Sexta 29 de Março de 2024

Internacional

NEOLIBERALISMO, CAPITALISMO. QUEM AGONIZA?

Debate na PUC-SP reúne estudantes para discutir uma saída para a crise econômica

23 Oct 2008 | No dia 22 de outubro ocorreu o debate "Neoliberalismo, capitalismo. Quem agoniza?", organizado pela LER-QI, onde estudantes da PUC-SP, trabalhadores terceirizados e estudantes da USP e da Fundação Santo André se reuniram para discutir a crise econômica, as perspectivas da situação internacional, e a necessidade de uma saída da juventude e dos trabalhadores ao presente cenário. A atividade, que inicialmente contava com a confirmação de Valério Arcary do PSTU, que no último momento não pôde comparecer, se realizou com o informe de Simone Ishibashi, dirigente da LER-QI. Além disso houve a participação do professor Pedro Fassoni Arruda, do curso de Ciências Sociais da PUC-SP contribuindo para o debate. Esta foi uma primeira iniciativa de nossa organização frente à crise econômica, que cada vez mais mostra a necessidade de uma saída dos trabalhadores ao capitalismo e a toda irracionalidade e miséria que este produz. Leia abaixo a íntegra da apresentação feita por Simone Ishibashi.   |   comentários

Antes de mais nada gostaria de saudar a greve dos bancários, que apesar de seguir sendo dirigida pela burocracia cutista, tem nos surpreendido se mostrando mais forte. Também fazer uma saudação à greve dos professores mexicanos, que tem se enfrentado com a dura repressão do governo pró-imperialista de Calderón, e aos operários de Zanon que vem enfrentando ameaças de desalojo por parte da burguesia, e são o exemplo mais avançado de luta da classe operária de todo continente.

Gostaria de centrar meu informe em alguns pontos importantes, e de certa forma há muito tempo inéditos, que conferem a esta crise económica contornos especiais, sobretudo para os marxistas revolucionários. Há fundamentalmente três pontos que buscarei aprofundar sobre este tema:

1) que a crise atual não é mais uma simples crise cíclica, e nem sequer do neoliberalismo, mas uma crise do capitalismo na medida em que é a conseqüência do esgotamento do último padrão de crescimento sobre o qual o capitalismo esteve baseado nas últimas décadas;

2) que trará implicações políticas e sociais profundas, também no que diz respeito à geopolítica;

3) que esta situação abre uma nova perspectiva para todos os marxistas revolucionários, e que se faz urgente preparar a classe trabalhadora e a juventude para os embates que já começam a se dar.

Sobre o primeiro ponto ’ se estamos diante de uma crise cíclica ou de proporções mais profundas ’ pode parecer à primeira vista que se trata de uma discussão meramente semântica ou de detalhes. Mas não é. Reveste uma importância muito grande na medida em que desta caracterização deriva uma atitude política que os marxistas revolucionários devem ter. E a presente situação exige a ruptura completa com todo tipo de rotineirismo, seja teórico, seja político, seja organizativo.

Se por um lado é certo que “não existe capitalismo sem crise” , como disse o companheiro Eduardo Almeida do PSTU no jornal Opinião Socialista 355, por outro não é correto enquadrar a presente crise como “parte do funcionamento cíclico do capitalismo” . Nem tampouco afirmar que “Depois dessa crise, existirá expansão e uma nova crise” , como faz Eduardo Almeida. Já se tornou lugar comum entre muitos analistas burgueses a comparação com a Grande Depressão de 1929 nos EUA, ante-sala da II Guerra Mundial, ou mesmo a afirmação de que estaríamos diante do correspondente à Queda do Muro de Berlim para o capitalismo.

É certo que existem crises cíclicas do capitalismo. Trotsky em diversos de seus textos dos anos 30 versa sobre as crises cíclicas. Mas não podemos nos esquecer que faz uma grande polêmica com Kondratiev que com sua teoria das ondas longas do capitalismo, muito em moda hoje em dia graças aos teóricos do sistema-mundo e de Mandel, dizia que o capitalismo era composto por fases de 30/50 anos de ascenso seguidas por crises que as encerravam, para novamente reabri-las. Trotsky tentava com esta polêmica atentar contra visões mecânicas, que localizavam a dinâmica do capitalismo em leis que operavam por fora da luta de classes, de rupturas bruscas, e acima de tudo, de saltos de quantidade em qualidade. É dessa forma que localizou a iminência da II Guerra Mundial, à qual ele não póde vivenciar por conta de seu brutal assassinato, e a imensa crise económica dos anos 30 nos EUA e na Europa não como mais uma simples crise cíclica, mas como um abalo profundo, uma ruptura do equilíbrio instável do capitalismo, que mudaria o mundo e as relações de forças internacionais.

Não queremos com isso fazer uma comparação mecânica com os 30, mas podemos afirmar que a crise atual prepara um salto de qualidade profundo, que aponta para situações de proporção histórica, principalmente se levarmos em conta que estamos ainda no começo, ultra-início, desta crise. Assim, esta crise é muito maior que uma crise cíclica, e esta não é uma discussão ociosa para os marxistas revolucionários, pois há que transformá-la em programa e orientação para que nossa ainda pequena vanguarda possa se ligar às massas, não de forma rotineira, mas preparando-a para grandes embates da luta de classes.

Mas para que fique clara a nossa discussão aprofundemos no caráter desta crise, e acima de tudo na tarefa de responder à questão do que veio acontecendo ao capitalismo nas últimas décadas. Como ele se manteve? Que transformações o capitalismo passou desde o Pós II Guerra Mundial? O que de fato está ruindo?

Como sabemos, o capitalismo e a ordem mundial do então “bloco capitalista” se definiu concretamente na saída da II Guerra Mundial. Foi neste momento que frente à imensidão de destruição das forças produtivas, e humanas com cerca de 30 milhões de mortos, foi o que possibilitou o que ficou conhecido como os 30 anos Gloriosos. A traição dos PCs às revoluções na Espanha, Itália, Grécia etc, por sua vez, foi o que no terreno das relações interestatais possibilitou que os EUA saíssem hegemónicos da guerra, na medida em que o capitalismo se mantém no Ocidente.

Estas três décadas após a II Guerra Mundial foram marcadas, como se sabe, de um crescimento económico importante, que só foi possível por estes fatores. Este período de crescimento parcial das forças produtivas se terminou com a crise que se inicia nos países imperialistas em 1967, e tem seu ápice ao longo da década de 70. Esta crise, que se transformou numa recessão importante, sobretudo nos EUA, após a Opep triplicar o preço do barril do petróleo em 1973, veio acompanhada de ascensos importantes da classe operária e da juventude, como foi antes o Maio de 68, as movimentações em torno da Guerra do Vietnã, o outono quente italiano etc. Isso se combinou a uma estagnação e inflação sem precedentes.

Mas se a burguesia imperialista conseguiu acabar ou desviar estes ascensos, em alguns casos com a ajuda inestimável da burocracia sindical, como foi na França de 68 com o papel traidor dos sindicatos dirigidos pelo PC, do ponto de vista da economia há alguns elementos que nos ajudam a entender a crise que hoje vivemos. Isso por que a saída do ponto de vista económico da crise dos 70 esteve baseada na seguinte combinação: 1 ’ o fim do sistema Bretton Woods, em 1971, em que o dólar se mantinha atado a 35 onças de ouro; 2 - com base na derrota do ascenso dos trabalhadores, que se fechou definitivamente com a derrota da greve dos controladores de vóo nos EUA e dos mineiros na Inglaterra entre 81 e 82, a burguesia imperialista forja uma via de recompor suas taxas de lucro em declínio após o boom do pós-guerra: a superexploração dos trabalhadores, ou o que se convencionou chamar “neoliberalismo” .

Isso teve uma conseqüência muito importante do ponto de vista económico: a saída da burguesia imperialista à crise dos anos 70 não envolveu destruição massiva de capitais, nem de forças produtivas. Isso fez com que se acumulassem as contradições profundas do capitalismo, com que a crise não fosse resolvida profundamente, mas postergada.
Chris Harman, que é um dos teóricos do SWP, organização que não coincidimos em quase nada em política mas que em teoria tem coisas interessantes, diz uma coisa muito boa para ajudar a compreender a importância deste fator. Ele explica que as crises são importantes para abrir outras perspectivas dentro do capitalismo. Que conduzindo alguns capitalistas à ruína, permite uma recuperação de outros capitalistas. A produção volta a ser rentável, e se reinicia o processo de acumulação.
Percebemos que a taxa de lucro - até antes da crise de hoje explodir - aumentou nos países imperialistas, mas que este aumento não veio acompanhado de acumulação durável e generalizada. Ou seja, não veio acompanhada de avanço nem sequer parcial das forças produtivas, entendido no sentido da definição de Trotsky.

O que explica o aumento desta taxa de lucro são vários motivos, dentre os quais figuram a própria entrada do capitalismo na China e na URSS, a diminuição do preço de matérias-primas, mas o mais fundamental é a superxeploração dos trabalhadores. Isso faz com que tal padrão de crescimento seja profundamente instável. Desde 1982 podemos distinguir várias fases. No início do século XXI, a taxa de lucro novamente alcançar um nível elevado, chegando perto aos níveis dos anos do boom da “nova economia” , ou das ponto coms, enquanto que a taxa de acumulação permanece ao redor de sua média histórica do último meio século.

Isso fez com que este aumento da taxa da exploração, se por um lado foi capaz de fazer com que os capitalistas dos países imperialistas recuperassem a rentabilidade, por outro tenha trazido a contradição de restringir o consumo de massas e, por conseqüência, o mercado mundial. Como a burguesia imperialista “resolveu” este impasse? A partir da concessão de crédito barato e aumentando a capacidade dos cidadãos, e das empresas de se endividar. Assim, foi que a economia, sobretudo a norte-americana se manteve como consumidor mundial em última instância baseada em um poder de compra inflado para muito além de sua capacidade real baseado no crédito barato. Assim foi como as famílias norte-americanas acumulam hoje uma dívida em cartões de crédito e títulos hipotecários, entre outros num volume que pulou de 200 bilhões de dólares, em 1964, para os atuais 140% do PIB nacional dos EUA, girando em torno de 19,6 trilhões. Isso se combina com um déficit orçamentário que os EUA acumulam que em 2001 era de três trilhões de dólares, e que com a crise e a política de pacotes como o Plano Paulson, pode saltar para algo em torno de 10 trilhões de dólares. Isso mostra que os EUA como potência hegemónica na época imperialista, do capitalismo declinante, é o maior devorador de capitais internacionais, ao contrário do que havia sido em seu momento a Grã-Bretanha que havia sido o principal fornecedor de capitais. Esta situação, no marco da crescente instabilidade económica tende a ser cada vez mais insustentável.

Assim, como fez os EUA para obter o volume de capital necessário para conceder crédito baratíssimo, e promover esta farra do endividamento? Emitindo títulos públicos de sua dívida, comprados aos trilhões por diversos países, mas principalmente pela China, em troca de escoamento de suas mercadorias para o mercado consumidor norte-americano, que não nos esqueçamos, não é um mercado consumidor qualquer, mas ancorado num consumismo como não há em nenhum outro país do mundo. E uma vez tendo reservas de capitais suficientemente grandes os EUA repassaram isso em forma de créditos baratos, que se transformaram na sobreacumulação do mercado imobiliário. Isso por que o americano médio, tendo acesso ao crédito (enquanto seu salário real era brutalmente atacado) com juros baixíssimo, comprava casas. E os especuladores, especulavam sobre este mercado superaquecido. Esta tendência ao superaquecimento da especulação no setor subprime dos títulos imobiliários responde também a uma outra tendência do capitalismo atual: a do crescente volume de mais-valia não investida, que flui para o mercado de capitais. Esta mais-valia passa a não ser investida justamente por que há cada vez menos nichos capazes de oferecer perspectivas de realização de capital. Os que existem tendem a sofrer sobreacumulação, como a China, que já começa a ter uma retração importante, a construção civil antes da crise, etc. Ao invés de ter que investir muito e ter pouco lucro os capitalistas enxurravam suas carteiras com ganhos provenientes da especulação subprime, ou seja de títulos de alto-risco na prática completamente impagáveis. Este padrão de crescimento se deu, portanto, ás custas de aprofundar os desequilíbrios estruturais da economia dos países centrais. É este padrão de crescimento que entra em crise. E as burguesias e governos dos países imperialistas não têm uma saída. E mais, que isso, esta é uma crise que já ninguém duvida que é mundial, pois golpeia o coração do capitalismo e não sua periferia como aconteceu nas crises da década de 90, não é de liquidez mas de insolvência, ou seja da falta endêmica de capacidade de pagamento de empréstimos e títulos, que golpeia o crédito ’ motor chave da produção capitalista ’ e golpeia o consumo, e portanto, a demanda mundial. Isso sem falar que as fortes oscilações das Bolsas mundiais são a reprodução mais aproximada do comportamento descontrolado que antecedeu o grande crack de 1929. Por mais que subam o que se expressa não é uma recuperação real da economia. E cada alta das Bolsas custa cada vez mais caro, já que para obtê-las os governos imperialistas injetam trilhões. De fato, como disse um colunista do El País, se ainda não estamos diante de um crack bancário por conta da intervenção estatal, já estamos diante de um crack das bolsas.
Assim, não se trata de mais uma crise cíclica. Nós da FT-CI podemos nos orgulhar de ser uma corrente que já apontava estas tendências pelo menos desde 2003, e ainda que tenhamos muito o que avançar, estamos com nossas todas as nossas forças aportando para uma análise marxista do capitalismo. E, que alem disso, colocamos como eixo a decadência do imperialismo americano. Hoje os analistas da própria burguesia norte-americana já discutem abertamente que estamos na era “pós norte-americana” .

Assim, começamos a ver uma interessante mudança ideológica, produto desta situação. Os próprios analistas burgueses que fazem a comparação com a situação de hoje e a crise de 29 rendem, de maneira inconsciente um tributo ao marxismo, e sobretudo a Lênin, que caracterizou o imperialismo como época de crises, guerras e revoluções, por que intuem de certa forma que não adianta injetar bilhões para comprar títulos podres e instituições financeiras quebradas. Isso não vai reavivar o padrão de crescimento que já se esgotou, podendo no máximo postergar as quebras bancárias, como mostram todos os índices da economia “real” . Eles de alguma forma sabem que é necessário destruir forças produtivas, e limpar capitais. Como disse um analista que escreveu na Folha de S Paulo “A crise de 29 comandou a ascensão do nazismo na Alemanha e outros fenómenos que culminaram na II Guerra Mundial. Por isso o quadro atual assusta” .

É desta maneira também que, se por um lado é verdade que esta crise é um golpe nos pressupostos fundamentais do neoliberalismo, já que tem se revestido no maior resgate estatal da história do capitalismo, por outro colocá-lo como uma mera crise do neoliberalismo é completamente patético. O saudosismo keynesiano de nada serve para dar uma resposta hoje. Inclusive por que quem salvou a economia norte-americana não foi o New Deal, mas a II Guerra Mundial, ou seja a destruição massiva de forças produtivas.

Neste sentido também, estamos diante da possibilidade cada vez mais concreta de que haja fenómenos sociais e da luta de classes como há décadas não víamos. Da magnitude que minha geração seguramente nunca viu. E estes fenómenos novos se darão à esquerda e à direita como foi a situação dos 30, que resultou em ocupações de fábrica na França, na revolução espanhola, e pela direita no fascismo na Alemanha. Para continuar falando dos países imperialistas, nos EUA hoje já tem lugar uma imensa polarização, na qual Obama surge como um catalisador das aspirações por mudança. Entretanto, o que se anuncia é uma presidência extremamente difícil, e se for com Obama a possibilidade da frustração das expectativas que desperta é muito mais concreta que a de sua realização. No imediato, cada vez mais norte-americanos que estavam acostumados a um nível de consumo absurdo são obrigados a abandonar suas casas para viver em acampamentos e estacionamentos. Além disso, já há perseguições aos imigrantes. Isso tudo abre a possibilidade de que surjam setores mais fascistóides. Mas também começamos a ver operários dos setores mais concentrados, como a GM e a Ford dos EUA, que saem a se organizar, inicialmente e de maneira ainda muito controlada pela burocracia da AFL-CIO, contra o corte dos empregos.

A Europa vê-se frente a um dilema importante. Sarkozy na França e Merkel na Alemanha foram eleitos para acabar com o Estado de Bem-Estar Social, mas a cada nova investida, se enfrentam com os trabalhadores, que apesar de responderem de maneira pouco política, barraram diversos ataques. Uma nova ofensiva, combinada à recessão, pode levar a enfrentamentos ainda maiores. Isso sem contar que eles ainda têm que lidar com o que está se transformando numa dificuldade, que é o euro, moeda artificialmente comum que dificulta mecanismos de desvalorização da moeda para fazer frente ao dólar baixo. Na verdade, o cenário de crise questiona profundamente o projeto da UE, ainda que por ora esteja primando o acordo trilionário que aprovaram. De qualquer maneira, quando a crise se transformar de recessão em uma depressão a tendência é que os interesses das burguesias nacionais européias se façam hegemónicos, desatando competições e tensões que mostrarão na prática que a superação do limite das fronteiras nacionais só pode se dar com as mãos da classe operária e da revolução socialista.
Por outro lado, na própria China também, que apesar de não ser um país imperialista tornou-se nos últimos tempos a menina dos olhos dos apologéticos do capitalismo que viam em sua ascensão a possibilidade de um equilíbrio de poderes frente à crescente decadência histórica do imperialismo norte-americano, começamos a ver demissões massivas, depressão das exportações para os EUA (que são responsáveis pela compra de 40% de tudo que é produzido no país), e as primeiras manifestações de operários contra o desemprego, como foi a reunião de 6 mil trabalhadores demitidos de fábricas de brinquedos que foram fechadas. Lembrando que as reuniões de trabalhadores são proibidas na China, não seria desparatada a pergunta feita recentemente por alguns analistas de se um das conseqüências desta crise não poderia ser a derrubada da burocracia do PCCh. A questão é se isso se daria no marco do avanço na retomada da revolução socialista, ou não.
Na América Latina, o que já começamos a ver é a falência total do mito do descolamento, e do desenvolvimento autónomo dos países do continente. Com a iminência de uma recessão profunda, abre-se uma tendência a que países já instáveis passem por mais enfrentamentos, como é o caso da Bolívia em que Evo Morales trata de conter o ascenso das massas trabalhadoras e camponssas, com a política de pactuar com a direita. Ou ainda em países como o México, em que se sofre profundamente os impactos da crise por conta da relação direta com os EUA, e onde está se dando neste exato momento uma importantíssima greve de professores, que retoma e amplia nacionalmente as ações da Comuna de Oaxaca, que é duramente reprimida pelo governo de direita de Calderón, que tende a aprofundar ainda mais seus traços bonapartistas de direita com a crise económica.

Já em nosso país, o que vemos é como o Brasil de Lula, que até pouco era visto como um modelo de desenvolvimento económico a ser seguido, tendo inclusive correntes de esquerda como a de Valério que consideram erroneamente como sub-metropole e que cresceu nos últimos anos tendo como base o aprofundamento da dependência ao imperialismo, e de é hoje já um dos países mais golpeados pela crise no continente, o que mostra que os “fundamentos sólidos” da economia, que renderam a Lula 80% de popularidade, não passa de um conto da carochinha.

Em pouco mais de duas semanas, o governo já lançou pacotes para salvar os bancos, vendeu suas reservas de dólares favorecendo os interesses da burguesia. Assistimos a uma fuga de capitais impressionante, o que mostra que a afluência destes capitais no período anterior não era produto de um crescimento real da economia, mas dos juros exorbitantes que permitia aos especuladores tomar emprestado lá fora e lucrar absurdidades emprestando a juros altos aqui. Chegou-se ao cúmulo do governo ter liberado reservas na forma de compulsório e os setores da burguesia brasileira que foram favorecidos se apropriaram deste capital para especulação. Isso mostra que a burguesia brasileira, seguindo a regas de todas as semicoloniais, é uma classe profundamente anti-nacional. Mas o mais importante, é que a patronal com o apoio do governo, e da burocracia sindical, tentará a todo custo fazer com que os trabalhadores paguem a crise, como já começam a fazer com as férias coletivas das montadoras e os anúncios de redução da produção em automotriz, químicos e construção, que todos sabem é a preparação das demissões. A classe operária tem que se preparar para enfrentar a crise baseada na unidade de suas fileiras, rompendo qualquer corporativismo se dispondo a defender em primeiro lugar a os trabalhadores contratados e tercerizados que serão os primeiros a atacar. As patronais e o governo contarão uma vez a mais com a ajuda da burocracia sindical cutista ou da Força Sindical, que trairá novamente a classe trabalhadora.

Frente à situação que se anuncia é preciso lutar pela mais genuína e intransigente independência de classe. Como ensina Trotsky e independência de classe não é uma questão tática e sim uma estratégia, ou seja que é um princípio elementar e não se negocia. Essa é a única via para preparar as condições para barrar a política de ataques da patronal e do governo e abrir o caminho para impor uma saída operária e popular. Tais ataques já estão acontecendo: com o anúncio de férias coletivas das grandes montadoras, que todos sabem é a preparação das demissões. E com a depressão do consumo produto da retração do crédito, mais demissões virão. Por isso, as greves, como sé hoje as dos bancários, que apesar de ser completamente controlada pela burocracia sindical, tem que se politizar. É preciso romper com o sindicalismo de pressão proveniente do petismo e que a esquerda insiste em reproduzir, com o conformismo de achar que responder à crise é “fazer campanhas salariais” ou atos isolados propagandísticos.
Estamos insistindo em nossos materiais sob a necessidade de reagrupar numa grande frente única de luta a todas as organizações combativas operárias, estudantis e populares para nos preparar: debater o conteúdo da crise que se avizinha e levantar um programa comum para que os capitalistas paguem sua crise.

É preciso fazer com que os trabalhadores confiem em suas próprias forças, para impor um programa operário de saída para a crise. É preciso que exemplos como o dos operários de Zanon, que frente à ameaça do desemprego ocuparam e colocaram a fábrica para produzir sejam disseminados e postos em prática em nosso país. Que lutemos pela unidade das fileiras operárias, pois sabemos que sua divisão entre efetivos, precarizados e terceirizados é uma das vias que a burguesia usa para dominar a nossa classe, e que para isso é auxiliada pela burocracia sindical que mantém, enquanto infelizmente setores da esquerda respeitam esta divisão. Assim, precisamos concretizar a consigna: se ataca um, ataca todos! E fábrica fechada é fábrica ocupada e posta para produzir! Além disso, precisamos lutar pela nacionalização dos bancos sob controle dos trabalhadores, única maneira de atender às demandas dos bancários em luta, e de impedir que o dinheiro público seja usado para salvar os banqueiros.

Nós acreditamos que a Conlutas se quer realmente ser um pólo de vanguarda capaz de se ligar ao conjunto da classe trabalhadora contribuindo para que esta seja vitoriosa, e não arque com a imensa crise em que já entramos, deve assumir este programa, não só como propaganda, mas para ser efetivado. A discussão sobre como levar a frente este programa, deve acontecer sem mais demora, em um encontro de delegados de base que prepare os trabalhadores nesta direção. Já dissemos antes, e frisamos de novo: o sindicalismo de pressão, ainda que com um discurso socialista de nada servirá á classe operária frente aos acontecimentos que virão. Fazer a diferença não se trata somente de disputar eleições sindicais para ter mais diretorias, mas sobretudo mostrar que onde os revolucionários estão existe uma diferença qualitativa na luta de classes. Esta é a via também de impactar os imensos setores que seguem dirigidos pela burocracia cutista e da Força Sindical.

Trotsky contava a respeito da revolução de fevereiro, que quando ela começou muitos revolucionários se “surpreenderam” pela sua eclosão. Estavam adaptados, no fundo não acreditavam que ela se daria. Os anos de democracia burguesia e petismo em nosso país educaram a vanguarda a acreditar que fenómenos de proporções históricas, e saltos de qualidades são coisas que só veremos daqui a muitos anos. Que na verdade tudo se restringe a greves salariais, disputas de eleições sindicais e eleitorais. É este espírito conformista que temos que combater desde já. Decerto que as greves salariais são importantes, mas hoje elas têm que ser ações politizadoras, para que a classe avance em sua consciência.

E não só isso. Precisamos abrir a discussão sobre a construção do partido revolucionário que necessitam os trabalhadores brasileiros e no mundo para triunfar.

As eleições municipais mostraram lamentavelmente que a esquerda no Brasil não tem peso e não conseguiu apresentar uma verdadeira alternativa de independência de classe. Como o mesmo PSTU informa os vereadores que conquistou o PSOL são em sua grande maioria representantes de partidos burgueses!!! Temos que declarar a guerra os partidos que se apresentam pela esquerda e falam de socialismo, mas praticam a colaboração de classes como a burguesia. Insistimos para os companheiros do PSTU que a condição para o triunfo da classe operária é que consiga nas vésperas sua total independência política da burguesia.

Lutamos para desmascarar o conteúdo de conciliação de classes da mal chamada frente de esquerda que só serve para mascarar ao PSOL, e trabalhar para por em pé uma verdadeira frente política classista.
Temos que combater as ilusões reformistas semeadas por partidos como o PSOL, que tentam aparecer como alternativa, mas na prática levam à frente uma política de embelazemento de setores da burguesia, tendo sido financiados por ninguém menos que a Gerdau nas eleições, além de já contar em seu breve tempo de existência com uma série de traições e ataques à classe operária, como é o caso da votação do Super-Simples. Há que superar este projeto. É preciso que os setores honestos que seguem em seu interior partam deste balanço para que se abra uma discussão sobre que partido político tem que ser construído para responder aos desafios que se avizinham. E os companheiros do PSTU têm que mudar sua política, e encarar esta tarefa.
Por fim só dizer que o capitalismo não vai cair só, mas que na sua decomposição levará milhões ao abismo da miséria e das guerras. Será necessária a força e a mobilização organizada de milhões para derrubá-lo e da construção de uma direção revolucionária, um partido de trabalhadores socialista e internacionalista. Nossa corrente é uma pequena Liga, mas são grandes nossos objetivos. Porem, nós da LER-QI ainda que assumimos essa estratégia, não acreditamos que o partido revolucionário será fruto de nossa evolução nem da evolução linear de qualquer corrente e sim da confluência revolucionária de diversos setores. Um partido revolucionário só pode ser o produto de fusões e rupturas, para essa perspectiva trabalhamos e nos preparamos.

Muito obrigada.

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