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Internacional

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Primeira Conferência Européia da FT-QI

26 Apr 2009   |   comentários

Entre os dias 11 e 13 de abril de 2009 se realizou nas proximidades de Paris a I Conferência da Fração Trotskista ’ Quarta Internacional. Participaram delegados do Clase contra Clase do Estado Espanhol, Internationaler Klassenkampf da Alemanha, membros da FT-QI que militam no Colletivo Comunista da Via Efeso de Roma e membros do ex-grupo CRI, e convidados e simpatizantes da tendência Claire do NPA na França. Apresentamos abaixo alguns dos principais debates e discussões que se desenvolveram.

A Europa frente à crise capitalista mundial

A Conferência abordou como se expressa a crise do capitalismo na União Européia (UE). Esta tem crises combinadas. Em primeiro lugar seus bancos mais importantes foram um dos principais receptáculos dos ativos tóxicos emitidos no mercado imobiliário e financeiro norte-americano. Em segundo, alguns países da UE que tinham se beneficiado dos fortes fluxos de financiamento externo ou do crédito fácil graças às condições iniciais de adesão ao euro, estão experimentando o ajuste da bolha imobiliária e creditícia, como na Inglaterra, Espanha e Irlanda e em menor medida na França. Em terceiro, os bancos ingleses e os da Europa continental tem uma grande participação nos empréstimos às economias emergentes. Como porcentagem do PNB os bancos europeus (21%) e britânicos (24%) estão cinco vezes mais expostos a tais mercados que os do Japão (5%) ou dos EUA (4%) o que pode ter um efeito bumerangue sobre eles e as economias que os sustentam. A Europa do Leste foi o maior destino dos empréstimos bancários. A crise da dívida que se abriu nesta região pode afetar a Europa ocidental não só pelo risco creditício, mas pela potencial fuga de capitais em alguns países. Outro elemento são as dificuldades de financiamento das economias que tem déficit de conta corrente semelhantes aos dos países em processo de convergência com o euro, e mantém uma proporção importante do seu PNB vinculado à evolução dos países emergentes, como é o caso da Espanha (23%). Por fim, em grande parte da Europa e, sobretudo na Alemanha onde as exportações foram a locomotora do crescimento, a abrupta queda do comércio mundial os torna extremamente vulneráveis, como nos países do Leste onde boa parte de sua produção foi terceirizada. Isso tudo explica por que a UE foi uma das zonas onde a crise golpeou mais forte, não só em pequenos países mas nas principais economias européias.

Frente a posições que dão como inevitável que a resposta à crise será um novo salto na integração burguesa e reacionária da Europa, a Conferência assinalou que ainda que não possamos descartar a variante de uma saída pró-européia, como a emissão de um bónus comum da UE no mercado de capitais, a atual crise enfatizava que o euro e a UE não são invulneráveis e que são plausíveis (o que não significa que seja fácil) cenários nos quais poderiam se dar não só a saída de algum país menor da zona euro, mas variantes que ponham em risco a conquista da integração, o euro e a própria UE. Em especial com desvalorizações competitivas dos países da zona extra euro como a Suíça (primeiro país com deflação no Ocidente) ou na Inglaterra, combinada com fortes pressões da luta de classe que leve a saídas populistas dos grandes países imperialistas ou uma cadeia de defaults de dívida soberana no Leste ou no Oeste. Assim, cobra toda vigência a afirmação de que a unidade da Europa só pode ser realizada pelo proletariado com a revolução proletária. Que o avanço da interpenetração de capitais, tendência que avançou em relação ao imperialismo do começo do século XX analisado por Lênin, não pode ser visto de forma abstrata e a-histórica. Que comparando com a formação dos Estados nacionais, por exemplo, o francês que necessitou de uma revolução, pensar a formação da unidade da Europa burguesa em forma evolutiva é reacionário e utópico, pois é impensável a cessão de soberania para a formação de uma entidade supranacional européia sem grandes enfrentamentos.

As primeiras respostas à crise e as novas mediações que surgem
A Conferência constatou que a violência da crise faz com que países não reconhecidos pela luta de classes como a Islândia sofram explosões agudas. Mas tomando em conta o estado de pouca preparação relativa do proletariado europeu produto do retrocesso de sua subjetividade e organização depois de anos de ofensiva neoliberal, privado de partido revolucionário e na maioria dos casos de partidos centristas de peso nacional (a França é deste ponto de vista uma exceção) o nível de resposta aos ataques do capital para fazer-lhes pagar a crise é surpreendente.

A Conferência analisou os distintos movimentos que vinham se dando desde a rebelião espontânea, forte, e prolongada da juventude grega e as greves gerais naquele país, as lutas estudantis contra o Plano Bolonia no Estado Espanhol, as manifestações na Irlanda, a crescente luta de classes na Itália e por último as duas jornadas de ação massivas e demais lutas da juventude secundarista, universitária e dos trabalhadores na França, que colocam este país na vanguarda da resposta operária e popular à crise mundial (ainda que esta se encontra por trás da magnitude da mesma). Estes movimentos tem características comuns: a juventude ocupa um lugar muito importante, e os jovens trabalhadores precarizados e mal pagos são também cada vez mais numerosos; a participação da classe operária industrial nas lutas não é algo generalizado, mas há uma clara tendência que começa a se desenvolver neste sentido, a reaparição de métodos de luta que há muito desaparecidos, ainda que não generalizada: seqüestro de patrões na França, greves com ocupações de fábrica (França, Ucrânia, Espanha, Reino Unido, Irlanda e Alemanha). Isso indica um começo de radicalização operária como resposta à crise.

Neste marco, a Conferência analisou as novas tendências “anarco-autonomistas” , que tanto no Estado Espanhol como na França e outros países se fortalecem. Este fenómeno surge como expressão mais geral frente às tendências do velho reformismo social-democrata (e em alguns casos stalinista) a se transformarem em partidos burgueses normais. Por outro lado reflete o avanço da subjetividade de certos setores, constituindo por sua vez um obstáculo a construção de organizações marxistas revolucionárias. Que este surgimento de uma juventude radicalizada, anarquizante, sem base ideológica anarquista tradicional e que não carrega as derrotas do passado, está facilitado por um giro oportunista ao pacifismo e ao eleitoralismo das correntes que se reivindicam do trotskismo.

Um exemplo são os jovens de Tarnac, grupo muito conhecido na França já que alguns deles foram presos sem provas acusados de sabotagem, tendo escrito um livro: A insurreição que virá. Este caso escandaloso juridicamente despertou a indignação dos habitantes do povoado onde estes jovens viviam. Este grupo que reivindica o “Que se vayan todos” argentino e os levantamentos das periferias francesas, tem uma ideologia que mescla Blanqui e Proudhon, as duas utopias do século XIX alternativas ao marxismo. Colocam que não serão o código penal ou a moral desta sociedade que nos dirão o que fazer, mas a raiva e a ética de cada um. Em A insurreição que vem colocam que o que unifica a todos é a raiva e não a classe, isto é uma “multidão” de raivosos é o sujeito da mudança. Isso requer uma luta ideológica, estratégica e organizativa com este fenómeno sabendo como discutir não sectariamente, mas intransigentemente, uma vez que mostramos a força e o potencial da classe operária e construamos uma forte juventude estudantil, de jovens trabalhadores precarizados e das periferias, setores entre os quais Olivier Besancenot conta com simpatia, mas que o NPA não tem uma política de organizar revolucionariamente.

A reconstrução da IV Internacional: uma bandeira central

Discutiu-se que havia que resistir à pressão existente em várias organizações da “extreme gauche” , em especial no NPA que vinha de abandonar em seu Congresso de fundação toda referência ao trotskismo e substituir a estratégia de luta pela ditadura do proletariado pela ambígua fórmula de “governo de ruptura” , colocando que a questão da IV Internacional se referia ao passado de luta contra o stalinismo. Defendemos que a gravidade da crise e as condições de putrefação do capitalismo fazem que “a mais imediata de todas as reivindicações deve ser a expropriação dos capitalistas e a estatização dos meios de produção” (Leon Trotsky, Aonde vai a França?). E que esta conclusão implica na necessidade de agitar mais abertamente a construção de partidos revolucionários e a reconstrução da IV Internacional. Que não fazê-lo nos poderia levar a ceder ao sindicalismo e/ou a participação nas lutas como meros ativistas, sem elevar o melhor da vanguarda a seu papel como classe hegemónica. Que por sua vez a necessidade de por a reconstrução da IV Internacional num plano mais ofensivo corresponde com a necessidade de dar uma forte batalha política frente ao projeto de reagrupar de maneira programaticamente ambígua e sem delimitação de classe os distintos partidos amplos anticapitalistas. A Conferência compartilhou as reflexões que vem sendo feitas em nossa corrente internacional, expressas nos artigos da Estratégia Internacional, em relação à necessidade de um novo método para buscar o reagrupamento dos revolucionários no próximo período. No passado, frente a um baixo nível da luta de classes e da subjetividade revolucionária nosso método era o de tirar lições revolucionárias dos principais acontecimentos. Hoje vemos a necessidade de, sem menosprezar os balanços sobre os fundamentos ideológicos e os balanços das atuações na luta de classes, o eixo ser as questões estratégicas e programáticas (provadas na ação). Este debate será um dos eixos da próxima Conferência Internacional da FT-QI.

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