Quinta 18 de Abril de 2024

Nacional

Qual a posição dos revolucionários em relação aos organismos de repressão?

16 Feb 2008   |   comentários

A atual conjuntura de escalada repressiva contra os trabalhadores e o povo pobre, em particular os últimos episódios da violência policial nas periferias das grandes cidades, mas também a perseguição política ao movimento estudantil e aos lutadores do campo e da cidade, não somente reforça as posições revolucionárias, como revela sua atualidade para encarar os novos fenómenos de degradação social e educar os trabalhadores para combater a barbárie imposta pelos capitalistas.

A podridão da democracia dos ricos e a incipiente crise do regime também se expressam por meio da degeneração crescente da polícia e dos órgãos de repressão, gerando por conseqüência verdadeiros bandos de extermínio que agem a revelia de qualquer roupagem democrática, assassinando abertamente aos trabalhadores e seus filhos. Como afirmava Trotsky: “A aparição de organizações combatentes voluntárias cujo objetivo é a supressão física do proletariado constitui um sintoma inequívoco de que começou a desintegração da democracia, devido a que não é possível controlar as contradições de classe pelos velhos métodos” . [1]

Ainda que Trotsky esteja discutindo uma realidade política marcada pela ascensão dos regimes fascistas na Europa às vésperas da 2ª Guerra Mundial, que surgiam para fazer frente a um movimento operário radicalizado, podemos afirmar que hoje, apesar de não existir um movimento operário radicalizado, a degeneração do regime capitalista está acompanhada de fenómenos que expõem o proletariado e o povo pobre ao recrudescimento da violência de Estado. Pois ninguém em sã consciência e que viva no Brasil irá negar que as milícias policiais que agem nos morros cariocas ou os grupos de extermínio que promovem chacinas nas periferias de São Paulo e Salvador tenham como prática a supressão física de jovens proletários e negros! Se há quem duvide, basta olhar as estatísticas oficiais e ver o perfil do crescente número de vítimas da violência policial.

Não podemos deixar de constatar como fruto da crescente decadência do regime de domínio burguês e barbárie capitalista brasileiros, a política reacionária de ocupações e militarização de morros, favelas e bairros inteiros nas grandes cidades, promovidos pelos governos locais com apoio do governo federal, a exemplo do envio das tropas da Força de Segurança Nacional ao Rio de Janeiro, a mando de Lula. O que assistimos na prática é uma política oficial de Estado, calcada num verdadeiro regime de terror contra os trabalhadores e a juventude negra.

A esquerda frente à escalada repressiva

Isto posto, e considerando o fato de que nenhuma organização de esquerda pode deixar de enxergar essa realidade, devemos ver como nos posicionar. O PSOL, mais preocupado em travar suas frias “batalhas” parlamentares em torno das CPIs e já articular chapas conjuntas com os partidos tradicionais da burguesia para as eleições de Outubro, não tem “tempo” para se preocupar com a supressão física do proletariado e do povo negro, fato constatado pela omissão diante do “faxinaço” baiano de suas figuras publicas e parlamentares, seja Heloísa Helena ou Luciana Genro. Inclusive talvez seja até melhor esse silêncio, pois quando se pronunciaram, em 2006, foi para exigir mais dinheiro para a “segurança publica” , investimentos nos sistemas de inteligência e um “policiamento preventivo” . Nestas condições, restou ao PSTU, como parte da esquerda anti-governista, se pronunciar em defesa dos trabalhadores e do povo negro. Vejamos o que dizem e propõem.

Em nota publicada no seu site o PSTU corretamente aponta o problema: “Grande parte dos assassinatos está ligada à ação de grupos de extermínio chefiados por militares (...) Essa ação é respaldada por uma política persistente do Estado brasileiro de eliminação física dos trabalhadores e trabalhadoras negros e da juventude que compõe a grande massa de desempregados” . E seguem numa linha correta de raciocínio “O modelo de "combate" à violência através de medidas de repressão à população faz parte da política de higienização nas grandes capitais, respaldadas e apoiadas pelo governo Lula. Esse mesmo governo anunciou que essas medidas fazem parte de um pacote nacional de ações do PAC da Segurança que prevê a ocupação de comunidades pela Força Nacional. Algo parecido com o que já é implementado no Haiti pelas tropas brasileiras” [2]. Pecam, não por acaso, ao narrar os últimos acontecimentos em Salvador, sem ao menos citar a resposta independente e sincronizada que deram os atos massivos de moradores de diversos bairros da periferia. No entanto, na denúncia, estão corretos. Essa ausência se explica quando vemos na pratica a política que propõem. Vejamos no caso de Salvador, a que se refere o texto acima. Se por um lado exigem corretamente que se demitam o secretário de segurança pública e os altos comandantes da polícia baiana, não questionam de conjunto a instituição, visto que alimentam ilusão em uma “apuração” por parte do governo, com seus próprios agentes. Ora, quem irá investigar e eventualmente punir os policiais envolvidos nas chacinas? A própria polícia?! Os políticos “sanguessugas” , “mensaleiros” e agora “cartonados” de Brasília?!

Nenhuma ação ou política independente por parte dos trabalhadores é ao menos cogitada. Por que não propor que se forme um comitê independente de mobilização e investigação, constituído a partir dos sindicatos e organizações de esquerda, que chame a tomar parte os representantes do movimento negro, representantes dos moradores que protagonizaram os bloqueios, queimas de ónibus e enfrentaram a polícia nas ruas? A mobilização independente das massas seria a única forma de impor qualquer tipo de punição aos assassinos de farda. A menos que apostem que os policiais cumpram um papel de classe e independente de seus oficiais, do governo e da burguesia, advogando os interesses dos trabalhadores e do povo pobre, possibilidade pouco plausível para qualquer pessoa com raciocínio lógico, o que dirá para os marxistas!

No entanto, ao contrário do que parece lógico, o PSTU não se contenta em igualar policiais e trabalhadores como explorados, idéia amplamente combatida por Trotsky, mas vai além e aposta sim que policiais embandeirem as reivindicações dos trabalhadores, como demonstram em outro artigo sobre a crise da polícia no Rio: “Porém existe uma divisão nos aparatos repressivos do Estado. Um setor da base e da baixa oficialidade está se mobilizando por reivindicações salariais e políticas, chocando-se inclusive com os governos e o comando maior destas instituições.[!)] Nós apoiamos esta luta salarial e manifestamos nossa desconfiança em relação aos coronéis. Mais ainda, defendemos que os policiais unifiquem sua luta com o resto do funcionalismo, inclusive contra a atual política de extermínio.[!!!]” .

Rompendo completamente com as posições revolucionárias, o PSTU defende primeiro que devemos apoiar as manifestações convocadas pelo velho coronel que foi substituído e que deseja manter seu cargo de alto oficial, usando como argumento que “há um setor de baixo escalão que luta por aumento salarial” , deixando de levar em conta que há também um setor da alta oficialidade que apóia essa demanda. O que leva ao segundo erro fundamental de apoiar as demandas de “melhores condições de trabalho” feitas por policiais, por mais rasa patente que sejam. Pois significa na prática reivindicar melhores condições para cumprir seu papel de assassinos dos trabalhadores e dos negros!

Ao final, chegam a convocar esses mesmos policiais para se juntarem com os demais funcionários públicos e encabeçar a mobilização contra o governo! Não é possível se quer imaginar como a polícia participaria de uma greve ou mobilização do funcionalismo público contra Sergio Cabral, nem muito menos encabeçá-la, visto que seu eixo de governo é justamente o fortalecimento do aparato policial para ocupar as favelas e militarizar as ruas. Seria no mínimo um contra-senso do governador abrir mão dos seus homens justamente quando precisasse reprimir uma greve geral do funcionalismo! Já assistimos a esse filme triste e sem final feliz para os trabalhadores em outras greves, em outros Estados.

Por uma política independente frente aos órgãos de repressão

A única política digna para os trabalhadores e coerente com a tradição revolucionária é lutar pela dissolução dessa instituição de conjunto reacionária. Combater desde já esses bandos de extermínio policiais que vão se formando na obscuridade e que agem na calada da noite nas ruas da cidade, é uma questão vital para os trabalhadores. É necessário por um fim a esses embriões de bandos fascistas, para que no futuro não se desenvolvam em novas tropas de elite a serviço da política oficial de Estado da burguesia. Como dizia Trotsky: “As tarefas do partido proletário no que tange à autodefesa operária surgem das condições gerais de nossa época” .

Aos trabalhadores, bem como aos negros e os oprimidos devemos desde já familiarizar a necessidade de organizar sua própria defesa, que será a base da futura ofensiva. É necessário moldar uma vanguarda consciente que seja capaz de organizar milícias operárias e camponesas ligadas aos sindicatos e às organizações populares quando for necessário se defender da contra-revolução e das bandas fascistas e preparar as ofensivas revolucionárias contra o Estado burguês. Quando o ascenso de massas esteja na ordem do dia, e a questão da luta contra o aparato de repressão e a luta para ganhar a base do exército se coloquem como tarefas concretas, os trabalhadores devem estar preparados para ganhar setores da base do exército (a base da polícia, pela sua função social e seu nível de profissionalização, é muito mais difícil de conquistar) não somente através de palavras de ordem e propaganda ideológica, mas de armas nas mãos. Por isso, o partido revolucionário e seus quadros devem ser forjados nas lições que Lenin tirou da revolução de 1905, seguindo os ensinamentos de Marx: “Não basta agrupar-se pela atitude em relação às palavras de ordem políticas, é indispensável agrupar-se também pela atitude em relação à insurreição armada. (...) Não é a passividade que nós devemos pregar, não é a simples «espera» do momento em que as tropas «se passarão» (para o nosso lado NdaR); não, nós devemos tocar todos os sinos, proclamando a necessidade de uma ofensiva audaciosa e de um ataque de armas na mão, a necessidade de exterminar ao mesmo tempo os chefes (militares NdaR) e de lutar do modo mais enérgico pelas tropas vacilantes.” [3]

[1Leon Trotsky em “Sobre a questão da autodefesa operária” , escrito em 1939.

[2Extraído do site do PSTU em 12/02/2008.

[3Do texto “Lições da Insurreição de Moscou” .

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