Quinta 18 de Abril de 2024

Nacional

Repressão e democracia dos ricos no Brasil

28 Feb 2012   |   comentários

Fatos recentes, como a repressão aos estudantes da USP a expulsão de moradores e usuários na Cracolândia, o desalojamento de milhares de pessoas na ocupação urbana do Pinheirinho, a consolidação das UPPs, assim como os motins policiais no Ceará, Bahia e Rio de Janeiro, trouxeram novamente à tona o debate sobre a repressão policial em nosso país. Por que o Brasil tem uma das policias mais assassinas do mundo e um exército que se especializa no assassinato de negros no Haiti? Qual é a necessidade histórica das práticas cotidianas dessa instituição? Apoiar as “greves”(motins) policiais caminha nessa direção? Como responder ao problema da “segurança”? Tentaremos aqui nesse pequeno espaço esboçar algumas reflexões iniciais que ajudem nesse importante debate entre os lutadores e ativistas de nosso país após o retomar deste debate fruto dos motins recentes.
Estes motins foram derrotados após o imenso desgaste trazido pelos métodos de “luta” de parte dos policiais baianos e os assassinatos que produziram. No entanto, este debilitamento conjuntural dos motins, não podemos encará-lo como algo mais que conjuntural uma vez que o que os motiva a “lutar” é o ganho ideológico com as UPPs e material com o aumento dos efetivos das forças repressivas nos últimos anos e, como com a Copa do Mundo e outros mega-eventos seus serviços se tornarão ainda mais necessários para a burguesia lhes habilitando a querer cada vez mais salários para seus serviços “essenciais” à repressão como desenvolvemos abaixo.

A cada 2 anos, durante as eleições, cada trabalhador ou jovem desse país escuta que “segurança” será prioridade. Melhores tropas, bem equipadas e com alto salários, é o senso comum dos engravatados em disputa. Em uma gangorra que varia entre a “polícia-cidadã” do PT e o “tolerância zero” de um Bolsonaro, os distintos espectros políticos da elite dominante brasileira apresentam seu projeto de aprimoramento do aparato policial. Anos de estabilidade econômica e consumismo, e não enfrentamentos a partir da ação independente do proletariado, fazem com que diversos setores de trabalhadores e jovens por mais que não apóiem os policiais devido a reconhecer seus abusos e repressões cotidianas, bem como os assassinatos que produzem, não vejam outra alternativa a não ser reivindicar “alguma segurança”. É querendo debater contra esta idéia que dedicamos este artigo.

Em que contexto ocorre a reivindicação de segurança que equivocadamente muitos trabalhadores fazem? O país da sexta maior economia do mundo, o Brasil-potência, a nação da Copa e das Olimpíadas, não pode esconder atrás de seu falso brilho os enormes problemas sociais de um país-continente da periferia do capitalismo que segue tendo como prioridade estrutural garantir os altos lucros da burguesia nacional e dos especuladores imperialistas em detrimento da vida de milhões explorados. Um crescimento econômico que não resolve as imensas mazelas sociais de um capitalismo apoiado no trabalho precário, na moradia precária e arriscada, na imensa desigualdade social que motoriza a violência urbana. É para conter estas contradições que a burguesia brasileira mantém uma imensa força repressiva. Mais: um olhar atento aos projetos atuais de “segurança pública”, dos tucanos aos petistas, deixa claro o objetivo de continuidade estrutural de tropas permanentes cuja função é manter a injusta ordem social estabelecida ao longo da história do capitalismo em nosso país através da violência oficial.

A carne mais barata do mercado é a carne negra...

O índice de assassinatos da juventude pobre e negra não se explica somente pela policia racista de nossa ditadura, mas remonta a aspectos estruturais do desenvolvimento do capitalismo em nosso país durante séculos de escravidão. A quantidade de sangue negro derramado é tão explicita, que dos capitães do mato aos soldados negros da PM ou das tropas do exército no Haiti, é uma necessidade instituída ter negros cumprindo essa função para disfarçar a questão racial enquanto elemento estruturante da desigualdade social brasileira.

A transformação dos escravos em subseqüente mão-de-obra extremamente precária foi aspecto fundamental para a manutenção da taxa de lucro da burguesia. A história do negro enquanto assalariado no Brasil é a história dos piores empregos, do trabalho precário, e o nome disso em nossos dias chama-se terceirização. Para manter tal padrão, a necessidade de um corpo especializado em silenciar os pobres em geral, e especialmente nossa juventude e os trabalhadores negros é tarefa estratégica para a elite dominante. A naturalização do racismo, da diferenciação salarial, da violência cotidiana, são aspectos centrais para a burguesia no Brasil. Afinal, a pobreza tem o rosto negro nesse país. Metade da população denominou-se negra ou “parda” no último Censo, mas o número de negros que são analfabetos é o triplo de brancos. A diferença salarial entre negros e brancos é enorme, em Salvador, cidade com quase 80% de negros e pardos, os negros recebem 50% do que recebem os brancos em média. Dos 16 milhões de brasileiros que sobrevivem em extrema pobreza(com até 70 reais mensais), 11,5 milhões são negros. ‎

...que vai de graça para o presídio, e para debaixo de plástico

"Quem tinha que nos defender, que nos proteger, que nos amparar, são os primeiros a nos derrubar". A frase acima é do pai de Douglas, um jovem negro, de 20 anos, assassinado pelas costas pela PM em Santo André (SP) na última semana. O crime? Ser um jovem da periferia desse país. Douglas estava vivo e baleado, mas por ser a única testemunha do assassinato de seu amigo pelas mãos da polícia, levaram seu corpo para o hospital apenas 3 horas depois, já sem vida. Um boletim de ocorrência forjado para mascarar o crime foi o motivo desse escândalo vir à tona. Uma prática cotidiana.

É dessa forma que a suposta função de "proteger o povo" é desconstruída em meio as lágrimas para mais uma família negra brasileira. Derrubar e não proteger. A PM do estado de São Paulo aumentou em 50% seu número de assassinatos entre 2010 e 2011. Entre os assassinados pela polícia brasileira, os negros aparecem três vezes mais que os brancos. Qualquer olhar atento na terceira maior população carcerária do mundo(atrás apenas dos EUA e da China), mostra rapidamente a cor e a idade dos rostos atrás das grades. Os jovens negros estão na mira.

O Haiti é aqui, o Haiti, não é aqui?

A repressão na USP, a violência na Cracolândia, e a repercussão nacional da desocupação do Pinheirinho, trouxeram a tona a truculenta ação policial dos tucanos, e seus objetivos de estabelecer uma repressão sistemática para melhor passar seus projetos políticos.

Mas o petismo, que completará uma década governando o país, também é responsável direto pelo fortalecimento estrutural do aparato repressivo brasileiro. Não entraremos aqui nos exemplos de repressão regional de Luiziane no Ceará, Tarso Genro no Rio Grande do Sul e de Jacques Wagner na Bahia, ou de Dilma que enviou a Força de Segurança Nacional a Jirau para suprimir aquela revolta operária, que poderiam ser assimilados ao realizado Alckmin. Isso é demonstrado de forma simples com um fato bastante categórico: a liderança brasileira na ocupação militar do Haiti implementada pelo governo petista. Não se trata somente da manutenção da violência contra o povo pobre brasileiro pelas mãos do petismo: o governo de Lula e agora Dilma são responsáveis pela opressão nacional contra a nação haitiana, atendendo aos interesses do imperialismo norte-americano.

Por trás do falso discurso de ajuda humanitária, desconstruído pela miséria massiva, pelos desvios de milhões de dólares arrecadados com o terremoto e com as constantes denúncias de assassinatos, violência e estupros pelas tropas da Minustah, o que vemos é um grande laboratório de treinamento para as tropas brasileiras que é diretamente aproveitado na constituição das Unidades de Policia Pacificadoras(UPPs). A ocupação que fere a soberania nacional haitiana, tem três objetivos estratégicos para o governo: pleitear uma vaga no Conselho de Segurança da ONU junto aos EUA, exercitar e treinar as tropas brasileiras contra os negros haitianos e garantir altos lucros da burguesia nacional naquele país, como o setor têxtil, que vem lucrando milhões com a mão de obra semi-escrava haitiana.

É para isto que serve a polícia, e a “segurança” que argumentam que ela faz, para cumprir este papel estrutural. Se hoje precisamos recorrer a elementos estruturais da repressão cotidiana a pobres e negros para explicitá-lo é porque mesmo em situações de calma na luta de classes a burguesia precisa impor a repressão para garantir seus lucros, e porque, ao mesmo tempo a luta de classes não coloca desafios que permitam mostrar a polícia em seu papel, essencial, de repressão aos lutadores. A Grécia e o Chile mostram mais claramente estas características, onde a luta de classes coloca algum desafio, ainda que inicial a governos e regimes, as polícias mostram para que servem – para impedir o livre desenvolvimento destas manifestações.

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