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Questão negra

Homenagem a Benjamin Péret, poeta e revolucionário

10 Dec 2006   |   comentários

Publicamos abaixo a tradução de um poema de Benjamin Péret, poeta surrealista e militante revolucionário francês. Companheiro e amigo pessoal de André Breton, Péret dedicou sua vida à arte e à revolução socialista. No final dos anos 1920 se mudou para o Brasil com sua esposa, depois de ter sido apresentado a Mário Pedrosa na Europa. Foi fundador da Liga Comunista Internacionalista, primeira organização trotskista brasileira, se interessou enormemente pela história das lutas do povo negro no Brasil, tendo publicado ao longo se sua vida militante textos sobre o Quilombo dos Palmares e a Revolta da Chibata. No início da década de 1930, foi deportado do Brasil pelo governo Vargas acusado de “atividade comunista” . Combateu no front de Aragon na Guerra Civil Espanhola. Em 1939 foi preso na França por “agitação internacionalista” . Poucos anos depois viaja ao México e em 1942, junto com Natália Sedova, companheira de Leon Trotski, que havia sido assassinado em 1940, rompe com a IV Internacional, porém sem jamais renunciar ao marxismo revolucionário. Morre na França em 1959. Sua poesia é de uma grande força, cheia de imagens impressionantes, como pode-se ver no poema que publicamos neste número do jornal Palavra Operária, em sua homenagem.

IMPERATIVO

Temer o suor das moscas extraviadas nos bairros em construção
Envilecer os jarros de estanho até serem rasgados pelos filhotes de cachorro
Retorcer os antigos armários para extrair um pouco de pó
de rubi com o qual colorir os lagos
Assoviar repetida e longamente para que respondam os ossos bem
caiados que não querem entender razões
Lavar a tinta com vinho tinto para distrair as crianças que brigam
no pátio
Cortar a luz em quatro e atirá-la às feras
Extrair da areia todos os dentes que ela contém para
levantar muros
Transformar as armaduras em incubadoras para obter
pintinhos de bico grande
Apertar as tartarugas até convertê-las em mantas
Regar todos os dias as bandeiras com óleo de máquinas
Queimar os camembert passados até que salte o fênix
Acariciar as lentilhas uma a uma antes de semeá-las
Sacudir os tapetes com uma navalha para fabricar gaiolas de
canários
Esgotar as reservas de ouro para comprar fivelas de cabelo
Assustar as lagostas que tentam penetrar em uma tabaqueira
Cozinhar os violinos em molho branco
Dourar as escadas para evitar varrê-las
Rodopiar nas igrejas na hora da missa solene
mas não insultar nunca o carteiro para expulsar os ratos
do relógio
que atacariam os bronzes artísticos a mordidas.

Poema publicado no livro "Feu central" e traduzido para o português com consulta à tradução ao espanhol feita pelo poeta argentino Aldo Pellegrini

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