Quarta 24 de Abril de 2024

Internacional

Matérias-primas, emergentes: a China será a próxima a cair?

16 Dec 2014 | Desde o começo do ano viemos alertando a entrada de uma nova fase da crise econômica mundial, com epicentro nos países semicoloniais e dependentes. Nas últimas semanas, esta crise vem se acelerando.   |   comentários

Em março, nos perguntávamos se estava se abrindo uma nova fase da crise mundial. Na semana passada houve uma aceleração da tendência à queda das matérias-primas, acompanhado por um importante enfraquecimento das divisas, o que aconteceu não somente com o rublo russo e em países como Ucrânia e Venezuela, mas também em algumas das economias mais fortes como Brasil, México e (...)

Em março, nos perguntávamos se estava se abrindo uma nova fase da crise mundial. Na semana passada houve uma aceleração da tendência à queda das matérias-primas, acompanhado por um importante enfraquecimento das divisas, o que aconteceu não somente com o rublo russo e em países como Ucrânia e Venezuela, mas também em algumas das economias mais fortes como Brasil, México e Turquia.

Parece que o fim de ciclo dos chamados países emergentes está adquirindo uma dinâmica irreversível, crise esta cujas bases estruturais explicamos neste artigo.

Uma nova crise da dívida como em 1980 ou uma crise asiática amplificada?

À medida que o petróleo, as commodities e as moedas dos “emergentes” sigam caindo, vai ficar mais difícil para os países, corporações e instituições financeiras obter os recursos para pagar a enorme dívida em dólares. A grande questão é se, no marco do fortalecimento do dólar, este processo vai levar ao mesmo tipo de estresse que vimos na crise da dívida latinoamericana na década de 1980 ou a crise da Ásia Oriental/Rússia no final da década de 1990.

Mesmo que os mercados emergentes tenham um sólido muro de contenção de uns US$7,7 trilhões em cédulas, o último informe do Banco de Pagamentos Internacionais (Bank for Internacional Settlements, BIS) com sede na Suíça, adverte que estes estiveram incubando uma enorme bolha de crédito de US$ 9,1 trilhões desde 2008.

Esta bolha poderia estourar em qualquer momento, tanto por causa das condições internas (limites do modelo de desenvolvimento da China, dependência das matérias-primas em outros países) como externas (fim do relaxamento quantitativo norteamericano, temor de uma subida das taxas de juros da Reserva Federal), no marco das debilidades da economia mundial.

Diferentemente de outros episódios de endividamento externo, os governos têm menos dívida em dólares, mas foi substituída pela dívida em dólares das empresas, excessivamente nos mercados de bônus não bancários.

O acesso sem precedentes nem restrições aos mercados mundiais de capital permitiu às empresas e bancos de países emergentes pedirem enormes somas de dinheiro a uma taxa de juros historicamente baixa (1%).

Um instrumento financeiro que especialmente se desenvolveu foi a emissão em moeda estrangeira, que eram arrematadas pelos gerentes de ativos financeiros de risco ocidentais, ávidos de grandes lucros. Estes títulos de dívida internacionais chegam a um valor de 2,6 trilhões de dólares, dos quais três quartos foram emitidos em dólares, segundo informe recente do BIS.

Se o petróleo cai a 40 dólares o barril nos próximos meses, junto a outras matérias-primas, o impacto nas economias dos mercados emergentes, que vêm de forte desaceleração ou em recessão, vai ser importante. Provocará que suas moedas caiam ainda mais, gerando fuga de capitais, queda do crédito, freio aos investimentos, aumento da inflação e incapacidade das empresas e governos para financiar a dívida anterior.

Os países emergentes atuaram como contratendência à enorme queda depressiva de 2008/2009. Por sua vez, uma nova crise nestes países semicoloniais e dependentes, pode ser inclusive mais extensa geograficamente que os dois episódios mencionados. Por estes motivos poderia ter conseqüências mundiais gravíssimas.

China, a próxima a cair?

Entre julho e setembro, a China cresceu a uma taxa de 7,3%, uma cifra que confirma a progressiva desaceleração do gigante asiático durante os últimos anos. Este 7,3% é a menor taxa registrada desde o primeiro semestre de 2009, quando a China sofreu a forte investida da crise financeira internacional e seu PIB aumentou somente 6,2%.
Neste marco, as autoridades chinesas devem responder a uma rápida mudança nas condições internacionais, com a queda das commodities, o aumento das pressões deflacionárias, o fortalecimento do dólar, a significativa desvalorização da moeda japonesa, da zona euro, Coréia do Sul e outros países. Tudo isso no marco de fortes tendências a sobreacumulação e super-especulação do capital do seu modelo econômico esgotado.

A verdade é que depois da crise do Lehman Brothers, a explosão de crédito e dívida nos Estados Unidos e na China correram em paralelo. Com a dívida federal estadunidense subindo 150% em seis anos e o balanço do FED inflado em um 400%, o excesso de dólares foi inundando o Banco Popular da China (BPCh).

Simultaneamente, o Banco Popular da China deu via livre a uma histórica expansão do crédito interno chinês. Este crédito alimentou auges históricos da capacidade manufatureira e de construção de moradias.

Esta “bolha de crédito”, por sua vez foi fundamental para as bolhas dos mercados emergentes que tiveram um auge de financiamentos baratos, em economias relacionadas com as matérias primas.

Este circuito foi facilitado pela forte ligação da moeda chinesa ao dólar. Sua moeda ancorada ao dólar (dollar peg) assegurava que quando os fluxos financeiros chegavam à China fossem facilmente conversíveis no balanço em moeda local do Banco Popular da China e logo reciclados imediatamente aos mercados de ativos (securities) norteamericanos.

Esta forte ligação ao dólar permitia importantes fluxos especulativos. O mecanismo de paridade fixa com o dólar, existente nos países do sudeste asiático, foi uma das razões pela qual a crise se expressou de forma tão brutal quando a sobre-acumulação de capitais chegou ao limite a mediados da década de 1990. Sem embargo, na China este perigo está praticamente descartado devido ao enorme colchão de reserva chinês, de mais de 3 trilhões de dólares.

Mas, que a crise não se manifeste da mesma maneira que a crise asiática de 1997, não quer dizer que a economia chinesa não esteja exposta aos limites evidentes do seu modelo econômico e do inconstante contexto internacional.

Com uma massiva sobre-capacidade, uma margem reduzida de lucros e uma crescente tensão financeira, as manufaturas chinesas estão expostas a uma desaceleração mundial e pressões competitivas de preços.

O setor financeiro chinês, ultra inflado, poderia ser ainda mais vulnerável. Os ativos dos bancos chineses projetam terminar 2014 com um capital de 28 trilhões de dólares, triplicando assombrosamente o nível de 2008, segundo algumas investigações autônomas. Isto sem considerar o substancial “setor bancário na sombra” que aparentemente tem sido um bastião dos empréstimos de alto risco.

Levando em conta a diferente estrutura econômica de ambas economias, a norteamericana motorizada pelo consumo e serviços, enquanto a chinesa pelas exportações, o mecanismo do “dollar peg” é difícil que se possa manter estável. É ascendentemente disfuncional para a economia chinesa.

Se sua moeda segue atada ao dólar, sofrerá uma forte revalorização, o que resultaria em uma importante perda de competitividade internacional. Considerando o massivo setor exportador e a estabilidade social, é provável que a China desvalorize, levando a um salto da atual guerra cambial. O que agravaria a crise dos países emergentes.
Optar por uma revalorização da sua moeda, em contrapartida, poderia ser o mais adequado para seu reequilíbrio interno, mas no imediato, o custo para seu setor exportador geraria um forte deslocamento interno de difícil absorção para seu sistema político.

Como vemos, a nova fase da crise mundial põe a burocracia chinesa diante de dilemas graves, que vão influenciar no futuro histórico do país, nos anos e décadas que virão.

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