Quinta 28 de Março de 2024

Internacional

XII CONGRESSO DO PTS

Situação nacional na Argentina: giro à direita do governo e crise capitalista internacional

21 Dec 2011   |   comentários

O informe partiu de repassar as definições do documento apresentado pelo Comitê Central, discutido em todos os núcleos de militantes.

Ali definíamos a situação política nacional como não revolucionária com traços transitórios. Em termos simples, não revolucionária significa, para dizer muito sinteticamente, que o crescimento econômico do país dos últimos anos tem gerado ilusões reformistas no movimento operário, confiança no governo e certa paz social, mesmo que vivemos fenômenos de luta de classes agudos (terceirizados ferroviários, Indoamericano, Jujuy, etc.) mas não generalizados. E traços transitórios significa que existem tendências para romper a relativa estabilidade atual. Por exemplo, a última situação transitória que se abriu na Argentina, foi a que vai desde o conflito com as patronais agrárias até – para dizer em datas – a morte de NK, onde começou a recuperar-se o governo.

Quais são os traços transitórios atuais?

Em primeiro lugar, na economia há problemas que poderíamos chamar “de arrastão” (aos que têm que responder inclusive se não se aprofundou o cenário adverso internacional) e outros que têm a ver com a tendência à agudização presente da crise capitalista com seu atual epicentro na Europa, que explicam o duro ataque que prepara o governo, contrário às ilusões dos trabalhadores e setores populares que votaram no FPV.

Há problemas “de arrastão” sérios. Sinteticamente:

a)O déficit fiscal, que para o kirchnerismo é um problema sério, ao que sempre tem prestado muita atenção, porque é um bonapartismo fiscal. Não podem manter os $70 bilhões em subsídios que gastaram durante este ano, se pretendem evitar que o déficit dispare.

b) O problema da “competitividade”, da qual dá muita importância Cristina porque é fanática no “capitalismo sério”. Querem aumentar a inversão (que é relativamente alta desde o ponto de vista dos parâmetros mundiais, mas para um país que cresce 8% anualmente e têm uma estrutura produtiva atrasada, é baixa) para frear o aumento das importações (de bens intermediários, de bens de capital, etc., coisas que a Argentina não produz) que leva a que de conjunto aumentam mais que as exportações, diminuindo o superávit comercial. Isto influi na inflação, que não se deve somente ao aumento dos preços internacionais, mas também a que há uma oferta limitada de produtos na Argentina. Mas as transnacionais, que têm um peso crescente entre principais empresas do país, reivestem somente 15% dos lucros enquanto as remessas de utilidades (o que se levam ao exterior) passaram de representar 1% do PBI nos anos 90, aos 2% nos anos K. Cristina pretende seduzir com muitos gestos os industriais, para que a inversão aumente e haja menos pressão inflacionária.

c) O atraso cambiário e a fuga de capitais que chegará este ano a U$ 20 bilhões.
Todos estes problemas o governo os ignorou durante o ano eleitoral, mas têm consciência de que está piorando a situação internacional. Começa a golpear a crise internacional por duas vias principalmente: pelo Brasil (se estima uma baixa do crescimento de 3,2%, que afeta muito a indústria automobilística) e pela soja ( o preço da tonelada baixou de U$S 500 a U$S420 durante este ano e se calcula que vai estar abaixo de U$S 400 em 2012). Então, como cresce a produção de soja, calculam que cairia entre 6 a 11% no conjunto da entrada pela colheita. Essa queda afeta a entrada dos produtores agrários e a oligarquia, do Estado e, dentro da entrada do Estado, o das províncias através do Fundo Federal Solidário. Tudo isso sem os cenários de agravamento maior da crise internacional.

Por isso, quando discutimos até onde está disposto o governo a levar as medidas que está anunciando, deve-se ter em conta de onde vem, o que quer e até onde vai. Há um antecedente de Cristina em uma situação parecida: o conflito da 125, tentando impor as retenções móveis, inclusive com uma situação melhor que agora. O governo, quando assume no fim de 2007, larga o conflito da 125 porque quer aumentar a arrecadação fiscal. Desde o ponto de vista econômico, logo após a derrota da 125 “resolvem” o problema com a estatização das AFJP (outubro de 2008) que lhes permitiu usar todo o sistema de subsídios com o dinheiro dos aposentados (o qual cria todo outro problema, ao que não vamos nos referir, que é o problema das reservas e as dívidas do estado com a ANSES e demais).

Que outra alternativa teria o governo senão baixar os subsídios – sobretudo para o problema fiscal – e os salários? Há algum outro setor burguês ao qual poderiam apelar, como foram as AFJP, liquidando um setor financeiro que estava em crise? Todos os anúncios contra os trabalhadores e o povo que faz o governo têm estas razões econômicas profundas.

Tarifaço e fim de “nunca menos”

Agora dizem que o tarifaço será aos assalariados que tenham uma renda maior que $5.200, mas “por casa”. Se há dois integrantes ou mais da família que são assalariados e se somam suas rendas, não têm direito ao subsídio. Só teriam os trabalhadores e trabalhadoras que mantêm uma casa com somente um salário menor que $5.200. Milhões de assalariados que possuem uma renda familiar acima desta quantia vão sofrer um duro golpe ao seu salário real. Irão aplicar em cotas, para ir disfarçando o quanto for possível, mas vai diretamente contra o “nunca menos”.

Muitos companheiros já dizem que nas fábricas, ainda que não venha o aumento da luz ou do gás, os trabalhadores dizem “começaram pelos bairros ricos mas vêm pra cá”. Inclusive há operários e operárias que se sentem envergonhados de terem votado no governo e não querem dizer porque veem que o mesmo está indo contra suas próprias ilusões.
Paritárias e ataque aos sindicatos
Em segundo lugar, as paritárias “com teto” também são uma coisa séria, ainda que não se firme um pacto social. Isso explica que seja profundo tanto o ataque a Moyano e os sindicatos em geral para fazer uma CGT mais de direita, e os discursos de Cristina contra a ação direta aos setores combativos que já vínhamos denunciando.

Consequências políticas

Já temos explicado a relação do cristianismo e as “Três B”. Não é pouco que tem atacado um dos pilares do poder do peronismo como é a burocracia sindical, mesmo que seja a uma ala sua. Estão jogando com fogo, porque não têm uma fração kirchnerista da burocracia. Estão ficando, como disse Luis Tonelli, com o software, que é a figura de Cristina, seu peso na “opinião pública” (algo que pode mudar rapidamente) e a “caixa”, mas se arriscam a romper o hardware.

Dentro do esquema político do kirchnerismo outro fenômeno que é desestabilizante, e que tem a ver com esta relação burocracia-polícias-intendentes-chefes provinciais, é que não há sucessão de Cristina, o que abre disputas entre as frações do próprio “oficialismo”.

E já temos denunciado além disso o giro à direita também no terreno cultural, com toda a discussão de Rosas e o Instituto Manuel Dorrego, um discurso de “revisionismo histórico” nacionalista de direita, contrário ao revisionismo de tom “progressista” que apresentaram nos festejos do Bicentenário (ambos opostos à tradição “liberal”).

Estamos falando das tendências para 2012. Hoje porém este é um governo muito forte, com alto apoio entre a população e as frações da burguesia, mas possui uma debilidade estrutural como aparato de poder burguês.

Perspectivas

Destas tendências políticas prevemos maior luta de classes para 2012. Se o Brasil se retrai e a importação de automóveis, a indústria automotriz será um setor afetado. Mas não há uma relação tão mecânica entre economia e luta de classes. Já vimos em 2009. A indústria de alimentação não era uma das mais afetadas pela crise e explodiu o conflito de Kraft por uma série de outros motivos. Então podemos prever que na indústria automotiva e nos estatais (cujos salários vêm atrasados em relação à inflação e agora lhes darão menos ainda, tanto para professores, profissionais da saúde, estaduais, etc.) abrirá condições estruturais objetivas para uma maior luta de classes. Mas não quer dizer que necessariamente as principais lutas vão surgir aí, porque isso depende dos grêmios, de como estão os setores de vanguarda e como se localizam os governos e as patronais. Mas de conjunto prevemos que vai haver mais luta de classes porque o governo vai atacar. O principal “traço transitório” da situação é que tudo tende a fazer chocar as ilusões das massas no “progresso”, com a política do governo e as patronais de terminar com o “nunca menos”.

A respeito dos cenários que sinalizamos nos documentos, tanto no informe como no debate posterior, se clarificou a tendência ao cenário qualificado de “intermédio”. E se a crise econômica se agudiza, a situação será mais convulsiva.

Se até agora o amplo apoio da maioria da classe operária ao governo “bloqueava”a possibilidade de construir um partido revolucionário “de vanguarda”, é dizer, que pudera incidir diretamente no desenvolvimento dos acontecimentos da luta de classes nacional (e não somente em algumas fábricas, empresas e universidades, como agora), além disso de ter uma voz que apresente um programa alternativo ao do governo e a oposição patronal, agora se abre a possibilidade de “desbloqueio”.

1. Ver “Apuntes sobre el poder real del kirchnerismo” de Matías Maiello, em http://www.ips.org.ar/?p=3747.

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