Sexta 19 de Abril de 2024

Juventude

UM BALANÇO DAS ELEIÇÕES ESTUDANTIS DA USP E UNICAMP

É necessário continuar na luta por uma juventude militante e revolucionária no Movimento Estudantil!

20 Dec 2012   |   comentários

por Fernando Pardal (Letras – USP) e Danilo Magrão (IFCH - Unicamp)

Neste final de ano, as eleições para DCEs e CAs da USP e Unicamp ocorreram em meio a mudanças importantes no cenário político estadual. O PSDB, partido que há décadas tem no estado de São Paulo um de seus principais pilares políticos nacionalmente, enfrenta importantes crises: sua política repressiva de segurança pública tem gerado desgaste, levando à recente substituição do secretário de segurança pública após mais de dois meses de chacinas que já contabilizam mais de 300 mortes perpetradas pela polícia nas periferias; na prefeitura, acabam de perder um ponto de apoio fundamental com a eleição de Haddad; e a ala paulista do PSDB, encabeçada pelos grupos de Alckmin e Serra, sofreu um duro golpe com o pronunciamento de FHC e o presidente do partido, Sérgio Guerra, em apoio à candidatura de Aécio Neves a presidência em 2014.

Enquanto isso, o petismo se fortalece dentro e fora da universidade: ainda que Haddad enfrente a primeira crise em sua base com o protesto dos movimentos de moradia após a confirmação da entrega da Secretaria de Habitação para o PP de Paulo Maluf, a conquista da prefeitura é um marco importante no projeto do PT de debilitar o PSDB cada vez mais em seu principal reduto. Na USP, particularmente, é um lugar onde o petismo se fortalece muito com a vitória de Haddad, que irá indicar três professores da universidade como secretários de sua gestão (veja mais sobre estas questões no artigo “Governo do estado de São Paulo e Reitoria da USP alinhados para reprimir”, no site da LER-QI).

Este fortalecimento se expressa também nas eleições estudantis, o que se demonstra em dois fenômenos importantes na eleição do DCE da USP. A chapa governista que concorre ao DCE, “Universidade em Movimento” (composta por Consulta Popular, PT e APS – corrente do PSOL que cada vez mais orbita o espectro governista), fortaleceu sua votação em unidades importantes da USP, e em algumas chegou a desbancar a chapa vencedora da situação, “Não Vou me Adaptar” (composta por CSOL-PSOL, MES-PSOL e PSTU). Em unidades onde o Movimento Estudantil é tradicionalmente mais forte, como os cursos da FFLCH (com exceção da Letras), Educação, Arquitetura e Urbanismo e Escola de Comunicação e Artes, a atual gestão do DCE foi derrotada nas urnas. A outra expressão notória da força do governismo é que a quase totalidade das chapas sequer se pronunciou sobre os governos para não perder votos, com destaque para o silêncio da chapa PSOL-PSTU, para a qual parece que vivemos em um país em que não há governo!

Ainda assim, o cenário na USP aponta para um período de férias letivas em que a reitoria, ligada ao PSDB, acena com novas medidas de repressão e cooptação do movimento: o reitor Rodas anunciou um prêmio “cala boca” de “excelência acadêmica” de nada menos que seis mil reais para funcionários, e, conforme anos anteriores, é provável que venham novas punições com expulsões e demissões de estudantes e funcionários. Este cenário torna ainda mais escandalosa a omissão completa da questão dos mais de cem processos em curso contra estudantes e trabalhadores na universidade no programa da chapa da situação, “Não vou Me Adaptar”, que venceu com folga as eleições para o DCE da USP.

Um “vale tudo” eleitoral que termina com “mais do mesmo”

O primeiro fator a chamar a atenção nas eleições dos DCEs é seu enorme grau de despolitização. Além da falta de discussão sobre os governos, as principais questões políticas que permeiam a universidade e o país estiveram ausentes dos programas das principais chapas. Na USP, a “Não Vou me Adaptar” do PSOL-PSTU teve mais uma vitória expressiva, com 2814 votos contra apenas 1385 do segundo lugar do governismo da “Universidade em Movimento”. Chama a atenção, contudo, que sua votação tenha se concentrado principalmente nos campi do interior e em cursos como Matemática e Estatística, Nutrição e Medicina, onde a participação em mobilizações é muito mais fraca. Isso é uma expressão da política levada à frente pelo PSOL e PSTU de colocar um programa cada vez mais rebaixado e distante das necessidades dos estudantes para conseguir triunfar no “vale tudo” eleitoral. Isto configura um cenário, na USP, de uma vitória da política do MES-PSOL, que segue tendo o PSTU como uma minoria subordinada dentro da gestão do DCE.

O fortalecimento do governismo nas principais unidades onde está o Movimento Estudantil expressa não apenas um voto consciente no governo (o que se dá principalmente em cursos como Ciências Sociais e Direito), mas também em muitos cursos um voto de oposição mais confuso, atraído por um discurso vago de “mudança” no movimento e maior democracia, misturado a um discurso oportunista contra a “auto-construção dos partidos”. A direita estudantil, que no começo do ano saiu em uma forte chapa que conquistou o segundo lugar, encabeçada pelo PSDB, agora saiu debilitada e dividida em duas chapas. O PSDB mostra um grande enfraquecimento, amargando 371 votos, e a chapa composta pelas atléticas e com participação do PP conseguiu uma expressiva votação mas apenas em algumas urnas do interior, com um voto que expressa rechaço ao ME, e totalizando 1143 votos.

Na Unicamp o governismo não se expressou nas eleições estudantis, ainda que tenha se fortalecido na universidade por outras vias, como com o lançamento do professor Marcio Pochman como candidato à prefeitura. Nesta universidade, em que o PSOL (Rosa do Povo) dirige há muitos anos o DCE, sem ameaças eleitorais por parte da direita ou do governismo, eles se sentiram mais cômodos para dispensar a aliança com o PSTU, a despeito das tentativas deste de se unificarem dizendo que seus programas eram iguais (e, depois da recusa do PSOL, se apresentarem como “oposição” para “mudar o DCE”). O PSOL segue vitorioso, ainda que, como apontava o PSTU, os programas das duas chapas realmente sejam muito parecidos, com o PSTU capitalizando o desgaste da gestão e tentando chegar a uma base eleitoral mais à direita e, como na USP, sem se referir à repressão aos estudantes, mas colocando um programa de “segurança no campus”. Assim, PSOL e PSTU mostram nas eleições estudantis como seu curso de ir cada vez mais se adaptando ao vale tudo eleitoral se expressa não apenas nacionalmente (seja na frente PSOL-PSTU-PCdoB em Belém com dinheiro da burguesia, ou na dobradinha PSOL-DEM no Macapá), mas se reflete também nas universidades, ainda que de forma distinta, pois no ME não há aliança com partidos governistas , burgueses ou financiamento empresarial.

O rumo que vem tomando o PSTU é de uma adaptação sem freios, e nestas eleições saiu com os programas mais rebaixados que já tiveram, abrindo mão até mesmo de bandeiras elementares do ME, como a defesa de uma universidade pública, gratuita e de qualidade para todxs, chegando ao cúmulo de nas eleições do CACH-Unicamp se adaptar ao corporativismo dos estudantes a tal grau que tinham o lema de “por um centro acadêmico dos estudantes e para os estudantes” e levantar como uma de suas principais demandas o conserto dos bebedouros! Isso se expressou cabalmente na assembléia estadual da ANEL, realizada pouco antes das eleições do DCE na favela São Remo, ao lado da USP, que vem sofrendo cotidianamente com a repressão policial. Frente a todas as propostas que a Juventude às Ruas levantou de solidariedade ativa aos moradores da Sâo Remo, a resposta do PSTU foi uma categórica oposição, mostrando uma vez mais que não querem utilizar as eleições para levantar um programa correto e debatê-lo com os estudantes, mas sim ganhar as entidades “custe o que custar”.

O voto dos estudantes nestas eleições foi em grande medida no continuísmo, ou em uma “oposição moderada”, como expressa o fortalecimento do governismo na USP e do PSTU na Unicamp. É uma votação que não avaliza as políticas repressivas e privatistas das reitorias, mas que tampouco expressa uma superação do imobilismo do atual ME.

Nas chapas Cícera (DCE USP) e Contra Corrente (Cach Unicamp), a Juventude às Ruas segue construindo uma oposição aliada aos trabalhadores, combativa e com um programa para democratizar a universidade e combater a repressão

Em que pese o resultado ainda conservador das eleições, as chapas que impulsionamos tiveram resultados eleitorais importantes. Nas eleições do DCE da USP impulsionamos a chapa Cícera, cujo nome é uma homenagem a uma jovem moradora da São Remo, negra e terceirizada, assassinada em sua casa no carnaval de 2007 por um policial que até hoje segue impune. Levantamos nesta eleição uma política de denunciar fortemente a repressão policial nas periferias, mostrando como a luta contra a polícia protagonizada pelos estudantes da USP no ano passado era justa e está atrelada a este combate – estas questões estiveram completamente ausentes dos programas das chapas vencedoras. Colocamos no centro de nosso programa a luta contra a repressão aos estudantes e trabalhadores que vêm sendo processados, bem como um programa de democratização radical da universidade, lutando pelo fim do vestibular, uma estrutura de poder composta por um governo de maioria estudantil e com professores e funcionários. Isto está em oposição completa ao programa que levanta, na USP, a chapa vencedora “Não Vou me Adaptar”, de eleições diretas e paritárias para reitor (onde o voto de um professor valeria o voto de cerca de vinte estudantes), e seu programa de lançar no ano que vem uma candidatura “do movimento” para a reitoria, demonstrando sua estratégia de querer uma “boquinha” no apodrecido e oligárquico regime universitário.

As votações mais expressivas das chapas impulsionadas pela Juventude às Ruas e independentes foram justamente nos cursos que mais se mobilizaram no ano passado. Na Letras USP, chegamos a 75 votos, contra 162 da “Não Vou me Adaptar” e 103 da “Universidade em Movimento”. Na Educação, foram 36 para “Não vou me adaptar”, 41 para a “Universidade em Movimento” e 21 para a “Cícera”. Votações como esta são o fruto de duras lutas políticas que travamos ao longo do ano para implementar na prática o programa que defendemos nas eleições. Ao contrário das outras chapas de oposição à esquerda ao atual DCE da USP, nós temos lutado para construir ao longo do ano nos cursos uma fração no movimento estudantil que possa se colocar como uma alternativa às atuais direções. A chapa “27 de outubro” (composta por PCO, POR e independentes, mas que carrega de forma oportunista o nome de uma ampla frente única que se formou nas eleições anteriores), tem demonstrado o caminho contrário, tendo uma postura ora abstencionista, ora sectária e vanguardista frente às principais lutas políticas contra o imobilismo da atual gestão. Pior ainda foi a postura da chapa “Território Livre” (MNN e independentes), que em seu programa bastante despolitizado chegou a colocar que as demandas por mais verbas para a educação ou a mudança da estrutura de poder na universidade eram “anacrônicas”, levantou um discurso oportunista para se colar ao sentimento antipartidário de muitos estudantes através do discurso contra a “auto-construção dos partidos” (tal qual a chapa governista!), e ao longo do ano não apresentou nenhuma luta consequente contra a repressão na universidade. Frente a isto, consideramos a votação da chapa Cícera, de 213 votos, um importante passo na construção de uma oposição ao DCE da USP.

Nas eleições do CACH, na Unicamp, combatemos a despolitização e o corporativismo das chapas do PSOL e PSTU, e a votação final expressou um amplo setor de estudantes que tem acordo com o programa levantado pela chapa Contra Corrente: foram 116 votos para a chapa do PSTU, 67 para a Contra Corrente, 24 para a chapa do PSOL e 18 brancos e nulos. Também na Letras USP, num cenário eleitoral truncado com seis chapas concorrendo ao Centro Acadêmico, a chapa “Primavera nos Dentes” da Juventude às Ruas e independentes conseguiu 65 votos (8%), contra 31 (4%) da Letras em Movimento (APS, Consulta Popular), 22 (3%) da “27 de outubro”, 150 (21%) da Travessia (MES-PSOL e independentes), 151 (21%) da Outra Margem (PSTU e independentes) e 265 (38%) da Caxangá (independentes). A chapa vencedora expressa um grande descontentamento dos estudantes do curso com as direções tradicionais de PSTU e PSOL. Travamos ao longo do processo um debate sobre a conformação de uma chapa unificada com os membros da Caxangá, e consideramos negativa a postura dos companheiros de, mesmo levantando necessidades corretas em seu programa, terem colocado como obstáculo para a unificação debates sobre as questões de “método”. Esta confusão se expressou no fato de que demoraram a sair com seu programa efetivamente, centrando grande parte do debate eleitoral em questões organizativas e secundárias, o que demonstra o ecletismo da chapa. Contudo, seguimos dispostos a travar ao lado da nova gestão uma luta pelos aspectos corretos de seu programa, como a luta contra os processos e contra a repressão da polícia.

No fim do ano, reitoria puniu estudantes com advertências e suspensões e demoliu o Canil. Fortalecer a campanha contra a repressão e em defesa dos espaços!

Neste momento em que entram as férias a política repressiva da reitoria nos últimos anos se acentua. Prevendo isso, travamos em diversos espaços, como o Fórum pela Democratização da USP, uma luta para organizar uma ampla campanha democrática em defesa dos estudantes e trabalhadores processados. Chamamos todas as entidades eleitas e as novas gestões a colocar-se na linha de frente desta campanha como parte de uma campanha nacional contra a repressão aos lutadores, que unifique entidades de direitos humanos, intelectuais, artistas, parlamentares, colocando esforços para que esta campanha extrapole os muros da universidade, se unifique com outros setores atacados, como os estudantes de Franca perseguidos por protestar contra o “príncipe” Dom Bertand, e que seja um exemplo nacional de defesa dos lutadores.

Como coloca o Sintusp no seu comunicado “No dia 21, a reitoria soltou um comunicado (http://www.usp.br/imprensa/?p=27261) informando o resultado dos trabalhos das Comissões Processantes nos casos da ocupação do Bloco G, em 2010, e da ocupação da Reitoria em 2011. As punições sugeridas pelas Comissões Processantes vão de repreensões por escrito até suspensões de 15 dias. Até o presente momento, nenhum estudante ou funcionário foi intimado individualmente, portanto não temos informações de quantos estudantes e funcionários serão punidos. Também na manhã de hoje ocorreu reunião das entidades representativas das 3 categorias da USP (professores, funcionários e estudantes) com a Reitoria da USP para exigir que não houvesse nenhuma punição, onde o Reitor João Grandino Rodas afirmou apenas que acataria o parecer das Comissões Processantes. Diante deste comunicado da Reitoria a Diretoria Colegiada Plena do Sindicato dos Trabalhadores da USP exige a revogação imediata de toda e qualquer punição a estudantes e trabalhadores em vista de, como denunciamos desde o início, a Reitoria e o governo do estado de São Paulo terem patrocinado processos e sindicâncias autoritários e inquisitoriais que à luz do direito democrático são viciados e passíveis de nulidade.”.

Estamos ao lado do Sintusp na luta por não aceitar nenhuma punição, ao mesmo tempo em que dizemos que foi a forte campanha contra a repressão em todo esse período que obrigou a reitoria a soltar punições menores do que eram suas intenções, assim como o que aponta que “A tarefa do movimento agora é não aceitar nenhuma destas novas punições e continuar na luta pela reintegração dos 8 estudantes expulsos, pela reintegração imediata de Claudionor Brandão (diretor do Sintusp), pela retirada de todos os processos contra estudantes e trabalhadores e pelo fim da perseguição política na USP”. Com a derrubada do Canil, espaço cultural dos estudantes da USP localizado na ECA, pouco tempo depois deste comunicado, a reitoria mostra que seus objetivos repressivos se mantém e a necessidade de em 2013 redobrar as forças da campanha.

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