Sexta 19 de Abril de 2024

Nacional

ENTRE GOLS, GREVES, ENCHENTES E ELEIÇÕES

O ponto de vista dos que assistem à Copa demitidos ou embaixo d’água

26 Jun 2014   |   comentários

Enquanto turistas viajam felizes pelos estádios que custaram rios de dinheiro, os alagamentos e enxurradas no Paraná afetaram quase 790 mil pessoas que literalmente assistem a Copa debaixo d’água. Assim como em Natal, uma das cidades sedes do megaevento, mais uma tragédia “natural” que poderia ser minimizada não fosse o descaso dos governantes.

Apesar da torcida por um suposto "Brasil de todos" que toma conta das TVs, muitos não têm motivos para comemorar. O dinheiro que o Governo Federal separou esse ano para destinar ao pagamento de dívidas a um punhado de investidores financeiros equivale a R$ 718 bilhões, cinco vezes mais que todo dinheiro gasto com saúde e educação. Enquanto turistas viajam felizes pelos estádios que custaram rios de dinheiro, os alagamentos e enxurradas no Paraná afetaram quase 790 mil pessoas que literalmente assistem a Copa debaixo d’água. Assim como em Natal, uma das cidades sedes do megaevento, mais uma tragédia “natural” que poderia ser minimizada não fosse o descaso dos governantes.

A música da campanha eleitoral de Dilma diz que "o que tá bom, vai continuar, e o que não tá vai melhorar". Mas pelas pesquisas que indicam a queda da popularidade do governo e o aumento dos votos nos candidatos opositores parece que muita gente não acredita. É que a inflação cada vez mais se faz sentir no bolso e o desemprego volta a ser uma preocupação em vários ramos da economia. Enquanto isso, para "melhorar" a vida dos patrões que reclamam do baixo crescimento econômico, Dilma acaba de anunciar mais um "pacote" de bondades, ampliando ainda mais as isenções de impostos aos empresários.

Os principais candidatos oposicionistas, Aécio Neves e Eduardo Campos, apoiados pela Força Sindical e pela UGT, apesar da demagogia, não conseguem esconder que defendem um mesmo "projeto de país" entregue ao capital financeiro e aos grandes monopólios, baseado na superexploração do trabalho precário e assistencialismo estatal, sacrificando o direito ao trabalho, salário e serviços públicos que correspondem com a enorme riqueza produzida pela população trabalhadora. No que mais se diferenciam é na defesa às vezes mais desavergonhada de uma politica de ajuste econômico (mais recessão, desemprego e cortes de gastos públicos) para descarregar os custos da falta de crescimento econômico sobre os ombros dos trabalhadores, inclusive com reformas legislativas que imponham maior flexibilidade aos direitos trabalhistas. Política essa que o PT tenta não defender abertamente, guardando para depois das eleições, ou implementando às escondidas, como nos acordos de flexibilização que a CUT fecha empresa por empresa. Ainda que a nova proposta do Planalto de ampliar e generalizar as suspensões de contratos de através de um projeto de lei mais uma vez ameaça "roubar" as propostas mais reacionárias dos tucanos.

As manifestações de junho do ano passado foram uma revolta contra toda essa situação que impõe serviços públicos estruturalmente péssimos e caríssimos, contra a casta de corruptos parasitas que sustentam esse sistema e contra o brutal aparato policial colocado a serviço de reprimir as explosões sociais inerentes a essa realidade. Na rasteira desse processo, as greves que atravessaram o país às vésperas da Copa, configurando a maior onda de lutas operárias em muitos anos, refletem o choque entre o aumento das aspirações de ascensão social geradas pelo lulismo e os limites do ciclo econômico dos últimos anos, fazendo vir à tona as contradições estruturais do país.

Um processo que ganhou corpo principalmente nos setores mais precários da classe trabalhadora, como os operários da construção civil, rodoviários e garis de várias regiões do país, cujas lutas se enfrentaram contra a repressão estatal e suas direções sindicais traidoras; e que mais recentemente se expressou também entre setores mais organizados da classe trabalhadora, como vimos na greve dos metroviários de São Paulo, dos trabalhadores da USP e dos professores do Rio de Janeiro.

Apesar da disputa eleitoral, o PT, o PSDB e seus respectivos partidos aliados estão unidos nos esforços para reprimir e derrotar essas greves como pré-condição para conseguirem descarregar os custos do baixo crescimento econômico e do início de recessão em determinados ramos da economia sobre as costas da classe trabalhadora. O PT de Haddad se negou a atender as reivindicações dos professores da rede municipal de São Paulo apesar dos 42 dias de uma dura greve que por várias vezes lotou as ruas do centro da cidade com marchas de mais de 10 mil trabalhadores; e se negou a atender as demandas da greve selvagem dos rodoviários que parou a principal capital do país, demitindo vários trabalhadores que estiveram na linha de frente dessa verdadeira rebelião contra a burocracia sindical. No Rio de Janeiro, Paes e Pezão demitem professores por lutar.

Alckmin, por sua vez, pôs a tropa de choque para reprimir brutalmente os metroviários em greve dentro da estação Ana Rosa do metrô, prendeu mais de 13 ativistas e demitiu 42 trabalhadores para impor uma derrota ao movimento. Com essa política repressiva, que contou com a conivência do PT que nada fez apesar dos discursos eleitoreiros, o PSDB quis impor um golpe à onda de greves em curso. De fato, se a greve dos metroviários triunfasse, devido à importância estratégica dessa categoria e à enorme dimensão nacional e internacional que ganhou o conflito, sua repercussão como estímulo ao conjunto da classe trabalhadora seria muito superior à dos garis do Rio de Janeiro, podendo gerar crises na Copa e nos planos da burguesia. Com a derrota, Alckmin busca preparar o terreno para impor novos ataques ao funcionalismo público, como se mostra no arrocho salarial contra os servidores das universidades estaduais paulistas, sinalizando para a burguesia que está disposto a ser mais consequente que o PT nessa tarefa.

Por mais que a derrota dos metroviários possa jogar para trás setores da classe trabalhadora ou debilitar as manifestações de protesto durante a Copa, isso não significa que as profundas contradições que marcam a realidade nacional deixaram de existir. Pelo contrário, está em aberto a possibilidade de que o profundo processo de recomposição da classe trabalhadora como sujeito de luta siga se alastrando a novos setores, podendo vir a atingir inclusive as bases dos principais bastiões da burocracia cutista.

Uma das principais tarefas de todo trabalhador e jovem nesse momento é cercar de solidariedade a luta pela reintegração dos 42 metroviários demitidos por lutar, ligando-a à luta contra os ataques que vêm sendo deflagrados também em outras categorias. Se revertemos esse ataque, todos estarão em melhores condições para travar novas batalhas. Ligado às medidas de mobilização dos próprios metroviários, os sindicatos e entidades estudantis dirigidos pelo PSOL e o PSTU (CSP-Conlutas, Intersindical e Anel) devem colocar em prática um plano sério nesse sentido – que não seja apenas de declarações dos dirigentes –, como veem fazendo os trabalhadores em greve da USP, impulsionado ações envolvendo milhares de pessoas para apoiar os metroviários. Outra das principais tarefas é cercar de apoio também a greve das universidades estaduais paulistas contra o arrocho salarial, pois se esta triunfa será uma importante posição conquistada para barrar novos ataques que virão.

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