Sexta 19 de Abril de 2024

Movimento Operário

A Primavera de Melfi: Operários da Fiat enfrentam a polícia em piquetes

Itália: vitória operária na Fiat

12 May 2004   |   comentários

“Inicio de outra história” , “Vitória em Melfi” , “Primavera em Melfi” . Assim a imprensa de esquerda italiana intitulou o triunfo dos trabalhadores da Fiat. Vinte e um dias de luta com métodos radicalizados que incluíram greve, assembléias massivas, piquetes operários nos portões, enfrentamentos com a policia, e paralisações em solidariedade ao longo da península. Com o pano de fundo do rechaço popular à participação italiana no Iraque, uma profunda crise económica, protestos sociais aumentando e um crescente desgaste do governo Berlusconi mais uma vez a classe operária italiana volta a ocupar o centro da cena política. Segundo alguns meios de comunicação este é o primeiro acordo, depois de 25 anos, que se chega na Fiat no qual se levam em conta as demandas dos trabalhadores e não as necessidades da patronal.

No postergado sul da Itália, mais precisamente na cidade de Melfi na região de Basilicata, a multinacional Fiat, montou há mais de 10 anos uma planta industrial modelo, subsidiada pelo Estado, na qual trabalham mais de 5.000 operários. Esta planta tinha duas importantes características, por um lado possuía alta tecnologia de ponta e por outro os melhores índices de produtividade dentro do grupo, contando para isto com os piores salários, turnos desumanos e um regime de perseguição disciplinar permanente contra seus trabalhadores. Era a apresentação de um novo regime de trabalho, que era aceito pelas distintas centrais sindicais, pela patronal e pelo conjunto do arco político. Nesse sentido Melfi era todo um símbolo do pacto social italiano.

Em meio a importantes lutas, que vêm se dando tanto com as “greves selvagens” dos condutores de ónibus de Milão, e com a dura luta dos trabalhadores da Alitalia, em defesa de seus postos de trabalho (que cancelou mais de 1.300 vóos), os operários metalúrgicos paralisaram e organizaram piquetes na planta de Melfi reivindicando, como principais pontos, aumento de salário equiparado com o resto dos trabalhadores da Fiat, contra o regime de rotação extenuante e pelo fim das medidas disciplinares levadas adiante pela patronal.

Para reverter esta situação, era necessária uma luta à altura das circunstâncias, já que a patronal também contava com a anuência de duas centrais sindicais, a UIL (social-democrata) e a CISL (católica).

Em 19 de abril, uma vez iniciada a medida de força e o piquete nos portões de fábrica, o conjunto dos meios de comunicação e grande parte da burocracia sindical falavam aos quatro ventos que estes métodos selvagens não levavam a nenhuma parte, que estavam por fora da relação de forças e que havia que discutir civilizadamente, ao mesmo tempo que a patronal e o governo mandavam a policia para rodear os piquetes e tentavam fazer entrar centenas de pelegos. A UIL e a CISL, pactuaram com a patronal às costas dos trabalhadores acordos que não satisfaziam nenhuma das demandas. Produto da pressão das bases, o mediador, o sindicato metalúrgico FIOM (com peso da Refundazione Comunista na sua direção), se opós a assinar dito acordo. Cabe destacar que a central operária de esquerda, a CGIL, apesar de não ter assinado o acordo, estava contra o método dos piquetes.

Em meio à traição aberta de um setor da burocracia sindical, os operários aprofundaram suas medidas. Enquanto isso, ia crescendo a simpatia e a solidariedade dos trabalhadores de distintos pontos e fábricas da Itália. Em 26 de abril o governo e a patronal buscaram dar um lição: reprimiram os piquetes e trataram de que entrasse um grupo de pelegos, ao que os trabalhadores resistiram, com um saldo de 10 operários e 3 policiais feridos. De forma urgente a FIOM, junto aos COBAS (Comitês de Base) chamou uma greve de 4 horas na indústria metalúrgica; que foi bem sucedida. Em algumas plantas se parou durante toda a jornada e em alguns estabelecimentos, como por exemplo, na planta de Mirafiori (em Turín, a maior da Fiat com mais de 11.000 trabalhadores) os operários marcharam ao grito de “Viva os métodos de Melfi” e “Todos somos Melfi” , o mesmo na Alfa Romeo em Pomigliano e em Val di Sangro. No fábrica da Fiat de Termini Imerese (Sicilia) se organizou um fundo de greve de mais de 25.000 euros.

Frente a operários que não se dobravam e que não estavam dispostos a se render por meio da repressão e frente a um estado de ânimo que começava a contagiar o coração dos operários industriais da Itália, a patronal tenta uma negociação, na qual reconhece o RSU (comissão interna) via o sindicato FIOM e os COBAS o direito a participar das negociações com a condição de levantar os bloqueios à fábrica e de voltar ao trabalho.

A direção da FIOM tenta convencer os trabalhadores a aceitar a proposta da patronal, e estes votam que apesar de que levantavam os bloqueios, continuavam com a paralisação e guardas nas portas de acesso. A patronal se vê obrigada a negociar sob estas medidas de força. Tendo a seu favor vinte e um dias de uma luta exemplar, e uma perda para a patronal de mais de 200 milhões de euros e mais de 21.000 autos; os trabalhadores conseguem impor suas demandas e se levantam as medidas mediante assembléias cheias de euforia e alegria.

Os trabalhadores conseguiram, entre outras coisas: o fim de duas semanas com o mesmo turno, agora se rodizia a cada 7 dias, se trabalha uma semana 6 dias e a seguinte 4, com o domingo sempre livre. Aumento escalonado durante 2 anos e licenças sindicais. A parte se cria uma comissão para revisar as medidas disciplinares aplicadas no último período. Alguns velhos operários diziam que isto se parecia às assembléias de 68, no sentido de rememorar as batalhas operárias que em sua maioria terminavam em triunfos. No fechamento desta edição todos estes pontos estão sendo levados para um referendum na base da fábrica.

Esta vitória que alguns meios denominam histórica, já que faz dar uma virada de página na relação de forças estabelecida pela patronal, que buscava mediante “fábricas tumba” , melhorar os tempos de produção, fazendo cair sobre as costas dos trabalhadores as conseqüências da crise económica em que se encontra o imperialismo italiano.

Devemos tomar em conta que o que se vinha dando nos últimos anos, em que o movimento operário italiano aparecia mediante massivas e êxitosas greves gerais, como oposição política a Berlusconi.

Nos últimos tempos, em alguns lugares está passando a ofensiva onde além de utilizar métodos de luta mais radicalizados, começa a questionar a burocracia sindical, decidindo-se sobre as medidas a tomar mediante assembléias e a cercar com solidariedade ativa aos trabalhadores em luta.

Os operários de Melfi contando com o apoio de seus irmãos de classe do resto da Itália, demonstraram que se pode torcer o braço da grande patronal, como é a Fiat.

O Partido de los Trabajadores Socialistas (PTS) é a organização irmã da LER-QI na Argentina, e também faz parte da Fração Trotskista - Quarta Internacional

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