Terça 16 de Abril de 2024

Nacional

O que devemos esperar em 2015 (os cenários estratégicos e o papel dos revolucionários)

10 Dec 2014   |   comentários

Chegamos ao final do ano e em meio ao bombardeio midiático ligado às festas e à necessidade imposta do consumo desenfreado (que esse ano tende a ser menor fruto dos efeitos mais presentes da crise). Já começamos a ver os grandes meios de comunicação ligados aos interesses da patronal fazerem suas respectivas retrospectivas de fim de ano, onde mostram aqueles que foram (a partir de seu ponto de vista) os principais fatos de 2014, os acontecimentos (...)

Chegamos ao final do ano e em meio ao bombardeio midiático ligado às festas e à necessidade imposta do consumo desenfreado (que esse ano tende a ser menor fruto dos efeitos mais presentes da crise). Já começamos a ver os grandes meios de comunicação ligados aos interesses da patronal fazerem suas respectivas retrospectivas de fim de ano, onde mostram aqueles que foram (a partir de seu ponto de vista) os principais fatos de 2014, os acontecimentos mais marcantes. É evidente que dentro da perspectiva deles (dos patrões, dos ricos e da mídia ligada a seus interesses), fatos como a greve dos garis, greve do metrô, a greve da USP, por exemplo, não tendem a ser vistos como fatos marcantes, que mereçam ser lembrados em seu balanço dos acontecimentos. E mesmo que fatos como esse possam eventualmente ser mencionados serão sempre de forma a distorcer seu efetivo peso e importância.

Assim, é necessário que nós trabalhadores e todos os demais setores oprimidos façamos também um balanço do ano de 2014, ano rico em experiências de luta e aprofundamentos das contradições do regime “democrático” (que serve apenas aos ricos), para que possamos pensar os cenários possíveis para 2015 e dessa forma possamos estar mais armados nas lutas e conflitos que certamente se colocarão no próximo ano.

A luta educa e um dos ensinamentos centrais que nós temos que tirar das batalhas mais agudas que começamos a viver a partir de junho de 2013 é que buscar prever (sempre de forma relativa e aproximada) os próximos momentos é elemento essencial para estarmos melhor preparados para os conflitos.

A crise se torna mais presente nas economias periféricas em geral e mais particularmente no Brasil

O primeiro fator importante para pensarmos a conjuntura que irá se abrir em 2015 é a atual etapa da crise internacional que atinge seu sétimo ano e que esta entrando num novo momento, em que os países da periferia capitalista deixam de ser contra tendências ao seu desenvolvimento e entram mais fortemente em sua espiral. Isso, combinado a recessão na União Europeia, a desaceleração do crescimento chinês e aos efeitos contraditórios da débil recuperação nos EUA - que ao mesmo tempo em que não permitem que esse país se torne o motor da recuperação da economia global, faz com que o FED (banco central noerte-americano) acabe com suas política de compra de títulos, o que até agora vinha sendo o narcótico que tinha permitido uma estabilidade artificial à economia mundial - levam a um cenário em que esses países periféricos serão mais golpeados e serão exigidos cortes de gastos, ataques a direitos sociais, aumentos de tarifas públicas mais contundentes.

Esses efeitos mais claros da crise mundial sobre nossa economia já vêm se expressando desde o ano passado, mas tiveram um salto de qualidade no segundo semestre de 2014 e se ainda não tem um impacto mais direto sobre os níveis de emprego e renda, isso se dá por conta do período eleitoral e das medidas cosméticas tomadas pelo governo petista para garantir sua reeleição.

No entanto, estas medidas cobrarão seu preço já no próximo período em 2015 e os ataques mais diretos que será obrigada a promover a administração petista sobre os setores populares levarão a um choque mais direto entre esses setores que ainda alimentam ilusões no PT e o governo.

A fragilidade do governo petista e sua necessidade de promover ataques a classe operária

É esse contexto econômico global e seus reflexos em nossa economia que irão forçar o governo de Dilma Roussef a atacar de forma mais direta a classe operária e os setores populares, seja por via de cortes nos gastos sociais ou aumento de tarifas de serviços públicos, seja pela via de uma política econômica mais restritiva que irá atacar empregos e salários.

Mas o governo petista que será obrigado a promover esses ataques estará mais enfraquecido que qualquer um dos governos anteriores. Com uma margem de votos que lhe permitiu uma vitória apertada, uma oposição fortalecida no congresso, mobilizações mais contundentes dos setores à direita exigindo logo depois da eleição o impeachment da presidente, com o PSDB não aceitando a derrota nas urnas e pedindo recontagem dos votos (coisa inédita na democracia burguesa que se erigiu a partir da derrota da ditadura civil-militar), a presidente terá muito menos legitimidade para desferir os ataques sobre a classe operária e os oprimidos e terão muito maior base as contestações a essas medidas.

Esse elemento se fortalece ainda pelo fato de que para garantir sua reeleição os petistas tiveram que insuflar antigas aspirações e ilusões principalmente em setores de juventude, mas também em setores operários e populares, de que representavam um novo projeto, uma alternativa, às políticas elitistas e pró-capital financeiro, que seriam políticas propriamente tucanas.

Essas aspirações e ilusões tendem a se chocar rapidamente com a realidade das medidas anti-populares que já começa a tomar Dilma Roussef para tentar combater a crise em defesa do lucro dos capitalistas, o que tende a levar a distensões e rachas do governo petista com sua própria base.

Esses primeiros elementos de contradições entre a base petista que acreditou nas ilusões veiculadas pelos marqueteiros para garantir a reeleição e a realidade do segundo mandato de Dilma já começam a se expressar com os protestos contra a nomeação de Joaquim Levy e Kátia Abreu para os ministérios da Fazenda e Agricultura respectivamente.

É evidente, no entanto, que essa fragilidade do governo petista é relativa, pois esse ainda tem importante influência nos sindicatos e nos movimentos sociais, o que permite ao PT ainda cumprir o papel de conter as lutas no próximo período.

Um regime que tende cada vez mais a crise

Não há uma relação mecânica entre a crise de um governo e a crise no regime político do qual esse governo é expressão. Numa democracia burguesa estável, num momento de passividade na luta de classes, a crise de um governo pode facilmente ser absorvida para dentro das instituições do regime. Não é o caso do regime democrático burguês brasileiro; erigido sobre uma base social extremamente contraditória, com desigualdades sociais e regionais muito grandes, sem acertar contas com o regime de ditadura civil-militar que o precedeu, com um elemento de corrupção congênita, que marca e deslegitima de forma aguda suas instituições, o regime democrático burguês brasileiro é extremamente frágil e instável.

A esses fatores se soma o fato de os setores mais conservadores da burguesia brasileira têm uma visão altamente econômico-corporativa de sua relação com o estado e veem nele não o instrumento para exercerem sua hegemonia sobre as demais classes da população, mas instrumento de ganho direto através de negociatas e favorecimentos. corrupção direta, o que apenas aumenta as fissuras do regime.

Num momento de instabilidade social e política, as medidas tomadas por tucanos e demais setores à direita do governo petista, somadas a sua contestação à esquerda desde as jornadas de junho do ano passado e que só aumentaram esse ano com a onda de greves que vimos no país no primeiro semestre, tendem apenas a aprofundar os elementos de crise no regime que ainda tem se manifestado de forma superficial.

A falência da esquerda tradicional

Desde as jornadas de junho no ano passado a esquerda tradicional brasileira (PSOL, PSTU, PCB, PCO) só tem mostrado e reforçado sua bancarrota. A incapacidade que tiveram essas organizações de darem voz às insatisfações populares nas eleições são apenas a expressão mais superestrutural de sua inercia e inépcia para se ligarem com setores amplos das massas que tem despertado para a vida política.

As mobilizações contra a falta de água em São Paulo organizadas por PSOL e PSTU apenas mostraram o quão adaptadas são essas organizações, que mesmo frente a um problema agudo que atinge a população de conjunto, principalmente os setores mais pauperizados, o que permitiria construir uma alternativa hegemônica da classe operária, como único sujeito social capaz de dar uma resposta de fundo para essa questão, não utilizaram o peso nos sindicatos e no movimento estudantil que têm para buscar construir uma mobilização que saísse da rotina e dos calendários e pudesse se constituir num movimento mais profundo capaz de se enfrentar com um regime cada vez mais desgastado e se colocar como alternativa frente ao projeto burguês de fazer com que a crise seja descarregada em nossas costas.

Os reflexos das jornadas de junho e a maior politização popular ainda persistem

Um processo grandioso como foram as jornadas de junho e a grande onda de greves que tivemos em maio desse ano não tende a se apagar do imaginário popular facilmente. Muito ao contrário, tendem a deixar marcas, por um período maior, novas relações e uma nova cultura de mobilização. As eleições tenderam a absorver esse novo clima de politização por um período e talvez pudessem mesmo canalizar a insatisfação popular para dentro das instituições da democracia dos ricos. Mas os elementos que forçarão os ataques dos patrões e o aumento das contradições sociais no ano que vem (agudização dos efeitos da crise, instabilidade no governo e no regime) tendem não a absorver essa politização mas a torná-las cada vez mais combativas e radicalizadas.

Frente ao aumento do desemprego e a queda nos salários, aumento na inflação e corte nos gastos sociais, um governo desprestigiado e um regime cada vez mais contestado, a juventude e a classe operária que tiveram experiências importantes de luta desde junho de 2013 até agora tendem a se colocar de novo nas ruas e com cada vez maior energia.

Conclusão: é necessário que os setores dos trabalhadores e dos oprimidos que se colocam em luta se organizem em um partido para se defender dos efeitos da crise e para construir uma alternativa revolucionária

Todo o exposto acima mostra que o ano de 2015 tende a ser um ano de lutas sociais mais profundas, de um maior embate entre as classes. A soma entre os efeitos a crise econômica que se torna cada vez mais presente na realidade brasileira e um governo e um regime cada vez mais instáveis tende a produzir uma mistura explosiva. Isso abre perspectivas e perigos. Com uma política correta e audaz, passa a ser cada vez mais possível, depois de décadas de passividade, que um programa realmente revolucionário possa se tornar sangue e carne, algo concreto e efetivo, no seio da classe trabalhadora, da juventude, para negros, mulheres, homoafetivos e todos os demais setores oprimidos da sociedade.

Ao mesmo tempo a incapacidade de a esquerda de dar uma resposta mais contundente às aspirações populares fortalece setores mais à direita dentro da classe dominante, que se nem de longe ainda expressam um perigo fascista, como poderiam pensar aqueles que se deixam impressionar facilmente, mas passam a ter uma capacidade de mobilização maior que em outros momentos.

Para pensar o cenário para o ano que vem devemos ter claro também que desde o fim da etapa neoliberal dos anos 90 os ritmos no desenvolvimento dos acontecimentos tanto na economia quanto na luta de classes têm sido mais lentos do que nos momentos anteriores com que poderíamos fazer analogias históricas (como na primeira metade do século XX), fruto de que por um largo período a ideia de revolução desapareceu do imaginário popular e todas as contradições da sociedade foram absorvidas para dentro do regime democrático burguês, tanto à direita quanto à esquerda.

Isso leva a que a burguesia possa administrar a crise fazendo com que até agora ela não tivesse proporções catastróficas a nível mundial, o que impacta nas diversas economias nacionais, e também que a luta de classes se desenvolva de maneira mais tateante, de forma menos contundente. Mas devemos também nos preparar para uma aceleração nos acontecimentos, posto que em momentos de crise e lutas os trabalhadores tendem a dar saltos em suas consciências.

Assim, a tarefa para os revolucionários para o ano que se aproxima é lutar para colocar em pé um verdadeiro partido revolucionário da classe operária, com influência em setores da vanguarda dos trabalhadores, da juventude e dos oprimidos que se colocarão em luta aproveitando um momento que deve ser particularmente propício para que possamos nos inserir no seio da classe operária.

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