Quinta 18 de Abril de 2024

Nacional

DEMISSÕES NA GM

PSTU entrega luta dos operários da GM em tempo recorde

09 Feb 2014   |   comentários

No final de 2013 a patronal da General Motors de São José dos Campos, em meio à férias coletivas, consumou a demissão de 687 trabalhadores, concluindo o fechamento da unidade chamada MVA. Apesar do PSTU – que dirige o Sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos há cerca de 30 anos – dizer que ficou “surpreso” com as demissões, o possível fechamento da MVA ao final do ano constava no acordo assinado pelo próprio sindicato em janeiro de (...)

No final de 2013 a patronal da General Motors de São José dos Campos, em meio à férias coletivas, consumou a demissão de 687 trabalhadores, concluindo o fechamento da unidade chamada MVA. Apesar do PSTU – que dirige o Sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos há cerca de 30 anos – dizer que ficou “surpreso” com as demissões, o possível fechamento da MVA ao final do ano constava no acordo assinado pelo próprio sindicato em janeiro de 2013; e a patronal já havia iniciado a desativação dessa unidade desde agosto desse ano. No dia 22/01, dois dias após o retorno das férias coletivas, o PSTU assinou um acordo que aceita as demissões em troca de melhores indenizações. Ao mesmo tempo, o PSTU anunciou uma suposta “luta” contra as demissões, continuando a política levada adiante até agora de centrar na exigência que Dilma as proíba e que a GM cumpra suas promessas de investimentos na planta de São José dos Campos, com o argumento de que essa seria uma “contrapartida necessária” aos subsídios fiscais que o governo deu à patronal e que esses subsídios estariam sendo utilizados para aumentar os lucros da GM enquanto a mesma transfere partes de sua produção até então feitas em São José para Rosário na Argentina. Até que essas exigências sejam atendidas, para não deixar os operários demitidos “na mão”, Mancha, dirigente do PSTU, anunciou que o sindicato estava ajudando os trabalhadores a distribuírem currículos em outras fábricas da região.

Rompendo o princípio de que interesses de patrões e trabalhadores são inconciliáveis

As demissões na GM se dão um período em que a mesma vem anunciando lucros altíssimos e crescentes. Com essa medida a GM dá mais um passo no processo de restruturação produtiva através do qual vem cortando seus custos de produção pelo menos desde 2008. Desde então, vêm sendo implementados planos de demissões “voluntárias” (PDVs), demissões em massa, bancos de horas, redução dos com pisos salariais de novos contratados, contratos temporários, terceirizações, redução de benefícios etc.

Em 2008 o sindicato assinou um acordo que impedia a implementação do banco de horas para os mais antigos em troca de autorizar a contratação de funcionários temporários na linha de produção recebendo R$ 600,00. Desde então foram assinados vários acordos que “evitavam” demissões em massa em troca de aceitar PDVs (que todos sabem serem demissões involuntárias mascaradas). Em janeiro de 2013 foi assinado um acordo que reduzia de R$ 3.100,00 para R$ 1.800,00 o piso salarial dos novos funcionários efetivos a serem contratados. E em junho desse mesmo ano assinaram outro acordo que reduzia de R$ 1.800,00 para R$ 1.700 o piso salarial dos novos funcionários efetivos que seriam contratados para uma nova unidade a ser instalada na cidade. Depois de tantos ataques já implementados, está mais do que claro que todo investimento ou preservação das condições de trabalho de alguns setores mais antigos da fábrica estão vinculados à implementação de medidas de redução dos custos com os funcionários.

Ao defender como programa mais investimentos capitalistas, o PSTU rompe com um princípio elementar do marxismo: o da contradição fundamental de interesses entre patrões e trabalhadores sob o capitalismo. Os patrões não investem se não for para obter lucros crescentes, e não existem lucros crescentes sem aumentar as taxas de exploração dos trabalhadores.

Rompendo o princípio de que o Estado é um “Comitê Executivo” dos negócios da burguesia

Chantageando com o destino dos investimentos para suas distintas fábricas no Brasil e no exterior, a GM tem obtido polpudos subsídios fiscais e empréstimos a custo mais baixo por parte de todas as esferas de governo. Desde o início da crise econômica mundial, esses subsídios têm sido oferecidos de forma crescente a vários monopólios capitalistas, cumprindo um papel chave na sustentação da economia. Ao mesmo tempo, segundo o próprio IPEA, órgão insuspeito por ser do próprio governo, 90% dos empregos criados nos governos de Lula e Dilma são precários; e mais de 20 milhões de trabalhadores passaram a entrar e sair anualmente dos empregos em função da rotatividade do trabalho, ao que se acrescente um aumento das terceirizações superior ao dos anos 90. Só tem uma conclusão possível: os subsídios fiscais que o governo federal ofereceu a alguns monopólios capitalistas nos últimos anos estão vinculados à flexibilização das condições de trabalho.

Ao defender a manutenção dos empregos como “contrapartida” aos subsídios fiscais o PSTU legitima a enorme transferência de recursos públicos que deveriam ser destinados à saúde, à educação e ao transporte diretamente para as mãos dos capitalistas, deixando de lado outro princípio básico do marxismo: o Estado capitalista é um “Comitê Executivo” dos negócios da burguesia, ainda mais frente ao domínio da economia por parte de monopólios internacionais cada vez mais concentrados.

Rompendo com o princípio de unidade da classe trabalhadora (nacional e internacional)

As burocracias sindicais da CUT e da Força Sindical que dirigem outras fábricas da GM no Brasil, vendidas como são à patronal, atreladas como são ao governo petista, contribuíram para que essa estratégia de flexibilização das condições de trabalho fosse implementada ao longo dos últimos anos, assinando inúmeros acordos nos quais os direitos e as condições de trabalho dos operários da GM nessas plantas foram sendo entregues um a um. O mesmo podemos dizer da burocracia sindical argentina, que aceitou a deterioração das condições de trabalho dos operários ao ponto de valer à pena para a GM deslocar toda uma linha de produção para aquele país. É impossível unificar os trabalhadores das distintas plantas da GM no Brasil e na Argentina, se não for defendendo um contrato coletivo único de trabalho que nivele as condições de trabalho e os salários pelos que estão melhor posicionados e implemente o aumento proporcional do nível de emprego em todas as plantas.

Ao defender os empregos e os investimentos na GM de São José dos Campos em detrimento das outras plantas, o PSTU transforma em palavras ao vento a consigna de contrato coletivo único, rompendo com mais um principio elementar do marxismo: a defesa da unidade da classe trabalhadora não só em nível nacional mais também internacional.

O abandono do método do Programa de Transição

Essas rupturas com princípios básicos do marxismo são inerentes à defesa de um programa de conciliação de classes e, como fica evidente, têm consequências reacionárias (precarização do trabalho, legitimação dos subsídios à patronal e divisão da classe trabalhadora).

A luta contra a demissão em massa de centenas ou milhares de trabalhadores e a precarização dos postos de trabalho tem o poder de se chocar com as bases do regime capitalista. Por isso, a luta contra as demissões deveria estar intimamente ligada à luta pela abertura dos livros de contabilidade da empresa para demonstrar aos olhos da população como a mesma lucra horrores sob as costas dos trabalhadores; à defesa da redução da jornada de trabalho sem redução dos salários, garantindo a manutenção e a ampliação dos empregos; e à defesa da incorporação de todos os terceirizados e temporários como efetivos da fábrica, com direitos e salários iguais aos mais antigos. Só esse programa poderia forjar uma sólida unidade entre os operários divididos pela precarização e pelas demissões para impor uma solução de fundo às custas dos lucros capitalistas.

Frente à alegação dos patrões de que assim não poderão ser “competitivos”, frente às ameaças de fechamento de unidades inteiras com demissões em massa, a obrigação de uma direção que se diz revolucionária, ao contrário de buscar “conciliar” interesses, era de defender que os operários da GM se unificassem com outros setores para lutar pela estatização de todo o ramo produtivo com administração dos próprios trabalhadores para colocar a produção a serviço do transporte público e de carros populares a baixo preço.

Esse programa, que desde a LER-QI temos defendido em várias oportunidades, se contrapõe pelo vértice ao programa de conciliação de classe defendido pelo PSTU.

A substituição da mobilização operária independente pela “boa vontade” do governo petista

Desde a demissão de 4.200 trabalhadores da Embraer em 2009, o centro da política do PSTU em relação aos ataques aos metalúrgicos de São José dos Campos vem sendo exigir a Lula e depois a Dilma que esses decretassem uma lei proibindo demissões. Consequente com essa orientação, o Sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos, por um lado, nunca deu importância à agitação da denúncia de que os governos Lula e Dilma compartilham do mesmo projeto estratégico que a patronal e por isso não iriam intervir para barrar as demissões. Nesse marco, de nada servem críticas ao governo feitas na literatura partidária ou em discursos para a vanguarda, já que nos panfletos e na agitação do sindicato o PSTU não combateu as ilusões de que o governo petista pudesse barrar as demissões por “boa vontade”.

Por outro lado, o sindicato nunca deu importância à agitação de que os operários metalúrgicos de São José precisam confiar apenas em suas próprias forças e na de seus potenciais aliados na classe trabalhadora, no movimento estudantil e nos demais setores explorados e oprimidos da sociedade. Consequentemente, o sindicato não foi capaz de unificar nem mesmo as forças das distintas fábricas metalúrgicas de São José em ações comuns contra os ataques; e nunca convocou um encontro de trabalhadores e jovens com representantes de base. Nesse marco, os acordos com burocratas sindicais, parlamentares ou religiosos para a realização de atos de vanguarda ou de idas a Brasília descolados de ações a partir da base dos trabalhadores se mostraram impotentes. O único ato organizado em São Paulo não contava com mais de 50 pessoas, sendo escandalosa a presença de gente paga para “fazer número” e a ausência da própria militância do PSTU e as entidades que dirigem, seja a ANEL – que poderia ter mobilizado centenas de estudantes – seja os sindicatos e oposições em que o PSTU tem peso.

Ao defender um programa de conciliação de classes e colocar o centro de sua política em soluções vindas “de cima” e não da unidade para o combate dos “de baixo”, o PSTU substitui a mobilização proletária independente pela “boa vontade” do governo petista, construindo a desmoralização e a passividade ao longo dos últimos anos. Desta forma, as muito importantes demonstrações de disposição de luta realizadas pelos operários da GM, como paralizações parciais de um dia e cortes da Rodovia Presidente Dutra, terminaram sendo desperdiçados, pois, ao contrário de fazerem parte de um plano estratégico de fortalecimento da mobilização independente para o combate, constituíam-se como um componente auxiliar às exigências ao governo e à patronal. Aqui não é difícil chegar à conclusão de que, a depender do grau de prejuízo que pudesse gerar as paralizações dos operários da GM, essas poderiam “atrapalhar” as negociações de mais investimentos com a patronal. Afinal de contas, que patronal destinaria seus investimentos a uma fábrica com operários combativos que para defenderem suas demandas lhe impõe prejuízos? Essa contradição da política do PSTU é inerente à estratégia de conciliação de classes que colocou em prática. [1]

O PSTU coloca a culpa nos trabalhadores pela derrota para se esquivar de sua responsabilidade como direção

O PSTU dirige o Sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos a cerca de 30 anos. Durante todo esse período, não foi capaz de construir uma fração de vanguarda combativa de operários organicamente ligados à base que fosse capaz de resistir aos ataques patronais com um combate à altura. Essa é um resultado inevitável de uma prática sindical que encara as consignas transitórias como ferramentas para os discursos vermelhos nos dias de festa e para serem implementadas numa crise revolucionária futura, enquanto nunca chega o momento de lutar para que essas sejam tomadas por setores de massa em processos concretos da luta de classes. É uma consequência da prática de acobertar derrotas estratégicas (como a divisão das fileiras operárias entre efetivos com distintos níveis de direitos e salários, temporários e terceirizados) com discursos eufóricos de “vitórias” táticas (como na manutenção de posições conquistadas pelos efetivos mais antigos) para nunca tirar lições do que é necessário mudar para reverter essas derrotas estratégicas. É um resultado inerente a uma prática sindical que não valoriza a construção de representações democráticas dos trabalhadores por local de trabalho, e que cria dirigentes sindicais “profissionais” que nunca voltam a trabalhar no chão da fábrica.

A atuação na GM como preparação da atuação nas jornadas de junho

Durante as massivas manifestações protagonizadas pela juventude em junho de 2013, o PSTU não foi capaz de utilizar sua influência sindical para que setores da classe trabalhadora entrassem em greve defendendo a estatização dos transportes públicos com gestão dos trabalhadores e controle dos usuários, mesmo estando na direção do estratégico sindicato dos metroviários de São Paulo. Pelo contrário, não só se negou a ir para as bases de metroviários travar esse combate como se adaptou à estratégia dos burocratas da CUT e da Força Sindical que esperaram o refluxo das manifestações para realizar um “dia de paralizações e atos” que desviasse a disposição de luta existente nas bases sem colocar em movimento os principais bastiões da classe trabalhadora para dirigir um processo de luta de classes superior que desse uma saída de fundo à demanda dos transportes em aliança com a juventude. Essa impotência não “caiu do céu”. Ela foi construída por batalhas não dadas como a que seria necessária frente à demissão de 4.200 operários na Embraer em 2009 e frente à série de ataques subsequentes na GM. Trata-se de uma prática sindical (no Sindmetal ou no metrô) que não forja uma vanguarda de trabalhadores para atuar como sujeito político independente frente a grandes processos da luta de classes como as jornadas de junho.

Nós, da Liga Estratégia Revolucionária – Quarta Internacional, através de nossa atuação em distintas categorias de trabalhadores e no movimento estudantil, através da construção de uma corrente nacional de trabalhadores e da Juventude Às Ruas, atuando dentro da CSP-Conlutas e da Anel, lutamos por uma nova tradição que esteja à altura desse desafio. É com esse objetivo que colocamos esse balanço da atuação do PSTU no sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos à consideração da vanguarda.

[1No site da LER-QI consta a declaração que publicamos logo após as demissões com várias propostas concretas para construir essa

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