Quinta 25 de Abril de 2024

Juventude

DEPOIS DO RESSURGIMENTO DO MOVIMENTO ESTUDANTIL EM 2007

O desafio é se ligar ao conjunto dos estudantes e aos trabalhadores

16 Feb 2008   |   comentários

2007 foi um ano que marcou o movimento estudantil (ME), que se colocou em cena depois de anos de paralisia, reinaugurando alguns métodos radicalizados de luta, como as greves e ocupações. Isso só foi possível porque atuou em grande parte por fora das direções tradicionais traidoras e governistas da UNE, do PT e PCdoB, que há tanto tempo tentam levar nossas lutas para o marco da confiança no parlamento e da conciliação com os inimigos do movimento. Na USP, luta que foi referência nacionalmente, um movimento espontâneo passou por cima em diversos momentos dessas direções, que boicotaram a greve e a ocupação desde o princípio, e algumas vezes do PSOL e do PSTU, que queriam aceitar as migalhas oferecidas pela reitoria logo nos primeiros dias da ocupação, o que poderia barrar todo o processo que se deu nacionalmente.

Porém, apesar de toda a nova mobilização dos estudantes, isso não foi suficiente para conseguir vitórias decisivas. Com exceção do estado de São Paulo, onde conseguimos um recuo parcial do governo com os decretos que queria implementar, além de recuos parciais também na PUC-SP (onde foi adiada a votação do “redesenho institucional” ) e na Fundação Santo André (onde se reduziu muito o aumento das mensalidades e a reitoria foi obrigada a retirar o processo judicial contra 50 estudantes e professores), em nível nacional, principalmente nas federais, o governo conseguiu avanços sobre o movimento. O Reuni passou em 33 das 54 universidades federais, sendo que em quase todos os lugares onde teve mobilização, o Reuni passou.
A grande debilidade que tiveram essas mobilizações foi que não buscaram uma política para se ligar ao conjunto dos estudantes e ganhar o apoio dos trabalhadores e do povo que estão fora da universidade. Esse é um balanço fundamental se queremos partir dos erros e acertos do passado para nos prepararmos para as próximas lutas.

Os desafios para reorganizar o movimento estudantil em 2008

Neste ano seguirá um processo de reorganização no movimento estudantil e queremos aportar para que dê origem a um novo movimento estudantil que seja antigovernista, antiburocrático, massivo e combativo.

O PSTU, direção majoritária da Conlute, vem propondo um encontro nacional para fundar uma nova entidade estudantil. Queremos debater como transformar esse encontro em um marco qualitativo.
Depois das mobilizações, a burocracia acadêmica começou uma ofensiva repressora contra os estudantes e trabalhadores, que tem como objetivo punir e desmoralizar a vanguarda que esteve à frente dos processos para conseguir passar outros ataques em 2008 sem que haja resistência. Frente a isso, a primeira tarefa que se coloca como primordial para este ano é travar uma luta séria contra a repressão, impulsionando uma grande campanha nacional. Esse é primeiro passo para que a vanguarda das lutas do ano passado não saia desmoralizada e dê exemplo para os novos estudantes de que “Se atacam um, atacam todos!!” , não permitindo que nenhum lutador seja punido. Ligar essa campanha com a violência policial ao povo negro nos ligará ao setor mais explorado e oprimido da população, conseguindo apoio para lutarmos juntos para que estes setores estejam na universidade pública.

Isso deve estar ligado com a defesa dos setores mais explorados dos trabalhadores, mostrando que somos nós que queremos a “universidade para todos” e não o governo Lula. Essa aliança entre estudantes e trabalhadores deve se dar dentro e fora das universidades, como única força social capaz de barrar os ataques e por fim a essa universidade elitista e racista.

Para um movimento massivo e democrático, devemos nos organizar através da democracia direta dos estudantes. Qualquer encontro nacional será burocrático e superestrutural, ou seja, por fora da base dos estudantes, se não se expressam as discussões e posições de cada assembléia de curso ou faculdade. Por isso, insistimos na necessidade de um encontro nacional que seja organizado a partir de delegados eleitos nas assembléias de curso, mandatados por elas e revogáveis a qualquer momento se não cumprir com suas deliberações. Além disso, para ser verdadeiramente democrático, o encontro deve expressar as posições de maioria e minoria das suas votações, publicando e levando para as bases todas as propostas levantadas.

Em segundo lugar, é necessário um programa para ligar o ME ao conjunto dos estudantes. Devemos partir de discutir as necessidades mais imediatas dos estudantes, travando uma luta séria por maior assistência estudantil, contratação de professores, melhorias na infra-estrutura etc., ligando isso com a luta contra a burocracia acadêmica, pela democratização radical da universidade e sua estrutura de poder, através da luta para impor estatuintes livres e soberanas que possam transformar a universidade. Isso faz parte de um questionamento de fundo de para quê e a quem serve a universidade hoje, ligando isso ao conhecimento que é produzido na universidade. Neste sentido, o encontro deve levantar um questionamento da ideologia reproduzida hoje por cada professor nas salas de aula, lutando para revolucionar os currículos dos cursos e pela defesa do marxismo na universidade.
Qualquer encontro nacional que se dê a tarefa de aportar para a reorganização do ME deve partir de tirar as lições das últimas lutas e levantar um programa que parta da luta contra a repressão aos lutadores e avance para se ligar às massas dos estudantes e dos trabalhadores. Só assim podemos derrotar os planos dos governos e das burocracias acadêmicas, obter conquistas reais e impor o nosso projeto de universidade.

Reorganizar desde as bases a partir de encontros estaduais

Para preparar um encontro nacional desde as bases, onde possamos discutir em cada sala de aula quais devem ser os rumos do ME, tirando as lições das lutas do ano passado, achamos fundamental que se organizem com antecedência encontros estaduais, que sirvam como preparação para o encontro nacional e para articular um novo ME estadualmente.

Em São Paulo, um dos principais estados onde se mobilizou o ME no ano passado, achamos que é concreto discutir um encontro onde tomemos em nossas mãos tarefas como essas que estamos propondo, baseado numa discussão muito ampla em cada curso sobre o programa que deve levantar o ME para se ligar às massas dos estudantes, partindo das demandas mais urgentes e questionando a universidade, sua produção de conhecimento e sua estrutura de poder.

Chamamos desde já os centros acadêmicos, DCEs, organizações políticas de esquerda e os estudantes combativos para lutarmos juntos para que se realize um encontro como esse, buscando discutir em todos os cursos onde estamos e eleger representantes em assembléias, como exemplo do que deve ser feito nacionalmente. E chamamos todos os estados a fazer o mesmo.

A partir de uma organização como essa em nível estadual, e avançando para ter um programa que ligue os estudantes aos trabalhadores, podemos discutir seriamente a necessidade de uma coordenação efetiva das lutas no estado de São Paulo, onde os estudantes possam articular não só suas lutas de forma unificada, mas se organizar para apoiar cada luta dos trabalhadores que surja no estado, avançando para uma verdadeira aliança entre estudantes e trabalhadores.

Sobre a “nova entidade nacional”

Achamos que a discussão do encontro nacional não deve girar ao redor da criação ou não de uma nova entidade. Para nós, esta é uma questão tática, que deve ser decidida de acordo com o resultado de um amplo e democrático processo de discussão. Partimos de que é necessária uma coordenação nacional democrática e combativa, porém, uma nova entidade é uma forma que só serve a depender de seu conteúdo, e é isso que achamos central discutir.

É impossível que a nova entidade não seja “superestrutural” e nem um “acordo de correntes” se o diálogo que o PSTU quer abrir é somente com o PSOL, se eles se dirigem ao PSOL como peça “fundamental” [1], mas não dialogam com as organizações políticas e estudantes combativos de todo o país sobre pra quê deve servir essa entidade. O surgimento de uma coordenação real de lutas não pode depender de que setores do PSOL rompam com a UNE.

Em primeiro lugar, não podemos ter confiança num partido que alimenta ilusões na negociação pacífica com a burocracia acadêmica e com o governo, vota leis anti-operárias como o Super-simples e tem como figura a Heloísa Helena, que entre outras barbaridades, é contra o direito ao aborto. Mais ainda, não iremos construir de fato um novo movimento estudantil se o mundo seguir girando ao redor das entidades e eleições estudantis, que em grande parte são “cascas vazias” distantes da base dos estudantes. Não queremos uma entidade como a “´Frente de Luta Contra a Reforma Universitária com o objetivo de reunir CAs, DCEs e Executivas de Curso” [2], mas que unifique os estudantes pela base. Não somos contra as entidades, inclusive participamos de várias, porém elas não são mais que instrumentos que podem ou não armar as lutas dos estudantes. Mais ainda depois de anos de um ME burocrático que ganhou o rechaço de amplos setores.

Achamos que a “democracia interna e a aliança com os trabalhadores como seus princípios” [3] deve se fazer concreta, o que não se demonstrou até agora nem na Conlute, nem muito menos na Frente de Luta contra a Reforma Universitária (Frente composta majoritariamente pelo PSOL e pelo PSTU). Se fosse concreta a aliança com os trabalhadores, o ME no ano passado não teria ficado isolado das greves dos Correios, dos professores secundaristas de vários estados, do metró em São Paulo, dos trabalhadores precarizados do telemarketing que começaram e se mobilizar etc. Isso teria impedido o discurso demagógico do governo de dizer que o ME é “elitista contra a democratização das universidades federais” [4], como disse a presidente da UNE, Lúcia Stumpf.

Se fosse concreta a democracia interna, a Frente de Luta (que o PSTU reivindica como “embrião da nova entidade” [5]) não impulsionaria encontros com calendários e resoluções pré-definidas com dirigentes do PSOL como foram no ano passado. Na desastrosa Plenária da Frente de Luta em de 26/3 em SP, um bloco que fizemos parte com cerca de 25% dos participantes sequer teve direito a UMA FALA na plenária final!
O que está colocado, sim ou sim, e esta deve ser a discussão central a ser feita em todas as universidades, é quais são as tarefas do ME para o próximo período: nossas lutas coordenadas sob a base de um programa que possa combater o discurso do governo e mostrar que o ME combativo é quem quer de fato os trabalhadores na universidade, para colocá-la a serviço de sua classe e não da burguesia.

Marília Rocha é estudante de Geografia da USP

[1“Precisamos ou não de uma nova entidade estudantil?” , Thiago Hastenreiter, site www.pstu.org.br, 12/02/2008.

[2Idem

[3Idem.

[4Citado em “Precisamos ou não de uma nova entidade estudantil?” , Thiago Hastenreiter, site www.pstu.org.br, 12/02/2008.

[5Idem.

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