Quinta 25 de Abril de 2024

Internacional

O povo grego dá a vitória ao Syriza

26 Jan 2015 | O Syriza conseguiu uma clara vitória nas eleições gerais na Grécia, com 36,6% dos votos. A formação esquerdista liderada por Alexis Tsipras ficou a duas cadeiras da maioria absoluta no Parlamento. O conservador Nova Democracia, impulsionador dos planos de austeridade no último período, é o grande derrotado.   |   comentários

O triunfo do Syriza, que muitos consideram “histórico”, representa um fato político de primeira ordem na Europa. Desde 2008, o continente vive uma profunda crise econômica, à qual os governos responderam aplicando duras políticas de austeridade ditadas pela “Troika” (Banco Central Europeu, Comissão Européia e o FMI).

O triunfo do Syriza, que muitos consideram “histórico”, representa um fato político de primeira ordem na Europa. Desde 2008, o continente vive uma profunda crise econômica, à qual os governos responderam aplicando duras políticas de austeridade ditadas pela “Troika” (Banco Central Europeu, Comissão Européia e o FMI).

O resultado obtido pelo partido liderado por Alexis Tsipras, assim como o voto em outras forças de esquerda que se apresentaram às eleições gerais na Grécia, é uma mostra do forte rechaço de amplos setores de trabalhadores e do povo gregos às políticas de austeridade, cortes, privatizações e ataques aos direitos sociais da maioria da população.

De acordo com os dados, o Syriza obteve 149 cadeiras parlamentares, duas a menos do necessário para conquistar a maioria absoluta.

Os conservadores da Nova Democracia, o partido do Primeiro Ministro Andonis Samarás, obteve 27,8% dos votos, o que dá 76 deputados, sendo os grandes derrotados da eleição.

São seguidos pelos neonazistas da Aurora Dourada, com 6,3% e 17 deputados, o que lhes localiza como terceira força política do país, apesar de praticamente toda sua direção estar em prisão preventiva acusada de ser parte de um grupo criminoso.

Os liberais europeus do novo partido To Potami(O Rio) ficaram em quarto lugar, com 6% dos votos e 17 deputados.

depois deles estão os comunistas do KKE, com 5,5% e 15 deputados, e depois deles os até agora socios da Nova Democracia no governo, os social-democratas do Pasok, do vice primeiro ministro Evángelos Venizelos, com 4,7% dos votos, que lhes dá 13 deputados.

Na margem dos partidos que conseguiram superar a barreira dos 3% para ingressar ao parlamento heleno, está a formação de direita nacionalista ANEL(Gregos Independentes), com 4,6% e 13 deputados.

O partido do ex-líder do Pasok e antigo primeiro ministro Yorgos Panpandreu ficou de fora do parlamento, assim como a coalização de esquerda anticapitalista Antarsya, que não alcançaram os 3% necessários.

Um cenário complexo para a formação do novo governo

Segundo a lei eleitoral grega, as cadeiras parlamentares se distribuem proporcionalmente entre os partidos que superaram o piso mínimo de 3% dos votos. Nestas eleições se apresentaram 18 partidos e 4 coalizões, mas apenas sete deles conseguiram cadeiras no Parlamento.

Uma peculiaridade do complexo sistema eleitoral grego é que a lei eleitoral presenteia com um “plus” de 50 cadeiras o partido ou coalizão que resulta vencedor nas eleições por maioria absoluta dos votos, o que lhe permite aumentar a diferença a respeito dos demais e, segundo seus defensores, garantir uma governabilidade. Não obstante, esta não foi assegurada após os comícios de domingo.

Para obter maioria absoluta e formar governo, um partido ou coalizão necessita somar ao menos 151 deputados. No caso de que nenhuma força o consiga sozinha, ou em aliança com outro partido, a Grécia se veria destinada a novas eleições, como já ocorreu em 2012.

Ao não haver conseguido o Syriza os 151 deputados nesta primeira votação, Alexis Tsipras, primeiro ministro eleito, teria 15 dias para ganhar um “voto de confiança” no Parlamento, por parte de ao menos 151 deputados. Nesse processo, o Syriza poderia ser apoiado por deputados de outros partidos, formar uma coalizão de governo, compartilhando ministérios, ou conseguir apoio com votos de outras formações ainda que estas não se integrassem ao novo governo.

Se neste período o Syriza fracassasse em conquistar o apoio de dois parlamentares para conseguir a maioria, prossegue um processo no qual o atual Presidente da República outorgaria ao líder do Syriza 3 dias mais e, se não conseguisse mesmo assim, o fará com o segundo partido mais votado (Nova Democracia), e de não prosperar, com o terceiro (Aurora Dourada).

A última alternativa seria formar um “governo de unidade nacional” que, se também falhasse, dever-se-ia eleger um governo interino que convocasse novas eleições, que foi o que aconteceu em 2012.

Tsipras necessitaria então o apoio de algum outro partido para garantir isso. Nas previsões anteriores às eleições, e vista a distribuição de cadeiras no Parlamento, o foco parecia estar posto no partido To Potami (O Rio), quarto melhor votado, com 6% dos votos e 17 cadeiras.

Entretanto, esta formação política “de centro” economicamente neoliberal, é confessamente pró-européia e defende todos os compromissos assinados com a Troika pelos governos gregos anteriores, premissa que condiciona a qualquer acordo com Tsipras e que inviabilizou o acordo. O mesmo problema se dá com os socialdemocratas do PASOK, que defende a continuidade irrestrita da austeridade em troca dos empréstimos aos banqueiros.

Assim, a alternativa de Tsipras foi garantir governo pactuando com o partido Gregos Independentes (ANEL), que obteve 4,6% dos votos e 13 cadeiras, uma formação nacionalista de direita que surgiu da ruptura de seu líder, Panos Kammenos, com seu antigo partido, o Nova Democracia, em virtude de seu voto contrário ao pacote de ajustes que implementou o governo de Antonis Samarás.

Este partido, fortemente xenófobo e antiimigrante, contra os direitos dos homossexuais como o matrimônio igualitário e defensor da sujeição da Macedônia pela Grécia, tem em comum com o Syriza seu discurso “soberanista” de direita contra a austeridade.

Syriza: entre as demandas das massas e um programa conciliador com a Troika

A 28 de fevereiro vence a última ajuda do programa europeu de resgate à Grécia. A Comissão Européia (CE) proporá uma nova extensão, de até seis meses, do resgate grego para evitar qualquer problema de liquidez, entre seu vencimento e a data em que se negocie um novo crédito com o futuro governo grego.

Alguns analistas opinam que o Syriza deveria aceitar a dita prorrogação do plano. Mas isto implicaria aceitar o grosso das condições sob as quais se estabeleceu a ajuda, que não são outras que aprofundar os planos de austeridade.

Tsipras assegurou antes das eleições que, se fosse Governo, o Syriza reconheceria as “obrigações frente às instituições européias e os tratados europeus. Estes tratados prevêem objetivos fiscais que devem respeitar-se, mas não as medidas para consegui-los”.

Mas Tsipras recordou também que a “austeridade não faz parte dos tratados europeus” e celebrou que a União Européia esteja dando passos agora para sair dela.
No mesmo sentido, no comício de celebração após conhecer-se os resultados das eleições, o líder do Syriza agradeceu a vitória conquistada nas urnas: “Hoje se escreveu uma nova página na história da Grécia. Fica para trás a catástrofe humana que causou a austeridade. Foram cinco anos de humilhações, e agora recuperamos o otimismo, a dignidade e a esperança no futuro”.

“É um grande passo adiante, não só em nosso país, mas em toda a Europa. Hoje estamos celebrando, mas amanhã é necessário começar a trabalhar duro, porque todos os gregos fechamos hoje o círculo vicioso da austeridade, cancelamos o memorando. É o voto que deixa no passado a Troika, porque os gregos nos deram um mandato muito claro,” afirmou, diante de centenas em Atenas.

“O novo Governo”, explicou o presidente do Syriza, “colaborará e negociará com seus sócios europeus para encontrar soluções viáveis. Mas o que está claro é que se rompeu o círculo vicioso da austeridade, e se recuperam os valores da justiça, da democracia e da solidariedade”. “Nós poremos nossas propostas de reformas sobre a mesa e uma nova política fiscal,” afirmou Tsipras.

“Temos um programa de investimentos, de reconstrução do país... Mas nossa prioridade são os que mais sofreram a crise e restabelecer os direitos, a justiça, aprofundar na democracia e acabar com a corrupção,” sentenciou.

Não obstante, o que não está claro é como fará Tsipras para resolver as agudas demandas da maioria social grega que vem de um longo período de sofrimentos, carregando nas costas as penúrias da crise.

A Grécia vive uma situação de verdadeira catástrofe social. O desemprego supera 27% e afeta mais de 50% dos jovens e mulheres, enquanto a metade da população se encontra abaixo da linha de pobreza. O nível de vida das famílias gregas diminuiu 40%, o PIB caiu 25% desde 2008; os empregos públicos se reduziram quase 40% desde 2009, e a dívida pública representa 175% do PIB.

Nesta situação, não é possível restabelecer “os direitos, a justiça e a democracia”, como disse Tsipras, sem afetar decididamente os interesses capitalistas responsáveis pela dita situação, começando pelos grandes magnatas gregos ligados ao capital financeiro europeu e internacional, e as reacionárias instituições que compõem a Troika credora.

Por isso, existe uma contradição entre as aspirações das massas e a moderação do programa e da orientação política do Syriza, que tentou em todo momento mostrar-se como “respeitável” e “responsável” ante os olhos da União Européia.

A Grécia passou por mais de 30 greves gerais, junto a uma infinidade de mobilizações e lutas desde 2010, quando se afundou sua economia. Essa potência social dos trabalhadores e do povo grego é o que mais temem as classes dominantes européias, que vêem no triunfo do Syriza o perigo de que caiam outros governos conservadores e socialdemocratas (virtualmente transformados em social liberais) na Europa, que levaram a cabo agendas idênticas contra os trabalhadores.

Neste mar de contradições, Tsipras ainda deve formar governo. Uma tarefa que não será fácil e que apesar de sua política conciliadora, pode apostar que tem grande parte dos "poderes de fato" da Europa do capital conspirando contra, seja para domesticá-lo desde já, ou inclusive, tentar burlar a vitória obtida nas urnas.

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