Sexta 3 de Maio de 2024

Juventude

Entrevista com estudantes da UFAL

07 Jun 2007 | Publicamos abaixo entrevista com Davi, do grupo estudantil “Além do Mito...” de Alagoas, que participou ativamente da ocupação da reitoria da Ufal. A ocupação na Ufal, que terminou nos últimos dias com a conquista dos pontos mais importantes da pauta de reivindicações dos estudantes é mais uma mostra de que o movimento estudantil começa a se colocar de pé em algumas partes do país.   |   comentários

Jornal Palavra Operária: Aqui em São Paulo ficamos entusiasmados quando soubemos que os estudantes de Alagoas ocuparam a reitoria da Ufal. Você poderia nos contar um pouco como foi essa ocupação, como se deu a participação dos movimentos sociais, o que vocês reivindicavam e qual foi o apoio que os ocupantes receberam do conjunto dos estudantes da Ufal? Quais vão ser os próximos passos do movimento estudantil de Alagoas?

Davi: A ocupação se deu no dia 24/05 como parte de uma semana de luta que fizemos. Iniciamos a semana com uma discussão na segunda-feira sobre reforma universitária; na terça-feira, fizemos um libera bandejão no restaurante universitário; no dia seguinte (23/05) fizemos, junto com sindicatos, uma paralisação da universidade e fechamos também a BR-103 em frente à Ufal; e finalmente, na quinta-feira, começamos a ocupação. Portanto, já vínhamos de um processo de luta bem intenso e de acumulação de forças.

Na ocupação, colocamos, prioritariamente como uma de nossas pautas, a Escola Agrotécnica voltada para a agricultura familiar, daí a aliança que fizemos com os movimentos sociais do campo. Reivindicávamos também a ampliação do restaurante universitário para 1.000 refeições no almoço e a elaboração de um projeto de R.U. para todos, o fim da cobrança de mensalidades nos cursos de pós-graduação, o fim das taxas acadêmicas, a ampliação da residência universitária, a gratuidade da creche para os estudantes, exigíamos o posicionamento da Ufal contra as restrições à meia-passagem estudantil (o prefeito tinha feito um decreto neste sentido) e também fazíamos a denúncia da reforma universitária. A maior parte desta pauta foi retomada da ocupação que ocorreu na greve de 2005, pois a reitoria havia descumprido uma série de acordos firmados e de decisões do conselho superior da universidade (Consuni). Este foi uma das motivações para a ocupação.

A ocupação, além de levantar todas estas reivindicações e fazer o debate acerca da reforma universitária, criou uma polarização muito grande na universidade. Conseguimos o apoio estudantil, passávamos em sala todos os dias, falando da ocupação e convocando todos a participarem. Por outro lado, a direita da universidade começou a reagir, fizeram uma verdadeira campanha difamatória tentando partir para a ofensiva.

Deste modo, estamos hoje em um momento em que a luta de classes dentro da universidade está bem escancarada, denotando claramente dois projetos distintos de universidade: de um lado o “Criar, Criar, Ufal popular” (uma de nossas palavras de ordem) e de outro o projeto dos privatistas.

Vale lembrar que a atual direção do DCE (UJS/Kizomba) depois de já ter sido retirada da ocupação por unanimidade (chegaram depois que a fizemos) ainda tentou negociar por fora com a reitora, inclusive com a ajuda do Gustavo Petta (presidente da UNE), que coincidentemente apareceu aqui durante este processo.

Agora a nossa tarefa é continuar a mobilização e a ofensiva, tentando manter este momento de ascendência do movimento na Ufal. Até mesmo porque precisamos garantir o cumprimento das nossas pautas conquistadas e avançar no que ainda não conquistamos. A Frente de Luta Contra a Reforma Universitária está com muita força e legitimidade dentro da Ufal, trata-se então de um instrumento que deve ser reforçado. A idéia é que empreendendo esta ofensiva se acirre ainda mais a disputa dentro da universidade, fazendo com que a polarização já existente se mantenha.

JPO: Uma das reivindicações da Ocupação da Ufal dizia respeito á criação de um novo Instituto agrotécnico na Universidade, em conjunto com os movimentos sociais. Você poderia explicar melhor do que se trata esse instituto?

Davi: No final do ano passado a reitoria levou para o Consuni um projeto de Escola agrotécnica voltada para o setor sucro-alcooleiro. Então nos organizamos, entramos em contato com os movimentos de luta pela terra e no Consuni conseguimos reverter o caráter da escola, colocando-a voltada à agricultura familiar. Entretanto, dado os compromissos que a Ufal estabelece com os usineiros, a reitoria não convocou o Grupo de Trabalho (que elaboraria o projeto da escola) com os movimentos sociais e, “por baixo dos panos” , tratou de fazer de novo um projeto favorecendo a monocultura da cana-de-açúcar.

A formação desta escola se tornou uma forma de se questionar o caráter da Ufal, que é muito direcionada para o latifúndio da cana-de-açúcar, e ao mesmo tempo disputar internamente uma universidade que atenda aos interesses populares. Daí a aliança com os trabalhadores do campo, bem como da formação desta escola técnica.

JPO: Nos últimos dias até a UNE anunciou uma onda de ocupações de reitorias em todo o país. Na nossa visão ela tenta se localizar frente a nova situação no movimento estudantil brasileiro, que foi sacudido pelo exemplo de luta das universidades paulistas. Você poderia comentar um pouco como vê a situação do movimento estudantil nacional e do nordeste, assim como o papel que a UNE vem tendo a nível nacional?

Davi: A luta nas universidades paulistas e as outras ocupações pelo país colocaram o movimento estudantil em um patamar um pouco acima do que se encontrava. Apesar disto ainda estamos muito aquém do necessário para barrar a reforma universitária. Ainda estamos na defensiva, reagindo às medidas impostas pelo governo Lula e pelas reitorias. Contudo, abriu-se uma perspectiva maior de radicalização e enfrentamento, que como não poderia deixar de ser, vem sendo feita por fora da UNE. Esta atitude agora da UNE é bastante sintomática: impregnada de oportunismo, nada mais é do que forjar representatividade e combatividade, visto que o movimento estudantil tem feito cada vez mais luta não só a par da UNE como contra ela, dado o papel que a mesma tem cumprido ao encampar o governismo e a reforma universitária.

Assim, além de tentar entravar o processo de reorganização do movimento estudantil que as lutas reais podem favorecer (pois é no seio das próprias lutas que se dão saltos neste sentido), ao propor estas simulações de luta, a UNE ainda tenta abaixar o programa do movimento, colocando suas bandeiras em destaque.

A formação da Frente Nacional de Luta Contra a Reforma Universitária foi um passo fundamental para o movimento, não só pelas lutas que pode empreender, mas porque do ponto de vista político-organizativo denota o reconhecimento, por parte de todos aqueles que compõem a Frente e ainda disputam a UNE, de que esta é incapaz de fazer a luta contra a reforma universitária.

O diferencial do movimento estudantil hoje é uma nova aproximação entre setores que disputam a UNE e setores que já romperam com ela. Isto não elimina de forma alguma a polarização entre UNE e reorganização do movimento estudantil (Conlute), mas a coloca em um patamar distinto. Pois, a Frente tem sido hoje a mais apta a se colocar no front da luta, portanto devemos fazer da Frente e da sua luta um momento importante na reorganização do movimento. Contudo o desafio é grande, pois a esquerda da UNE ainda está muito ligada aos aparatos burocráticos e de alguma forma também representam a burocracia estudantil ’ não é toa que ainda estão naquela entidade.

No nordeste as coisas não estão muito diferentes. O movimento estudantil combativo tem se organizado em grupos locais, mas ainda falta maior interação entre eles. Existem algumas tentativas de maior interação em nível regional, mais que não chegaram a levar a atos em conjunto.

“O Além do Mito... é um grupo estudantil da Ufal que defende a construção de um movimento estudantil combativo, classista e autônomo. Nos formamos em março de 2005, sempre pautando o combate ao governismo e à burocracia estudantil, portanto defendemos o rompimento com a UNE e atualmente construímos a Conlute. Entendemos que o movimento estudantil deve fazer uma opção de classe, ou seja, defender os interesses da classe trabalhadora dentro dos espaços em que atua. Assim, defendemos também um movimento estudantil que se organize a partir de seus próprios espaços, sem a tutela do Estado, livre da burocracia e do aparelhamento.”

Davi - estudante de História Ufal
Grupo: "Além do Mito..." de Lula, CUT e UNE.

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