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Internacional

Uma “nova Tiannamen” em Hong Kong?

30 Sep 2014   |   comentários

Hong Kong está sendo sacudida por protestos, que já estão sendo comparados com as manifestações de Tiannamen em 1989. Já contam três meses desde que uma ampla mobilização estudantil se organizou, e há diversas semanas ocupou a praça em frente à sede do governo local. A sua principal reivindicação é por mudanças nas leis para as eleições, que colocam uma série de restrições às candidaturas, sendo consideradas como (...)

Hong Kong está sendo sacudida por protestos, que já estão sendo comparados com as manifestações de Tiannamen em 1989. Já contam três meses desde que uma ampla mobilização estudantil se organizou, e há diversas semanas ocupou a praça em frente à sede do governo local. A sua principal reivindicação é por mudanças nas leis para as eleições, que colocam uma série de restrições às candidaturas, sendo consideradas como antidemocráticas.

De acordo com a reforma eleitoral elaborada por Pequim em 31 de agosto, o próximo chefe de governo local, apesar de eleito pelo voto universal, deverá ter sido indicado previamente por um colégio eleitoral composto por 1200 notáveis, ou em outras palavras, representantes das empresas mais importantes ligadas ao governo central. Com isso se garante o controle por parte do governo central de Pequim de todos os candidatos.

Enquanto a greve estudantil tinha início, ocorria em Pequim o maior encontro entre os empresários dos principais setores ligados à especulação imobiliária, bancária e grandes monopólios empresariais de Hong Kong, e o governo central, grupo tido pelo PC como fundamental para garantir seus interesses, e o controle político da ex-colônia.

O regime vigente em Hong Kong desde 1997 é conhecido sob o lema “um país, dois sistemas”, e ao contrário do restante da China em que os chefes de governo são escolhidos pela cúpula do PC, conta com eleições, que o movimento atual está denunciando como uma falácia. Um referendo realizado em 31 de agosto, e que teve a participação de cerca de 800.000 dentre os sete milhões de habitantes da ex-colônia britânica havia demonstrado o amplo rechaço à proposta do governo central. Mas nem isso fez com que Pequim retrocedesse, e o resultado é a crise política mais significativa dos últimos tempos.

Como fruto da resposta repressiva dada pelo governo às manifestações, agora essa agregou à sua pauta de reivindicações, a exigência pela saída do chefe do executivo, Leung Chun-Ying, cujo mandato é amplamente percebido como responsável por um aumento da submissão aos ditames de Pequim. Cada vez mais o grito de “renuncie já!” tem ecoado pelos milhares de vozes que estão nas ruas de Hong Kong.

Desde que as manifestações se iniciaram reuniram milhares de estudantes. A greve estudantil declarada no dia 22 de setembro foi marcada desde o início por aulas públicas sobre ocupação do espaço público, e direitos civis. A partir da ação da polícia, mais dura no último final de semana, o movimento se tornou mais forte e massivo. No último sábado, dia 27, a repressão veio sob a forma de bombas de gás lacrimogêneo, e culminou na prisão de 74 pessoas, dentre eles Joshua Wong de 17 anos, uma das principais referências estudantis, que segue encarcerado com o pedido de libertação sob pagamento de fiança negado.

A repressão foi entendida como desproporcional e desnecessária, não apenas pelos manifestantes, como pelo conjunto da opinião pública. No dia seguinte às prisões, as redes sociais foram tomadas por declarações de repúdio ao governo, e a situação se tornou claramente desfavorável para que aquele seguisse pela via da repressão estatal para tentar conter o movimento. E mais importante, agora as manifestações reuniram 100 mil pessoas em frente à Praça, que claramente não se intimidaram com a repressão.

Outro efeito da repressão foi que essa gerou a unidade entre o movimento estudantil e aquele que ficou conhecido Occupy Central que, sem a denúncia à democracia corrupta dos “1% contra os 99%” que caracterizou o movimento Occupy Wall Street, YoSoy132 no México e outros, abriu margem para o apoio e a presença da elite local, como Edward CK Chin, grande empresário das finanças, que montou sobre o movimento contra a tutela chinesa para defender o “desenvolvimento econômico” de Hong Kong.

Ainda assim, conta a participação de professores, e também exige mudanças democráticas no regime. O Occupy Central está organizando um protesto para o dia 1 de outubro, dia do 65º aniversário da República Popular da China. Se isso de fato ocorrer, não está descartado que possa se transformar em um importante ato político contra o governo central, carregado de simbolismo pela data escolhida. Soma-se a isso, a declaração de que os sindicatos e associações de trabalhadores apóiam as manifestações (com a ameaça de uma greve geral por parte do HKCTU, a Confederação Sindical de Hong Kong).

Caso se integre como parte ativa das manifestações, essas poderão ganhar ainda mais fôlego, e tal como em Tiannamen em 1989 radicalizar os protestos. Entretanto, diferentemente de 1989, pelo menos na conjuntura aberta depois da resposta repressiva do último final de semana, classicamente utilizada por Pequim, o governo central teve que retroceder, e desautorizou o uso do Exército Popular de Libertação contra o movimento.

Dessa forma, a crise política ainda conta com um resultado incerto, e será muito difícil que o movimento retroceda, pois é um sentido propagado por diversos analistas que os manifestantes se prepararam para uma longa jornada até a conquista de seus objetivos, que já se colocam como uma grande transformação, e um dos maiores desafios impostos ao poder dos grandes conglomerados econômicos locais, e para o governo de Pequim. Sigamos com muita atenção.

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