Segunda 29 de Abril de 2024

Juventude

ARQUIVO EDGARD LEUENROTH

Meus heróis são outros

21 Nov 2009   |   comentários

Quem participou da festa oficial de inauguração do Pirâmide Branca, a nova sede do AEL, pode ver ali uma luta aberta sendo travada. De um lado um monte de gente e burocratas boquiabertos, atoleimados diante da grandeza e brancura do nosso totem, a Pirâmide Branca. De outro alguns estudantes gritando reivindicações e fazendo um happening. Acho que ninguém ali estava contra um novo prédio para o AEL que há anos merece ser melhor instalado, saindo daquele porão infecto (de poeira, fungos e microorganismos - que faziam mal às pessoas e ao próprio acervo). Eu espero que algum destes estudantes narrem, aqui, neste Jornal do Porão, o que aconteceu, com a propriedade de quem esteve lá. Eu não estive, por protestar contra uma festa feita com dinheiro do imposto do povo (supérfluo dizer que sem a presença de quem pagava a festa). Uma festa de privilegiados para privilegiados, com dinheiro dos excluídos.

Um luta cultural antes de mais nada se travava ali. Estes estudantes que não ganham nada, ou mesmo perdem, ou perdem tempo como dizem os velhos senis e os burocratas, defendendo um novo destino para o país. Gritam contra a terceirização que dana o serviço público, que constrói desastres dia-a-dia e drena recursos do povo para empresas irresponsáveis à cata de lucro. Gritam por mais funcionários e professores, quando a ADUNICAMP e o STU ficam numa silêncio de cemitério (a ADUNICAMP no seu magnífico e esplendoroso mausoléu). Estes incovenites estudantes que exigem que o patrimônio cultural da humanidade, como o AEL, seja defendido e cuidado. Esta "meia dúzia", como dizem os senis e os burocratas , de incovenientes e mal comportados, que sobem nos balcões, que colocam cartazes onde os burocratas acham que não devem colocar, esta "meia dúzia" é o único fato realmente cultural da inauguração. Foi a única coisa viva, que ali não rescendia a cadáver; e pelo que eu conheço, os estudantes, ali, era a única coisa que mirava o futuro. Um comentário que me chegou de uma funcionária que reclamava dos estudantes, funcionária esta que deve seu emprego à luta dos estudantes por mais funcionários. Gostaria de ouvir dos estudantes, gostaria que escrevessem para este Jornal do Porão, pois fiquei sabendo que um militante de esquerda, o que assim se diz, estava ali como um cão de guarda contra quem colocava cartazes. Talvez aqui a nota mais triste desta luta.

Estes estudantes, queria declarar, são meus heróis. Alguns dos meus heróis do passado hoje são governo ou burocratas que agem em interesse próprio, de grupo, ou do poder. E eu escolhi este jovens heróis que ainda permitem sonhar. Soube de alguns comentários de funcionários que diziam que estes estudantes poderiam fazer assim ou assado. Mas não se dão conta, este funcionários, que estes estudantes estavam ali defendendo funcionários públicos, os serviços públicos e a cultura da humanidade. E qual era a intenção dos funcionários, outros estudantes e burocratas que estavam ali? Enquanto grande parte dos funcionários, a totalidade dos burocratas e chefes estavam embasbacados diante de um prédio, alguns estudantes se manifestavam, buscando um saída para o futuro. Contra o silêncio conivente da maioria, eles se manifestavam. Contra o carreirismo de alguns funcionários e profesores, eles se manifestavam. E ele estavam ali para defender um arquivo que já foi um arquivo do movimento operário, mas que hoje não ostenta mais este perfil. Estavam ali para alertar que este arquivo já correu risco demais, enquanto outros faziam festa com o dinheiro do público.

Dizem os canalhas de hoje que este estudantes serão os canalhas de amanhã. Eu escolhi apostar no futuro. Mesmo que venham a se acanalhar, neste momento, a escolha é clara. Escolho a vida contra a morte. Escolha a vida juvenil que pulsa à carcaças senis dos burocratas. E viva os estudantes!! !

Soube também que um professor falou que quando ficamos dando uma importância primordial a um prédio é porque há algo errado com a própria instituição. Este professor, um homenageado, poderia falar mais. Poderia falar que o Arquivo que ajudou a fundar corre risco o tempo todo. Risco pela falta de funcionários. Risco porque não há uma brigada de incêndio na Unicamp. Risco porque esta nova sede, a Pirâmide Branca, fica em local quase ermo e sem uma vigilância interna, preparada e treinada para proteger o acervo, contra sinistros ou invasão ,ou depredação. Mais corre um risco muito maior. De perder toda a alma militante que construi o acervo, através da luta secular dos operários e trabalhadores, e da militância política para construir o próprio a arquivo. Hoje o arquivo é dominado por uma política burocrática. Onde o movimento operário não é referência. Onde o nome Edgard Leuenroth, acho eu, já é meio incomôdo, para a mente burocrática vitoriosa. Não sei se vão mudar o nome do Arquivo, mas ele agora tem na sua principal sala, o nome de um governista. Uma espécie de ofensa ao Patrono oficial Edgard Leuenroth, um anarquista, portanto antigovernista. Para atestar que os tempos são outros. Acho eu, se estes estudantes deixarem, o Arquivo, pouco a pouco se livrará desta carga de ser um Arquivo do movimento operário, como é visto, pois na realidade já não é.

Na inaguração, para quem quisesse ver, estava ali este confronto. Entre um passado de luta e as sinecuras e burocracias do futuro. Não consigo fugir da imagem, vendo estes professores que escrevem sobre movimento operário, e mesmo estudantes que pesquisam, com o intuito apenas de alicerçarem suas carreiras e se comportando, muitas vezes, diante do movimento real, da luta de classes presente, de maneira tão reacionária - a imagem que me vem é de um gigolô. São como gigolôs do movimento operário.

E estes estudantes que protestam, eu os imagino como um máquina do tempo, me projetam para o futuro. Permitem que me veja no futuro, não como um cadáver, mas de acordo com o rito da vida, como celebração da vida. E viva os estudantes!! !

Ali estavam vários estudantes antenados com o futuro. Mas queria destacar, para aqueles não dão por dentro do movimento estudantil e dos trabalhadores, aquilo que acontece hoje, muito deste estudantes eram de uma organização muito pequena chamada LER-QI. Destaco isso por justiça, pois estes estudantes desta pequena organização lutam, pelo que conheço, aqui no IFCH, há 5 anos eu os acompanho atentamente, por reivindicações estudantis, mas principalmente, lutam contra a terceirização, contra toda precarização e foram este estudantes da LER-QI, que colocaram sempre o arquivo no centro do debate. Lutam por aquilo que seria o dever do STU que se cala. No que tange à cultura seria uma luta central da ADUNICAMP, que putrefaz ali no seu mausuléu de ouro. Eles foram fundamentais para tirar o arquivo do limbo burocrático, das manobras e silêncios burocráticos, para evitar que a tecnicidade burocrática matasse qualquer discussão. Estes estudantes da LER-QI, no que me toca, foram os maiores responsáveis em impedir que professores burocratas, que burocratas funcionários, tentatessem me dequalificar, como tentam há anos. Estes jovens estudantes resistiriram ao discurso oficial dos nossos professores burocratas, colocando discussões políticas , para responder a estas tecnicidades estupificiente que é o discurso das autoridades acadêmicas, convertidas em burocratas eficientes,donos dos discursos "verdadeiros’ , cheios de autoridade. Estes jovens retomam, ao meu ver, e carregam a herança do movimento dos trabalhadores. Eles, para mim, são herdeiros do espírito que deu origem a este precioso acervo, que corre tanto risco. Correria mais ainda sem estes heróis. E viva os estudantes!! ! E saúdo os jovens militantes da LER-QI.

Texto escrito para o Jornal do Porão, por Mário, funcionário do Arquivo Edgard Leuenroth

Artigos relacionados: Juventude , Cultura , Campinas









  • Não há comentários para este artigo