Sexta 29 de Março de 2024

PUC

Entrevistamos Bia Abramides, professora da PUC-SP sobre a luta de estudantes, professores e funcionários

15 Feb 2013   |   comentários

Nos últimos meses de 2012 se desenvolveu uma importante e destacada luta de professores, estudantes e trabalhadores da PUC-SP. O Jornal Palavra Operária esteve presente em atos e manifestações defendendo um movimento independente para que a comunidade triunfasse contra a Fundação São Paulo, pelo “fora” Anna Cintra e por nenhuma ilusão em Dirceu de Mello (leia nossa declaração em http://www.ler-qi.org/spip.php?article3698). Publicamos a seguir entrevista de com Bia Abramides, professora de Serviço Social da PUC-SP sobre a luta da comunidade universitária no último semestre.

1) Qual é o papel da Igreja na PUC-SP? Essa intervenção nas decisões
políticas da universidade é algo novo?

A PUCSP tem a Fundação São Paulo-FUNDASP, como sua mantenedora que é da Igreja Católica. Isto se dá desde a criação da PUCSP, em 1946, ou seja, há 67 anos. Porém a PUC não pode se confundir, se diluir, se dissolver na FUNDASP. A PUC é uma universidade e como tal tem que ter autonomia e democracia, estar desvinculada da Fundação. A Intervenção política na Universidade não é algo novo. Nos anos 80 a PUCSP sofreu intervenção da Fundação por conta da questão administrativa. Depois conseguiu-se retomar a autonomia da PUCSP. Porém, a partir de 2005, na gestão da reitora Maura Veras, a PUC sofreu nova intervenção da Fundação que permanece até os dias atuais. Naquele período ocorreram as demissões em massa de professores e funcionários, chegando a quase mil trabalhadores demitidos. Houve a invasão da tropa de choque durante a ocupação da reitoria pelos estudantes, e sindicância a 12 alunos que participaram do movimento de ocupação contra o redesenho institucional. Desde então tem ocorrido uma sucessão de medidas de destruição do ensino e do trabalho: o não pagamento dos 7,66% devidos de reajuste aos professores desde 2005, tabelas salariais diferenciadas para a mesma função, repressamento na ascensão da carreira, maximização de contratos, com uma sobrecarga de trabalho, redesenho institucional em acordo com a Fundação, numa lógica instrumental racionalista, criação do CONSAD-Conselho da Administração, acima do Conselho Universitário com três votos: o do reitor e dos dois padres que representam a FUNDASP. Em relação aos alun@s um aumento das mensalidades acima da inflação, redução de bolsas, e, em relação ao ensino, curso aligeirados, cursos de ensino a distancia. Para os funcionários além da redução numérica, estão com plano de carreira bastante defasado. Para enfrentar a questão financeira em 2006, a PUCSP juntamente com a FUNDASP se curvaram aos bancos, Santander e Bradesco, que passaram a ditar como a universidade deveria ser saneada, o que consubstanciou nas medidas que recaíram sobre funcionários, professores e estudantes. Em 2012 ocorreram as eleições e o Cardeal indicou para assumir a reitoria, a terceira e última colocada no pleito. Desde 80 a PUC tem eleições diretas para reitoria, e, embora estatutariamente haja a lista tríplice encaminhada ao Cardeal para sua indicação, durante 32 anos, o Cardeal sempre indicou @ reitor(a) escolhida pelos três seguimentos: estudantes, professores e funcionári@s, o que garantia a soberania das urnas.

2) Qual a relação entre o processo de elitização e o projeto da universidade da FUNDASP?

O Projeto de Universidade da FUNDASP é o projeto da Igreja que pretende sempre formar seus quadros. Isso não é novo. Porém o Projeto da Igreja dos anos 60, 70, 80 estava identificado com um projeto humanista da Igreja vinculado a Teologia da Libertação, em toda a América Latina, longe da posição conservadora, reacionária que hoje está presente no Vaticano com Bento XVI. Nos anos 80 a PUCSP era a universidade privada mais barata do país, isto porque ao ser confessional recebia recurso público do Estado na esfera federal que reduziu drasticamente a partir dos anos 90. De fato o dinheiro público deve ser aplicado na educação pública, gratuita, universal, laica e ñao nas universidades privadas. Sabemos porém que com a implantacão do neoliberalismo desde 89 nos governos Collor, Itamar, FHC, Liula e
Dilma, mais acentuadamente pós FHC, os recursos públicos para educação
pública são irrisórios e a política desde o governo Lula, é a de deslocar uma parte do recurso público para a esfera privada pelo Prouni, que é um programa "salvacionista" `a inadimplência do ensino privado e que cada alun@ neste corresponderia a possibilidade de três alun@s cursarem na universidade pública. Na universidade pública também tem ocorrido uma precarização do ensino com a implantação do Reuni como um programa que desqualifica o ensino e precariza o trabalho. A contrareforma do ensino superior no país está subordinada aos interesses do grande capital, do FMI, da OMC que dita sua programática no âmbito internacional. A PUCSP sobrevive das mensalidades que estão cada vez mais caras, elitizando cada vez mais o ensino, e precarizando cada vez mais as condições de trabalho. Um número significativo de cursos que são considerados de baixa procura, na realidade são cursos com demanda reprimida, pois @s alun@s que procuram esses cursos não tem poder aquisitivo para pagá-los e assim se inscrevem nas universidades privadas mercantis, em que a mensalidade é bem inferior. Esses cursos são basicamente da área das ciências sociais, da educação, do serviço social, de letras, da filosofia. Ao invés de se pensar em mensalidades mais reduzidas para todos estes cursos, garantindo a existência dos mesmos, que dão sentido a uma universidade, esses cursos estão fechando turmas e poderão até ser extintos. Na realidade os trabalhadores e seus filhos não tem como suportar os preços das mensalidades. O caráter elitista se aprofunda nesta direção.

3) Como você enxerga a atitude da FUNDASP e de Dom Odilo na nomeação da prof. Anna Cintra- 3º colocada da lista tríplice - a reitora da PUC-SP?

Esta atitude coloca na prática a intervenção da Igreja na Universidade não somente do ponto de vista financeiro, mas também acadêmico, e de concepção de universidade. Creio que é uma atitude de ir às últimas consequências o projeto da Igreja para a Universidade. Este é um fenômeno mundial, em que a Igreja não suporta mais uma universidade como a PUCSP, mesmo com sua democracia extremamente limitada. Nos EEUU houve intervenção em PUCS progressistas, e, recentemente o Vaticano fez com que a PUC do Peru deixasse de ser PUC. Ou seja, segue o receituário ou se desvincula. Basta analisar as declarações da candidata ilegítima em que diz claramente que a PUC é da Igreja, e, portanto deve seguir a ela. Aí nos perguntamos como debater temas tão fundamentais como a questão do aborto, das drogas, da sexualidade, da criminalização dos movimentos sociais, da luta contra o capital e por uma sociedade igualitária, sem exploração de classe e opressão social, de gênero, étnico-racial, em uma universidade que possa vir a reprimir a liberdade de manifestação, expressão, do conhecimento e da práxis necessária a uma vida emancipada?

4) Na sua opinião até onde esse forte movimento democrático contra a Igreja na PUC-SP deveria chegar?

Na minha opinião a luta é longa. A nomeação da indicada por D. Odilo foi impugnada pelo CONSUN, pelo fato de ela ter publicamente se comprometido em não assumir, caso não fosse a primeira colocada, e assumiu. D. Odilo não acatou a deliberação do Consun que desomologou a lista tríplice e a colocou por mérito na ilegalidade por descumprimento da palavra. Houve uma liminar que reafirmou que a indicada está juridicamente impedida de assumir. A Fundação recorreu e aguarda-se o fim do recesso do judiciário para uma decisão definitiva. Acredito que teremos um início de ano com muita luta. Tivemos uma greve de estudantes, bem significativa, que foi ampliada com a greve dos professores, em muitos cursos, por um mês. Os estudantes, professores e funcionários devem seguir na Luta do Fora Anna Cintra, impedindo que assuma, por ser ilegítima e agora, ilegal por deliberação do CONSUN e do Judiciário. A proposta do Movimento é a de que façamos uma Convenção dos três setores para debater que PUC queremos, e aí temos que avançar com uma nova estatuinte, pois a que temos hoje é um remendo da anterior, negociada por cima, pela burocracia da PUCSP, com a Igreja, por ocasião do redesenho. De fato tem que se avançar na separação da PUC em relação á FUNDASP. Se tivermos força retomar a luta de imediato pela estatização. À Igreja não interessa esta forte mobilização, e vem a ameaça com Intervenção de nomeação direta, disseminada pelos setores que apoiam Anna Cintra. Na realidade Anna Cintra é já esta intervenção, o projeto que a Igreja quer sedimentar. “Contra a vontade do cardeal, a vontade Geral” e “Pela autonomia e democracia universitária”.

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