Quinta 25 de Abril de 2024

Internacional

ARGENTINA

O movimento operário argentino se reorganiza

07 Mar 2009   |   comentários

A fuga de capitais estrangeiros e a queda brusca do financiamento externo paralisam a produção de diversos setores da economia burguesa da América Latina. A queda dos preços das matérias-primas que movem as economias e exportações das burguesias latino americanas fazem o pano de fundo da crise mundial do capitalismo também em seu reflexo argentino. Em termos nacionais estes fatores deram abertura a uma crise que divide a burguesia semicolonial e também a base de apoio do governo, uma transformação da situação de estabilidade política para uma situação transitória, sujeita a maiores e mais importantes fenómenos de luta de classes.

O peronismo deixou uma marca histórica de intervenção direta do Estado burguês nos sindicatos operários que dura até hoje. Esta dependência política dos sindicatos em relação ao Estado é feita por via do Ministério do Trabalho que tem poder de indicar quais organizações sindicais têm o direito legal de representar os trabalhadores, impedindo candidaturas independentes a elas, e por esta via mantém o espaço de uma burocracia sindical diretamente ligada ao governo que parasita e sufoca a vida dos trabalhadores e trabalhadoras.

É foco de especial atenção da burguesia que nenhum sindicato operário, por ser o núcleo central da classe trabalhadora, seja libertado das amarras estatais. Diferentemente das demais categorias, entre os operários existem apenas duas exceções de sindicatos independentes, um deles é o Sindicatos de Operários Ceramistas de Neuquén, onde o PTS atua, conquistado após a fabrica de Zanon ter tido sua produção posta sob controle operário em meio ao enfrentamento físico dos operários contra o governo em 2001.

A resistência operária às políticas neoliberais durante a crise de 2001 e também dos anos 90 trouxe uma acumulação de experiências de luta de classes e organização da classe operária argentina em ação-direta que é uma vantagem que deve ser aproveitada pelos trabalhadores argentinos neste momento preparatório aos grandes ataques que a burguesia irá desferir.

A independência política da classe trabalhadora é um princípio vital e o enfrentamento contra a burocracia sindical e o estado em defesa de sindicatos e organizações operárias independentes surgem localmente, quando não de forma selvagem, através das comissões internas influenciadas por partidos revolucionários de vanguarda.

A luta pela unidade da classe

Em setembro do ano passado se iniciou um processo valioso de resistência entre os operários de autopeças e automotrizes em combate à patronal respondendo às demissões de cerca de dois mil operários sob contrato de trabalho temporário em diversas empresas. Em resposta às suspensões que a patronal aplicava para tentar evitar a mobilização, os operários efetivos da Gestamp paralisaram o trabalho e bloquearam com pneus e pedras as vias entre as fábricas de Córdoba, exigindo a readmissão. Esta ação impactou os operários de outras fábricas como IVECO e Volkswagen que também se uniram à luta e tomaram em suas mãos a defesa dos temporários, um exemplo de união dos trabalhadores rompendo a divisão que a burguesia impõe a fim de aumentar a precarização do trabalho e a redução do nível de vida da classe trabalhadora. Desta mesma forma os operários efetivos da GM e da Paraná Metal enfrentaram a patronal contra centenas de temporários demitidos. Em média, cerca de 30% da força de trabalho das fábricas estão sob contratos temporários ou situação irregular com trabalho instável, fora o crescente contingente de trabalhadores terceirizados que cresce.

É de fundamental importância que as organizações operárias combatam a precarização do trabalho com um programa efetivo pela unidade das fileiras operárias que supere a divisão entre efetivos e temporários ou terceirizados cristalizada pelo legalismo reacionário das burocracias sindicais. Em todas estas lutas foi essencial a influência de partidos como o PTS, dentre elas se destaca uma importante e recente luta que está ainda por ser fechada entre os metroviários de Buenos Aires.

Os metroviários e a decisiva experiência de democracia operária

Depois da privatização do metró, houve várias demissões e contratações temporárias, mas desde 2000 os trabalhadores do Metró se organizaram a partir de delegados independentes do sindicato, organizando paralisações que reduziram a jornada de trabalho de 8 para 6 horas, criando mais de 1500 postos, e a quase 10 anos não há demissões. Os trabalhadores metroviários e ferroviários da Grande Buenos Aires derrotaram a tentativa de terceirização em seus setores, levando esse enfrentamento às suas próprias formas de organização. Quando a burocracia sindical agrediu delegados de base, em repúdio os metroviários pararam a circulação dos vagões por duas horas. A burocracia da UTA que legalmente representa os metroviários de Buenos Aires, mas que cotidianamente mantém a divisão e sufoca a organização das comissões setoriais e seus delegados eleitos, teve sua legitimidade questionada pelos trabalhadores de forma histórica.
Neste fevereiro se realizou um plebiscito organizado pelo corpo de delegados que decidiria se haveria a criação de um novo sindicato que representasse os trabalhadores através da democracia operária pela base. Em meio à votação, os bate-paus da UTA agrediram trabalhadores na tentativa de roubar as urnas e inviabilizar o plebiscito.

Depois de contidos, em seguida fez-se uma assembléia, e se mostrou quem é que controla as coisas no local de trabalho. Os metroviários aprovaram uma paralisação imediata e o metró da cidade parou. A denúncia da burocracia sindical se fez conhecida através de Daniel Dellacarbonara, metroviário delegado do metró de Buenos Aires e militante do PTS, organização irmã da LER-QI, indicado para denunciar em rede aberta de TV as agressões desferidas por capangas da UTA contra os organizadores do plebiscito em meio à paralisação. O enfrentamento dos metroviários ganhou a mídia e o plebiscito continuou até seu fim com a esmagadora vitória pelo Sim.

Agora haverá um esforço dos delegados para que sejam feitas assembléias por cada linha e cada setor, para que os delegados sejam eleitos a partir dos locais de trabalho, e que a proposta a ser levada para as negociações de reajuste salarial e todas as outras reivindicações sejam construção dos trabalhadores. Além disso, será necessário desenvolver um amplo debate democrático sobre o programa do novo sindicato, e seu estatuto será votado em uma assembléia geral. Apesar disso o novo sindicato já está de pé na consciência dos trabalhadores do metró e na sua importantíssima experiência para toda a classe trabalhadora argentina.

No Brasil, onde estão ocorrendo demissões massivas, e a burocracia sindical cumpre um papel reacionário de negociar demissões e evitar que a classe operária brasileira desperte, estas lições têm uma profunda importância, e devem ser apropriadas. São lições que mostram que é a luta de classes a via para a resolução das necessidades da classe trabalhadora, e não o governo Lula, a burocracia ou encontros burocráticos. Esta é a via para fazer com que a crise seja paga pelos capitalistas.

O papel central do partido e a ação de um programa transitório contra a crise

Todos os experimentos de luta que a classe operária argentina se coloca hoje serão cruciais para a decisão de futuros enfrentamentos maiores de toda a classe contra a avalanche que a burguesia terá que desferir. O papel dos partidos de esquerda serão de fundamental importância nesta etapa preparatória. Justamente por uma organização de vanguarda, como o PTS ser demasiadamente limitada para o tamanho das tarefas da classe trabalhadora em meio a uma situação de crises, guerras e revoluções cada vez mais próxima, é que devemos ter claro que a atual situação das organizações de esquerda que almejam a independência da classe trabalhadora não podem continuar a mesma. Não será o crescimento gradual destas organizações que dará forma ao partido revolucionário. É através de rupturas e fusões em meio à luta de classes que se formará um partido que represente o que haverá de mais avançado na classe trabalhadora. É necessário que as demais organizações como MAS, Izquierda Socialista, ou o Partido Obrero, com influência predominante no movimento de desempregados, responda a iniciativa do PTS em abrir um debate através de um programa de independência de classe conformar em base ao centralismo democrático um partido operário independente, para que seja possível uma experiência comum das organizações de vanguarda frente à próximas lutas operárias na argentina.

Hoje se abre uma nova situação nacional, em que é necessária uma alternativa política que prepare a classe trabalhadora em meio às experiências de luta com um programa de unificação das fileiras operárias, com independência de classe frente à burguesia e às burocracias sindicais, para que de uma vez por todas não paguemos pela crise que não fizemos. Que a crise seja paga pelos capitalistas!

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