Sexta 26 de Abril de 2024

Gênero e Sexualidade

INTERVENÇÃO DE DIANA ASSUNÇÃO NO LANÇAMENTO DO LIVRO

“A precarização tem rosto de Mulher”

10 Mar 2013   |   comentários

Estas mulheres passaram a enxergar que não há saída individual pra tamanha opressão e exploração. Sozinhas é muito difícil. Nós, militantes revolucionárias, como eu, acreditamos profundamente na força da classe operária, e acreditamos profundamente que quando este “exército silencioso” de mulheres trabalhadoras, donas de casa, empregadas domésticas, estudantes, desempregadas se levantarem, como Silvana, se colocando como sujeito ativo e enfrentando a (...)

Boa tarde a todas e todos, meu nome é Diana Assunção, sou dirigente da LER-QI, fundadora do grupo de mulheres Pão e Rosas Brasil e diretora do Sindicato dos Trabalhadores da USP. Organizei o livro “A precarização tem rosto de mulher” junto com Silvana e uma equipe de companheiras e companheiros. Também sou uma das trabalhadoras da USP denunciadas pelo Ministério Público e pela Reitoria da universidade, num escandaloso caso de perseguição política contra 72 estudantes e funcionários que lutavam contra a repressão policial dentro e fora da universidade. Inclusive neste momento estou suspensa do trabalho, junto a dezenas de estudantes e trabalhadores também punidos pela Reitoria.

Antes de começar a minha fala, queria agradecer a algumas pessoas. Em primeiro lugar à Silvana, mas também à Natália Viskov, diretora das Edições ISKRA e toda a equipe que trabalhou muitíssimo para que esta publicação fosse possível. Também queria agradecer ao professor Jorge Luiz Souto Maior e às professoras Maria Beatriz Costa Abramides e Claudia Mazzei Nogueira que escreveram as apresentações deste livro.

Então para começar eu queria reafirmar que o relato que acabamos de escutar nesta intervenção de Silvana é a rotina de milhões de trabalhadoras terceirizadas em nosso país. É a rotina de homens e mulheres que vivem sob condições de trabalho degradantes, no Brasil profundo, com histórias tão ou mais humilhantes. Ao mesmo tempo este é o relato de uma revolta, dos primeiros passos de reorganização dos trabalhadores precários, que contamos em “miniatura”, neste livro que apresentamos hoje.

A precarização do trabalho não é um problema apenas das empresas, das universidades ou de tal ou qual patrão. A precarização é uma política de Estado. Por ter surgido de forma mais enfática como parte do ataque neoliberal a partir da década de 1980, tem efeitos objetivos de divisão da classe trabalhadora, mas principalmente na subjetividade dos trabalhadores. Hoje, a classe operária brasileira, e em todos os países, se encontra profundamente fragmentada entre efetivos, terceirizados, informais, desempregados. Ao mesmo tempo, divididos entre homens e mulheres, negros e brancos, homossexuais e heterossexuais. O poder deste ataque é fazer com que todos estes se sintam parte de “diferentes classes” e não de apenas uma classe operária.

Apesar de muitos trabalhadores e trabalhadoras verem no governo de Dilma e de Lula a possibilidade de melhorias nas condições de vida, é preciso demonstrar como na verdade ambos governos, que se dizem “dos trabalhadores” foram agentes continuadores da política neoliberal a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso do PSDB. O próprio ex-presidente Lula declarou publicamente que os banqueiros nunca lucraram tanto como no seu governo. Ao mesmo tempo os sindicatos e centrais sindicais que deveriam ser as ferramentas de luta da classe operária falam contra a precarização, mas na prática foram agentes diretos da implementação de toda esta flexibilização trabalhista que resultou na proliferação do trabalho precário.

Nesta década de PT no governo, as “grandes terceirizadoras”, empresas onde cotidianamente morrem trabalhadores por péssimas condições de trabalho como a Camargo e Côrrea, Andrade Gutierrez, Odebretch, foram as empresas da construção civil que mais lucraram com o chamado “Pacote de Aceleração do Crescimento” (PAC). Uma tendência que deve aumentar diante dos megaeventos como a Copa e as Olímpiadas em 2014. Estas empresas são ao mesmo tempo as grandes financiadoras do PT e do PSDB nas eleições – e em São Paulo, com Fernando Haddad não é diferente.

Ao mesmo tempo é neste governo também que vemos a violência contra as mulheres aumentar drasticamente. Os dados oficiais mostram que a cada 15 segundos uma mulher é agredida no Brasil e a cada 2 horas uma mulher é assassinada. Este é o país onde vemos a impunidade dos assassinos de Eliza Samudio – que chegou à recorrer à tão propagandeada Lei Maria da Penha sem sucesso e que no final das contas seus assassinos terão liberdade em poucos anos. É também neste governo de Dilma, que reina a hipocrisia e o silêncio diante da indicação de um deputado racista e homofóbico para a suposta “Comissão de Direitos Humanos” do Senado. Não poderiamos esperar nada muito diferente de um país onde os torturadores e mandantes da Ditadura Militar permanecem livres e impunes, e onde hoje a repressão e criminalização dos movimentos sociais, com assassinatos dos trabalhadores do campo, perseguição à dirigentes sindicais e ao movimento estudantil permanecem na ordem do dia.

Neste cenário, a classe operária brasileira se vê fragmentada, e portanto debilitada. Com um governo que de “trabalhadores” só tem o nome de um partido que há mais de uma década vem governando para a burguesia. E com sindicatos e centrais sindicais, como a CUT, Força Sindical e CTB, que atuam diretamente em defesa deste governo e deste estado, que é capitalista. Hoje, mostram mais uma vez de que lado estão quando o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC leva adiante um projeto chamado ACE (Acordo Coletivo Especial) que tem como objetivo flexibilizar os direitos já conquistados pela classe operária.

A esta situação, de “derrota moral” da classe operária e profunda desorganização, queremos fazer um contraponto. Este livro, que conta a luta das trabalhadoras terceirizadas da USP, é apenas uma forma de generalizar a idéia de que a classe operária é a única classe capaz de subverter esta ordem que impera e que as mulheres trabalhadoras, como parte dos setores mais oprimidos, estarão certamente na “linha de frente” deste combate. Ao mesmo tempo, o contraponto que quero apresentar parte também de um mundo que já não é mais o mesmo de alguns anos atrás. Um mundo em que a idéia de que a “classe operária” acabou é somente coisa do passado. Um mundo em que a decadência histórica do capitalismo está cada vez mais evidente através de sua própria crise.

Há 6 anos do estouro da crise capitalista internacional, vemos um cenário de crises políticas, processos revolucionários e tensões sociais que são potencialmente explosivas. Com uma tendência de que se aprofunde a grande recessão nos Estados Unidos e na União Européia, este processo já começa a se estender para outros países. E aqueles que defendiam que o Brasil estaria “blindado”, terão que começar a rever esta definição diante dos primeiros efeitos da crise capitalista no país que farão sentir de forma mais aprofundada características dos últimos anos brasileiros como o aumento dos postos de trabalho precário, tendência á desindustrialização, dependência da exportação das commoditties.

Neste mesmo cenário que vimos também grandes levantes da população pobre, da classe operária e da juventude. Aos processos chamados por “Primavera Àrabe” se somam grandes lutas da juventude nos países da Europa, mas também na América Latina, como no Chile e no México. Foram processos onde também as mulheres e os jovens estiveram na linha de frente. Como dizia Leon Trotsky, grande revolucionário russo “aqueles que lutam com mais energia pelo novo, foram os que mais sofreram com o velho”. No nosso continente, processos de reorganização da classe operária passam a acontecer até mesmo em países com governos considerados como “progressistas” como o de Evo Morales na Bolívia. A explosiva classe operária boliviana ontem e hoje estão organizados em um Congresso para construir o seu próprio instrumento político de luta, um partido dos trabalhadores. E a grande luta contra a violência às mulheres na Índia tem sido apenas o prelúdio de um enorme movimento das massas proletárias indianas, que há menos de uma semana protagonizaram uma greve geral de centenas de milhares.

Estes são alguns contrapontos à situação nacional que vivemos, aparentemente de maior passividade, mas que mantém latente as contradições de um país baseado na superexploração do trabalho, na concentração de terras nas mãos de grandes latifundiários, na submissão aos países e monopólios imperialistas, na opressão histórica ao povo negro, na segregação de amplas massas proletárias nas favelas de todo o país, na repressão policial contra a juventude, na enorme violência contra as mulheres, seja através de agressões, estupros e assassinatos, seja através das mortes por abortos clandestinos.

Nenhuma destas contradições pode ser profundamente resolvida no marco de um sistema baseado na exploração. Vivemos em uma sociedade dividida em classes, onde há homens e mulheres explorados – a classe operária – e homens e mulheres exploradores – a classe capitalista, a burguesia. Partimos desta idéia para dizer que os interesses destas duas classes são inconciliáveis, incompatíveis. A opressão às mulheres, anterior a este sistema capitalista, é utilizada como forma de aprimorar a exploração. Como dizia Karl Marx “A opressão do homem pelo homem começou com a opressão da mulher pelo homem”. Ao mesmo tempo, o racismo também é utilizado para aprofundar a exploração capitalista, aumentando assim a taxa de exploração do conjunto da classe operária.

As mulheres, como um grupo subordinado socialmente, também expressam um recorte de classe. Isso porque há mulheres oprimidas que são exploradas, e há mulheres oprimidas que exploram e que também oprimem a outras mulheres. Há três anos o Brasil é presidido por uma mulher. Que mudanças houve na vida das mulheres? Por acaso podemos comparar a vida de mulheres como Hilary Clynton (Secretária de Estado dos EUA) e Angela Merkel (Primeira Ministra da Alemanha), com a vida de mulheres e meninas que vivem em situação de guerra, sob o comando de tropas “de paz” que assassinam e estupram como no Haiti? Que semelhança há entre estas mulheres no poder com a vida de milhões de trabalhadoras terceirizadas em todo mundo, pra além do fato de todas serem mulheres? Não há nenhuma semelhança. Estas mesmas mulheres “no poder” disseminam uma ideologia feminista burguesa que é tomada por amplos setores feministas, como a Marcha Mundial de Mulheres ligada ao próprio governo, que buscam manter a idéia de que é possível uma emancipação das mulheres por dentro deste sistema capitalista. Nada mais falso. Como dizia Alexandra Kollontai, uma revolucionária russa: “Apesar da aparência radical das reivindicações feministas, não se deve perder de vista o fato de que as feministas burguesas não podem, em razão da sua posição de classe, lutar pela transformação fundamental da estrutura econômica e social contemporânea da sociedade, sem a qual a libertação das mulheres não pode ser completada”.

A partir da classe trabalhadora, as mulheres devem lutar firmemente pelos seus direitos, mas entendendo que não há possibilidade de conquistar “igualdade” em um sistema baseado na desigualdade social e econômica entre os seres humanos. Para as grandes massas proletárias, conquistar “igualdade” com os homens nesta sociedade significa apenas compartilhar uma parte da desigualdade, ou seja, condições iguais de exploração. Isto nos diferencia, estrategicamente do feminismo burguês e reformista: não são os homens nossos inimigos, mas sim a burguesia. Citando novamente Alexandra Kollontai “Enquanto para as feministas a conquista da igualdade de direitos com os homens no marco do mundo capitalista atual representa um fim suficientemente concreto em si mesmo, a igualdade de direitos no momento atual, para as mulheres proletárias, é apenas um meio para avançar na luta contra a escravidão econômica da classe trabalhadora. As feministas veem os homens como o principal inimigo, pelos homens terem se apropriado injustamente de todos os direitos e privilégios para si, deixando para as mulheres somente as correntes e obrigações. Para elas, a vitória se ganha quando um privilégio que antes era desfrutado exclusivamente pelo sexo masculino passa a ser concedido ao ‘sexo frágil’. As mulheres trabalhadoras têm uma postura diferente. Elas não veem os homens como o inimigo e o opressor, ao contrário, pensam nos homens como seus companheiros que compartilham com elas a monotonia e a rotina diária e lutam com elas por um futuro melhor. A mulher e seu companheiro masculino são escravizados pelas mesmas condições sociais, as mesmas odiadas correntes do capitalismo oprimem sua vontade e os privam dos prazeres e encantos da vida.”

Aí reside também o caráter estratégico de refletir sobre o problema da precarização do trabalho, que dizemos que tem rosto de mulher (e no nosso país particularmente das mulheres negras), buscando recompor objetiva e subjetivamente a classe operária na luta contra esta exploração capitalista, baseando-se não somente nos exemplos atuais que têm sido protagonizados no mundo inteiro, mas na vasta história da classe operária mundial que já chegou a tomar o céu por assalto, como na Revolução Russa, em 1917.

O poder, então, de resgatar histórias como esta da Dima, da União, da BKM, da Façon, que são todas experiências de terceirizados que contamos neste livro, é o poder de proporcionar à classe operária, em pequeno, o conhecimento do que fazem seus irmãos de classe. Enquanto lutávamos com mais de 400 mulheres e homens trabalhadores na luta da União em 2011, numa arrebatadora greve de 30 dias que sacudiu a Universidade de São Paulo, os operários da construção civil em Jirau, no norte do país, ateavam fogo sobre os canteiros de obra numa rebelião incendiária contra a superexploração.

Na USP, em contraposição a um “espaço de excelência”, estas mulheres foram capazes de se organizar. Bebiam da fonte da experiência da luta da Dima, retratada já na primeira edição deste livro, onde Silvana e dezenas de trabalhadoras recorreram aos métodos da classe operária, organizando assembléias e votando comissões de trabalhadores com as chamadas “linhas de frente”. Ora, se a burguesia e os patrões têm suas formas de organização, nós também temos que ter. E nós não começamos do zero. Em todas estas lutas estivemos participando, militantes revolucionários junto a independentes, em agrupações como os Metroviários Pela Base, Professores Pela Base, Uma Classe (bancários) e a partir do Boletim Classista.

A juventude que se decide por atuar ao lado da classe operária estrategicamente na luta pelos seus direitos, sempre pode cumprir um papel explosivo. Foi assim em todas estas lutas. Em 2005 os estudantes “deixavam de brincar o carnaval”, como diziam as trabalhadoras, para apoiá-las. Em 2011, centenas de estudantes largavam as carteiras e os cadernos para acompanhar os trabalhadores reforçando o coro que gritava “Ô estudante, eu limpo o chão, mas eu sou contra a escravidão!”. Depois com os jovens jardineiros da BKM, os estudantes ocuparam a sala da administração da Prefeitura do Campus da USP, e ali permaneceram até o pagamento dos salários e a garantia de nenhuma demissão. No Metrô de São Paulo, na luta da Façon, os estudantes e jovens metroviários, e particularmente uma estudante travesti se aproximou e foi firmemente defendida pelos operários, que respondendo a qualquer atitude homofóbica diziam “ela veio nos apoiar” reconhecendo inclusive o seu “gênero”. Todos estes estudantes se organizam na Juventude Às Ruas.

Esta juventude não começou do zero. Também parte de uma compreensão histórica de que a classe operária é a única capaz de mudar pela raiz esta sociedade de miséria e opressão, e portanto os estudantes têm que decidir se irão se formar para serem serviçais da burguesia, para “aprimorar” as formas de opressão a manutenção desta sociedade, ou se vão se decidir pela luta de classes, pelo lado dos explorados e dos oprimidos contra esta sociedade.

Os exemplos que pudemos vivenciar, lado a lado, com estas trabalhadoras terceirizadas avançando para superar seus próprios sindicatos burocráticos e patronais, auto-organizando-se e buscando apoio em sindicatos combativos e classistas, como é o Sintusp do qual sou Diretora, mostraram também uma das principais “regras” históricas da luta de classes que hoje vemos em todos os processos no mundo árabe e na Europa. Historicamente também podemos dizer que as mulheres estiveram na linha de frente dos principais embates de classe, e foram de aterrorizar governos, patrões e burguesia. Para isso basta dizer que a primeira revolução operária vitoriosa do século XX, na Rússia, teve início com uma greve de mulheres trabalhadoras.

É este legado o que também reivindicamos para encarar a luta das mulheres. O legado das mulheres marxistas revolucionárias do século XX que lutavam firmemente por nossos direitos desde uma perspectiva anticapitalista. Mulheres que não deixavam nenhum minuto de lado a luta pela única possibilidade de terminar com toda a forma de opressão, que é a luta por uma revolução socialista. Uma idéia que pode, para muitos dos presentes aqui, parecer distante. Mas que até mesmo em pequenas lutas como foi a da Dima, retratada neste livro, veio a tona. A idéia da revolução social, de uma sociedade sem classes, sem exploração e livre de toda a opressão, que foi arrancada com todo o ódio burguês do imaginário das últimas gerações da classe operária. Ali, em pequeno, naquela luta surgia nas palavras de uma trabalhadora que nos dizia “No dia que tiver qualquer coisa assim, uma coisa pra gente ir pra cima, eu vou também! Se for o caso até de uma revolução, eu estou dentro também!”. Por isso hoje digo, parafraseando Marx “Que as idéias, sozinhas, nada podem realizar. Para realizar as idéias são necessários homens e mulheres que ponham para funcionar uma força prática”. A crise capitalista mundial e a catástrofe social que desencadeia em vários países da Europa, mostram que o capitalismo reserva à classe operária e aos oprimidos. Esta crise, por outro lado, fará mais atual e necessária uma revolução socialista.

Hoje, neste salão, temos a presença de inúmeras trabalhadoras e trabalhadores que protagonizaram estes processos de luta que relatamos na 2ª edição do livro “A precarização tem rosto de mulher”. Também aqui estão muitos estudantes e professores que apoiaram todas estas lutas e que seguiram após as greves levando a luta no movimento estudantil para que a pauta da terceirização não fosse esquecida. Com a chapa “Cícera” homenageavam Cícera Maria, terceirizada da USP, negra, moradora da favela São Remo que simboliza as milhares de mulheres e jovens assassinados pela polícia nas favelas e bairros do país. Com o bloco “José Ferreira da Silva”, jovem terceirizado da USP vítima de um acidente de trabalho, homenageavam os milhares de trabalhadores mortos por acidentes de trabalho, em sua maioria terceirizados. Com um enorme apoio aos professores categoria no último ato organizado pela burocracia governista que nenhuma atenção dá para estes trabalhadores. E muitos outros exemplos. Por outro lado, também estas trabalhadoras apoiaram firmemente os estudantes e trabalhadores da USP quando sofremos o enorme ataque da Reitoria com a entrada da polícia. Uma delegação de trabalhadoras esteve em uma das maiores assembléias para dizer “Agora somos nós apoiando vocês”.

Ao mesmo tempo, reivindicamos profundamente o papel que cumpriu o Sindicato dos Trabalhadores da USP, que após estas experiências não apenas passou a considerar como base de sua categoria todo o trabalhador terceirizado e informal, possibilitando que estes se filiassem ao Sindicato, como votou em Congresso Estatutário o programa pela efetivação dos terceirizados sem necessidade de concurso público, uma vez que o fato de já estarem trabalhando é a maior “prova” de que podem continuar fazendo – e de forma mais qualitativa – se tiverem os mesmos salários e direitos. Para isso, o Sintusp enfrentou toda forma de repressão, desde a demissão de Brandão até multas ao nosso Sindicato. Ao mesmo tempo é preciso dizer que este é um programa que demanda um enorme movimento, uma enorme aliança capaz de reverter os ataques neoliberais das últimas décadas. Esta é urgência desta luta. E não é um programa impossível. Nosso país vizinho, a Argentina, vivenciou experiências como nas Ferrovias de Trens de Buenos Aires onde os trabalhadores organizados impuseram a efetivação, num enorme embate com a burocracia sindical.

Então, o sentido que queremos dar para esta publicação é o de transmitir o enorme valor subjetivo dos passos que dá a classe operária quando as mulheres se colocam na linha de frente, quando os trabalhadores precários passam a se sentir parte de uma mesma classe, quando os trabalhadores efetivos passam a romper com o comodismo e ter políticas não corporativas, se unindo aos terceirizados. É necessário levar adiante este programa, pela efetivação, combatendo também a própria esquerda que infelizmente como PSOL, mas também o PSTU que se reivindica revolucionário, não defendem fervorosamente nos sindicatos que dirigem. Assim, se omitem desta enorme batalha pela recomposição da classe operária.

Estes pequenos avanços na prática, produzem enormes saltos na consciência de trabalhadoras e trabalhadores. Desde mulheres que a partir da luta conseguiram se livrar das amarras da opressão se permitindo ser sujeito de sua própria vida, como Silvana, até mulheres que, em meio a luta, diziam que deixavam de sonhar com a louça, a roupa, a comida. e passavam a sonhar com a assembléia, os estudantes e com a luta.

Estas mulheres passaram a enxergar que não há saída individual pra tamanha opressão e exploração. Sozinhas é muito difícil. Nós, militantes revolucionárias, como eu, acreditamos profundamente na força da classe operária, e acreditamos profundamente que quando este “exército silencioso” de mulheres trabalhadoras, donas de casa, empregadas domésticas, estudantes, desempregadas se levantarem, como Silvana, se colocando como sujeito ativo e enfrentando a opressão que existe no seio da própria classe operária para recompô-la em uma só classe numa só luta, não haverá burguesia e governos capaz de nos deter.

A força que nos querem retirar – sejam os sindicatos pelegos, sejam os governos pró-burgueses – está contida nos exemplos históricos que não nos permitem conhecer. Quando vocês souberem o que a nossa classe, a classe operária, já enfrentou, já organizou, já fez, será simples até demais pensar que não devemos nos contentar com o possível. Devemos exigir o impossível.

Por fim, chamo todos os presentes a conhecerem este livro, e como me disse uma grande lutadora da União: “não é um livro pra ficar na estante”. Este é um livro da nossa luta. É um livro militante. Que cada jovem, trabalhador, terceirizado, dona de casa que folhei esta páginas, sinta ali concentrada a força, em pequeno, de uma classe revolucionária que dentro em breve terá que se levantar para enfrentar os efeitos da crise capitalista, que quando chegar em nosso país atingirão em primeiro lugar os terceirizados, as mulheres, os negros e a juventude. Mas este gigante, que é a classe operária brasileira, tem muita história de organização e luta, e poderá se apoiar também nos exemplos avançados que a classe operária já está dando internacionalmente, como na França os operários das montadoras lutando contra as demissões.

Como dizia Leon Trotsky, um dos dirigentes da Revolução Russa ao lado de Lenin “Se queremos transformar a vida, temos que aprender a enxergá-la através dos olhos das mulheres”. A partir da publicação da 2ª edição do livro “A precarização tem rosto de mulher” fazemos um chamado a todas as mulheres, a toda a juventude, a todos os trabalhadores a se organizarem conosco, no grupo de mulheres Pão e Rosas e nas agrupações de trabalhadores e estudantes que impulsionamos na USP, no Metrô, entre professores, trabalhadores bancários, dos Correios, das fábricas, terceirizados e nas universidade, e que a partir da difusão deste livro organizemos um amplo movimento contra a precarização do trabalho, por nossos direitos e pelo fim desta sociedade de opressão e exploração. Porque exigimos o nosso direito ao pão, mas também às rosas!

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