Sexta 19 de Abril de 2024

Internacional

Resolução 1701 da ONU: Um salva-vidas para o Estado Sionista

O primeiro fracasso militar de Israel em sua história

10 Aug 2006   |   comentários

Em 14 de agosto o líder de Hezbollah, Hassan Nasrallah, declarou que essa milícia obteve uma "vitória estratégica" no conflito com Israel. "Saímos vitoriosos de uma batalha, enquanto o inimigo se viu imerso em debilidades", alegou pelo Al-Manar, canal do Hezbollah. A imprensa do mundo árabe considera que este conflito acabou com "o mito da invencibilidade de Israel” ."O fim do mito” intitula jornal liberal egípcio Al Wafd. Também jornais dos emirados do Golfo Pérsico, como o kuwaitiano Al Qabas colocou em 14/8 que o Hezbollah "devolveu aos árabes sua dignidade". Al Quds al Arabi, jornal editado em Londres, assegura que "o que se passou (...) será registrado nos livros de Historia árabes como uma vitória". Apesar do exagero das declarações de Nasrallah e parte da imprensa burguesa árabe, já que não houve uma derrota militar de Israel, pois este conservou intacta a maior parte de seu poderio bélico, expressam um fato correto e de caráter histórico: o primeiro fracasso militar de Israel desde sua formação em 1948 e nas guerras sucessivas em que combateu. Este fato foi um elemento de moralização para as massas árabes, abrindo a possibilidade de uma nova situação nesta região estratégica em que as massas passem para a ofensiva contra o Estado de Israel e seus próprios governos conservadores e pró-imperialistas. Frente a esta realidade, a resolução 1701 da ONU é por efeito “um salva-vidas para o Estado sionista” . A resolução reacionária, mesmo não podendo diluir a derrota política e o fracasso militar de Israel, reforça a presença de tropas imperialistas e do exército burguês do Líbano (ponto até então refutado pelo Hezbollah que agora foi aceito, o que significa uma capitulação política ao governo pró-imperialista de Fouad Siniora, sobretudo quando este se encontra profundamente debilitado) e resguarda Israel. Estes pontos vão claramente contra os interesses das massas libanesas e palestinas.

“Um salva-vidas para o Estado sionista”

A resolução 1701 da ONU aceita pelos governos do Líbano e Israel, significa - como consta no jornal liberal israelense Haaretz - “um acordo redigido às pressas pelos EUA para salvar Israel de uma humilhante derrota” . A resolução trata de conquistar no terreno diplomático o que Israel não conseguiu no militar. É uma fraude claramente favorável ao Estado sionista.

Mas o calcanhar de Aquiles de todo o processo está em sua implementação, que repousa em boa medida sobre um governo libanês debilitado e um Hezbollah fortalecido, de acordo com a declaração de 14/8 em que o grupo assegura que não se desarmará por "intimidação ou pressão" (Nasrallah ensaiou retornar ao “Diálogo Nacional” com os líderes das principais facções do país), alertando o exército libanês para que pense duas vezes antes de desarmar o Hezbollah no sul do rio Litani. Mas frente ao que aparenta ser um início de acordo, o responsável político pelo Hezbollah no sul do Líbano, Nabil Kauk, afirmou que seu grupo facilitará a instalação do exército libanês no sul, porém adverte que "continuará presente". Este entendimento ainda parece pouco sólido para facilitar a entrada de tropas imperialistas. Sobre o desarmamento do Hezbollah o ministro francês de Relações Externas, Philippe Douste-Blazy afirmou que este assunto "diz respeito ao Estado libanês” , lembrando que o mandato da FPNUL "não é impor a paz, mas ajudar o governo a se recompor, contribuir com o regresso dos refugiados e com a chegada da ajuda humanitária".

Israel, por sua vez, apoiado na sua força, se nega a assumir as conseqüências de seu fracasso militar e no marco de que se mantenha a sua presença no sul do Líbano, podem se reiniciar as hostilidades a qualquer momento. Esta é uma perspectiva nada desprezível, sobretudo frente aos enormes questionamentos ao governo de Olmert, que poderiam feri-lo de morte e substituí-lo por um novo governo sob a direção de Benjamin Netanyahu. Este fantasma alenta que Nasrallah vem se amoldando às exigências do governo libanês à medida que possa manter o essencial de seu armamento em sues bastiões ao norte do Litani e no vale de Bekaa. Sem dúvida, qualquer incidente ainda pode levar este cessar fogo ao colapso.

O fim do mito da invencibilidade do Estado de Israel

O resultado da guerra do Líbano de 2006 é inédito para Israel. Em todas as guerras que combateu -1948, 1956, 1967, 1973 e 1982 - impós sua superioridade militar apesar de em algumas ocasiões não ter obtido seus objetivos políticos (Yom Kippur-1973, Líbano-1982). É a primeira vez que o 6º exército do mundo e potencia regional não pode derrotar seus inimigos. É um fato histórico que abre as portas a um choque na ordem regional contra os interesses do Estado sionista e de seu “patrão” EUA.

O temor de Olmert a uma nova guerra de contra-insurgência como a desgastante invasão do Líbano de 1982, acabou não só dando a vitória política ao Hezbollah, senão que desde o ponto de vista militar, apesar dos golpes sofridos, este póde conservar sua capacidade de resistência, como demonstram os mísseis caídos no norte de Israel e a significativa quantidade de baixas das Forças de Defesa Israelenses no fim de semana prévio ao cessar das hostilidades. Frente a opção de uma guerra de desgaste que o submetesse a uma grande quantidade de baixas como uma repetição de um novo “Vietnã” libanês, ampliado e multiplicado, que exasperaria a sociedade israelense, incitaria a radicalização das massas árabes e colocariam as massas do mundo contra seu “terrorismo de Estado” , e diante de uma margem diplomática e de legitimidade que foi se fechando rapidamente depois de massacres como o de Qana, o governo israelense optou por um compromisso. Esta opção mais económica desde o ponto de vista dos custos que Israel estava disposto a assumir para se livrar do Hezbollah, de um ponto de vista político e de percepção, colocam que o Estado de Israel foi incapaz de derrotar o Hezbollah no campo de batalha. Ao se manter este resultado se acaba sua imagem de “invencibilidade” , elemento central em que se baseia a sobrevivência do Estado sionista e da ordem regional reacionária a serviço dos EUA. A liquidação desta enorme vantagem psicológica pode deixar sem sustentação a política de compromissos das burguesias árabes com Israel, fundamento que está por trás do reconhecimento diplomático do Egito e da Jordânia ao Estado sionista, cujos governos e políticas conciliadoras se encontram totalmente amparados em uma base precária. Mas, sobretudo o fato de não ser inevitável uma derrota total árabe, eleva a moral das massas da região e abre a possibilidade de passarem para a ofensiva.

As conseqüências deste projeto são tão grandes que é pouco provável que Israel aceite sem nenhuma reação o resultado provisório da atual batalha. Neste sentido, o recente cessar-fogo se assemelha a um armistício entre duas guerras, ou tem um caráter bastante provisório. Sem dúvida, nem para os EUA (sem opções à vista frente ao estancamento e a crise do novo governo no Iraque) nem para Israel será fácil recuperar a iniciativa. Mais ainda, este último pode entrar em um verdadeiro dilema político devido às acusações contra seus dirigentes pela desastrosa condução da guerra, como já demonstra o pedido de renúncia do chefe das Forças Armadas, Dan Halutz, impulsionado por vários setores.

Neste marco de debilitamento conjunto dos EUA e seu enclave sionista, o verdadeiro perigo contra-revolucionário virá diretamente dos “amigos” da resistência nacional libanesa e palestina: os regimes da Síria e do Irã. Estes quererem capitalizar o triunfo político do Hezbollah, em função dos interesses de suas respectivas burguesias nacionais. O primeiro, para recuperar influência política e económica no Líbano, os Altos de Golan e reverter seu isolamento diplomático com as potências ocidentais. O segundo, para se consolidar como potência regional contra o Egito e a Arábia Saudita.

Já em 15/8 o ministro da Defesa de Israel, o “duro” Amir Peretz, colocou que “deveríamos criar as condições para um diálogo também com a Síria” , ainda que sua posição não seja hoje muito popular nesse país. Tão pouco pode se descartar uma abertura para o novo governo palestino sob a direção do Hamas, que aparentemente teria chegado a um acordo para sua conformação com o presidente conciliacionista da Autoridade Nacional Palestina, Abbas, de forma a deixar esta causa histórica, que foi o pavio que incendiou a atual guerra, sendo esta bastante apagada, ganhando tempo para derrotar os grupos radicais, como aconselham os setores mais lúcidos do imperialismo.

Devemos enfrentar toda manobra sionista-imperialista e as políticas dos governos burgueses do Irã e da Síria ’ principais fontes de aprovisionamento e apoio do Hezbollah - que não almejam liquidar a influência imperialista na região, mas se localizar como atores regionais mais fortes, assim como o Hezbollah dentro do Estado semi-colonial libanês, disputando a liderança das massas da região frente às variantes sunitas como o Al Qaeda, o Hamas, ou seculares como o Al Fatah.

Hoje, mais do que nunca, é necessário lutar por uma direção operária revolucionária para o conjunto das massas na região, os únicos que podem aproveitar de forma progressiva o debilitamento dos principais recursos da ordem regional pró-norte-americana e sionista.

O que se pretende com a resolução da ONU?

1- Cessar-fogo enquanto Israel continua ocupando o sul do Líbano.

2- A detenção de todas as operações do Hezbollah e apenas das ações ofensivas de Israel, o que lhe permite restabelecer suas ações militares sob o pretexto de “defesa” .

3- O Hezbollah deve se retirar da faixa entre a linha azul (fronteira reconhecida pela ONU entre o Líbano e Israel) e o sul do rio Litani. Nessa faixa não deve haver armas nem forças que não as do exército libanês.

4- Reforça o contingente da ONU estabelecido desde 1978, com a presença de 15.000 novas tropas sob a direção da França, com o objetivo de serem guarda-costas de Israel. Estas tropas não estão submetidas ao capítulo 7 da Carta da ONU “que autoriza o uso da força” (como solicitava Israel e era parte do primeiro texto apresentado pela França e pelos EUA, sendo retirado por pressão do governo do Líbano, que incorporou a exigência da retirada simultânea do exército israelense e a entrada do libanês). As tropas têm direito de usar a força para assegurar que as áreas sob o seu controle não sejam usadas para atividades hostis e para, por exemplo, defender os civis frente a um ataque iminente. Em outras palavras lhe outorgam autoridade para responder a eventuais ataques com mísseis do Hezbollah.

Não há um compromisso sério quanto à devolução das terras de Sheeba, ou menção sobre os Altos de Golan; os 10.000 presos em Israel entre palestinos e libaneses, nem sequer os 2.500 milhões de dólares necessários para a reconstrução

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