Sexta 17 de Maio de 2024

Movimento Operário

AOS TRABALHADORES DA USP

A luta de 2009 desmascarou este regime universitário aristocrático

08 Dec 2009   |   comentários

A greve do Iº Semestre da USP escancarou para a grande maioria dos trabalhadores e estudantes uma realidade que há muitos anos vem sendo contestada. Depois que a ex-reitora Suely Vilela, a mando do governador José Serra, apelou para o uso da força contra a greve dos trabalhadores chamando a polícia militar na tentativa de nos desmobilizar, e que culminou com o inaceitável episódio do dia 9/6, ficou evidente que a estrutura de poder de uma das maiores universidades da América Latina não pode mais continuar assim. Apesar das dificuldades em levar até o final a luta pela democratização radical da universidade e pelo fim da criminalização de nosso sindicato e de seus diretores no IIº Semestre, como continuidade da exemplar luta que os trabalhadores travaram praticamente sozinhos por mais de 30 dias, conseguiram impulsionar a anticandidatura com o professor Chico de Oliveira para protestar contra essa reacionária e aristocrática estrutura de poder.

Em seu programa foram levantados os principais pontos da pauta de reivindicações que ainda segue em aberto. Ainda sim, conseguimos impedir no dia 10/11 que a burocracia acadêmica representada pelo CO elegesse o novo reitor como se nada tivesse acontecido, e que só pode se concluir no dia seguinte, no Memorial da América Latina, de novo sobre as botas da polícia militar.

Assim foi “eleito” o novo REItor, João Grandino Rodas, que antes de sua posse oficial já expressa a crise em que vive a Universidade de São Paulo e que, a partir de agora, ganhará novos capítulos.

RODAS: O REItor DA REPRESSÃO

Não foi somente entre os trabalhadores e estudantes da universidade, que se dispuseram a lutar no Iº Semestre deste ano, que a indicação de Rodas gerou indignação. Serra ignorou a nomeação de Glaucius Oliva como primeiro da lista tríplice no segundo turno das eleições. Desde 1981 a tradição do governador do Estado é acatar a decisão da burocracia acadêmica e indicar como REItor o nome mais votado no CO. O último a contradizer essa “lei” foi o governador biônico Paulo Maluf, ainda no período nebuloso da Ditadura Militar.

A indicação de Rodas, discípulo de Serra há muitos anos, não vem à toa. Por trás do seu “imponente” currículo, está uma decisão estratégica tomada por Serra. Rodas vem gabaritado por sua capacidade e “vivencia administrativa testada em órgãos internacionais e na administração federal e estadual” e por sua larga “experiência na solução de conflitos”.

Prova maior disso foi a decisão que Rodas tomou, quando ainda dirigia a Faculdade de Direito da USP, de reprimir uma manifestação no Largo São Francisco em 2007 com um efetivo de 120 policiais da Tropa de Choque, e que terminou com o fichamento de estudantes e ativistas dos movimentos sociais na delegacia. È também invenção do novo REItor o dispositivo aprovado no CO que permite a entrada da polícia no Campus, e a conseqüente repressão dos movimentos de greve nos casos de “ruptura da normalidade acadêmica”. Em recente entrevista após se tornar o REItor de fato, Rodas respondeu o seguinte quando questionado sobre a presença da polícia na USP: “Existe a necessidade legal, do diretor ou diretora, do reitor ou da reitora, de proteção das pessoas e das coisas. Isso é responsabilidade legal.”

A candidatura de Rodas foi articulada pelo grupo de professores titulares que dirige a São Francisco, encabeçados por Celso Lafer, professor de Filosofia do Direito, sucessor e cria de Miguel Reale, tucano gabaritado, ex-ministro, atual presidente da FAPESP e, principalmente, herdeiro de uma linhagem quatrocentona paulistana que ocupa lugar de destaque nas entidades empresariais.

Porém, um dos fatos mais “notórios” de sua vida pública é pouco comentado. Rodas integrou a Comissão de Mortos e Desaparecidos da Ditadura Militar, e foi o responsável pelo indeferimento do caso Zuzu Angel, famosa estilista assassinada pela Ditadura, mãe do ativista político Stuart Angel, também barbaramente assassinado no regime militar. Segundo o ministro de Lula, José Gregori, Rodas foi “responsável e operoso nessa Comissão, indispensável para fazermos a chamada transição democrática”.

A dita “transição democrática” que vivemos a partir da segunda metade da década de 80, e promulgada pela constituição de 88, foi nada mais do que o desvio da luta revolucionária da classe trabalhadora brasileira, que tinha como bandeira “Abaixo a Ditadura, Povo no Poder”. Essa luta foi desviada por Lula e pelos chamados sindicalistas autênticos, mas também por responsabilidade de pessoas como Rodas, para a democracia burguesa –democracia dos ricos, dos capitalistas - que vivemos hoje; a “democracia” do mensalão do PT de 2005, dos dólares nas meias e cuecas, a “democracia” dos Sarneys, Renans e todos os corruptos do Congresso Nacional....a “democracia” da criminalização dos movimentos sociais, assassinatos impunes de sem terras e sem tetos no campo e na cidade; enfim a “democracia” da demissão inconstitucional de Brandão e Dirceu Travesso (Conlutas/Nossa Caixa).
Além de inocentar o Estado no caso Zuzu Angel, Rodas também indeferiu outros 45 casos. Com isso, pode ser considerado de fato co-responsável pela “transição democrática” que mantém até hoje impune os militares e civis que de alguma forma contribuíram com a Ditadura Militar, ocupando um papel destacado de colaborador da farsa de democracia que vivemos até hoje e por isso recebe tantos apoios para ocupar o cargo de REItor, em especial do auto-intitulado grupo “Compromisso USP” composto por dirigentes da FM, FD, FEA, Poli – unidades que têm cada vez mais relação com as fundações privadas.

OS NOVOS PROJETOS DE SERRA E RODAS
PARA A EDUCAÇÃO

Se não bastasse tão vasto histórico, Rodas já vem dando mostras de quais projetos pretende implementar na USP. Um dos projetos Serra queria aplicar já este ano, e foi adiado por conta da greve do Iº Semestre, é a Univesp (Universidade Virtual). Já aplicado por Lula em outras universidades federais, o ensino a distância se acoberta de uma falsa “democratização” do acesso ao ensino para, na verdade, expandir o ensino universitário de forma precária, sem aumentar os recursos humanos, materiais e financeiros que a universidade pública necessita. Obviamente que o uso integrado de variadas mídias, possibilitado pelo uso conjunto de tecnologias de comunicação e informação deve ser aprimorado nas universidades públicas brasileiras. No entanto, a intenção real dos governos federal e estadual não é o de fazê-lo em consonância com o aumento de verbas e recursos nas universidades “reais”, e sim substituí-los por um ensino cada vez mais precário, sem custos para o Estado, voltado cada vez mais para o interesse do mercado, das grandes empresas, com utilização de mão de obra barata e semi-qualificada.

Ainda que venha dizendo ser contrário a expansão da terceirização na USP, Rodas é também aliado de outro braço direito de Serra, o Presidente da Sabesp Gesner de Oliveira, que nos últimos meses já demitiu mais de mil trabalhadores de uma das maiores empresas públicas de saneamento básico, com o claro intuito de terceirizar postos de trabalho com salários precários. Escreveram em co-autoria um livro sobre direito e economia da concorrência em 2004 e já se revezaram na presidência de outros órgãos públicos, sempre com o aval de Serra e dos mesmos figurões que hoje impulsionaram sua candidatura. Questionado por funcionários, Rodas chegou ao cinismo de dizer que não sabe da terceirização do Restaurante Universitário XI de Agosto, localizado na unidade que ele próprio dirigiu nos últimos 4 anos.
Sobre a estrutura de poder, Rodas defende o modelo 70/15/15 adotado por outras universidades como a Unicamp, onde os professores titulares tem peso de decisão em 70% e os outros 30% divididos entre funcionários e estudantes. Uma mudança superficial que não altera o fundamental que já existe hoje, mantendo o controle da universidade nas mãos de pouquíssimos professores interessados cada vez mais com o enriquecimento fácil que suas fundações privadas e empresas terceirizadas os proporcionam. Com isso, Rodas quer desviar o foco da crise aberta esse ano e confundir os trabalhadores e estudantes que clamam: abaixo o CO, por uma Estatuinte Livre, Soberana e independente da burocracia, para avançar de fato na democratização radical da universidade.

NENHUMA CONFIANÇA EM RODAS!

Em meio a crise aberta na USP, e aprofundada pela imposição de um interventor mandatado para aplicar os planos de Serra, Rodas chega a universidade como o maior defensor do diálogo, “disposto a retomar as relações com as entidades, a fim de pacificar a universidade”, para garantir a aplicação dessas medidas sem maiores conflitos, e manter a pasividade num ano eleitoral.

Alertamos os trabalhadores e estudantes da universidade que, ainda que seja necessário para Rodas e Serra fazer algumas concessões (e muita demagogia) para criar uma nova base de sustentação para os próximos 4 anos, sua gestão não demorará a mostrar sua verdadeira face.

Nesse sentido, é fundamental que nosso sindicato e os trabalhadores da USP, que nos últimos anos vem se mostrando uma das categorias mais combativas do país, se coloquem novamente na linha de frente para arrancar as demandas inconclusas da greve do Iº Semestre sem alimentar nenhuma ilusão em Rodas. Nenhum REItor pode oferecer mudanças significativas para a transformação radical da universidade, eles são os representantes do governo na universidade; é tarefa nossa colocá-la a serviço dos trabalhadores e do povo pobre.

Os trabalhadores efetivos temos uma tarefa estratégica essencial: unir nossas fileiras

Na manhã do dia 2 de dezembro tivemos uma grande demonstração de que, apesar da demagogia do “fim da crise”, os trabalhadores, que se vêem numa situação de aumento da precarização do trabalho e, por essa via, de diminuição ou simplesmente não cumprimento das leis trabalhistas, enfrentaram os patrões e a polícia para terem seus direitos garantidos. Nada menos que 300 trabalhadores terceirizados da Fiocruz (Fundação Osvaldo Cruz, da administração federal) localizada em Manguinhos, no Rio de Janeiro, se organizaram em busca de seus elementares direitos trabalhistas, reivindicando seus salários dos quais não foram pagos nos últimos meses, assim como férias e 13° salário. Os trabalhadores, em sua maioria moradores das comunidades de Manguinhos, que já se enfrentam diariamente com a opressão policial e os assassinatos de moradores cometidos por esta força assassina, tiveram novamente que se enfrentar contra dois batalhões da polícia por estarem reivindicando seus direitos elementares e poder ir às ruas defender suas mínimas condições de trabalho.

Uma tarefa central de nossa categoria e de nosso sindicato é superar a derrota que nos impôs o neoliberalismo, levantando em primeiro lugar a exigência de imediata efetivação de todos os temporários, e pela incorporação à categoria dos trabalhadores terceirizados com iguais direitos.

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