Quarta 24 de Abril de 2024

Internacional

CRISE MUNDIAL

Enquanto a recessão se aprofunda, a crise financeira não pára

29 Nov 2008   |   comentários

Resgate do Citigroup:
um novo salvamento
vergonhoso

O generoso resgate do CiItigroup
definido, entre outros, pelo
recentemente nomeado futuro secretário
do tesouro de Obama, Timothy
Geithner, atual presidente do Banco
Central de Nova York, junto ao
atual secretário do Tesouro, Henry
Paulson e o chefe do Banco Central,
Ben Bernanke, mostra que, apesar
de toda a demagogia de mudança do
novo presidente, são os interesses da
aristocracia financeira que ainda decidem
o rumo político dos EUA.

A queda do banco mais
importante do mundo:
ninguém está seguro

O tsunami financeiro foi transferido
do setor de investimentos
àqueles que até agora pareciam estar
a salvo: o setor comercial norte-americano.
Aquele que há dois anos foi o
maior banco do mundo, o criador do
conceito de holding financeiro, o Citigroup,
teve que ser resgatado pelo
governo urgentemente para evitar
uma quebra de conseqüências imensas
para o sistema internacional.

Até agora os grandes vencedores
da crise vinham sendo os
holdings financeiros, entidades que
combinam o setor comercial com o
de investimentos, já que seu negócio
tradicional de depósitos e financiamento
do consumo os oferecia
um colchão contra as fortes perdas
do setor de investimentos. Mas esta
situação mudou. O JP Morgan comprou
o Bear Stearns e o Wahington
Mutual, e o (anti-spam-(anti-spam-(anti-spam-(anti-spam-Bank)))) of America ficou
com o Merril Lynch, enquanto o Citigroup
se encontrava em uma situação
mais delicada: havia apresentado
perdas durante 4 trimestres seguidos
num total de 20 bilhões de dólares.

Em poucos dias, o banco que em
outubro era visto como um potencial
ganhador da crise creditícia e que se
preparava para devorar outros competidores,
caiu em desgraça. Na atual
crise financeira mundial não há ninguém
que esteja seguro.

A gota d”™água foi na semana
passada quando a cotação do banco
desmoronou (83% desde o começo
do ano e 60% só na semana passada)
pela desconfiança do mercado na capacidade
do Citi em seguir adiante,
pese o anúncio de 52.000 demitidos
e um corte nos gastos de 2 bilhões
de dólares. Isso desatou o temor de
uma retirada massiva de depósitos
de investidores institucionais, o que
provocaria a quebra da entidade com
2 bilhões de ativos e 200 milhões de
clientes em mais de 100 países.

Um novo degrau na
sustentação estatal dos
bancos

O resgate do Citigroup marca
um novo degrau no uso de fundos
públicos para sustentar o sistema.
Constitui a maior operação de resgate
até hoje, superando os 200 bilhões
de dólares usados na nacionalização
de Fannie Mae e Freddie Mac, e os
mais de 150 bilhões de dólares gastos
para respaldar o gigante do seguro
AIG (American Internacional
Group).

Depois de intensas negociações
entre o Tesouro, o Banco Central, a
Asseguradora Federal de Depósitos
(FDIC) e o Citigroup, foi aprovado
o maior resgate da história: 64,5 bilhões
de dólares em injeções e avais
por importe de outros 306 bilhões
de dólares [1]. Isso tudo em condições
generosas. O banco seguirá com seu
anunciado plano de reestruturação:
na semana passada anunciou 52.000
demissões em todo o mundo. Quando
se implementar esta redução seu
quadro se reduzirá de 350.000 postos
de trabalho para 300.000.

O último resgate do
Citigroup?

O pior de tudo é que, apesar
dos favoráveis termos e da expressiva
soma, a viabilidade do Citigroup
segue questionada. Suas ações ainda
não se recuperaram. Isto resulta dos
zig-zags das autoridades que há duas
semanas deixaram para trás o emblemático
plano de compra de ativos tóxicos
de 700 bilhões de dólares, para
garantir uma boa parte dos ativos
tóxicos do Citi e anunciar em 25/11
um novo plano de injetar até 800 bilhões
de dólares no sistema financeiro
para comprar hipotecas e valores
respaldados por ativos de duvidosa
eficácia.

Porém, o mais grave de tudo
é que não se pode determinar uma
grande parte dos ativos tóxicos do
Citi e de outros grandes bancos comerciais
dos EUA, como se deu com
o JP Morgan que foi absorvido pelo
Bearn Stearn incluindo boa parte
de seus ativos tóxicos (outra parte
foi entregue ao Estado). E não nos
referimos só aos créditos de consumo,
mas ao astronómico negócio
especulativo de derivados que pode
explodir a qualquer momento. O
dano inimaginável que uma queda
do Citi poderia causar salta à vista
quando fazemos a seguinte comparação:
o Citi possui uma participação
no mercado de cinco vezes o capital
do Lehman Brothers, o banco cuja
queda abriu uma nova etapa da crise
financeira.

Alguns analistas como o
ex-consultor de McKinsey, James
Kwak, em seu blog disse que o resgate
é “débil, arbitrário, incompreensível”
e agrega: “... o Citi tem mais
de 2 bilhões de dólares em ativos e
várias centenas de milhões de dólares
passivos (dívidas) fora de balanço.
Vinte bilhões é uma gota em um
balde.

A semana passada Friedman
Billings Ramsey estimou que o Citi
necessitava de 160 bilhões em novo
capital... Se, há 306 bilhões de dólares
em garantias de ativos (os quais
não se desembolsarão até que se esgotem
esses 20 bilhões), há 2 bilhões
em outros ativos, muitos dos quais
não muito saudáveis.

Um acidente económico
ou financeiro que pode
desencadear uma
depressão

O caso do Citi mostra que é
falsa a idéia de que agora caminhamos
para a recessão, e que o pior da
crise financeira ficou para trás. Pelo
contrário, a queda económica e a
duração da recessão desencadeará
uma onda de falências, fechamentos
e demissões que pode alimentar um
novo pico da crise financeira. A perspectiva
do aumento do desemprego
pode multiplicar a incapacidade de
pagamento dos cartões de crédito e/
ou dos créditos estudantis de milhares
de pessoas, pondo em dúvida a
viabilidade de muitos bancos. E
ainda, uma quebra de uma das Três
Grandes montadoras (GM, Ford e
Chrysler) e suas seqüelas em toda a
rede de produtores e distribuidores
nos EUA seria grave não só para a
indústria automotriz, mas poderia ser
pior para os bancos, especialmente
para aqueles envolvidos em credit
default swaps (CDS) [2]. Dependendo
de como alguns acontecimentos
imprevisíveis se desenvolvem nas
próximas semanas, a economia norte-
americana pode terminar numa
depressão deflacionária (ou uma
espiral inflacionária se faz-se o impossível
para evitá-la, ou uma alternando
com a outra).

Tudo para o capital
financeiro, cacetada para
os trabalhadores

Enquanto as autoridades, com
o aval de Obama, saíram correndo
para resgatar o Citi, o pedido de ajuda
das patronais das Três Grandes
automotrizes segue em debate. Obama
ao mesmo tempo em que colocava
a importância de evitar a queda
destas, esclarecia que não deve ser
incondicionalmente, deixando claro
que exige uma série de medidas para
aprovar seu resgate, exigências que
não foi imposta a nenhum banco.

Diferente do sistema financeiro
que é resgatado incondicionalmente,
a burguesia e o novo governo
querem utilizar este caso para atacar
o nível de vida, as condições de trabalho
e os direitos sociais que ainda
restam dos trabalhadores da velha
indústria automotriz norte-americana,
apesar de anos de retrocesso e
concessões da burocracia sindical da
UAW [3]. Este é a entrelinha do “plano
de viabilidade futura” que Obama e
os líderes do Congresso exigem aos
gerentes das empresas automotrizes
antes de receberem um dólar, enquanto
tratam com luvas de seda os
gerentes dos bancos.

O objetivo é usar os trabalhadores
da indústria automotriz, que
são referência para o conjunto dos
trabalhadores, como bode expiatório.
Recentemente, sob o governo
de Reagan, quando havia um alto
índice de desemprego nos anos ”™79 e
”™82, perderam-se 200.000 empregos
somente na indústria automotriz e a
classe operária sofreu grandes derrotas,
em particular na greve dos controladores
aéreos, o que encorajou a
ofensiva patronal. Sob a pressão formidável
do governo, a UAW firma
um contrato com enormes perdas de
conquistas (suspensão do aumento
automático e sistemático do salário
por hora nominal, dos aumentos ligados
à inflação e o abandono dos
feriados remunerados), depois de
anos de avanços nas negociações
coletivas.

Depois, a adaptação das direções
sindicais se generalizou ao
conjunto do movimento operário e
foi um enorme retrocesso das conquistas
da classe operária, iniciando
a recuperação do lucro capitalista
depois da crise dos 70. É essencial
que os trabalhadores não se submetam
à chantagem de Obama e do
parlamento, nem aceitem a pressão
dos patrões da GM, Ford e Chrysler.
Há que lutar pela nacionalização das
Três Grandes sob controle operário.
A política de Obama de apoiar o
salvamento dos bancos e exigir duras
condições para os trabalhadores
da indústria automotriz, mostram
que sua propaganda de mudança é
só propaganda, enquanto defende
a aristocracia financeira que dirige
o país, que deve boa parte de suas
fortunas a homens como Bob Rubin,
ex-secretário do Tesouro de Bill
Vlinton na década de 90 e que agora
ajuda a vários de seus protegidos
como Geithner.

Só rompendo com os dois
grandes partidos patronais e confiando
em suas próprias forças os trabalhadores
norte-americanos poderão
impedir o novo retrocesso que mais
cedo do que tarde o novo governo
quer impor. É essencial que os custos
da crise sejam pagos pelos que a
criaram: os grandes bancos e empresas
que defendem o conjunto da elite
política da qual Obama não é mais
que sua nova cara.

[1A primeira cifra compreende varias magnitudes:
20 bilhões de injeção direta de capital;
outros 7 bilhões em ações preferenciais
como pagamento pela garantia de 306 bilhões,
dos quais 3,5 bilhões se contabilizam
como capital do banco; 25 bilhões de outra
injeção de capital que foi liberado com as
garantidas recebidas hoje. As garantias são
espécies de avais contra perdas por 306 bilhões
de dólares em empréstimos e títulos
que figuram no balanço do Citigroup. Os
termos do resgate contemplam que o banco
cobrirá os primeiros 29 bilhões de perdas
e, a partir daí o governo se encarregará de
90% das perdas do Citi. Um plano similar ao
resgate do grande banco UBS por parte do
governo Suíço. Tenhamos em conta, além
da injeção de capital que se faz similar ao
valor de mercado do Citigroup, que chegou
a 20,5bilhões, que equivalem a 7,6 por centro
do valor que a empresa financeira teve
em fins de 2006, de 270 bilhões de dólares.

[2Os CDS são produtos de seguro totalmente
desregulados que os investidores
compram para se proteger de um default de
um bónus corporativo ou soberano. A proteção
contra um default da General Motors
estava entre os contraltos mais requeridos.

[3O poderoso sindicato da indústria automotriz.

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