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Nacional

O “beija-mãos” da bancada evangélica na política brasileira

23 Sep 2014   |   comentários

A entrada em cena de uma candidata com forte e assumida ligação às igrejas evangélicas como é Marina Silva, e também a presença de um candidato menos expressivo mas longe de ser algo a ignorar, como Pastor Everaldo, trás novamente à tona a discussão sobre a influência das Igrejas Evangélicas sobre não apenas as campanhas eleitorais, mas o próprio funcionamento do Estado (...)

A entrada em cena de uma candidata com forte e assumida ligação às igrejas evangélicas como é Marina Silva, e também a presença de um candidato menos expressivo mas longe de ser algo a ignorar, como Pastor Everaldo, trás novamente à tona a discussão sobre a influência das Igrejas Evangélicas sobre não apenas as campanhas eleitorais, mas o próprio funcionamento do Estado brasileiro.

No podre sistema eleitoral, os pastores de diversas igrejas utilizam legendas de aluguel para lançarem suas candidaturas. As igrejas que administram são, em geral, empresas muito lucrativas e isentas do pagamento de qualquer tipo de imposto. No congresso, esses deputados e senadores constituem a chamada “bancada evangélica”, que unifica seus mandatos em torno de impedir o exercício de direitos elementares em nome de supostos “valores cristãos”, tais como a manutenção e ampliação da criminalização do aborto, contra qualquer direito civil a mais para os LGBTT, contra a legalização das drogas e a eutanásia. Até as eleições, eles constituem 14,2% dos deputados e 5% dos senadores. Estão envolvidos em dezenas de esquemas de corrupção, entre os quais o recentemente ganhou mais destaque é o de Natan Donadon, condenado a treze anos de prisão.

E aí, em nome da “governabilidade” feita com a política de alianças entre o que há de mais atrasado e oligárquico na política, todos os governantes, independente de seus partidos e inclusive de suas convicções pessoais, se curvam diante das exigências da bancada evangélica, demonstrando claramente que até mesmo a constituição, que fala em um Estado laico, não passa de papel molhado.

Dilma seguiu à risca as determinações da bancada evangélica

O tamanho da influência da bancada evangélica e o tanto que o governo Dilma se submeteu sem hesitar a seu poder pode ser facilmente constatado ao lembrarmos da subida do Pastor Marco Feliciano ao posto de presidente da Comissão de Direitos Humanos da câmara. Gerando inúmeros protestos na comunidade LGBTT, o pastor pretendia utilizar esse cargo para incentivar a homofobia e o machismo presentes no Estado, aprofundando os ataques que já hoje existem. O PT, tentando salvar sua imagem diante de setores feministas e LGBTT que têm ilusão em seu governo, fez declarações públicas contra o projeto da reacionária “cura gay” que Feliciano propôs. Mas, quem colocou o pastor na comissão foi o próprio governo...

Além disso, podemos lembrar do episódio em que Dilma recuou diante dos protestos dos evangélicos quando propôs o lançamento do kit anti-homofobia nas escolas, apelidado pela bancada como “kit-gay”. A bancada evangélica tem como um dos pontos fundamentais de sua atuação a defesa da “liberdade de expressão” e “liberdade de culto” nas Igrejas para instigar a homofobia em seus fiéis, perpetuando a opressão que leva a crimes como o que ocorreu recentemente contra João Donatti. O poder da bancada evangélica é diretamente proporcional à homofobia no Brasil, um dos países com o maior índice de crimes de intolerância contra os LGBTT.

Nessa eleição, segue o “beija mãos”

Nenhum dos candidatos da burguesia escapa às “declarações de amor” aos princípios dos pastores. A inauguração do “Templo de Salomão” da Igreja Universal de Edir Macedo – que custou nada menos do que R$ 680 milhões de reais – foi um palco para que esse demonstrasse sua imensa influência. Enfiada numa lama de escândalos, que vão desde fraudes fiscais até a exportação de terra contaminada para o campus da USP Leste (EACH), a construção do templo é, em si, uma “demonstração de poder” de Edir Macedo, que controla sua própria rede de televisão, a Record, hoje a principal rival da Globo. Na inauguração compareceram Dilma, Alckmin e Haddad para “prestigiar” Edir Macedo.

Em 2010, a ofensiva da bancada evangélica garantiu que Dilma declarasse publicamente que não faria nada para legalizar o aborto. Dito e feito. Milhares de mulheres seguem morrendo no país em decorrência de abortos clandestinos, e nessa eleição todos os candidatos já garantiram que seguirão esse “mandamento”.

Em relação à homofobia, mesmo as tímidas concessões que apareciam no programa de Marina Silva para tentar angariar um eleitorado LGBTT não resistiram 24 horas ao pronunciamento de mais um dos “todo poderosos” da igrejas evangélicas: bastou Silas Malafaia se pronuncia em seu twitter para a candidata soltar uma “errata” de seu programa, levando à renúncia de seu coordenador de campanha para a questão.
Aécio, por sua vez, compareceu a um evento em que elogiou a “grande parceria” com as igrejas na queda da evasão escolar em Minas e disse que “Tudo tem jeito sim. Desde que se tenha fé, humildade e se possa permanentemente louvar a Deus.”

Pela separação entre Igreja e Estado

Enquanto o Estado continuar se submetendo aos dogmas obscurantistas de uma ou outra Igreja, não há como garantir os direitos das mulheres e LGBTT. É necessário retomar a tradição revolucionária desde a Comuna de Paris, em que os trabalhadores, ao tomar o poder, instituíram imediatamente a separação entre Igreja e Estado confiscaram as terras da Igreja Católica. Não se trata de proibir qualquer tipo de religião: pelo contrário, hoje, no Brasil, os que mais pregam a intolerância religiosa contra as religiões afro-brasileiras são justamente as Igrejas evangélicas, baseadas em pressupostos racistas que datam dos tempos coloniais.

O fundamental é que o Estado reconheça a fé como uma questão de consciência individual e privada, e que se as Igrejas quiserem sobreviver, que vivam da contribuição espontânea e voluntária de seus fiéis, sem desfrutar de benefícios e regalias como têm hoje, com isenção de impostos e o uso de sua influência para conseguir seus benefícios, como a aprovação sancionada por Lula do dia nacional da Marcha para Jesus.

Contra o obscurantismo que, por trás de uma máscara de fé, prega o ódio e a intolerância contra os direitos civis mais elementares, como o direito ao aborto ou ao matrimônio igualitário, só a classe trabalhadora pode oferecer uma perspectiva progressista.

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