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Juventude

MOVIMENTO ESTUDANTIL

Universidade: conhecer para transformar

16 Feb 2008   |   comentários

Em mais um começo de ano, é necessário desmascarar para o conjunto dos estudantes como funciona a universidade para lutar conscientemente para transformá-la. [1]

A universidade é composta por vários organismos, que a maioria sequer conhece. A organização ocorre hierarquicamente em três instâncias: nos cursos (Conselhos de Curso e Departamentos), nas faculdades ou institutos (Direção e Congregação) e de toda Universidade (Reitoria e Conselho Universitário - CU) [2]. Isto é a burocracia acadêmica: quem controla o poder dentro das universidades e estabelece uma verdadeira ditadura de uma casta privilegiada de docentes contra os interesses da maioria de estudantes, funcionários e, inclusive, de alguns professores precarizados.

Esses burocratas docentes governam a serviço dos interesses dos governos e dos empresários e controlam a ampla maioria dessas instâncias, sendo responsáveis por 75% dos votos contra 15% de funcionários e estudantes. Com isso, qualquer consulta aos chamados órgãos colegiados (CU e Congregação) são formais, sendo o “executivo” a principal estrutura do Regime Universitário.

A escolha dos reitores é uma farsa. Só podem ser reitoráveis três docentes titulares [3], escolhidos pelo CU (chamada lista tríplice). Mesmo com uma eleição tão antidemocrática, o reitor passa pelo crivo do chefe de Estado. Quem define o Reitor? Nas estaduais, o governador; nas municipais, o prefeito; e nas federais, o Presidente. Na PUC-SP... o vaticano!!! Todo o resto da estrutura de poder funciona na mesma lógica de cima para baixo: governador indica o reitor, reitor indica os diretores, diretor indica os chefes de departamento.

É para impor sua política universitária e definir a produção científica que os governos e empresários precisam da ditadura de uma minoria docente, pois nunca poderiam contar com os funcionários e estudantes que são atacados por estes planos. Nem mesmo com todo o corpo docente, onde existe ainda uma ala esquerda (minoritária) que defende a Universidade contra ataques e devemos nos ligar à ela para dividir essa categoria que é a base do regime universitário e pode ajudar a massificar a mobilização.

Por isto, a estrutura universitária exige que os candidatos a reitor sejam professores titulares. Estes recebem os melhores salários e uma série de privilégios materiais para seguir à risca a política dos governos. Nem sequer nos órgãos colegiados todos são eleitos. O Conselho Universitário é presidido pelo reitor e composto em sua maioria por diretores de unidades indicados por ele! Sem falar que as cadeiras para a “sociedade” são ocupadas por representantes patronais, como a Fiesp e a Confederação Nacional das Industrias.

Nas salas de aula e na relação com os funcionários o peso dos docentes também se faz presente. Tente sempre questionar seu professor, mas saiba que estes usam de sua autoridade para calar os alunos discordantes na sala de aula e, em relação aos funcionários fazem ainda pior, pois crêem que esta autoridade é justificada pela discrepância salarial.

Autonomia para quê?

A luta em defesa “autonomia universitária” ganhou peso na ditadura militar contra a ingerência desta na Universidade. Porém, a “autonomia universitária” que temos hoje está longe da que defendemos, visto que significa o poder da burocracia acadêmica controlar livremente as finanças da universidade como seu clube particular. A conquista da autonomia pelas estaduais paulistas significou em ”™89 que o governo repassaria um montante às reitorias para gerir este recurso.

Esta autonomia ajudou a explicitar o balcão de negócios entre reitoria-governo-capitalistas. Como o orçamento das Universidades é bastante apertado (pois os banquetes dos reitores não são nada baratos), estes freqüentemente pedem ao governo migalhas... para em troca aplicar sua política. A luta das estaduais paulistas em 2007 contra os decretos de Serra em defesa desta autonomia provou isto: as reitorias ficaram ao lado do governador.

Para preencher o orçamento, a Reitoria tem “autonomia” para buscar uma grana extra com grandes empresários através das fundações privadas. E quem paga a banda....escolhe a música: a grana vem condicionada a ligar a Universidade cada vez mais à iniciativa privada, acelerando o processo de privatização interna e deixando a produção acadêmica à disposição dos melhores investidores.

A Universidade do Mensalão e do Cartãozinho

A democracia burguesa só se sustenta por via da corrupção, os inúmeros escândalos do governo Lula como o mensalão e os cartões corporativos escancaram isto. Isto vale para todo o regime burguês, incluindo a Universidade; com os mesmos mecanismos de compra de votos, barganhas espúrias e privilégios.

Na principal universidade do país, a USP, onde as fundações privadas controlam o Conselho Universitário, composto por donos de empresas e fundações, isto é evidente. Até hoje, ninguém explicou o porquê do dono do restaurante privado da Química da USP ser de um professor do Conselho Universitário (o professor Mario Beni, dono da empresa StarBeni, ex-diretor do Banespa envolvido no escândalo do BANESTADO).
Na Universidade também há barganha em troca de votos. Por exemplo, em 2005 na luta por aumento de verbas como o governador conseguiu convencer uma maioria de deputados a vetar o aumento de verbas? Um deputado da época nos dizia “não posso votar nessa proposta, pois senão o governador não libera verba para meus projetos” . O governador fez o mesmo no processo de expansão de vagas da UNESP com o Conselho Universitário: prometeu uma verba “extra-cota” para os diretores fazerem seus projetos.

São inúmeros casos a serem citados, como na UnB nesta virada de ano onde o Reitor utilizou-se de meio milhão de fundos da “Fundação de Apoio a Pesquisa” para reformar seu apartamento e hoje está envolvido nos escândalos dos cartões corporativos de Lula! Os quadros dirigentes das principais universidades brasileiras, como a USP, UnB, UFRJ, UFBA, UNESP, entre outras encontram-se envolvidos em escândalos até a medula dos ossos. Assim vemos o estado putrefato do atual regime universitário, envolvidos pela mesma lama de corrupção de Marcos Valério, Roberto Jefferson, Zé Dirceu...

Pelo fim da universidade elitista e racista

Diante dessa estrutura, toda a política educacional da burguesia formulada pelo MEC e pela Secretaria de Ciência e Tecnologia (obedecendo às orientações do FMI e Banco Mundial) é facilmente aplicada quando não há resistência.

Para nós, a única saída possível para transformar a Universidade como instrumento da maioria da sociedade, dos trabalhadores e do povo pobre é derrubar este regime e organizá-lo democraticamente a partir de Assembléias ou Congressos Universitários, o que só será possível com um pacto entre a comunidade universitária e os setores mais explorados da sociedade que têm interesse em acabar com a atual universidade elitista e racista.

Assim, estamos contra os grupos estudantis reformistas que querem nos fazer crer que elegendo representantes para esse tipo de conselho democratizaremos a Universidade. Já sabemos como este regime funciona. Até mesmo uma luta conseqüente por reformas deve se pautar por uma estratégia revolucionária, porque a única chance da burocracia acadêmica conceder uma democratização real é verem a possibilidade de um movimento se desenvolver e arrancar-lhe as dedos; para não perdê-los, podem dar alguns anéis.

Assim como a participação dos revolucionários no Parlamento não pode ser a de um deputado reformista que implora migalhas à burguesia, não pode ser essa nossa atuação nos órgãos colegiados. Nós marxistas, não nos pautamos pela lógica dos votos parlamentares; mas pela correlação de forças na luta de classes e na Universidade não tratamos diferente.

Os estudantes não podem se colocar nestes espaços para implorar migalhas aos serviçais da burguesia. Devemos atuar com uma política independente para ajudar a organizar um forte movimento que negue essa estrutura reacionária, colocando os mandatos nestes órgãos a serviço das lutas pela transformação radical da Universidade.
Para nós não basta lutar por pequenas reformas na universidade, nos limitando à luta por moradias ou pela saída de um reitor como defendeu a direção do movimento na Fundação Santo André no ano passado e agora apontam os companheiros do DCE da UNB. Se trata de impor essas demandas propondo uma saída alternativa. De que adianta derrubar a reitoria para colocar uma nova administração que não se anteponha à estrutura de poder existente?

Chamamos os estudantes a lutarmos por revolucionar esse regime universitário; começando por organizar o movimento estudantil de baixo para cima, com delegados eleitos nos cursos, para impor pela nossa própria força Congressos Estatuintes, independentes da burocracia acadêmica, para organizar um novo regime universitário sob uma nova base de classe, opondo-se à velha universidade elitista e racista, na luta por uma universidade a serviço dos trabalhadores e do povo.

Pelo fim do vestibular!
Pela estatização das universidades particulares!
Por uma universidade pública e massiva, onde a produção de ciência esteja voltada para resolver os grandes problemas das massas e não de um punhado de parasitas capitalistas e burocratas acadêmicos!

Del é estudante de Ciências Sociais e trabalhador do Restaurante Universitário da UNESP de Marília

[1Este texto foi escrito tendo como base às universidades estaduais paulistas, particularmente a UNESP. No entanto, essa estrutura é muito similar em todas as Universidades estatais do país e somente em algumas privadas.

[2Assim como no Estado temos o executivo (presidência, governo e prefeitura) e legislativo (senado, congresso, assembléia legislativa e câmara municipal), na Universidade temos o executivo (Reitoria e diretoria) e o legislativo (Conselho Universitário, Congregação).

[3Titulação máxima da qual a minoria dos docentes faz parte

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