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MÉXICO

Guerrero é um barril de pólvora com uma forte energia explosiva

20 Oct 2014   |   comentários

Há 20 dias do massacre de normalistas de Ayotzinapa e desaparecimento de 43 desse jovens, a indignação popular cresce no país, assim como o desprestígio do Presidente Enrique Peña Nieto que há apenas alguns meses era elogiado pela revista Times e pelos organismos financeiros internacionais por alcançar o "milagre mexicano" (a privatização da Pemex).

Longe de conter o descontentamento frente aos assassinatos dos jovens estudantes, cresce o rechaço às declarações demagógicas e impotentes do presidente e seus principais funcionários, para além da percepção generalizada de que Peña Nieto protege o governador repressivo Aguirre Rivero.

O discurso oficial soa como o do "velho" PRI, aquele dos anos 70. Foram anos de autoritarismo e perseguição contra a juventude: Tlatelolco em 68, o halconazo em 71 e a guerra suja dos 70 e 80.

Ações pelo reaparecimento dos jovens normalistas

A memória histórica e a volta do "novo" PRI provocam mobilizações por todos os lados no país, como há anos não se viam no México. A juventude estudantil é a que se expressa, fundamentalmente, na Cidade do México e em vários estados, realizando paralisações ativas em 35 escolas, com assembléias agitadas e bloqueio de avenidas, ou com a concentração e marcha de hoje (16/10) na Cidade Universitária de milhares de estudantes para a recepção dos companheiros de Ayotzinapa no campus.

Enquanto isso, o magistério de Guerrero - depois de incendiar há dois dias o edifício do Congresso do estado - fecha avenidas, ocupa sucursais bancárias, edifícios públicos e de governo, restaurantes da cadeia estado-unidense McDonald’s, e prepara para a próxima sexta uma paralisação estadual de trabalhadores exigindo a queda do governador Ángel Aguirre Rivero e a prisão e punição para o Presidente Municipal de Iguala, José Luis Abarca Velázquez, que está foragido. A esses protestos se somaram trabalhadores aposentados e pensionistas do magistérios, que exigem o pagamento das dívidas atrasas em títulos de pensões e o Sistema de Orçamento para Aposentadoria.

Além disso, integrantes da Federação de Estudantes Camponenes Socialistas do México ocuparam três transmissoras de rádio em solidariedade aos normalistas de Ayotzinapa, enquanto em Michoacán 2.000 viajam para Guerrero se solidarizando aos companheiros estudantes e, longe de saírem dos caminhões tomados das empresas de transportes, serão escoltados até o incendiado estado do Sul.

É uma dinâmica que pode facilitar o surgimento de protestos de distintos setores, como os camponeses dos municípios de Nacajuca, Cárdenas e Comalcalco, que fecharam as instalações da Secretaria de Governo exigindo o cumprimento de quatro minutas que discorrem sobre os benefício de mais de três mil famílias afetadas pela atividade de Petróleos Mexicanos (Pemex) em suas comunidades. Pelos altos, o conservador PAN exige a decadência de poderes na entidade para aproveitar este enfraquecimento conjuntural do governo.

Produz-se um coquetel tão explosivo que até os meios de comunicação estão se precavendo da tradicional demonização que dão a essas ações. A situação deu um giro, e hoje o governo está na defensiva, sem dar resposta ao desaparecimento dos normalistas e sem poder justificar a fuga do Presidente assassino do Município de Iguala, e onde cada vala clandestina descoberta ameaça aprofundar a crise deste governo e alavancar as mobilizações contra o presidente. Por hora, é um governo "tolerante", "aberto às opiniões divergentes" e "respeitoso com os direitos democráticos".

A luta de classes que o regime de partidos (PRI, PAN, PRD) vinha contendo passa hoje a se expressar, questionando indiretamente o Pacto por México e suas consequências. A pólvora de Guerrero tem um rastro muito comprido, que pode repercutir nos alicerces da Cidade do México. Fica demonstrado, assim, que a democracia mexicana não é assim tão perfeita.

A crise de credibilidade alenta a mobilização

O escândalo contra a repressão selvagem imposta sobre os normalistas cresce e se internacionaliza cada dia mais. A imagem de Peña Nieto, já deteriorada, enfrenta a preocupação dos capitalistas estrangeiros pelo desprestígio de seu sócio na semicolônia mexicana.

Em várias embaixadas, estudantes de outros países realizam atos de repúdio ao massacre de Iguala e exigem a aparição com vida dos normalistas desaparecidos.
Ao calor da impotência do governo de fechar a crise imediatamente, se desenvolve uma tendência à frente única de estudantes e da juventude - como mostram-nos os patos de escolas em solidariedade a Ayotzinapa - e tende a crescer o movimento democrático que congrega distintos setores. Ao passo que o movimento do Instituto Politécnico Nacional continua pressionando com suas demandas e atuando - indiretamente - como base do descontentamento nacional.

A indignação... Às ruas

O povo nas ruas mostra sua indignação com a brutalidade policial e a cumplicidade dos servidores de Estado com o narcotráfico. A ingovernabilidade e a impunidade apontam o novo governo como o responsável. E ainda que a toda a população não vá a luta, acompanha moralmente o descontentamento e as demandas dos que hoje se mobilizam.

Para refrear a mobilização, Peña Nieto teria que resolver por completo as demandas de outro ator central na mobilização: o movimento politécnico que, ao confiar em uma negociação imediata com o governo, passou a desconfiar do mesmo e a exigir uma solução já.

A partir daí, uma saída vitoriosa para a luta politécnica fortaleceria o setor estudantil, e alavancaria a necessidade da organização do movimento a nível nacional para frear o ataque a educação. Isto significa um golpe para os planos do PRI de instaurar outro período histórico no poder, se ganhar a maioria dos nove governos que disputam nas urnas no próximo ano.

Seja como for, o governo em associação ao narcotráfico estão muito deslegitimados e a "rua" começou a se fazer ouvir.

Isto, no marco de uma crise que não se fecha e o anúncio de uma queda de 25% dos preços internacionais do petróleo, e a previsão do Fundo Monetário Internacional da baixa de crescimento mundial, que reduzem as marchas de manobra do que foi nomeado por alguns meses de milagre mexicano.

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