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Movimento Operário

GREVE

Petroleiros: um dia sem terceirizados

23 Feb 2008   |   comentários

Não foi de forma abrupta, nem fantasmagórica, como no filme “Um dia sem mexicanos” que as refinarias de Paulínia e Mauá e alguns terminais na grande São Paulo amanheceram sem petroleiros terceirizados. Esta paralisação foi tudo menos abrupta. O RH, a mídia, já haviam noticiado antes mesmo das bases saberem que haveria paralisação. Não à toa. Ela foi impulsionada pela Federação Única dos Petroleiros ’ FUP, filiada à CUT. Os agentes sindicais do governo (que também é a patronal na Petrobrás) quiseram colocar-se à frente de uma campanha chamada “Somos todos petroleiros: trabalho igual, direitos iguais” . Mas os trabalhadores tercerizados se colocaram na frente e conseguiram a solidaridade de um setor dos efetivos.

A FUP anunciava que esta seria a maior paralisação de terceirizados da história do país e, dependendo de confirma a adesão na Bahia, nas refinarias e nos terminais de Barueri e Guararema, terá provavelmente sido. Em São Caetano do Sul, cerca de 450 petroleiros terceirizados cruzaram os braços por 24h encampando a proposta da FUP, oferecemos ao leitor uma crónica e algumas reflexões sobre a paralisação em SCS.

A proposta colocada em votação contemplava uma série de medidas sociais e económicas que aproximariam os efetivos e os terceirizados. Até igual salário. Duas questões chave a burocracia, é claro, não lançou: organizar na base efetivos e terceirizados em comitês ou similares e incorporação sem concursos daqueles que já realizam o trabalho ’ excluindo aqueles ex-chefes aposentados que agora “prestam serviços” e outros costa-quente.

Não daria para organizar efetivos e terceiros, diz a burocracia, porque os “crachás verde” (efetivos) não são importam com os “crachás amarelo” (terceirizados). “Esta é a luta, mas não dá” , insistiam outros diretores. Os terceirizados, entretanto, sorriam e cumprimentavam os crachás verdes solidários, “de bom coração” no dizer de uma companheira. Alguns novos concursados, muitos deles filhos de classe média, ficaram lá na portaria observando aquela multidão multicolorida de uniformes e mesmo com a diretoria do sindicato lhes avisando que podiam entrar, por lá ficaram. Quietos, inexperientes, porém curiosos com a potência que estava lá diante de seus olhos. Aos poucos, um a um, foi entrando, cada um voluntariamente mais atrasado do que o outro. Isto é uma mostra de como há potencial para a unificação dos trabalhadores efetivos e dos mais explorados.

Alguns terceirizados chefes tentavam furar o piquete e eram colocados em seu lugar. Várias secretárias, técnicos de informática e peões da Skanksa, mas a massa de mecânicos, eletricistas, jardineiros e faxineiras lhes impuseram a unidade. No nível atual de organização muitos reagiam corretamente à proposta da diretoria como irrealizável, e a diretoria passou a mostrar seu real objetivo: “não achamos que conseguiremos tudo, mas se conseguimos que a Petrobrás se responsabilize juridicamente (garantindo os pagamentos em caso de falência), já seria uma vitória” . Quem sabe a burocracia consiga essa conquista, para colocar em seu rol e usá-la para se localizar melhor nas eleições sindicais de junho.

Depois de votada da paralisação, os companheiros perguntavam se teriam o dia cortado, visivelmente vários, mesmo mais velhos, nunca tinham feito greve na vida. Aí outros lhes asseguravam “pode ser, mas vamos ficar parados?” . Seguindo a orientação da diretoria, se dispersaram, e os efetivos restantes, sem escolha, entraram. Hoje não foi um despertar tumultuoso, espontâneo, revolucionário, mas foi um despertar. Seguindo os metalúrgicos terceirizados da Voith, os terceirizados da refinaria de Duque de Caxias e da base de prospecção em Sergipe, os petroleiros terceirizados paulistas, esticaram, pouco, é verdade, mas esticaram seus músculos nunca antes usados.

Do lado de dentro

Mesmo sendo uma luta de pressão, limitada, elogiosa do governo e da Petrobrás, esta greve afetou profundamente o funcionamento do terminal.

Gerentes e chefes impacientes em ter que atender seu próprio telefone, documentos que precisavam ser xerocados, e candidatos à chefe perguntando um ao outro qual é a senha da máquina. Turbinas de cálculo de passagem de produto (tipo um registro gigante) que não podiam ser abertas porque não havia quem abrir, e menos ainda quem examinar os instrumentos. Diante de sua impotência, coordenadores e chefes procuravam descobrir o que fazer fora checar e-mail e operar os dutos, algo feito em grande parte por computador, e decidiram, “vamos consertar uma caldeira, isso dá” . Mobilizaram um monte de crachás verde, e aí descobriram que não havia gente suficiente para manter operando o que havia e montar um andaime. A caldeira continuou parada!

Rios de tinta já correram sobre como o neoliberalismo haveria fragmentado a classe para além de sua possibilidade de ação, ou ainda que a automatização haveria liquidado a classe como tal. Hoje, uma parte dos 150 mil terceirizados do sistema Petrobrás, impuseram sua vontade sobre 50 mil efetivos solidários ou não. O proletariado brasileiro ainda gagueja, mas quando falar, estes teóricos se calarão.

Jonantan Silva é trabalhador petroleiro

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