Sexta 26 de Abril de 2024

Notas sindicais

06 Sep 2005   |   comentários

Orientada por uma vanguarda inexperiente e pouca conhecedora do que é ou deve ser um sindicato, a parte mais combativa do operariado desta capital viu-se há alguns meses e da noite para o dia sem as suas organizações de classe, a mercê da exploração patronal.

É que a polícia, apavorada naturalmente com a suada feita por essa vanguarda através de organismos que desfraldavam a bandeira da luta de classe, tomou a nuvem por Juno [“a nuvem por Deus” , o sintoma pela causa] e em três tempos fê-los silenciar, trancando-lhes as sedes e carregando com os respectivos arquivos.

Porque conseguiu o poder coercitivo dispersar com tanta facilidade os milhares de operários que se achavam sob a orientação política da mencionada vanguarda? Primeiramente porque já lavrava o descontentamento contra a orientação que se lhes imprimia: e em segundo lugar porque quando irrompeu a reação ’ esperada alias por todos aqueles que militavam nos sindicatos ’ não apareceram os orientadores senão quando nada mais se podia fazer.

Disso foram testemunhas todos aqueles que ocupavam os cargos na direção dos sindicatos, muitos dos quais foram dar com costados no xadrez da [8ª? - ilegível].

Assim, mais uma vez pagaram o pato muitos operários que não enxergavam e não acreditavam nas mirabolantes previsões de nossos messias. E da luta, se dirá.

Mas o que se fez durante quase todo o ano passado não foi luta propriamente. O que se fez foi um trabalho metódico de auto-denúncia das nossas possibilidades no meio das massas, comprometendo todo e qualquer trabalho legal que ainda se pudesse fazer, pondo a descobertos os nossos redutos, sem motivo justificado, orientando enfim com uma sem-cerimónia espantosa a ação daqueles que mais tarde nos deviam desbaratar...

Pode-se procurar dar outra explicação aos acontecimentos, mas a massa que fazia parte dos sindicatos aí está para julgar quem diz a verdade.

Como explicar que se haja chegado ao ponto de negar na prática, e de maneira não desastrada, a nossa capacidade de lutar pela emancipação dos trabalhadores?

É fácil: O P.C. desde princípios de 30 passou a ser orientado dirigido por dúzia de “jovens” bem intencionados, um tanto viajados e bem falantes. Mas, esquecidos, que estavam à frente de um partido, embora composto em sua maioria de elementos “sem cultura” , entendiam de iniciar a política que denominavam centralizada: isto é, passaram a dar ordens e a despejar manifestos sem se importar com os que deviam cumprir essas ordens, na certeza de que após um tanto de papelório despejado ao léu, tantos seriam ideologicamente preparados para a revolução. Quando alguém, imprudentemente se lembrava de fazer-lhes alguma observação negativa à marcha que tomavam os acontecimentos, era logo fuzilado por todos os [ilegível] conhecidos e desconhecidos do vocabulário, ao mesmo tempo que se dava ordens ’ que se fava ordens repetimos ’ para que chovessem as manifestações de solidariedade à direção...Ninguém entendia de nada. Eles eram possuidores exclusivos da dialética marxista e tática leninista e não admitiam crítica de aspecto algum. Assim, convencidos como estavam de que a situação já era revolucionária e meio trataram de alcançar a massa para não ficar a reboque.

Quando lhes pareceu tudo pronto para irromper a sonhada revolução “agrária e anti-imperialista” cai-lhes em cima a reação e põe em evidência toda a incapacidade dos ensinadores da imaginária aventura. Os sindicatos foram abandonados a sua sorte, enquanto o grupelho ’ que há de se tornar célebre pela imensa quantidade de mancadas cometidas, procurava compreender aquilo que suas mentalidades saturadas de teoria mal digeridas ainda não conseguiram discernir.

****

O patronato diante da especialíssima situação que lhe foi proporcionada sem outro incómodo, entrou, nestes últimos meses, a lançar mão de todos os meios a seu alcance para aumentar seus lucros à custa da miséria que paralelamente acarreta aos lares proletários.

É verdade que diminuindo salários, aumentando horas de trabalho e submetendo os trabalhadores ao regime de fome em que se encontram presentemente, o patronato prepara condições objetivas excelentes para um trabalho de reorganização.

E esta péssima situação deve ser aproveitada pelos mais conscientes para reorganizar os sindicatos sob novos moldes, capazes de resistir não à reação, mas também à ação dissolvente daqueles que vivendo no mundo da lua querem dirigir os operários da maneira por que acabamos de ver, sem fazer e nem permitir que se fizesse um trabalho sério de organização.

A experiência nos tem demonstrado inúmeras vezes que nós nos descuidamos, pois não procuramos intercasar os operários na luta em que estamos empenhados.

Confiamos demasiadamente na tradição revolucionária das massas e muito poucas vezes nos lembramos de pór à prova a sua capacidade. E é disto que ela mais precisa, de adestramento, treino, educação revolucionária.

E o melhor meio de se preparar militantes capazes e massas combativas é levar os sindicatos à luta, periodicamente, pelas reivindicações de melhorias económicas imediatas, pois só na prática os operários se convencerão mais facilmente da inevitabilidade de se transformar a luta económica em luta política.

Não nos esqueçamos de que a maioria dos trabalhadores daqui, ainda hoje se preocupa mais com as torcidas esportivas do que com o desenvolver da luta revolucionária mundial.

Para desviá-los desse caminho para entregá-los no seu papel histórico de coveiros do capitalismo, é preciso saber conduzi-los. E como “só um máximo de organização e de participação das massas pode garantir o êxito da luta do proletariado” nós devemos nos aproveitar de todas as questões que diariamente surgem e que interessam aos trabalhadores para ajudá-los a formar sua consciência de classe, para levá-los à organização.

É preciso convencer os trabalhadores de que os sindicatos “não são organizações exclusivamente políticas, mas sim, e em primeiro lugar, organismos de luta económica dos operários que se colocam no terreno da luta de classes.”

Todos nós sabemos que para conquistar a hegemonia no meio proletário é preciso demonstrar praticamente que se sabe trabalhar, que se sabe defender os interesses da classe pobre melhor que outra qualquer tendência furta-cor. É o que ainda não demonstramos durante vários anos de luta e o que é preciso fazer, a todo transe, se não quisermos continuar a ser o que temos sido até aqui e que nos dispensamos de qualificar.

Luta de Classe, n.1, ano 1, maio de 1930









  • Não há comentários para este artigo