Terça 16 de Abril de 2024

Internacional

Tensão na Europa pelo fogo cruzado entre Rajoy e Tsipras

03 Mar 2015 | Neste fim de semana houve fogo cruzado entre Atenas e Madri. Num discurso diante do comitê central do Syriza, Tsipras acusou ao presidente espanhol, Mariano Rajoy, de fazer um complô com Portugal para levar as negociações do Eurogrupo “ao abismo”. Sobe a tensão na Europa em um ano marcado por eleições que estremecem o cenário político.   |   comentários

Neste fim de semana houve fogo cruzado entre Atenas e Madri. Num discurso diante do comitê central do Syriza, Tsipras acusou ao presidente espanhol, Mariano Rajoy, de fazer um complô com Portugal para levar as negociações do Eurogrupo “ao abismo”. Sobe a tensão na Europa em um ano marcado por eleições que estremecem o cenário político.

Este sábado Tsipras falava na primeira reunião do Comité Central do SYRIZA, depois de vencer a eleição. Durante a semana haviam se tornado públicas as críticas de vários líderes do SYRIZA, membros da "Plataforma de Esquerda" e outros setores críticos, questionando o acordo alcançado pelo governo com o Eurogrupo.

Em seu discurso Tsipras argumentou que não havia outra opção para o seu governo, argumentando que, mesmo antes do início das negociações "forças conservadoras na Europa, em cooperação com o Governo de Samarás, lhe tinham preparado uma armadilha".

Com esta declaração fez alusão ao fato de que o governo anterior da Grécia, liderado por Samarás da Nova Democracia, tinha assinado uma extensão de resgate por apenas dois meses, para deixar em aberto uma crise de pressão extrema para o governo a ser formado depois das eleições.

"Enfrentamos um eixo de poderes, liderados por Espanha e Portugal, que, por razões políticas óbvias tentou trazer as negociações para o abismo", disse Tsipras.

"Seu plano era, e é, nos desgastar, derrubar nosso governo e trazê-lo para uma rendição incondicional antes de nosso trabalho começar a dar frutos e antes que o exemplo da Grécia afete outros países, principalmente antes das eleições na Espanha".

O líder do Syriza centrou sua atenção para a situação política espanhola, que está em profunda crise do bipartidarismo e onde a ascensão eleitoral do PODEMOS gera uma grande incerteza no “establishment” europeu.

"Espanha e Portugal tentaram empurrar a Grécia para o abismo, correndo o risco de uma evolução fora de controle, para evitar um contágio político em seus países."

"Eles tentaram nos empurrar a fazer concessões inaceitáveis sob ameaça de falência" para semear o descontentamento entre a população e sobre as bases do Syriza, disse Tsipras.

O líder do Syriza disse que o medo de França, China e Estados Unidos, em relação "a instabilidade política que poderia ter gerado uma queda do novo governo" ajudou a "empurrar adiante as negociações".

A resposta de Madri foi imediata. O governo espanhol solicitou formalmente ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, e ao presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker, que "condenem as palavras de Alexis Tsipras".

Secretário de Estado espanhol para a União Europeia, Íñigo Méndez de Vigo, rebateu, dizendo que "os problemas da Grécia não são resolvidos com declarações, mas com reformas, e é isso que nós esperamos fazer o novo governo grego." E ele se referiu aos 26 bilhões de euros de dívida grega correspondente ao Estado espanhol, como uma demonstração de solidariedade com a Grécia em "uma realidade muito difícil para a economia do nosso país em franca recessão."

De fato, dos 26 bilhões de euros, apenas sete foram um empréstimo do governo espanhol, enquanto o restante é um número referente ao papel de "avalista" que assumiu o Estado espanhol diante do BCE, como parte do plano de resgate para a Grécia acordado pela Troika.

Rajoy se juntou à troca de alfinetadas no domingo. Aproveitando-se de um evento eleitoral do PP na Andaluzia, respondeu a Tsipras: "Nós não somos responsáveis pela frustração que criou a esquerda radical, que prometeu o que não podia cumprir."

Ele não perdeu o momento para também atacar o Podemos, a agrupação que cresce nas pesquisas para as próximas eleições: "Todo mundo promete, na Grécia e também aqui, mas uma coisa é prometer e outra é entregar o pão, e uma coisa é prometer e criticar o governo e outra é pegar um governo em ruína à beira da falência e a ponto do resgate e tocar ele pra frente. Isso não é tão fácil."

O interlocutor que estava faltando era Alemanha, que, na segunda-feira, através de um porta-voz do ministro das Finanças alemão, disse que Tsipras fez um incomum "jogo sujo. Não se faz isso no Eurogrupo, não é adequado ".

Desde o Podemos, Tania Gonzalez também dedicou a segunda-feira às palavras Rajoy: "Rajoy teria que antes de se preocupar com a forma como os outros cumprem seu programa, deveria ele mesmo reconhecer que ele não cumpriu o seu, quando ele disse que iria criar 3,5 milhões de empregos ou não elevaria o IVA. Quando faz o oposto ao que disse na campanha eu acho que não é a pessoa certa para falar de outros programas que, a propósito, estão sendo cumpridos".

No entanto, nem todas eram palavras que abordaram Atenas. Quando perguntado por repórteres se as ações do governo grego vão determinar o curso do Podemos, preferiu ficar distante, garantindo não "vincular o sucesso ou fracasso de Tsipras e do Podemos", porque "as realidades grega e espanhola são diferentes".

O debate sobre o acordo entre o governo grego e do Eurogrupo ainda segue aberto. A resposta de Tsipras a setores críticos, dizendo que a extensão do resgate era a única opção que tinha para não ir à falência, é incapaz de silenciar aqueles que apontam que foram abandonadas grande parte das "linhas vermelhas" anunciadas na campanha eleitoral. Ou, talvez, pensava-se que o Eurogrupo agiria de forma diferente? Além disso, muitos argumentam que o pior do acordo é que o governo tentou apresentá-lo como um "triunfo", o que, na verdade, foi um retrocesso.

A subida ao poder de um partido "anti-austeridade" na Grécia concentra a atenção de toda a Europa. A grande maioria do povo grego votou contra os planos de cortes e ajustes, enquanto que a Troika pretende que nada seja alterado.

No primeiro enfrentamento entre o novo governo e as instituições, estas conseguiram impor suas condições e o governo cedeu à sua pressão. Apresentá-la como uma vitória e como a "única opção possível" não promete nada de muito bom para os próximos meses, onde a pressão para que a Grécia "cumpra os seus compromissos" a todo o custo se intensifica. Os próximos meses serão decisivos e a mobilização social em toda a Europa para apoiar o povo grego é mais necessária do que nunca.

Artigos relacionados: Internacional









  • Não há comentários para este artigo