greve do setor público que viveu este país desde a greve geral de 1926 e, pelo nível de oposição aos planos governamentais, o ambiente é comparável com o “Inverno do descontentamento” de 1979. A medida, convocada pela TUC, a Central Sindical do Trabalho do Reino Unido, vem sendo construída ativamente há várias semanas, com ações de distribuição de panfletos, atos e palestras públicas em vários lugares do país. Se somaram trabalhadores de 29 sindicatos, do quais podemos citar entre os mais importantes pela quantidade de filiados a UNITE (hospitais e limpeza), UNISON (funcionários administrativos de hospitais, escolas, universidades e governos locais), NUT e NASUTW, professores, UCU (professores universitários e secundaristas) e PCS (trabalhadores de órgãos estaduais).

Os setores que saíram em greve são os professores do ensino infantil, médio e universitários, os trabalhadores do setor da saúde (enfermeiros e técnicos), escritórios e agências governamentais nacionais e municipais, da alfândega, coletores de lixo e trabalhadores das rodovias. Quase 70% das escolas permaneceram fechadas e as que abriram só o fizeram parcialmente e estavam praticamente desertas. Os hospitais reprogramaram as operações e atividades de rotina e só mantiveram serviços de emergência. Os locais de trabalho e distribuição de planos sociais, as bibliotecas municipais e as universidades também fecharam suas portas para participarem do "Dia de Ação". Também aderiram os lixeiros, garis e trabalhadores das estradas.

As principais reformas do plano de aposentadorias do governo são o aumento da idade de aposentadoria - que já aumentou de 65 para 67 anos e de 60 para 65 anos para homens e mulheres, respectivamente, ainda que tenha sido adiada a implementação -, o aumento em 3,2% nas contribuições das pensões, o estabelecimento da pensão segundo o salário médio no lugar do salário a partir da idade de aposentadoria, como é atualmente, e o aumento da aposentadoria segundo o índice de mercado, e não segundo o consumidor que é utilizado para medir a inflação. Este pacote de medidas pode resumir-se em trabalhar e contribuir mais para obter uma aposentadoria menor.

Os argumentos do governo, que acusam os trabalhadores estatais de serem "egoístas" por pensarem só em seu futuro apesar de receberem "aposentadorias privilegiadas", em uma tática de jogar os trabalhadores do setor privado contra os estatais, se mostram infundados, e é claro que o único objetivo que persegue o governo é que os trabalhadores contribuam para resolver o déficit, já que com o aumento do tempo de contribuição para aposentadoria o governo pretende cobrir um déficit de 2,8 bilhões de libras para 2014/15.

Se bem que é certo que o que está no centro da cena é a reforma das pensões, a raiva no setor público se vem acumulando por vários motivos, um deles é o congelamento salarial de quase 2 anos, quando a inflação em setembro foi superior a 5,2%. Frente a esta perda salarial, que segundo os sindicatos chegariam a 16%, o anúncio de um provável e mísero aumento de 1% claramente não conseguiu acalmar esta raiva. Outro motivo de incerteza é o anúncio de cortes nos postos de trabalho. De início se falava em 400.000 postos de trabalho, mas o Ministro de Economia, George Osborne, em seu último anúncio orçamentário declarou que a cifra de cortes no setor público poderia superar os 700.000 entre 2011 e 2017. Teme-se além do mais que estes cortes sejam nas zonas mais vulneráveis do país e com maior nível de pobreza. Com uma taxa de desemprego médio de 8%, a cifra mais alta desde 1994, que entre os jovens chega aos 20% ou mais, dependendo do local, o anúncio dos novos cortes só deu mais justificativas para a amplitude da greve, ainda apesar das limitações impostas pelas leis anti-greve herdeiras do governo de Margaret Thatcher.

Nenhum dos argumentos do governo pode ocultar o fato de que mais de 70% dos trabalhadores de 29 sindicatos consultados na votação para a greve, segundo exigem as leis implementadas por Thatcher e ainda em vigência, votou a favor da greve.

A meia-noite, horário em que começava a greve, em várias cidades os trabalhadores dos hospitais abandonaram suas tarefas e começaram a organizar os piquetes, para garantir a adesão à greve. Ao longo do dia milhares de piquetes nas portas dos locais de trabalho, com ações de distribuição de panfletos e pequenos atos mostravam um alto nível de militância. Por volta do meio-dia começaram a se organizar os contingentes em distintos pontos do país e se organizaram marchas pela cidade; milhares de manifestantes recorreram às ruas de Londres (30.000), Birmingham (10.000), Leeds e Bristol e também se viram manifestações de vários milhares na Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales.

A greve e "Dia de Ação" do 30N não é um fato isolado, é a continuidade de uma série de expressões de luta de distintos setores. Em 09/11/2010, milhares de estudantes saíram às ruas de Londres contra as taxas universitárias e tomaram a sede do Partido Conservador. A esta marcha se seguiu uma série de ações dos universitários em todo o país. Em 26/03 mais de 500.000 pessoas marcharam pelo centro de Londres na chamada "Marcha por uma Alternativa" em repudio aos cortes nos programas sociais e em 30/06 mais de um milhão de trabalhadores do setor público e professores aderiram a greve de 24 horas pela defesa de suas aposentadorias. Com o congelamento e redução das ajudas sociais como plano de fundo, em um marco econômico de inflação e aumento do desemprego onde estão frescas as imagens da revolta e saques da juventude nos bairros em agosto, a greve de 30N transcende uma resposta ao ataque sobre as aposentadorias.

Para um país que só viveu uma greve geral em toda a sua história, as duas greves com mobilização do setor público (30/06 e 30/11) expressam um profundo mal-estar e podem estar pré-anunciando uma nova dinâmica da luta de classes. Se bem que a situação da crise não é tão grave como na Grécia, Itália ou Espanha, com relação a ofensiva dos governos capitalistas que pretendem que os trabalhadores paguem a crise. Estas ações expressam uma grande disposição a luta. No entanto, não podemos deixar nas mãos das direções sindicais a organização dos próximos passos. Esta greve pode ser um grande começo para organizar um plano de luta escalonado que apresente uma alternativa independente dos trabalhadores para que a crise seja paga pelos capitalistas.

Artigos relacionados: Internacional









  • Não há comentários para este artigo