Sexta 3 de Maio de 2024

Movimento Operário

GREVE DA UNICAMP

Entrevista com Guilherme, trabalhador em greve da DGA da Unicamp, sobre os conflitos na Unicamp e na USP

14 Nov 2011   |   comentários

O Centro de Estudos e Pesquisa Hermínio Sacchetta entrevista Guilherme Righetto, trabalhador independente da DGA (Diretoria Geral de Administração) da Unicamp, unidade em greve e um centro nevrálgico para o funcionamento da administração da universidade. Guilherme discorre sobre a greve dos trabalhadores da Unicamp, a mais forte em décadas, sobre a importância de se arrancar conquistas da Reitoria - que se beneficiou de uma burocracia sindical governista (PCdB) para calar os trabalhadores no último período - perspectivas, e sobre o conflito na USP.

CEPHS.: Os trabalhadores da Unicamp estão em greve há três semanas, com uma importante recomposição da confiança dos trabalhadores depois da saída da burocracia governista da diretoria do STU, o que resultou em que as principais unidades administrativas da universidade (DAC e DGA) estejam paralisadas. Isso se enfrenta com uma posição endurecida por parte da Reitoria, que rejeita a abertura de negociações com os representantes dos trabalhadores e o sindicato. Como vê o prosseguimento da greve, sendo que representa uma nova geração que entrou recentemente na categoria? Como vê a direção do STU/Rosa do Povo, e as organizações políticas que estão atuando na greve?

G.: Outro elemento importante para a compreensão da dimensão e da dinâmica impressionante que essa greve demonstrou desde seu início é a disposição dos trabalhadores em responder aos ataques e ao desrespeito que sofrem há vários anos.

De fato, a própria vitória da chapa de oposição nas eleições sindicais, contra a antiga direção imobilista, demonstrou uma disposição dos trabalhadores de enfrentamento contra os projetos da reitoria.

Essa disposição de luta, aliada à confiança que os trabalhadores depositam na nova direção do STU, explodiu em uma mobilização que a Unicamp não via há muitos anos.

O movimento que estamos construindo ainda não conseguiu impor uma derrota concreta à reitoria, que, mesmo após um mês de greve, continua sem apresentar qualquer proposta. Mas, sem qualquer dúvida, já mudou a correlação de forças dentro da Unicamp e colocou em xeque a continuidade do projeto de universidade elitista que a reitoria, a serviço dos governos, vem implantando.

O grau de mobilização e organização dos trabalhadores, em especial nas unidades administrativas chaves para o funcionamento da Unicamp, abre perspectivas muito boas para que greve avance na conquista de muitas reivindicações. Já começamos a enfrentar ataques diretos da reitoria contra nosso direito de greve, através do corte do ponto dos trabalhadores das unidades ligadas diretamente às unidades da reitoria, mas o ânimo, mesmo nessas unidades, não diminuiu.

A tarefa agora é manter a organização nos locais de trabalho e fazer com que os trabalhadores participem ativamente da direção política do nosso movimento. Porém, para realizá-la, estamos tendo de enfrentar uma postura equivocada da direção do sindicato, que contrapõe atos de visibilidade à organização política do movimento, pressionando e desarticulando sistematicamente reuniões de unidade para cumprir os calendários de atividades da greve. Ou seja, em vez de organizar a base de trabalhadores para fortalecer a greve e os atos, a diretoria do sindicato acaba imprimindo uma lógica de movimento que impede que as reuniões nos locais de trabalho aconteçam. Isso desarticula a greve e enfraquece progressivamente as manifestações que ela tenta construir com essa dinâmica.

Dessa forma, os trabalhadores não são preparados para dirigir politicamente a greve, o que desarma nosso movimento para o enfrentamento político contra a reitoria.

CEPHS.: Os processos judiciais contra os funcionários que participaram do comando da greve de 2010 seguem de pé, e novos mecanismos repressivos, como a GR-34, são utilizados para amedrontar e desativar a mobilização dos trabalhadores. Outro obstáculo profundo que ganha particular acento é a terceirização do trabalho. Como essa forma de privatização da universidade pública afeta a mobilização?

G.: A terceirização na universidade cumpre um papel perverso na precarização das condições do trabalho e ensino. Submete os trabalhadores a situações de exploração extrema, absolutamente desumanas, com o objetivo de garantir mão de obra barata e sem direitos à universidade – e, também, o lucro a uma máfia de empresários que se enriquece às custas da saúde e da vida desses trabalhadores.

Além disso, a terceirização impõe uma divisão da classe trabalhadora que dificulta bastante a luta unificada contra a reitoria e os patrões. Esse é um dos seus objetivos. Dividir e enfraquecer os trabalhadores.

Por esses motivos, não há alternativa política que não seja assumir efetivamente a luta contra a terceirização e em defesa dos direitos dos trabalhadores terceirizados.

Temos de derrotar a terceirização e o projeto de universidade da reitoria e do governo. E, nesse sentido, me parece que não há diretriz política melhor do que a luta pela efetivação imediata desses trabalhadores.

CEPHS.: Os estudantes cumpriram papel importante junto às greves dos trabalhadores da Unicamp, com exemplos em 2005, 2007, 2009 e 2010, através da atuação de suas entidades, com relevo na atuação do Centro Acadêmico de Ciências Humanas (CACH). Nesse ano, os estudantes do IFCH aprovaram greve no instituto em exclusiva solidariedade à greve dos trabalhadores. Fale-nos um pouco sobre a importância da aliança entre estudantes e trabalhadores e o período em que foi estudante e militante do CACH, como era e o que vê de diferente hoje.

G.: Apesar de nunca ter feito parte da gestão do CACH, militei junto a este centro acadêmico durante todo o período em que estudei na Unicamp. Na época o CACH era conduzido por uma política clara enfrentamento contra os ataques que a Universidade sofria do governo e da reitoria. Ele sempre assumiu a responsabilidade de se postar à frente na luta em defesa da educação e dos interesses da classe trabalhadora e, nesse sentido, organizava ativamente os estudantes para esses enfrentamentos – muitas vezes cumprindo um papel que deveria ser do DCE.

E, nesse contexto, sempre teve como aliado estratégico os trabalhadores da Unicamp. Às vezes os chamando para a luta, às vezes se colocando ao lado deles durante as mobilizações. Mas sempre pronto a construir um campo de oposição ao projeto de universidade elitista e privatista que hegemoniza a política dos governos e reitorias.

Mesmo um pouco distante do movimento estudantil, durante todo esse ano pude perceber a ausência do CACH enquanto entidade protagonista na organização dos estudantes e nos debates políticos na universidade. Felizmente os estudantes do IFCH parecem estar retomando essa postura militante e essa mobilização em solidariedade à greve dos trabalhadores nos dá muito ânimo e nos enche de esperanças de que possamos construir outras lutas conjuntamente.

CEPHS.: A luta dos estudantes da USP pela expulsão da Polícia Militar do campus (entendendo seu papel comum de repressão à juventude negra e pobre nas favelas e na periferia) se transformou num debate nacional a partir dos conflitos de 27/10, e principalmente durante a brutal investida de um operativo de guerra (com 400 efetivos da tropa de choque, cavalaria, GOE, GATE, e helicópteros), para desalojar a ocupação e render presos políticos para a reitoria de Rodas, relembrando os momentos mais sombrios da ditadura militar. Os estudantes e dirigentes sindicais presos, graças à mobilização imediata do movimento estudantil, foram soltos a 9/11, e votou-se greve geral estudantil na USP, contra a militarização, os processos contra estudantes e trabalhadores e pela anulação dos inquéritos ilegais aos 73 presos políticos. Como você enxerga a ligação da luta dos trabalhadores da Unicamp por isonomia e dos estudantes da USP pelo Fora PM?

G.: Antes de tudo é necessário compreender que esses processos de luta são duas faces do mesmo combate.

O projeto de privatização e precarização do trabalho das reitorias da USP, UNESP e UNICAMP é o mesmo. Para implementá-lo elas precisam destruir qualquer postura crítica dentro das universidades. E as armas que usam são a repressão e o medo – a PM, os processos judiciais e administrativos, o assédio moral, o estágio probatório, o desconto de ponto.

A diferença é que na Unicamp a luta se encontra em um patamar inferior ao da USP. Mesmo assim nos enfrentamos com as mesmas ameaças. Em 2010 os sofremos processos judiciais e a PM era usada para intimidar os trabalhadores em suas reuniões de unidade; esse ano os trabalhadores estão tendo seus pontos cortados e a PM, chamada pela reitoria, acompanha os atos.

Se a reitoria da Unicamp se sentir ainda mais ameaçada, é bastante provável que passe a usar diretamente da repressão às mobilizações através da PM.

Afinal, foi exatamente isso o que ocorreu na USP. Basta observar o histórico do uso da força policial. Desde a ditadura ela era mantida afastada da USP. Com a luta do Sintusp e dos estudantes contra a reitoria, ela foi chamada de volta. O objetivo da reitoria não é garantir a segurança, mas reprimir os movimentos sociais. Quem não se lembra da primeira grande invasão da PM na USP em 2009? O objetivo não era outro senão reprimir a luta dos estudantes e funcionários que acabaram sendo encurralados na FFLCH. O mesmo ocorreu agora, e o mesmo pode ocorrer na Unicamp.

Por isso é nossa tarefa construir instrumentos que permitam unificar esses enfrentamentos contra a precarização do trabalho e a repressão aos movimentos sociais. Penso que um passo importante pode ser a realização de um grande encontro dos estudantes, trabalhadores e professores das universidades estaduais paulistas para debater essas questões e organizar uma luta unificada contra a reitoria, o governo e sua força repressora, a PM.

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