Sexta 19 de Abril de 2024

Entrevista com Diana e Pablito

Balanço e perspectivas frente ao primeiro turno das eleições

09 Oct 2014   |   comentários

Diana e Pablito, diretores do Sintusp, fazem balanço das eleições e tiram conclusões políticas para próximo período.

Site Palavra Operária: Como se expressaram nas eleições as jornadas de junho de 2013 e a onda de greves que tem atravessado o país?

Diana Assunção: As jornadas de junho trouxeram à tona enorme crise de representatividade do regime político brasileiro. Essa crise se expressou no repúdio a toda a casta política que parasita o país, a suas instituições, como se viu na queda vertiginosa da popularidade de todos os governos, de todos os partidos. Ficou evidente que existe uma enorme separação entre representantes e representados.

Pablito: No último período vimos a classe trabalhadora protagonizar a maior onda de greves desde a década de80. Boa parte dessas greves se deram a partir de rebeliões das bases contra suas direções traidores que parasitam os sindicatos em benefício próprio, mostrando como a crise de representatividade política que existe no país repercute também sobre movimento sindical.

Diana: Nas eleições, essa crise de representatividade se expressou na ausência de uma alternativa política que fosse capaz de vocalizar o profundo sentimento de mudança que existe na sociedade. Todos os candidatos falam em “mudança”, mas nenhum consegue realmente empalmar com esse sentimento. A subida meteórica de Marina Silva se deu porque amplos setores a princípio viram nela a possibilidade de uma “nova política”. Da mesma forma que sua queda vertiginosa se deu porque ficou evidente que ela era parte do velho. O voto útil em Dilma como mal menor frente ao retorno do neoliberalismo dos anos 90 com Aécio ou Marina também é expressão dessa falta de alternativa. É um voto com o nariz tapado. Assim como boa parte do voto de protesto contra o PT que foi destinado a partidos mais à direita do espectro político como o PSDB. O que se expressa também no aumento do voto nulo, braço e abstenções.

Pablito: O PT nunca teve uma votação tão baixa nas cidades de maior concentração operária do país. O número de deputados oriundos do movimento sindical caiu de 83 para 46 cadeiras. Aqui se mostra também a crise de representatividade do regime sindical, com o PT, partido que mais tem parlamentares oriundos do movimento operário investindo muito mais recursos nos políticos ligados à máquina estatal do que aos sindicatos.

Diana: Existe uma enorme contradição nessas eleições. Por um lado, as jornadas de junho deram lugar a uma sociedade muito mais sensível às causas democráticas, como os direitos dos homossexuais. Por outro lado, no próximo Congresso se fortalecerão os setores mais conservadores. A bancada evangélica aumentou de 70 para 80 deputados. A bancada ruralista cresceu de 205 para 263. E a chamada “bancada da bala” também cresceu. Figuras reacionárias como Celso Russomano em São Paulo e Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro estiveram entre os deputados mais votados do país. Essa contradição, combinada com um número de reeleições de governadores semelhante ao de eleições anteriores, é uma demonstração cabal da separação entre representantes e representados. A eleição de políticos conservadores entra em choque com o sentimento de mudança que emergiu em junho.

Palavra Operária: Em que medida pode-se considerar que os partidos da esquerda expressaram essa vontade de mudança?

Pablito: De conjunto, as organizações da esquerda, como o PSOL, o PSTU, o PCO ou o PCB, tiverem um resultado muito aquém do que significaram as jornadas de junho, a onda de greves que vivenciamos e crise de representatividade política e sindical que existe por trás desses processos. O PSTU, o PCO e o PCB tiveram praticamente a mesma quantidade de votos que nas eleições de 2010. Apenas o PSOL cresceu, duplicando seu número de votos. Ainda assim, teve 1,55%. Ou seja, muito aquém da dimensão do que tem ocorrido no país desde junho de 2013. Com exceção do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Norte, onde a votação no PSOL foi mais significativa, chegando a algo em torno de 10%

Diana: Setores da classe trabalhadora e mais ainda da juventude votaram em Luciana Genro em função dos enfrentamentos que ela fez nos últimos debates presidenciais. Em especial pelo enfrentamento contra o reacionário Levy Fidelix, em que ela defendeu o direito dos homossexuais. Mas também no enfrentamento contra a rede globo e a corrupção que de que PT e PSDB são cúmplices. Esse foi um voto muito progressista, que expressa a nova etapa no país aberta por junho.

Pablito: Lamentavelmente, Luciana Genro só deu uma guinada para enfrentar um aspecto do conservadorismo e o reacionarismo da política brasileira na reta final de sua campanha. O resultado que teve essa guinada mostra a potencialidade que teria se o PSOL fosse consequente com essa batalha. Mas esse partido não luta para que o movimento operário levante bandeiras democráticas de todo o povo, que seria a única forma de dar uma saída de fundo para as mesmas. E não foi capaz de responder ao repúdio à casta de políticos parasitas que domina o país, como poderia ter sido se utilizasse a candidatura para impulsionar uma forte campanha para que todo juiz, parlamentar ou funcionário político de alto escalão ganhe o mesmo que um professor.

Palavra Operária: Qual saída dar para essa falta de alternativa diante da crise de representatividade que se expressou nas eleições?

Diana: A saída se encontra na enorme combatividade e criatividade que a classe trabalhadora vem demonstrando nas greves por todo o país. Os operários da construção civil, os garis do Rio e os rodoviários em várias capitais do país mostraram que é possível combater a burocracia sindical e que é necessário recuperar os sindicatos para as mãos dos trabalhadores. Os trabalhadores da USP mostraram que é possível ligar a luta econômica com a política em defesa de demandas de todo o povo como a saúde e a educação. E mostraram que é possível os trabalhadores se organizarem de uma forma verdadeiramente democrática, baseada nas assembleis de base e em comandos de representantes mandatados e revogáveis pelas bases. É necessário darmos uma expressão política para essa experiência, organizando os trabalhadores mais conscientes de cada uma dessas lutas em um novo partido que para de tirar lições da experiência com o PT e da impotência da esquerda que existe hoje para construir algo verdadeiramente revolucionário em aliança com os setores mais pró-operários da juventude e da intelectualidade. É possível colocar em movimento uma potência superior aos 800 trabalhadores e jovens que reunimos no encontro "Lições de Junho" em outubro de 2013.

Pablito: O PSTU já demonstrou que não serve para isso. Enquanto os militantes da liga estratégia revolucionária se jogaram com tudo nessas lutas para se fundir com a combatividade e a criatividade desse novo movimento operário, potencializando-a ao máximo com uma estratégia marxista, o PSTU tratou essas lutas de forma rotineira. Com seus métodos burocráticos, o PSTU foi incapaz de transformar as lutas que participou em algo mais que transcendesse as demandas econômicas de cada categoria. E muito menos foi capaz de expressar essas lutas nas eleições.

Diana: A votação de cerca de 3% que o PSOL teve em várias cidades de alta concentração operária do sudeste mostra como as questões democráticas são sensíveis a um importante setor da classe trabalhadora. Uma primeira tarefa desse novo partido deve ser impulsionar fortes campanhas democráticas no movimento operário e na juventude que façam jus a esse sentimento progressista de junho que se expressou nas eleições. Para tal, as organizações da esquerda estão convocada a impulsionar uma ampla unidade na ação com esse objetivo comum.

ENCONTRO "LIÇÕES DE JUNHO", ORGANIZADO PELA LIGA ESTRATÉGIA REVOLUCIONÁRIA EM OUTUBRO DE 2013.









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