Quinta 25 de Abril de 2024

Internacional

REALIZOU-SE IMPORTANTE PLENÁRIA NACIONAL DA LER-QI

Reflexões sobre a crise capitalista e os dilemas estratégicos do movimento operário internacional

11 Aug 2011   |   comentários

Nos dias 23 e 24 de julho realizamos uma Plenária Geral da LER-QI que teve como eixo a discussão sobre a situação internacional e contou com a presença de Juan Chingo e Daniela, membros da Fração Trotskista na França, que constroem a Corrente Comunista Revolucionária do Novo Partido Anticapitalista.

A partir de relacionar dialeticamente a economia, a relação entre os estados e, como elemento essencial, a luta de classes, preenchemos de conteúdo a definição de que a crise histórica do capitalismo que vivemos, que só tem paralelo com a dos anos 30 e marca o fim da etapa de restauração burguesa, traz à tona fenômenos que marcam o começo da volta de tendências clássicas e mostram a vigência da fase imperialista – de decadência - do capitalismo, que Lenin definia como de crises, guerras e revoluções.

Do ponto de vista da economia, definimos que há dois cenários possíveis se desenhando. Um seria de crack generalizado, que teria conseqüências mais profundas que a primeira fase da crise em 2008 quando quebrou o Lehman Brothers. Outro seria de uma depressão econômica de vários anos, com fluxos e refluxos. Ou seja, não há outra possibilidade senão o aprofundamento da crise, inclusive com a possibilidade de que países que vem sendo uma contra-tendência como a China e o Brasil tornem-se futuramente epicentro da crise. Mas a fase atual tende a ser mais explosiva porque as medidas utilizadas para salvar os capitalistas nas primeiras fases – como a transformação da dívida privada em dívida pública com os salvamentos dos capitalistas realizados pelos Estados – se transformaram nas contradições mais agudas. Cada vez fica mais inevitável a queima massiva de capitais – de maneira concentrada ou controlada no tempo - e o aprofundamento das tensões interestatais, das tendências a polarização social, crises políticas e intensificação da luta de classes.

Centramos a discussão principalmente nas expressões da crise na Europa, aproveitando a presença especial dos camaradas da França. Uma das definições mais importantes foi a de que o acordo para o salvamento da Grécia, bancado fundamentalmente pela Alemanha, passava longe de um novo “Plano Marshall”, como propagou um setor de analistas1, e que a crise grega antecipava o que viria a ocorrer em países de importância mais decisiva, como a Espanha e a Itália (terceira economia da Europa). O recente socorro do Banco Central Europeu a essas duas economias, comprando as suas dívidas em base a um compromisso de mais ataques aos trabalhadores e ao povo, é apenas uma expressão mais do aprofundamento da crise que vai “obrigando” que economias cada vez maiores sejam resgatadas. São medidas que visam evitar a quebra de algum país da zona do euro e manter a moeda comum que a maioria dos analistas e países concordam que vem sendo um fator, em meio à crise, de contenção do que seria o natural: as desvalorizações competitivas das moedas nacionais que agudizaria tendências nacionalistas em cada país. Contra esta pressão à fragmentação européia e nacionalismos, a Alemanha, como principal país imperialista europeu, vem buscando uma outra saída, a de recompor a Europa sobre sua hegemonia, semi-colonizando países como a Grécia e aprofundando a relação de subordinação de outros como Espanha e Itália.

Na Europa, traçamos como cenário alternativo a hegemonização alemã (que não seria construída pacificamente) ou a essa tendência fragmentária e de nacionalismos, a de que a luta de classes entre como elemento definidor da correlação de forças. Foi o que não ocorreu até agora apesar de que o outono Francês do ano passado, a Grécia e o Estado Espanhol foram demonstrações de que a classe trabalhadora e a juventude vem recompondo suas forças e podem cumprir esse papel estratégico se superam os entraves da burocracia sindical. Este seria o cenário mais favorável aos trabalhadores em todo o mundo: que algum país do velho continente seja o elo débil que se rompe na cadeia do imperialismo em decadência. Este cenário não é aventado somente pelos revolucionários. Os jornais gregos avaliam que as possibilidades na Grécia são: golpe militar, guerra civil ou revolução. A ruptura de um elo débil significaria um salto em relação ao que significou a primavera árabe, que recolocou o espectro da revolução no mundo mas não reverteu a correlação de forças a favor do proletariado internacional. A existência de uma classe trabalhadora com uma forte tradição de luta na Europa, inclusive com tradição do movimento trotskista (ainda que com poucos fios de continuidade com a tradição verdadeiramente revolucionária) em países como a França (ou a Inglaterra), é uma enorme fonte de otimismo revolucionário.

É pelo caráter estratégico da França como país imperialista de primeira linha e pela tradição do movimento operário, que viemos como FT concentrando forças para construir uma corrente operária revolucionária neste país (junto ao trabalho audaz que estamos impulsionando no Estado Espanhol), que a própria mídia francesa se refere como a extrema esquerda do NPA. Tivemos a oportunidade de ter um testemunho vivo das conquistas que tivemos na construção na França, onde rapidamente a FT passou de um punhado de camaradas a um grupo dinâmico de dezenas de militantes, que vem se estendendo nacionalmente, com importantes figuras operárias como Manu Georget e Vincent Duse, que junto a Daniela hoje são parte da direção nacional do NPA, com uma juventude revolucionária que vem sendo protagonista de uma forte intervenção na luta de classes e elaborações teórico-políticas que fundamentam uma grande luta de tendências dentro do NPA contra a política liquidacionista de sua direção. Debatemos vivamente nosso trabalho na França, por entender claramente um dos ensinamentos fundamentais de Trotsky: “para um marxista o internacionalismo entranha, em primeiro lugar, a participação ativa de cada seção na vida das demais”2. Por isso, concebemos a construção nacional e internacional, duas dimensões de uma mesmo construção revolucionária. Trotsky insistia uma e outra vez que “Qualquer grupo que tente desenvolver uma linha política limitada aos problemas nacionais está condenado inexoravelmente à degeneração sectária”3.

Depois desta rica discussão, debatemos o artigo apresentado por Simone Ishibashi sobre a primavera árabe. Definimos que o principal dilema estratégico é se as massas árabes vão avançar no enfrentamento com o imperialismo em chave independente das burguesias nacionais, depois das heróicas lutas que travaram em toda essa primeira fase. Nesse sentido, apontamos como processos importantíssimos, por um lado, a experiência que as massas egípcias estão fazendo com o governo militar que manteve todo o fundamental do antigo regime, e por outro o processo na Síria, um país que por sua tradição carrega enorme potencial para desatar um movimento de caráter anti-sionista, contra o Estado de Israel e o imperialismo, o que é um dos elementos mais débeis da primavera árabe até o momento, abrindo caminho para uma eventual terceira intifada.

Neste marco, fizemos um profundo debate de estratégias e programas à luz da primavera árabe, em particular com LIT, organização internacional do PSTU, que demonstrou uma deriva estratégica justamente no lugar do mundo em que a teoria da revolução permanente mostra sua vigência em 100%. Ao contrário de levantarem uma política de independência de classe que possa forjar uma vanguarda que tenha a clareza de que só a classe operária pode encabeçar a luta pelas demandas democráticas estruturais, avançando na sua auto-organização e na construção de direções revolucionárias que possam ser consequentes na luta pela tomada do poder, preferem se colocar a reboque das oposições burguesas que protagonizam o desvio dos processos revolucionários como na Líbia ou no Egito. A LIT transforma a ditadura do proletariado num "horizonte" e não num orientador da teoria, programa e táticas, uma separação da estratégia que não tem nada a ver com a tradição marxista revolucionária.

Estes foram alguns dos debates que cruzaram dois dias de intensas discussões. Analisar desde uma perspectiva marxista a dinâmica da crise econômica e da luta de classes, refletir os cenários, fazer prognósticos, pensar as vias de recomposição do movimento operário internacional e o papel da nossa corrente trotskista, debater com as distintas estratégias e programas que vem se provando nesses primeiros anos da crise capitalista, aprofundar o conhecimento e reflexão sobre os desafios da construção da FT na França, foram alguns dos objetivos que nos colocamos nessa plenária.

São aspectos essências da tarefa de construir uma organização com uma ampla camada de militantes que sejam capazes de pensar os grandes problemas que a realidade internacional vem trazendo à tona, superando não somente a perspectiva contemplativa e passiva da intelectualidade (inclusive aquela que se reivindica marxista), mas também a da esquerda que se reivindica revolucionária e internacionalista, mas não faz mais do que análises superficiais para dizer que “a revolução avança”, que é necessário apoiar as lutas ou enviar correspondentes para tirar fotos e fazer “diários de bordo”.

A tarefa histórica de recompor o marxismo revolucionário, como parte essencial da construção de partidos revolucionários internacionalistas em cada país, passa também pela formação de revolucionários que possam elaborar as bases teóricas, políticas e programáticas de uma organização internacional que possa cumprir um papel qualitativo na etapa que se abre, que além de mais crises e mais guerras, também vai dar lugar a revoluções. Nos preparemos.

1- Em alusão ao pacote levado adiante pelos EUA na saída da II Guerra Mundial, vendendo uma visão duplamente falaciosa: em primeiro lugar de que o plano Marshal seria produto da generosidade norte-americana de então, e em segundo de que o atual pacote para a Grécia teria as mesmas proporções. Definimos como o Plano Marshall foi uma política consciente de coroamento da hegemonia norte-americana na saída da II Guerra Mundial, mediante o estabelecimento de laços de submissão da Alemanha aos EUA, que longe de ter “reconstruído” o país, como a leitura histórica burguesa vende, foi uma política que despojou o país vencido e levou à morte centenas de milhares de alemães por fome depois de 1945. Foi precedido pela iminência da revolução em diversos países no calor do final da II Guerra, como na própria Grécia, e em menor grau pelas greves que percorreram a França entre os anos de 47-48, no marco do fortalecimento da URSS, sendo uma política contra o início de um ascenso de massas no velho continente.
2- Trotsky. “As conferências nacionais e o internacionalismo”. 22 de dezembro de 1930. Escritos, T II. CEIPLT 1999.
3- Trotsky. “A unificação da Oposição de Esquerda”. 8 de febrero de 1930. Escritos, Tomo I. CEIPLT 1999.

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