Sábado 20 de Abril de 2024

Juventude

OCUPAÇÃO DA REITORIA DA UnB

Potencialidades e limites da ocupação da UnB

24 Apr 2008 | “... a democracia burguesa em que vivemos se caracteriza precisamente por permitir que um senhor passeie com o cachorro e por permitir protestos contra a guerra do Vietnam, mas dirigindo-os (...) as regras do jogo desta democracia nada razoável não são as nossas. O ponto de partida da politização dos estudantes deve consistir para nós em acabar conscientemente com as regras do jogo” Dutschke, líder estudantil alemão que sofreu um atentado em Berlim ocidental em 11 de abril de 1968, um dos estopins das mobilizações na Europa naquele ano   |   comentários

Desde os anos 70, os estudantes da UnB não protagonizavam um movimento com método de luta radicalizado: a ocupação da reitoria. Este ano, os estudantes rapidamente se tornaram o epicentro do combate contra a corrupção, motivados pelos escândalos que atingiram a gestão de Timothy Mulholand e seus aliados.

Os estudantes da UnB apontaram o caminho da mobilização na luta contra a corrupção que atinge não só a universidade, mas todas as instituições dessa “democracia” dos ricos. Do famigerado Mensalão até os cartões corporativos que agora pegou assessores, parentes, ministros e até os REItores de Lula, a corrupção assola todas as esferas desse sistema que não privilegia somente um ou outro parlamentar/burocrata acadêmico ladrão, senão que é orgânica do regime capitalista e da universidade burguesa.

Por isso, a luta na UnB poderia ter se transformado em um grande impulso de mobilização social contra a corrupção, caso tivesse chegado ao conjunto da classe trabalhadora e do povo que só vê falcatrua, impunidade e demagogia dos políticos, ao mesmo tempo em que as questões elementares de emprego, educação e saúde não são atendidas. A roubalheira generalizada tinha a possibilidade de voltar à tona e dar um novo gás nas lutas. Essa demanda, ligada à democracia na universidade e contra as fundações tinha uma grande potencialidade de se nacionalizar.

Entretanto, o governo e a burocracia acadêmica armaram uma grande “operação-desmonte” , canalizando o descontentamento para a figura do reitor e seus aliados, com a ajuda das direções tradicionais do movimento estudantil, para impedir que se transformasse em um questionamento profundo da estrutura de poder e do caráter da universidade e da corrupção como endêmica do próprio regime.

A luta da UnB contida nos marcos da legalidade

Desde o princípio, a luta dos estudantes da UnB sofreu a intervenção direta do Governo Federal que nomeou a dedo como “mediadores” os senadores Eduardo Suplicy (PT) e Cristóvam Buarque (PDT), ex-reitor e professor “carismático” da casa.

Da vitória parcial que impós a saída dos corruptos pela força da mobilização, infelizmente o movimento estudantil da UnB retrocedeu ao mesmo patamar “legal” ao qual estava preso antes de ressurgir. A maior expressão disso foi a nomeação de Roberto Aguiar como reitor temporário. No lugar de um corrupto, a burocracia acadêmica conseguiu impor um chefe de polícia! Ex-secretário de Segurança Pública do RJ e do DF, co-autor do projeto de Lula para a Segurança Nacional, e tão aliado do governo como era Timothy. Com isso, preservaram o regime universitário, em especial o anti-democrático Conselho Universitário (Consuni), pilar de sustentação da burocracia acadêmica.

Infelizmente, a queda pactuada da gestão Timothy com a burocracia acadêmica e com o governo, não serviu para que o movimento estudantil percebesse a necessidade de avançar na mobilização e nas pautas com métodos independentes de luta confiando apenas em suas próprias forças, por conta do papel cumprido por suas direções. A estratégia política defendida tanto pela UNE como pela direção do DCE composta majoritariamente pelo PSOL e PSTU, se mostrou inócua frente à manobra que realizou a burocracia.

Da UNE ao PSTU... a mesma política de submissão

A posição defendida pelo DCE, que acreditava “desgastar a imagem da burocracia acadêmica para avançar na pauta de reivindicações” , contribuiu decisivamente para desgastar na verdade o próprio movimento, que ao invés de ganhar mais força e se massificar a partir dos cursos e salas de aula, foi perdendo força a cada assembléia e a cada uma das intermináveis reuniões burocráticas do Consuni. Prova disso é que nem o Congresso Estatuinte Paritário nem as Eleições Paritárias, principais demandas da ocupação, foram aprovados no Consuni.

Se é sabido entre a maioria dos estudantes que a UNE (PCdoB/UJS) passou a ser correia de transmissão do governo após a chegada de Lula e do PT à presidência; não existiu por parte do DCE a iniciativa de impulsionar um movimento independente que rompesse com os marcos institucionais, em enfrentamento com o regime universitário, ligando essa denúncia ao caráter corrupto do regime democrático burguês. Tanto o PSTU como o PSOL foram impotentes para fazer frente ao discurso de Cristóvam e Suplicy. Também não fizeram uma denúncia acachapante contra os governistas da UNE, exatamente porque defendiam a mesma estratégia.

Se a UNE mascarava sua política de negociação às escondidas com os professores do Consuni e com a mídia, acobertada por um demagogo apoio à paridade, o PSOL e o PSTU não se diferenciaram programaticamente em nada da linha conciliadora que acabou com as conquistas parciais que o movimento obteve. Na forma, PSOL e PSTU tentavam aparecer como mais combativos, pedindo “mais representatividade” estudantil nas reuniões do burocrático conselho. Ao final, o que conseguiram foi alimentar as ilusões no CONSUNI e ajudar a burocracia acadêmica e a UNE a escolher um “bom nome” de consenso, com a benção do MEC. Está mais do que claro que a única demanda que o Consuni defende é a manutenção dos privilégios desses burocratas, blindando os chefes de departamentos que recebem altos salários e tem as mãos livres para negociar pesquisas que só favorecem suas contas bancárias e o grande capital. Para isso querem usar a luta estudantil para “limpar” as universidades e “moderniza-las” com o Reuni e a transparência nas Fundações, enquanto que a democracia, o acesso e o conhecimento produzido estão distantes do conjunto dos trabalhadores e do povo pobre.

A radicalização no método tem que ser acompanhada pela radicalização política

Falamos abertamente aos estudantes da UnB que a paridade (1/3 de participação para cada categoria), ainda que mais democrática que o atual modelo 70-15-15 (70% de participação aos professores e 30% dividido entre estudantes e funcionários), sequer alcança a herança deixada pela revolução francesa de uma pessoa ’ um voto! Mais de 200 anos depois... Impor o voto universal é optar pelos interesses da maioria contra os privilégios de uma casta dos professores que estão preocupados exclusivamente com seus interesses.

Defendemos que para unificar todos os setores e massificar a luta por vitórias, o movimento deveria avançar para consolidar um COMANDO DE MOBILIZAÇÃO INDEPENDENTE que ganhasse o conjunto dos estudantes para discutir e preparar uma greve unificada dos 3 setores ’estudantes, funcionários e professores - e que impusesse pela força da mobilização um Congresso Estatuinte que de fato questionasse a anti-democrática estrutura de poder que hoje rege o conjunto das universidades públicas do país, por fora das garras e do controle desses burocratas serviçais dos interesses privados.

Esse comando de mobilização formado a partir de representantes por sala de aula, para garantir de fato uma ampla participação democrática, deveria se ligar ao conjunto da classe trabalhadora e do povo, para questionar também de fora para dentro o caráter elitista e racista da universidade, e o seu principal funil social: o vestibular. Este comando teria toda a autoridade para convocar um Encontro Nacional de Delegados de Base, com delegados eleitos por universidade e revogáveis, a partir das demandas da UnB, e que reunisse estudantes de todo o país para discutir um plano unificado de luta contra os ataques promovidos pelos governos e contra a corrupção.

A massificação da luta só poderia se dar extrapolando a própria ocupação. Desde o ano passado colocamos que não basta radicalizar nos métodos se não for acompanhado por uma radicalização na política. Quando não levamos isso a frente, nossas ações podem ser usadas como massa de manobra por frações da burguesia, governos e burocracia acadêmica que desejam impor sua política numa determinada situação. Este foi o resultado final da ocupação da UnB que, por culpa de suas direções, não lutou por um programa que se contrapusesse, à posse de um reitor com um currículo de chefe da polícia e organizador dos massacres ao povo das favelas. Os estudantes necessitam levantar um programa independente que dê uma saída de fundo à crise da universidade na perspectiva de transformá-la radicalmente e colocá-la a serviço dos trabalhadores e suas lutas. Somente com um apoio massivo dentro e fora das universidades será possível manter uma radicalização nos métodos e na política até as suas ultimas conseqüências.

É por essas posições que fazemos nossa homenagem a Dutschke e às lutas de 68, que parece falar com esse novo movimento estudantil que surge.

Basta de lutas isoladas! Construir pela base encontros estaduais de estudantes!

No dia 3 de maio os estudantes combativos do estado de São Paulo estarão comemorando o 1º aniversário da ocupação da reitoria da USP, estopim de uma série de lutas, ocupações e greves por todo país. Isso num início de ano em que algumas lutas estudantis tomaram a cena nacional, como a ocupação da UnB e a luta da Unifesp. No estado de São Paulo, há várias resistências ocorrendo em universidades particulares (FSA, Unicid, PUC-SP) e uma recomposição das forças nas estaduais paulistas.

No entanto, o movimento estudantil continua fragmentado e canalizado por direções tradicionais que vem se mostrando incapazes de ter uma política de unificação nacional e de independência da burocracia acadêmica. Todas as lutas ocorridas desde o ano passado demonstraram uma potencialidade imensa, mas que se dissipam ao se manter isoladas. Está na hora dos estudantes que ocuparam as reitorias e fizeram greve impulsionarem um chamado à construção de encontros estaduais, como preparação de um grande Congresso Nacional Estudantil anti-burocrático.

Chamamos a todos que concordam com este chamado, começando por aqueles que estão organizando o ERECS em suas faculdades, a construí-lo conosco na perspectiva de colocar de pé um programa que subverta a universidade e a coloque a serviço das nossas lutas e da classe trabalhadora.

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