Quarta 24 de Abril de 2024

Internacional

IV Conferência da Fração Trotskista

O surgimento de um novo movimento operário e o desafio para os trotskistas

24 Mar 2007 | Uma importante resolução da IV Conferência foi o desafio assumido por toda a FT-QI de apoiar todos os esforços da LOR-CI da Bolívia para influir de maneira decisiva no processo de reorganização da combativa classe operária deste país. Este é o país da América Latina onde o processo revolucionário se mantém aberto, pese as enormes expectativas que a maioria dos trabalhadores, camponeses e o povo têm em Evo Morales. Neste marco, um importante setor da classe operária boliviana começou a recompor suas forças tanto social como sindicalmente. Entrevistamos Elio Aduviri, secretário de relações do Sindicato de Trabalhadores de SABSA (Aeroporto Internacional de El Alto) e dirigente da LOR-CI, para que nos comente a situação da classe trabalhadora e os desafios que se discutiram na Conferência da FT em relação a este país de grande tradição revolucionária.   |   comentários

Conte-nos qual é a situação da classe trabalhadora na Bolívia.

Elio: Em primeiro lugar o movimento operário boliviano vem de uma importante derrota que se arrasta desde 1985, quando os trabalhadores mineiros que foram historicamente a vanguarda de nossa classe foram despedidos massivamente após enormes jornadas de luta, traídos pelas suas direções. Nos anos 90 são impostas as privatizações de quase todas as empresas públicas gerando mais demissões, destruição da organização sindical e debilidade dos trabalhadores. É por isso que desde 2000 a classe operária não foi protagonista central das distintas jornadas revolucionárias que derrubaram dois governos, ainda que alguns setores como os combativos mineiros de Huanuni tenham intervindo. Este é um setor histórico de nossa classe, obteve a reestatização da mina em 2000 impondo o “controle social” e que há uns meses defendeu esta conquista contra a tentativa privatizante do MAS e dos dirigentes das cooperativas num enfrentamento que deixou mais de uma dezena de mortos. Graças a esta luta a empresa Huanuni passou a ter de 800 assalariados quase 5.000. Mas isso é só uma parte. O verdadeiramente novo é que setores de uma nova classe operária começam a se organizar centralmente em La Paz e EL Alto onde existem fábricas que chegam a concentrar até 3.000 trabalhadores. Em Santa Cruz surgiu uma classe operária da agroindústria, ligada à produção agrária e florestal. No Altiplano o ascenso de Evo Morales ao governo gerou fortes expectativas entre os trabalhadores por se tratar de um presidente indígena. Mas isto não levou a uma espera passiva para que o governo mude a situação que os trabalhadores vivemos e as humilhações que sofremos dos empresários, já que os maus-tratos são cotidianos nas fábricas e oficinas, e os salários fabris apenas chegam a 50 dólares. Ao contrário, se está dando um processo de organização de novos sindicatos e em muitas fábricas se busca a forma de organizar-se para mudar a situação. A formação do SITRASABSA do qual sou dirigente não é mais que uma expressão deste fenómeno.

Quais atividades e política vocês estão desenvolvendo frente a este processo?

Elio: Nós como LOR-CI concentramos nossas forças em El Alto. Abrimos há dois anos a “Casa Obrera y Juvenil” onde se realizam debates, cursos e atividades sociais e culturais. Mas, além disso, a partir da fundação do SITRASABSA pudemos chegar a dezenas de fábricas que buscavam se organizarem, e a “Casa Obrera” se converteu numa referência para todos eles. Neste ano a “Casa Obrera” se converteu numa referência para todos eles. Vários setores se aproximaram para se organizar e lutar, como os trabalhadores de Maestros de Educación Informática de El Alto, que formaram seu sindicato (SITRSAI), trabalhadores de TOTES (empresa de limpeza a domicílio, dependências estatais e estabelecimentos), de ASEO URBANO, que são coletores de resíduos que se enfrentaram à burocracia de seu sindicato, jovens contratados da AISA (Ã guas de Ilimani), operários do Taller Externo de El Alto pertencente à empresa Exbol, primeiro exportador de jóias do país. Neste momento, se reúnem os trabalhadores da ex fábrica Christies, que mantém um processo pelas demissões que sofreram. Há várias fábricas mais que são muito importantes lutando pelo seu direito a se organizar, com as quais estamos colaborando.
Este é um processo essencialmente sindical, ao qual a Central Obrera Boliviana (COB), a Federação de Fabriles, as Centrales Obreras Regionales e Departamentales não dão importância, quando não o boicotam. Produto de velhas derrotas, mas também porque dão as costas a esta nova classe operária, é que centrais sindicais se encontram muito debilitadas na Bolívia. Por exemplo, SITRASBSA é um dos quatro sindicatos de assalariados que tem participação real dentro da COR de El Alto. Além disso, o resto da esquerda, inclusive os que se reivindicam trotskistas, tampouco consideram este fenómeno como algo potencialmente revolucionário, no qual concentrar suas energias militantes. É notório que, além do MAS o único local da esquerda em El Alto seja a Casa Obrera y Juvenil. Mas, como te dizia, se trata de um processo essencialmente sindical no qual existem muitas expectativas e há ilusões em que o MAS de Evo responda às demandas dos trabalhadores quando saem a lutar. Entretanto, quando isso passa muitos trabalhadores vêem como os ministros do governo do MAS atuam contra seus interesses e fazem uma experiência importante.

Qual é a política para acelerar estas experiências?

Elio: E frente às eleições do ano de 2005 fomos parte da Comissão Política da COB, onde se discutia por em pé um Instrumento Político dos Trabalhadores (IPT) para que os trabalhadores apresentemos candidatos operários e um programa independente frente ao MAS. Nós demos esta batalha, ainda que lamentavelmente os dirigentes da COB não quiseram avançar neste sentido. Se houvesse se formado um IPT nós teríamos lutado para que este adquirisse um programa revolucionário e para que se utilizasse a tribuna eleitoral para desenvolver a mobilização nas ruas e fazer com que a classe operária tivesse peso na vida política nacional. Experiências deste tipo também formam parte do acervo do proletariado boliviano, como quando em 1947 se conformou o Bloco Parlamentar Mineiro entre os dirigentes da Federação dos trabalhadores mineiros e os trotskistas do POR, que obtiveram 2 senadores e 8 deputados. Lamentavelmente o POR, que é a corrente que historicamente expressa o trotskismo em nosso país, renega nos fatos esta experiência e transforma em um princípio não se apresentar às eleições. É uma organização que há um tempo perdeu completamente o rumo, combinando um discurso maximalista com uma prática profundamente sindicalista.

Agora que a Constituinte está pactuada com a direita, mas as massas seguem depositando suas expectativas, estamos colocando a todos estes trabalhadores que se reorganizem sindicalmente, que temos que levantar um programa de reivindicações operárias e camponesas, um conjunto de demandas para serem exigidas à Constituinte e, sobretudo, para lutar nas ruas, durante e após a Constituinte, começando pelo pleno direito à organização sindical, as terras para os camponeses, salários que dêem para sustentar uma família, nacionalização sem pagamento e sob controle operário de todos os recursos naturais, etc. Tratamos assim de que a classe operária se organize politicamente, e faça uma rica experiência com o governo do MAS e a Constituinte, enquanto seguiremos denunciando fortemente todos os pactos do MAS com a direita. Esta experiência é fundamental para que a classe operária possa dar um passo adiante em sua independência política.

Apostamos desta maneira em forjar uma vanguarda operária com a qual se possa formar um grande partido revolucionário dos trabalhadores; esta será a única forma de dar uma saída revolucionária ao processo aberto. É uma enorme aposta estratégica a que nos colocamos os revolucionários na Bolívia, e é por isso que a IV Conferência da FT-QI discutiu dar grande importância e por parte de sua dedicação e recursos para apoiar a LOR-CI neste desafio.

Quais são as tarefas colocadas?

Elio: Em primeiro lugar, desenvolver este processo de reorganização operária, ajudando a formar novos sindicatos combativos que em perspectiva sejam classistas. Estão dadas as condições para por em pé um novo movimento operário desde as bases que dêem uma nova vida às organizações históricas dos trabalhadores. Mas nós sabemos que apesar do desvio que é o governo de Evo Morales, seguimos passando uma etapa revolucionária. A reação da direita é buscar ganhar força para enfrentar os trabalhadores e os camponeses. O governo do MAS busca conciliar com a direita, ao mesmo tempo em que tenta conter as massas mediante algumas concessões e promessas. É difícil que alcancem este objetivo como se viu nos enfrentamentos que se desenvolveram em Cochabamba e em Huanuni. Os trabalhadores deveremos dar uma saída própria, verdadeiramente revolucionária e socialista para o conjunto dos explorados e oprimidos da Bolívia. É necessária uma aliança operária e camponesa que acabe com a Bolívia capitalista, única forma de conquistar todas as nossas reivindicações. Isto não o fará o MAS e é por isso que os trabalhadores temos que ter não só uma forte organização sindical, como também é preciso que se forme uma organização política operária que tenha objetivos revolucionários. Já em outros momentos da história de nosso país, os trotskistas bolivianos fizeram com que uma parte da vanguarda tomasse como próprio um programa revolucionário que dava uma resposta operária para terminar com o domínio dos capitalistas. Foi no ano de 1946 e as chamadas “Teses de Pulacayo” , escritas pelos trotskistas, nas quais se colocava a luta pelo poder operário e o socialismo, foram adotadas pelos mineiros e logo após pela própria COB. Nós agora queremos ser parte deste processo de reorganização e recomposição operária com o objetivo de colaborar para que a nossa classe possa avançar num caminho político revolucionário, não só sindical.

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