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Cultura

RIO DE JANEIRO

Justiça brasileira nos faz reviver os tempos da ditadura: a censura de “A Serbian film”

11 Aug 2011   |   comentários

Há 26 anos não se proibia uma peça, censurava um filme inteiro a qualquer audiência e muito menos apreendia-se a película. A mando do DEM a justiça do Rio recriou os tempos do AI-5.

A iniciativa para essa empreitada foi do ex-prefeito do Rio, César Maia (DEM), e seu filho, o deputado Rodrigo Maia, com seus advogados de plantão, que entraram com uma ação civil pública para impedir que o filme “A Serbian Film – Terror sem Limites” (2010) – longa-metragem do diretor sérvio Srjdan Spasojevic; fosse exibido no Rio. O longa, estrearia dia 05 de agosto na cidade, e teria uma exibição na Caixa Cultural no dia 23 de julho durante o Festival de Cinema Fantástico do Rio de Janeiro (“RioFan”), mas logo foi retirado da programação por ordem da Caixa Econômica Federal. Foi programada então uma sessão para o mesmo dia no Cine Odeon que não chegou a acontecer. Com a exibição proibida no Rio de Janeiro por decisão da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio de Janeiro, a película do filme foi apreendida um dia antes.

Esta medida inédita, sem precedentes desde ao menos o final da ditadura é um absurdo que precisa ser denunciado por toda organização de direitos humanos e da esquerda. Não podemos permitir o retorno do arbítrio de uma juíza, pressionada pela bancada do DEM, sobre o que podemos ou não ver. É o retorno do AI-5 e suas aulas de “moral e cívica”.
Cerca de 150 pessoas se reuniram no dia 02 de agosto em frente ao Cine Odeon para protestar contra a censura, e diversos jornalistas, cineastas, atores e atrizes, roteiristas, ativistas, críticos, entre outros, assinaram um abaixo assinado “Censura não”, repudiando a medida.

A justificativa para a censura do filme foi baseada na afirmação de que era “um filme com pedofilia” (veiculada pelo diário Folha de São Paulo), o que foi contestado, com o envio inclusive do making off do filme para esclarecer quaisquer questionamentos. Mesmo assim, o filme, que já foi exibido em festivais em Porto Alegre (RS) e São Luís (MA), bem como em Belo Horizonte (MG), segue censurado no Rio. É preciso estarmos atentos, pois quando o Estado burguês aplica uma medida antidemocrática, sem demora esta pode se voltar e se aprofundar contra os trabalhadores e o povo. E diante disso, devemos dizer todos e todas: “Censura não”!

Não entrando no mérito sobre a qualidade do filme em si, ou ainda sobre se a empreitada do diretor de realizar uma metáfora para a situação política da Sérvia (conforme declarou em entrevista) foi bem sucedida ou não, não cabe ao Estado burguês e sua “justiça” decidir o que pode ou não ser exibido. Cabe sim ao público, julgar, e ter condições para tanto, se manifestar sobre a obra artística, criticar, apreciar ou não. Num estado como o Rio de Janeiro, com altíssimos índices de mortes por “auto de resistência”, onde um desconhecido número de meninos Juans são assassinados (e ocultados?) pela polícia ano a ano, é no mínimo hipócrita destes senhores do DEM e da chamada “justiça” encabeçar essa censura dizendo supostamente defender o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), já que, diferentemente de uma mera ficção, a polícia espanca, assassina e estupra dia-a-dia. Retrato da realidade, e não mera ficção, a polícia brasileira pode torturar e assassinar jovens negros impunemente (herança da impunidade dos torturadores e assassinos da ditadura), mas um filme que representa este nível de brutalidade é proibido? Deveríamos nos perguntar também: onde está a “justiça” e o ECA para crianças e adolescentes das periferias e favelas? A realidade social do Rio (de assassinatos à invasão dos lares pela polícia), o recente retorno das prisões políticas do ato contra Obama, e agora, a censura artística, demonstra como direitos democráticos estão sendo violados na cidade que irá sediar mega eventos internacionais, como a Copa em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Se não combatemos desde já, o que virá depois com o aprofundamento da crise econômica mundial? É preciso nos preparar! Nenhuma censura! Não aceitemos que este Estado nos diga o que podemos ou não ver ou pensar! Que a violência contra as crianças e as mulheres, a homofobia, o racismo e a política genocida perpetrada pelo Estado e seus agentes sejam combatidos com a auto-organização de todas e todos violentados, expropriados de si mesmos, oprimidos e explorados pelo capitalismo!

NOTA: No fechamento desta edição, fomos noticiados da proibição, pelo Ministério Público Federal de Minas Gerais, da exibição deste filme em todo o território nacional – o que vem como um grande exemplo de como o reacionarismo da burguesia carioca não é exceção, senão regra, do reacionarismo de conjunto da burguesia nacional e da incapacidade desta classe parasitária em sustentar e levar adiante demandas democráticas mínimas. Que o povo pobre, sem nenhuma espécie de aliança com a burguesia, abra os caminhos para o livre desenvolvimento da produção artística!

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