Quarta 24 de Abril de 2024

Internacional

A CORÉIA DO NORTE SOB CERCO IMPERIALISTA

É necessário um programa revolucionário pela reunificação das Coréias

12 Mar 2013   |   comentários

A crise capitalista acelera a disputa interestatal na política internacional. Os EUA, nos últimos três anos vêm recuperando sua economia através de uma política exportadora e de desvalorização do dólar a fim de dar fôlego à sua economia golpeada pela crise de 2008. Esses movimentos militares dos EUA que aproveitam a suposta “ameaça nuclear” nortecoreana estão a fim de reposicionar estrategicamente o imperialismo na região, forçando com que a China condene (...)

Crescem as ameaças de guerra na península coreana. O governo Barack Obama insiste em promover exercícios militares com a Coréia do Sul através de suas vinte bases militares na região do mar amarelo. Estas manobras são uma das medidas do governo dos EUA de intimidar a Coréia do Norte em suas tentativas de desenvolver testes de mísseis e principalmente de mandar uma mensagem de segurança aos capitalistas japoneses e sul coreanos na região.

A crise capitalista e as disputas interestatais como pano de fundo das provocações militares

A crise capitalista acelera a disputa interestatal na política internacional. Os EUA, nos últimos três anos vêm recuperando sua economia através de uma política exportadora e de desvalorização do dólar a fim de dar fôlego à sua economia golpeada pela crise de 2008. Esta política ataca a capacidade exportadora de seus antigos aliados estratégicos como a China. Desta forma, a economia chinesa não cresce mais a cifras superiores a 10% desde 2010, o que leva a uma atual disputa de mercados com os EUA e seus aliados na Ásia, como Japão e Coréia do Sul. A sua maneira, a China vem fazendo política para ampliar seus mercados de exportação incomodando a economia japonesa já enfraquecida. Os EUA é o imperialismo que defende militarmente seus aliados asiáticos desde o fim da Segunda Guerra, quando assentou bases na Coréia do Sul. A política de George W. Bush de intensificar as sansões à Coréia do Norte como uma inimiga dos EUA aumentando a crise humanitária no país cresceu a necessidade do país em se proteger de uma possível intervenção, que passou a desenvolver testes de mísseis sobre o arquipélago japonês e no Mar do Japão. Esta situação tem se acirrado devido às crescentes rusgas entre a China e os EUA e se materializado na disputa política da China com o imperialismo japonês pelo controle da ilhas de Diaoyu e a redemarcação da fronteira marítima entre os dois países que garantiria o controle sobre as reservas marítimas de petróleo e gás da região.

Diante deste cenário conjuntural bastante conflituoso em meio a crise capitalista mundial, os EUA promovem o reposicionamento norte-americano na região da Ásia-Pacífico como uma política de Estado tirada no Pentágono, por um documento oficial elaborado pelo general Petraus, depois de sua derrota estratégica no Oriente Médio (Iraque e Afeganistão), como forma de tentar conter o avanço diplomático da China como potência comercial. Desde a instalação de bases ianques na Austrália, na Coréia do Sul (com incessantes exercícios militares), nas ilhas do Pacífico (Guam) e na costa japonesa (além da V Frota no oceano Índico), esses movimentos norte-americanos se vêem acelerados com a "ameaça" de conflagração por parte da Coréia do Norte, bastante golpeada economicamente pela crise, o que prontifica Kim Jong-un a lançar uma ofensiva de auto-preservação do regime. A China se tornou o quinto maior exportador de armamentos do mundo, suas vendas cresceram 162% de 2003 a 2012, despachando o Reino Unido da posição, e modificando as 5 primeiras posições da lista pela primeira vez em 20 anos. Quanto aos importadores de armas, os cinco maiores, todos, são asiáticos: Índia com 12% das importações globais; China com 6%, Paquistão com 5%; Coréia do Sul com 5% e Cingapura com 4%. Esses dados mostram como aumenta a tensão pelas disputas territoriais nos mares do leste e do sul da China, a partir da ameaça imperialista na região. Esses movimentos militares dos EUA que aproveitam a suposta “ameaça nuclear” norte-coreana estão a fim de reposicionar estrategicamente o imperialismo na região, forçando com que a China condene as ameaças de Pyongyang evitando dar pretextos para aproximações excessivas dos ianques na zona.

A demagogia imperialista e o real perigo nuclear

Diante deste cenário, é fundamental defendermos a autodeterminação do povo norte-coreano contra a intervenção e ameaça de qualquer país imperialista, seja por intervenção direta ou através do intermédio de outros países e semicolônias. O povo norte-coreano tem o direito de se defender inclusive dispondo de qualquer tipo de armamento nuclear. A demagogia da imprensa mundial em torno da ameaça da "paz mundial" e da "segurança nuclear" por conta do desenvolvimento de urânio enriquecido por parte de países como a Coréia do Norte ou Irã são um instrumento político que serve apenas ao monopólio nuclear imperialista. Nada se falam das dezenas de testes nucleares realizados pelo Japão na mesma região, ou pela França em suas semi-colônias na polinésia francesa, e principalmente do fato de que o único país até hoje que foi uma real ameaça nuclear para o mundo foram os EUA que carbonizaram vivos centenas de milhares de civis japoneses em 1945 com a detonação das bombas nucleares em Hiroshima e Nagasaki. A ONU por sua vez emite sansões aos “inimigos do imperialismo” como a Coréia do Norte e os obriga a visitas de reconhecimento por técnicos de seus países inimigos enquanto os EUA não se questiona por ter invadido militarmente e testado armas contra populações civis no Iraque e Afeganistão. Isso revela o caráter imperialista da ONU, controlada pelas grandes potências capitalistas a fim de ora ou outra servir de como respaldo internacional para as invasões militares e ingerências dos países grandes contra os menores. A capacidade de autodeterminação destas nações contra a política externa imperialista e sua legitimação através da autodefesa deve ser parte de uma defesa de princípios da esquerda em todo o mundo, a começar pelas organizações revolucionárias.

Os massacres das Ligas Bodo e a Guerra da Coréia

Desde o fim da Segunda Guerra, como parte dos processos de libertação colonial, a Coréia passou por intensos processos de luta de classes que incorriam sob o direito de propriedade contra a ocupação japonesa, em que o liberal nacionalista Syngman Rhee regressou ao país de seu exílio nos EUA e promoveu uma ditadura sob a tutela norte-americana. Sob a direção guerrilheira de Kim Il-sung, setores da pequena burguesia que detiveram o controle das províncias do norte se negaram a responder ao governo que se formou em torno de Rhee. Em 1948 com o pacto de Yalta, firmado entre os EUA e a URSS, as Coréias se dividiram. A URSS a fim de transformar a Coréia do Norte em um aliado geopolítico na região, patrocinou no norte um processo parecido com o que passaram países da Europa do Leste como na Polônia, onde a burguesia foi expropriada pelas direções burocráticas do movimento de massas que se basearam nas mobilizações contra a miséria promovida pelo imperialismo e pela guerra, conformando um estado operário deformado desde seu nascimento por uma burocracia estatal aliada a Moscou e stalinizada desde seu início, instaurando um regime bonapartista em torno do unipartidarismo do Partido dos Trabalhadores da Coréia (PTC) e Kim Il-sung como sua liderança. A onda de greves na Coréia do Sul corroíam a força do governo Rhee que agia para o país se transformar em uma semi-colônia disciplinada pelos EUA.

Promoveu-se uma caça às bruxas onde todos os sindicalistas, trabalhadores rurais e ativistas da esquerda eram incluídos em ligas de confinamento e "reeducação" chamadas Ligas Bodo, verdadeiros [progroms] sulcoreanos, que na época, faziam milhares se refugiarem no vizinho do norte, oferecendo grande correlação para que Kim Il-sung se aventurasse em uma manobra bonapartista de tentar anexar as duas coréias rompendo o pacto firmado entre URSS e EUA, levando a uma guerra entra as duas Coréias em 1950. O programa de Rhee se transformou em um massacre brutal aos trabalhadores e à esquerda onde todos os homens incluídos nas Ligas Bodo foram executados, levando centenas de milhares à morte patrocinados pelos EUA. A guerra da Coréia terminou com a derrota do regime de Kim Il-sung, dando origem ao estado sangrento e anti-operário da Coréia do Sul contra o aprofundamento bonapartista do regime burocrático de Kim na Coréia do Norte, que ficou isolada dos demais países sendo impostas diversas sansões econômicas e comerciais.

O regime Juche e a emergência de uma revolução política e social

Kin Il-sung se transformou em secretário geral do PTC até 1970, quando impôs uma reforma constitucional implantando a ideologia Juche como força dominante no país. A ideologia Juche foi (e ainda é) uma adaptação norte-coreana da concepção stalinista do "socialismo em um só país", que entre outras medidas elevou a família Kim a uma posição parecida a de uma dinastia despótica e à quase falência do comércio exterior do país que matou cerca de 10% da população de fome e a depender de “ajuda humanitária” por parte de seus vizinhos, promoveu também a entrega dos operários como mão de obra super barata nos empreendimentos industriais com a Coréia do Sul, em troca de divisas, que para nada serviram para atenuar as penúrias da população, mas para aumentar os privilégios escandalosos da burocracia e do exército, a ponto de terem a escandalosa preferência na repartição de comida antes dos trabalhadores. Trotski foi taxativo em descrever a burocracia stalinista: “O prognóstico político tem um caráter alternativo: ou a burocracia, tornando-se cada vez mais o órgão da burguesia mundial no Estado operário, derrubará as novas formas de propriedade e lançará o país de volta ao capitalismo ou a classe operária destruirá a burocracia e abrirá uma saída em direção ao socialismo [1].

Em todos os países em que a burocracia stalinista assumiu o controle do estado, ou foram degeneradas ou já nasceram deformadas as bases sociais progressivas destes estados, servindo seus regimes de arma para a burguesia atacar o proletariado ora com sua máscara ditatorial ora com sua máscara “democrática”. A casta burocrática Juche se baseia politicamente no unipartidarismo e no enorme poder das forças armadas, a quinta maior do mundo contando com cerca de 1,2 milhões de efetivos e mais de 5 milhões de milicianos em um país de população de pouco mais de 20 milhões de habitantes, perseguindo a oposição política ferozmente e oprimindo o proletariado industrial, forçando os norte-coreanos a viver com salários menores que os níveis chineses. Ainda assim, a economia norte-coreana segue sendo estatal e planificada, onde a propriedade privada é proibida e o comércio exterior determinado pelo estado. Estas conquistas dão base material para sustentação do regime Juche como "defensor" dessas conquistas desde 1948, contra a ocupação japonesa e posteriormente a ditadura Rhee sul-coreana. Entretanto, a burocracia é a face contra-revolucionária e anti-operária que busca com sua política se encastelar no poder a fim de transformar as conquistas sociais em privilégios materiais através da restauração do capitalismo. Se esta restauração ainda não foi levada a cabo pela burocracia Juche, foi principalmente pela incapacidade do imperialismo em integrar a Coréia do Norte na divisão internacional do trabalho e convencer a burguesia semicolonial sulcoreana a ceder espaço para a casta dominante nortecoreana em uma possível reunificação.

Desta forma a idéia de reunificação soa como uma ameaça ao povo norte-coreano e suas conquistas históricas, o que oferece a base de apoio para o sangrento bonapartismo Juche. Desde 1998 foram criadas zonas francas de comércio onde é permitida a propriedade privada. Foi uma iniciativa de Kim Jong-Il de atrair investimentos da Rússia e da China, que exploram a mão de obra barata do país e seu vasto parque industrial. Cerca de 45% do PIB da Coréia do Norte vem da produção industrial que hoje é sobretudo voltada a complementar a produção chinesa e resolver parcialmente as enormes crises de abastecimento do país. Desde 1980 o governo norte-coreano buscou por distintas vezes iniciativas diplomáticas de construção de uma "República Federal Democrática da Coréia", chegando a propor uma união federativa em que ambos os países convivessem com seus regimes intactos sob uma só constituição. Uma tentativa palaciana de promover uma reintegração da burocracia norte-coreana ao capitalismo.

Neste caso, existem muitos setores da esquerda que abdicam de defender as conquistas históricas do estado norte-coreano no que elas ainda mantêm de progressivas, diante de tamanho atraso e deformação levada pela burocracia Juche. Como dizia Trotski aqueles que se recusavam em defender a URSS por conta do stalinismo, “Prometemos, unicamente, defender a URSS como Estado operário e, exclusivamente, aquelas coisas internas que ela contém que pertencem a um Estado operário [2], jamais defendemos esta burocracia assassina de seu povo em se apropria de imensos privilégios em nome do “comunismo”.

Este tipo de políticas restauracionistas e reacionárias, que oprime o povo nortecoreano só podem ser respondidas pela ação dos trabalhadores em uma revolução política [3] contra a burocracia, pela conformação de organismos de autodeterminação das massas, que proponha uma saída para a reunificação das coréias em chave revolucionária, a única maneira de atender a necessidade de democracia das massas norte coreanas.

Ainda assim, o combate contra a burocracia Juche requer um caráter de luta que também é social, onde é necessário restituir em bases democráticas e estratégicas do monopólio do comércio exterior em que a burocracia transformou o país em hiperdependente de importações, e a industrialização em caráter da propriedade social, a fim de reverter a política de rebaixamento dos salários e de exportações competitivas e de mão de obra barata que deterioram cada vez mais os níveis de vida das massas.

Os trabalhadores sul-coreanos necessitam de um partido que responda a altura as diversas ações de luta dos operários que se manifestam desde 2001 nas ondas de greves, ou como na batalha pela ocupação de fábrica em Ssangyong em 2009 como resposta às medidas capitalistas em descarregar a crise sobre os trabalhadores. Na Coréia do Sul é necessária uma revolução socialista que exproprie a burguesia sul-coreana a fim de dar poder a organismos de autodeterminação operária desde as fábricas, oferecendo aos trabalhadores de toda a Coréia uma alternativa anticapitalista e que dê folego aos trabalhadores norte-coreanos a destruírem o escombro burocrático Juche que impede a eles usufruírem das conquistas de seu estado operário.

É impossível que a demagogia “democrática” imperialista possa oferecer melhorias ao povo de ambas as coréias, devemos dar a voz aos trabalhadores sulcoreanos que contra a democracia de fachada impuseram meses de duras greves em 2001-2005 durante a crise asiática, resultado da reestruturação produtiva como política neoliberal imperialista que forçou os níveis salariais da imensa classe trabalhadora destes países aos mais baixos do mundo. É necessária a retirada imediata de todas as bases militares dos EUA na Coréia do Sul para pôr fim à ingerência yankee neste país que existe desde 1948. Nenhuma intervenção imperialista nas coréias! Por uma união revolucionária das repúblicas operárias das coréias!

[1O Programa de Transição, A União Soviética e as tarefas da época de transição. Leon Trotski

[2“Em última análise, um Estado operário é um sindicato que conquistou o poder. A atitude diferenciada ante um e outro, se explica pelo simples fato de que os sindicatos têm uma longa história e estamos acostumados a considerá-los como realidades e não simplesmente como ‘categorias’ de nosso programa. (...) Prometemos, unicamente, defender a URSS como Estado operário e, exclusivamente, aquelas coisas internas que ela contém que pertencem a um Estado operário. (...) Um sindicato dirigido por burocratas reacionários, organiza uma greve contra a admissão de operários negros em um determinado ramo da indústria. Apoiaremos uma greve tão vergonhosa? Naturalmente que não. Porém, imaginemos que os patrões, utilizando tal greve, tentem derrotar o sindicato e impossibilitar, no geral, a defesa organizada dos trabalhadores. Neste caso, logicamente, defenderemos o sindicato, apesar de sua direção reacionária. Por que esta mesma política não poderia ser aplicada à URSS?”. (Novamente e uma vez mais sobre a natureza da URSS, Leon Trotski)

[3“O novo ascenso da revolução na URSS começará, sem dúvida alguma, sob a bandeira da LUTA CONTRA A DESIGUALDADE SOCIAL E A OPRESSÃO POLITICA. Abaixo os privilégios da burocracia (...)Maior igualdade no salário de todas as formas de trabalho. A luta pela liberdade dos comitês de fábrica e dos sindicatos, pela liberdade de reunião e de imprensa transformar-se-á em luta pelo renascimento e pelo desabrochar da DEMOCRACIA SOVIÉTICA. A democratização dos Sovietes é inconcebível sem a LEGALIZAÇÃO DOS PARTIDOS SOVIÉTICOS. Os próprios operários e camponeses, mediante votação livre, mostrarão quais partidos são soviéticos. REVISÃO DA ECONOMIA PLANIFICADA de alto a baixo no interesse dos produtores e dos consumidores! Os comitês de fábrica devem retomar o direito de controle sobre a produção. As cooperativas de consumo democraticamente organizadas devem controlar a qualidade dos produtos e seus preços. REORGANIZAÇÃO PRODUTORES AGRÍCOLAS COLETIVOS de acordo com a vontade dos mesmos e segundo seus interesses. A política internacional conservadora da burocracia deve ceder lugar à política do internacionalismo proletário. Toda a correspondência diplomática do Kremlin deve ser publicada. ABAIXO A DIPLOMACIA SECRETA! Todos os processos políticos montados pela burocracia termidoriana devem ser revistos mediante ampla publicidade e livre-exame. Os organizadores das falsificações devem sofrer o merecido castigo, É impossível realizar este programa sem a derrubada da burocracia, que se mantém pela violência e pela falsificação. Somente o levantamento revolucionário vitorioso das massas oprimidas pode regenerar o regime soviético e assegurar sua marcha para a frente em direção ao socialismo”. (O Programa de Transição, A União Soviética e as tarefas da época de transição. Leon Trotski)

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