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Uma campanha militante nas eleições estudantis da USP para combater a Reitoria

20 Oct 2011   |   comentários

Aproximam-se as eleições para os Centros Acadêmicos e Diretório Central dos Estudantes da USP. Entrevistamos André Bof, estudante de Ciências Sociais, Beatriz Michel, estudante de Letras, e Gustavo Carneiro, estudante de História, militantes da LER-QI.

JPO – As eleições estudantis encontrarão a universidade em que situação?

Bof – As eleições estudantis ocorrem em um momento em que o reitor Rodas e o Conselho Universitário, a serviço do governo do PSDB, preparam um ataque estratégico à universidade. Já estão ocorrendo demissões sem “justa causa”, que antecipam o PROADE, um instrumento que institucionaliza o assédio moral e acaba com a relativa estabilidade no emprego que existe na USP. Depois de reduzir a verba para pagamento de salários, e aumentar a verba para a terceirização, esse é o mecanismo com que a reitoria pretende “enxugar” o quadro de funcionários. O projeto de Rodas, ele mesmo disse ao assumir, passa pela demissão de milhares de trabalhadores.

Bia – Rodas está privatizando a universidade. Quer demitir e colocar ainda mais a máfia das empresas terceirizadas pra lucrar na USP. As trabalhadoras da União escancararam com sua greve como a universidade já é sustentada por trabalho semiescravo. A burocracia do seu sindicato tentou desmontar sua greve. Mas a aliança com o SINTUSP e um setor combativo do movimento estudantil, do qual participamos orgulhosamente, impôs à Reitoria que pagasse os salários, abalando sua imagem e seu projeto. E Rodas sabe que para passar seus ataques precisa derrotar essa resistência.

Por isso se utilizou da morte de um estudante da FEA no semestre passado para criar um clima de medo e consolidar a militarização da USP. A PM vem para reprimir, como vimos em 2009, tentando dissolver piquetes de greve com bombas e balas de borracha cruzando prédios de aula, e agora abordando e intimidando funcionários e estudantes, até nos espaços estudantis. Por isso, depois da demissão política de Brandão no fim de 2008, agora abre um processo pedindo a demissão de outros seis dirigentes do Sintusp e ativistas, buscando destruir esse sindicato e acabar com a liberdade de organização sindical. No mesmo processo, pede a “eliminação” de Rafael, um companheiro estudante perseguido por lutar pela permanência estudantil.

JPO – Para vocês, como as eleições estudantis se relacionam com essa situação?

Gustavo – É preciso por em pé uma grande campanha contra a PM, as demissões, os processos, a terceirização e a precarização do ensino. Essa é a primeira tarefa do movimento estudantil. E há uma boa chance de que as eleições estudantis atuem no sentido oposto com cada corrente ou coletivo buscando votos, por fora dessa tarefa, disputando as entidades de modo despolitizado. Contra essa tendência, partimos de um chamado à unificação do movimento estudantil combativo em chapas de combate ao projeto de Rodas de reprimir para melhor precarizar.

Isso exige romper completamente com a política que tiveram as direções do movimento estudantil que, ao longo desse ano, se mantiveram passivas mesmo frente a tudo isso. O DCE, cuja gestão é dirigida pelo PSOL, não travou nenhum combate à Reitoria, não teve nenhuma política para fortalecer e ampliar o alcance das greves de terceirizados, nenhum combate às demissões, nenhuma defesa dos lutadores do CRUSP, nenhuma medida contra a militarização do campus. Com isso, alimentou a passividade construída pela Reitoria. Mais em geral, as entidades estudantis, mesmo aquelas integradas pelo PSTU, deram muito menos peso a todos esses conflitos do que a suas campanhas de calendários definidos por fora da luta de classes.

Bia – Um exemplo disso é a campanha pelos 10% do PIB para a educação. Assistimos há meses a juventude chilena na luta por educação gratuita já, para todos, contra o regime herdeiro de Pinochet. A mídia já fala de um setor “moderado”, que quer negociar com Piñera, e de outro, “ultra”, que está derrubando essa burocracia, justamente por se manter intransigente no enfrentamento com a polícia nas ruas pela educação gratuita para todos. Esse é o exemplo que queremos seguir: a educação precisa desesperadamente de mais verbas, mas não queremos dinheiro para o Grupo Anhanguera, ou para as terceirizadoras de Rodas, e sim para garantir permanência estudantil, para dar vagas para a juventude trabalhadora e negra, derrubando o vestibular que a exclui, através da estatização de todo o ensino privado.

As bravas lutas de professores que ocorreram em nosso país e as ocupações nas universidades federais também poderiam ter sido um espaço para organização de todos estes setores, em políticas como um encontro nacional pela educação gratuita, para potencializar desde a base e unindo professores e estudantes numa mesma luta. Para isso, não bastam plebiscitos e marchas de calendário à Brasília. O que faria a diferença é ver a esquerda dar todo esse peso a se ligar às greves nacionais da educação que tiveram, todas as greves que atravessam o país e, na USP, defender os lutadores, o Sintusp, e combater a precarização do trabalho e do ensino.

JPO – E como vão intervir nessas eleições estudantis?

Bof – Chamamos os estudantes a construir chapas para intervir nessas eleições e disputar as entidades estudantis com o objetivo de impulsionar uma ala revolucionária no movimento estudantil. Estamos em um momento preparatório no país, frente à abertura de uma nova etapa histórica pela crise internacional que hoje golpeia fortemente a Europa, e que vem motorizando processos da luta de classes em todo o mundo.

Conforme esse processo se aprofunde no Brasil, a juventude pode fazer toda diferença. Para isso é preciso que se tenha forjado frações do movimento estudantil na aliança profunda com os setores mais oprimidos do povo; na luta pelos direitos que Dilma segue negando às mulheres, como o aborto, no combate à homofobia, pela liberdade sexual e contra os grupos fascistas que têm em canalhas como Bolsonaro seus expoentes; na aliança com o povo negro que carrega séculos de opressões e exploração sobre as costas; na auto-organização contra o genocídio estatal nas favelas, seja com o exército, o BOPE ou as UPP’s; na aliança com esse fenômeno de um novo ativismo operário que cruza o país, e certamente se aprofundará quando a crise levar a se rebelarem os milhares de semiescravos das obras do PAC, da preparação para a Copa e as Olimpíadas, do trabalho precário que sustenta o país.

Bia – Dentro da USP queremos ser parte de uma ampla campanha contra a expulsão do Núcleo de Consciência Negra, que tem sido ameaçado deste ataque pela Reitoria racista. Ao mesmo tempo, temos a tarefa de questionar os currículos e o conhecimento que é produzido na universidade, que estão diretamente ligados aos objetivos do governo do Estado e da Reitoria em privatizar. Em cada curso em que estamos, buscamos discutir dentro e fora das salas de aula o marxismo como uma ferramenta ideológica transformadora, como estamos fazendo no grupo de estudos Marxismo e Cultura na Letras, que tem reunido estudantes e professores para discutir algo que não há dentro das salas de aula. O atual estado de coisas é sustentado também pelas as ideologias dominantes na academia, e portanto parte da nossa combatividade é encarar a luta de idéias como um campo de combate.

Gustavo – Para que a juventude possa cumprir seu papel histórico nessa nova situação, é preciso um novo movimento estudantil, que passe por cima das “burocracias de esquerda” como é hoje o PSOL como direção majoritária do DCE da USP. Um movimento estudantil organizado em torno de entidades estudantis militantes e democráticas, com gestões proporcionais, expressando todas as posições que existem entre os estudantes, e que dê espaço à auto-organização nos momentos de luta, radicalizando suas lutas em aliança com a classe trabalhadora e os setores oprimidos, com independência de classe, e assim arrancar seu direito ao futuro.

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