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Nacional

I Congresso da LER-QI

Teses sobre a situação nacional

09 Nov 2007   |   comentários

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No Brasil, ainda predomina em linhas gerais uma situação não-revolucionária, no marco da ofensiva neoliberal que o governo Lula se esforça em dar continuidade para terminar a obra inacabada de FHC. Esse neoliberalismo tardio do governo Lula, no entanto, provoca uma série de crises políticas no regime e tende a desgastar a relação das principais direções governistas do movimento de massas com as suas bases, fazendo com que a situação não-revolucionária tenha um forte elemento preparatório, expresso tanto nas crises do regime como em alguns processos iniciais da luta de classes.

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O principal elemento que tem ajudado Lula, o PT e a grande burguesia a contornar essas contradições e garantir a estabilidade política necessária para aplicação dos seus planos é o atual ciclo de crescimento da economia. O Brasil se aproveita do crescimento da economia internacional para motorizar a expansão interna. O alto preço das commodities no mercado mundial é o que permite a expansão das exportações e um saldo positivo do comercio exterior. A grande disponibilidade de crédito barato no mercado internacional tem irrigado a economia brasileira, provocando um reaquecimento do mercado interno. O real valorizado, em relação ao dólar e outras moedas da região, tem proporcionado uma situação favorável para a expansão das grandes empresas nacionais em outros países, já que estas se beneficiam da taxa de cambio favorável ao real para avançar em aquisições, em particular de empresas argentinas. Este ciclo de crescimento da economia tem como um de seus fundamentos centrais uma maior exploração da classe trabalhadora brasileira, principalmente através de uma ampliação e intensificação do trabalho precário.

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Desenvolve-se uma crise de legitimidade entre as distintas frações da burguesia, dos seus partidos políticos e do Congresso Nacional. Os fundamentos desta crise encontram-se na crescente dificuldade do Estado, após a crise do “Consenso de Washington” , de contemplar os interesses das distintas frações da burguesia e do imperialismo e de seus representantes políticos, inclusive dos setores que têm composto as coalizões de governo, em especial o PMDB. Essa crise, contida pelo crescimento da economia, apesar de não ter rompido a unidade da alta burguesia e do imperialismo em torno das orientações centrais do governo Lula, afeta diretamente as relações entre as frações da burguesia, o executivo, o legislativo e o judiciário, obrigando Lula a atrasar os seus planos de ataques em função às massas por diversas vezes desde 2005.

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Outro efeito fundamental desta crise de legitimidade é que cada vez mais a classe média está órfã de canais de representatividade política. Esse fenómeno, instável tal qual é da natureza das classes médias, tem conformado um “caldo de cultura” favorável para freqüentes irrupções do movimento estudantil; ao mesmo tempo em que tem assentado bases para as respostas fascistizantes para o problema da violência urbana. Principalmente no Sudeste e no Sul, as classes médias têm tendido a passar para oposição ao governo, sem, no entanto, isso significar automaticamente uma adesão à oposição do PSDB e do PFL(DEM). Daí a fragilidade permanente da oposição burguesa. No momento, no entanto, o que contém o potencial desestabilizador desta situação é a confiança dos trabalhadores em Lula, apesar do desgaste do PT mesmo entre os trabalhadores, já que os torna incapazes de iniciar ações de massas que mostrem um caminho independente do governo e da burguesia para a situação

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A direção da CUT, do MST e da UNE (PCdoB) têm cumprido o papel de conter e desviar o descontentamento em relação ao governo e as lutas com começam a se desenvolver. Ao contrário do que vinha acontecendo desde a década de 90, quando os reajustes salariais vinham sendo em sua maior parte abaixo da inflação, desde que iniciou-se o atual ciclo de crescimento económico, a maior parte dos acordos das campanhas salariais das categorias mais organizadas do país têm conquistado aumentos levemente acima da inflação, o que tem contribuído para a manutenção do prestigio da burocracia sindical. Por outro lado, existe uma ala da burguesia que pressiona a todo o momento o governo Lula a acelerar com as medidas de ataques e prescindir das negociações com as direções do movimento de massas. Isso provocou e tende a provocar respostas da burocracia, como com as paralisações nacionais contra a chamada “Emenda 3” no primeiro semestre deste ano, puxadas pela CUT, ainda que não sejam de ruptura com o governo. Assim, a dinâmica de sua relação com o movimento de massas é contraditória. Ao mesmo tempo que mantém um controle importante, opera-se também seu desgaste frente aos olhos dos trabalhadores quando se mostra incapaz de lutar para barrar os ataques ou obter maiores conquistas. Essas condições nos colocam a tarefa de empreender políticas de exigência e denúncia em relação à burocracia sindical, de modo que as bases possam fazer uma experiência com suas direções e avançar em posições de independência de classe..

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Apesar da luta de classes seguir sendo o elemento mais atrasado da situação nacional, o processo de experiência com o governo de Lula e do PT tem dado lugar fenómenos novos da luta de classes que, mesmo não sendo os elementos determinantes da situação, têm uma enorme importância para os revolucionários. Dentre estes destacamos lutas duras e prolongadas no funcionalismo público; algumas “greves selvagens” com elementos claros de rebelião nas bases, dentre as quais destacamos a greve dos bancários em 2004 e mais recentemente lutas em setores mais precarizados; e processos de organização que expressão um incipiente processo de recomposição do proletariado, atravessado pela experiência das massas com Lula e o PT no governo. O ponto alto mais recente deste incipiente processo foi a greve dos correios, onde a burocracia sindical cutista foi rechaçada pelas assembléias de base em São Paulo. Boa parte dessas lutas têm sido enfrentadas com repressão pelos governos federal e estaduais, como mostram distintas lutas estudantis, as ocupações de terras e algumas greves no funcionalismo público.

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Discutimos dois cenários possíveis a partir da evolução da crise aberta com o estouro da bolha imobiliária nos EUA: se a crise avança lentamente e a economia dos EUA caminha para uma recessão moderada de forma controlada, o mais provável é que as atuais contradições da situação política nacional continuem evoluindo de forma gradual até que os efeitos da crise económica sejam sentidos diretamente; no entanto, a eventual abertura de uma crise mais aguda na economia norte-americana arrastaria fatalmente o Brasil. Neste último caso, haveria uma mudança qualitativa em todos os componentes da situação nacional: desde as contradições do regime, que poderiam ver-se aceleradas, aos elementos iniciais de luta de classes, que poderiam se acentuar. Ao contrário das visões catastrofistas, não acreditamos que as crises económicas levem automaticamente a luta de classes. Entretanto, ao desestabilizar o governo Lula e aprofundar as crises no regime, um cenário de crise económica abrirá condições favoráveis ao desenvolvimento de novos e mais profundos processos da luta de classes, cujo caráter dependerá do grau de intervenção do movimento de massas e em especial da classe operária.

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A Conlutas e a Intersindical, ao mesmo tempo em que constituem também uma expressão do processo de experiência com o governo de Lula e do PT, em função da política de suas direções encabeças pelo PSOL e pelo PSTU, têm sido incapazes de explorar sua potencialidade. O PSOL e o PSTU subordinam-se às datas-bases e à lei burguesa, organizam marchas a Brasília encontros burocráticos e plebiscitos completamente descolados da luta de classes (e no caso do plebiscito da Vale que lavam a cara do governo e das direções governistas do movimento de massas), levantam como programa um salário mínimo miserável de R$ 700, uma “Auditoria Cidadã” que capitula aos defensores da “negociação soberana” da dívida publica, e, como corolário, a “mudança da política económica” (esta última junto à direção da CUT). Depositam a solução para os escândalos de corrupção em reformas vindas desse mesmo carcomido Congresso, como o “Fora Renan” votado pelos parlamentares corruptos ou a dissolução do Senado em favor da podre Câmara dos Deputados. Negam-se a abrir na base dos seus próprios sindicatos um debate sobre que tipo de ferramenta política os trabalhadores precisam para combater e superar a influência do PT sobre as massas (enquanto o PSOL vai votando leis anti-operárias no Congresso fazendo todo tipo de alianças com a burguesia). Ou seja, infelizmente, continuam reproduzindo em sua prática sindical organizações de massas o “modo petista de militar” . Isso acaba tornando a Conlutas e a Intersindical incapazes de se constituir numa alternativa à burocracia sindical e um pólo de organização de setores das massas baseados nos métodos da luta de classes, preparando os 600 sindicatos que se reuniram no dia 25 de março ou os 10 mil que marcharam em Brasília para enfrentamentos mais duros contra o governo e a patronal.

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Temos lutado e continuaremos lutando junto aos processos mais avançados da luta de classes para ligar os setores que começam a romper com o PT e o governo às massas mais atrasadas que ainda depositam alguma confiança e expectativa em Lula e nas direções petistas das organizações de massas, buscando com isso semear uma nova tradição no movimento operário e popular. Lutamos para que a Conlutas e a Intersindical levantem uma política capaz de unificar e mobilizar as massas trabalhadoras na sua luta contra a burguesia e o governo, superando suas direções burocráticas e traidoras. Defendemos que os trabalhadores se expresem políticamente independente da burguesia começando por responder por exemplo aos escândalos de corrupção, impondo pela força da mobilização dos sindicatos e organizações populares uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana para a qual todo trabalhador ou sem-terra possa se eleger apoiando-se em seus organismos de luta; uma Assembléia nacional democrática e que discuta todos os problemas estruturais do país como a reforma agrária, o desemprego, a violência urbana, a opressão imperialista etc.

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