Quinta 2 de Maio de 2024

A situação internacional e as tarefas dos marxistas revolucionários hoje

Apresentação

28 Jun 2005   |   comentários

As últimas décadas foram caracterizadas pela ofensiva burguesa sobre o trabalho, sobre os países semicoloniais e sobre os ex-Estados operários burocratizados. Esta foi a resposta do capital ao período convulsivo aberto nos anos 1970. Esta década esteve marcada pela crise de acumulação capitalista depois do boom do pós-guerra, da emergência de potências competidoras como Alemanha e Japão e do ascenso operário e popular de 1968-81 nos países centrais e, de forma mais aguda, na periferia, que debilitaram a relativa estabilidade da Ordem de Yalta hegemonizada pelos EUA, questionando as bases de seu domínio. Este período marcou o fim da chamada “hegemonia benevolente” do imperialismo norte-americano e o obrigou a passar à contra-ofensiva para prevenir uma rápida erosão de seu poder, tanto na arena económica como no terreno militar. Como resultado desta reação imperialista, os Estados Unidos conseguiram desacelerar os ritmos de sua decadência, alcançando uma recomposição relativa de sua hegemonia. Esta política que se iniciou com Reagan na década de 1980 teve seu ponto mais alto na década de 1990, onde a debàcle da URSS e a reafirmação dos EUA como potência triunfante da Guerra Fria permitiram criar a miragem de um domínio indisputado sobre o mundo, ocultando e minorizando as contradições de seu domínio. O reforço da ofensiva liberal e a extensão do capital a novas áreas geográficas antes vedadas à sua exploração geraram um triunfalismo burguês desenfreado, dando lugar a uma década de prosperidade e renovada confiança capitalista.

O fim da década de 1990 marcou um ponto de inflexão com relação à situação das décadas precedentes. A abertura deste novo período na situação internacional é o resultado dos seguintes fatores:

1) O fim do boom da economia norte-americana do fim dos anos 1990 e, em nível mais geral, o desenvolvimento das contradições inerentes à maior internacionalização do capital e de um importante desequilíbrio na economia mundial, que se tinha anunciado já na crise asiática de 1997-99.

2) Uma mudança significativa na política exterior do imperialismo norte-americano após os atentados de 11/9 para uma orientação ofensiva voltada a gerar as condições para reafirmar o domínio norte-americano sobre o mundo, o que levou a debilitar instituições internacionais como a ONU, e a redefinir o papel de outras como a OTAN, pondo em questão o sistema que desde o segundo pós-guerra rege em linhas gerais as relações internacionais.

3) Como conseqüência do anterior, estamos presenciando um desenvolvimento sem precedentes nos últimos anos das tensões interestatais entre as grandes potências, fundamentalmente entre Estados Unidos por um lado e França e Alemanha por outro, que atingiram níveis importantes às vésperas da guerra norte-americana contra o Iraque e que mostram uma rachadura nas relações internacionais que seguirá atuando a longo prazo, independentemente das diferentes conjunturas de maior cooperação ou diálogo ou de maior confronto que atravessem estas relações. No curto prazo, a crise que se abriu no projeto da União Européia depois do triunfo do NÃO no plebiscito sobre a Constituição Européia na França e em outros países, é um handicap a favor de Estados Unidos.

4) Uma recuperação lenta mas sustentada do movimento de massas depois do retrocesso de quase duas décadas que implicou a ofensiva neoliberal, o impacto da restauração capitalista em curso e o profundo retrocesso na consciência de classe e na organização independente do proletariado. A greve dos servidores públicos franceses em 1995 marcou um ponto de inflexão num processo de reversão ideológico-política do derrotismo dos anos precedentes. À emergência de aliados do proletariado, como setores juvenis anti-capitalistas, principalmente nos países centrais, camponeses etc., que vinha se desenvolvendo, somaram-se como elementos de importância a tendência à ação direta na América Latina e uma crescente atividade do movimento operário. Esta lenta recuperação de setores avançados do movimento de massas se dá no marco de uma crescente polarização social e política à esquerda e à direita, o que pode estar prenunciando o desenvolvimento de acontecimentos mais convulsivos onde as contradições são mais agudas, como já vem antecipando o processo revolucionário aberto na Bolívia em outubro de 2003, e que atingiu um novo pico em junho de 2005.

Do ponto de vista da situação internacional, o mais dinâmico é a perda de legitimidade do domínio norte-americano e a tentativa dos Estados Unidos de redefinir uma ordem mundial segundo seus interesses nacionais.

Se, por um lado, a decadência da hegemonia norte-americana é um elemento histórico, que começou em meados da década de 1970 com a derrota dos Estados Unidos no Vietnã, e seguirá atuando a longo prazo, este processo se acelerou depois dos atentados do 11 de setembro de 2001, precipitando o giro do governo de Bush a uma política externa mais unilateral e guerreirista. A oposição à guerra do Iraque de potências imperialistas como França e Alemanha, de governos semicoloniais e do movimento de massas a nível mundial, pós de manifesto cruamente a polarização gerada por esta política ofensiva.

Estamos atravessando um período no qual os Estados Unidos seguem sendo a principal potência imperialista, mas seu domínio não é aceitado passivamente, pelo contrário, é cada vez mais questionado ou sofre resistência por parte de diferentes atores que foram se perfilando no curso da última década. Seu crescente militarismo é uma mostra de debilidade e não de um domínio indiscutido, uma mostra de sua perda de consenso e da necessidade de apelar a métodos mais brutais para sustentar sua hegemonia a nível mundial.

Este é o principal elemento pelo qual, desde nosso ponto de vista, abriu-se uma etapa preparatória, em que diferentemente dos anos precedentes de incessante ofensiva burguesa e de derrotas importantes do movimento operário e de massas, combinam-se golpes reacionários como a guerra contra o Iraque com uma tendência a uma maior resistência do movimento de massas e a uma incipiente recomposição da subjetividade proletária, ainda que a luta de classes não seja o que predomine.

O início deste novo século, marcado pela decadência da hegemonia do imperialismo norte-americano, pelos conflitos entre as potências imperialistas, pelo crescente militarismo, por polarização social e por um lento emergir do movimento de massas, coloca a necessidade de avançar num programa revolucionário que esteja à altura dos próximos combates dos oprimidos no período que se abre.









  • Não há comentários para este artigo