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Luta da fábrica Stefani na Argentina

09 Jul 2010   |   comentários

A luta dos operários ceramistas de Neuquén na Argentina, onde se localiza a fábrica controlada pelos operários, Zanon, parte do SOECN (Sindicato Ceramista de Neuquen) continua atuando em favor do movimento operário. Dessa vez, a luta se deu em torno da fábrica de cerâmica Stefani em Cutral Co, a maior fábrica de tijolos da região, que foi ocupada e posta para produzir sob controle operário desde meados de maio, depois de mais de seis meses de luta em defesa dos postos de trabalho. A novidade é que o sindicato ceramista levou adiante uma grande campanha política de massas com a população para conseguir o voto pelo SIM ao projeto de expropriação sem pagamento de indenização e estatização sob controle operário da fábrica.

A convocatória do governo de Cutral Co a um referendo para este 4 de Julho, pretendia boicotar o projeto exigindo para sua validação legal, a participação de metade dos votantes da cidade, quer dizer 13 mil eleitores e obter a maioria deles. Isso põe como condição aos operários de uma fábrica obter mais votantes do que o prefeito e todos os partidos no município nas últimas eleições. A direção do sindicato ceramista, revertendo a manobra do oponente, conseguiu se utilizar disso como uma ferramenta de apoio à luta operária.

Desde o Partido dos Trabalhadores Socialistas – organização irmã da LER-QI na Argentina, saudamos o triunfo do SIM que obtiveram os companheiros da Cerâmica Stefani com mais de cinco mil votos contra os 47 votos pelo NÃO obtidos pelo prefeito. Apresentamos abaixo, entrevista com Raul Godoy, dirigente do PTS e operário de Zanon.

JPO: Que conclusões podemos tirar da recente campanha pelo SIM no referendo em Cutral Co?

Raul Godoy: Para nós foi uma experiência muito forte. A campanha que levamos adiante a partir do sindicato para enfrentar a manobra do referendo está cheia de ensinamentos que vão muito além dos números eleitorais. O resultado em si mesmo é importante porque, como dissemos nos comunicados do sindicato, com mais de 5 mil votos superamos um limite político que é ter tirado mais que qualquer vereador do município. Isso dá legitimidade ao que verdadeiramente importa que é a ocupação e controle da produção sob controle operário da cerâmica, ante a perda de postos de trabalho que a patronal impõe. Se tivemos uma a favor em meio a tantas travas legais impostas pelo referendo, foi a memória histórica deste povo que sofreu a devastação do desemprego com a privatização da YPF, o que faz com que a luta pelo trabalho seja uma causa popular.

Mas, além disso, a campanha mostrou uma ofensiva política dos trabalhadores, em uma nova experiência que significa um sindicato classista buscando apoio político na população. Há que levar em conta que conseguimos, nas eleições em que o Estado não te obriga a votar, como nas eleições gerais, que uma faixa importante da população de Cutral Co se mobilize por vontade própria em respaldo aos trabalhadores. É mais importante, todavia, se temos em conta que se colocou os métodos de ação direta dos ceramistas, o corte de rua pelo qual há 14 companheiros e companheiras sendo processados; e a ocupação de fábrica, no marco de que na província há um ataque ao direito de greve contra os docentes, com a Lei de Emergência Educativa de Sapag, que já tem meia sanção. Ante isso são é uma tendência oposta os mais de 5000 votos pelo SIM no referendo, um respaldo a um território de controle operário para o que conquistamos uma retaguarda social muito importante disposta a fazer algo em sua defesa. Nos dias depois do referendo choviam telefonemas em favor dos trabalhadores da Stefani.

JPO: Um grupo de companheiras nos contou uma anedota sobre uma mulher que se pôs a chorar porque não atendia às exigências para votar. Era a companheira de um operário falecido e ex-trabalhador da Stefani, demitido pela empresa, e tinha um sentimento de vingança de classe enorme. Ao não poder votar se pôs a militar em seu bairro para que outros vizinhos votassem. Há muitas anedotas que expressam esta solidariedade...

RG: Não caberia nesta entrevista todas estas histórias. Os petroleiros que saíram nos meios de comunicação por nós, os motoristas da cooperativa El Petróleo que puseram à disposição carros, as mais de 100 pessoas que participaram na assembléia dos fiscais com grande protagonismo dos docentes do município de Cutral Co, as demonstrações de apoio quando passamos pelos bairros e as pessoas saíam a aplaudir.

Como nova experiência tomamos muitas medidas de organização próprias de uma eleição, como a preparação de todo o material de divulgação, organizamos 10 postos de informação em cada bairro, e organizamos o transporte daqueles que precisaram. Tudo isso tornou a votação de 4 de julho uma jornada de luta, não uma eleição “normal”. Mas, uma de todas as medidas mais notáveis foi a militância conjunta de operários e estudantes casa por casa se pode aplicar também nas greves, não necessariamente só nas eleições, como para rodear de apoio popular com uma greve por salários, contra demissões ou que seja.

LVO: Houve além disso uma campanha de exigência às direções sindicais e de apelar ao ativismo e a base dos sindicatos, em especial da CTA. Que conclusões isso traz?

RG: Foi uma campanha militante com cartas políticas de chamados de rente-única dos sindicatos, de tratar de agrupar os setores mais ativos em comitês de apoio às campanhas, e de pronunciamento na base, seja em assembléias ou com centenas de assinaturas nos hospitais reivindicando que a CTA se defina por Stefani. Conseguimos que as direções locais da ATE (Asociación de Trabajadores del Estado) fizesse uma conferência na própria fábrica chamando seus afiliados a votar pelo SIM. Isso foi produto da força da campanha. Para que os leitores tenham uma idéia o secretário geral da ATE, Contreras, no dia seguinte à conferência de imprensa pelo SIM repudiou o corte de rua dos trabalhadores do Hospital Castro Rendon por salário. No caso dos dirigentes da ATEN dizem que há pensar formas “mais criativas” de luta que as greves, no marco em que deixam passar sem luta a Lei de Emergência Educativa que ataca o direito de greve. Por isso vamos seguir reivindicando um plano de ação dos grandes sindicatos da província que se pronunciaram pelo SIM. Por que com o apoio de milhares de votos conseguimos isolar as tentativas de desalojamento, mas vamos reivindicar medidas de ação contra a perseguição aos que lutaram por cortarem as ruas, e que nos acompanhem nas marchas que o sindicato está chamando para reivindicar uma resposta do governo aos mais de 5000 votantes pelo SIM.

JPO: O que o governo disse depois do referendo?

RG: Acusou de golpe. Ainda que os meios tratem de dar a idéia de que os operários de Stefani não conseguiram seus objetivos porque não tiveram os 13 mil votos exigidos legalmente para que o projeto de expropriação passe, o governo depois de um dia de silencio ante o resultado fez declarações que não quis se chocar de frente com os milhares de votantes. A verdade é que por baixo fizeram de tudo contra a ação dos trabalhadores. Não só que os operários de Stefani são perseguidos por cortarem as ruas, como também usaram as chantagens do Estados contra os companheiros desempregados, que nos diziam que nos apoiavam mas que se votassem perderiam os planos de assistência. Esta coerção do prefeito e do Estado temos que superar buscando uma aliança de unidade da classe como a que em seu momento tivemos em Zanon com o MTD (movimento de trabalhadores desempregados) na Coordenadora do Alto Valle, que foi o maior movimento de desempregados da província e estava arraigado nos bairros do oeste da cidade de Neuquen. A última assembléia de Stefani se aproximou um grupo de desempregados de Cutral Co que recebem planos de assistência e vieram nos felicitar por ter conseguido e se solidarizar. Nós nunca pensamos que com fábricas isoladas, ainda que sob controle operário poderíamos sobreviver separados do destino do resto da classe trabalhadora. Vemos a gestão operária tanto em Zanon como de Stefani como pontos de apoio, um exemplo que nos momentos de crise capitalista poderão se generalizar como saída ante o fechamento de fábricas, e agora defendemos colocá-las a serviço de um plano de obras públicas que possa dar trabalho a todos.

JPO: Como segue o plano ceramista?

RG: Discutimos em uma nova reunião da Comissão Diretiva do SOECN um amplo plano de ação. Começamos por convocar uma nova reunião multisetorial a todas as organizações solidárias para fazer um primeiro balanço, as sessões da ATEN opositoras, da ATE independentes das direções burocráticas, as internas de varias fábricas e estabelecimentos da região com os quais viemos compartilhando várias batalhas em comum, os estudantes combativos e os organismos de direitos humanos. Vamos dar os passos a seguir na luta de Stefani e propor uma campanha em defesa do direito de greve dos docentes e contra a perseguição e os ataques judiciais aos que lutam. Em segundo lugar queremos votar a convocatória em comum, entre todas as organizações, a uma reunião ou encontro regional de todos os setores burocráticos e classistas para obter um pólo que dialogue com os milhares e conquiste cada vez mais expressão nos grandes sindicatos.

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