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CUBA

Cuba: “planos” de ataque contra a economia nacionalizada e os trabalhadores

06 Dec 2010   |   comentários

O objetivo central do Congresso é aprovar o “Projeto de Linhas da Política Econômica e Social” que propõe aprofundar o plano econômico que o governo de Raul Castro vem aplicando, mediante novas reformas e duros ajustes. O impacto da crise capitalista internacional, agravado pelo embargo, está golpeando severamente a economia cubana, mas a resposta de La Habana – expressada no “Projeto” –aprofunda um rumo estratégico que ameaça as bases da economia nacionalizada, com graves ataques aos trabalhadores e suas conquistas, aproximando mais Cuba à restauração capitalista, ainda que com uma estratégia “gradualista” e mantendo no poder a burocracia “comunista”. Raúl se preocupou em por um limite: “Não há reforma, é uma atualização do modelo econômico. Ninguém pensa que cederemos propriedade, iremos administra-la de outra forma” (Gramma 15/11/2010). Mas não é casual que diversos meios burgueses, incluídos dos EUA, saúdem as propostas do documento ainda que o imperialismo pressiona por uma abertura econômica e política ampla que favorela uma acelerada restauração e semicolonização da ilha.

O “Projeto...”

O texto apresenta um programa de conjunto a ser aplicado durante os próximos 5 anos. Numa primeira análise de alguns eixos se destaca que:

Promove mais concessões ao investimento estrangeiro, criando zonas especiais de desenvolvimento e o pagamento da dívida externa. Ainda que mantém o controle do cambio, debilita ainda mais o controle don comércio exterior, deixando amplas margens para que cada empresa efetue suas operações, com o que a economia cubana fica mais exposta às pressões do mercado capitalista internacional.

Se impulsiona uma mudança na gestão das empresas e serviços estatais em função da eficiência e rentabilidade individual, dando às gerências mais autonomia e diluindo ainda mais o plano, se habilita a possibilita de quebrar e liquidar toda empresa ineficiente.

Amplia os espaços para a iniciativa privada, com as empresas mistas, além da extensão das cooperativas, especialmente no setor agropecuário e diferentes formas de trabalho por conta própria que ainda que não constituam um setor propriamente burguês, mas um setor de “pequena produção mercantil simples” (e exército industrial de reserva), ao se debilitar ao setor nacionalizado, não ter um programa integrado de industrialização estatal e não ser a classe operária a articular estas camadas na economia de transição, tenderá a servir de base social para as forças mais abertamente restauracionistas.

Prevê ataques inéditos à classe trabalhadora como a demissão de mais de 500 mil trabalhadores estatais em uma primeira etapa e o corte de conquistas para impor maior produtividade e disciplina trabalhista. Isto é, que o grosso do esforço por enfrentar a crise se imporá os trabalhadores. Tudo isso, sob uma campanha contra o “igualitarismo”, a “indisciplina”, etc, que é funcional a “reeducar” a classe operária para aceitar condições de “mercado de trabalho” que haviam sido erradicadas há meio século pela revolução.

Nos privilégios da burocracia não se tocam

O documento nem fala da responsabilidade na crise que tem a desastrosa gestão da burocracia, que por um lado semeia desorganização e desperdício na economia nacionalizada, e por outro acumula privilégios e estreita laços com as novas camadas acomodadas que buscam nos espaços de mercado, turismo e nos acordos com os investidores estrangeiros, enquanto a maioria da população tem um pobre nível de vida. Esta camada social parasitária utiliza o monopólio do poder político e afoga toda atividade sindical e política independente das massas, e constitui o maior perigo interno para a revolução, com setores que já se preparam para se converter em uma nova burguesia, em particular setores da cúpula das FARs.

O “Projeto” não se dirige à classe trabalhadora e aos camponeses cubanos com exceção em alguma frase retórica, lançando neles cinicamente a responsabilidade pela baixa produtividade e acusação de “igualitarismo”, quando o que provoca o desencanto das massas é justamente a corrupção da burocracia.

Um processo burocrático

Ainda que o Gramma declare que “neste processo quem decide é o povo” como se abrisse uma discussão democrática de massas em Cuba, o certo é que a burocracia manterá um duro controle, e como se mostrou no primeiro seminário de altos dirigentes, seu objetivo é alinhar os altos escalões do Partido e das organizações de massas para baixar o “Plano” às bases sem possibilidade de uma verdadeira discussão. A liderança de Raul é menos popular que a de Fidel, e as disputas entre as distintas alas da burocracia provocam freqüentes tensões, o Congresso busca legitimar o plano para evitar resistências nas massas.

O duro controle do aparato do PCC impede a formação de tendências dentro do partido, sanciona rapidamente qualquer crítico contundente, e reprime qualquer espaço de vida política independente; enquanto a direção negocia com a Igreja “o partido católico da contra-revolução”. Que os trabalhadores possam definir realmente sobre os grandes problemas nacionais, o rumo adotado pela direção e a vida política do país é incompatível com o regime de partido único.

Um programa operário e socialista contra o programa do VIº Congresso

Longe de justificar o plano apresentado pelo PC cubano como faz a esquerda que apóia a direção castrista (encobrindo o perigo de avanços restauracionistas sob a etiqueta de “defesa do socialismo”), nem de denunciá-lo como um simples “ajuste neoliberal” como faz outro setor como a LIT, que rompeu com a caracterização marxista de Cuba como um Estado Operário Deformado (fechando os olhos à necessidade de defender o que resta das conquistas estruturais da revolução, como é o regime de propriedade), é preciso rechaçá-lo por que ameaça as conquistas da revolução e afeta os interesses dos trabalhadores.

Os custos da crise devem ser descarregados nos altos setores da burocracia que administram o Estado em proveito próprio, atacando seus privilégios, e não sobre as costas dos trabalhadores, que devem ter plenos direitos de reunião, expressão e organização sindical, incluindo o direito de greve a formar novos sindicatos independentes da tutela do Estado e do PC, questão imprescindível para enfrentar os ataques às condições de vida e emprego, assim como para o estabelecimento de um genuíno controle operário em todos os aspectos da produção e da vida econômica, única forma de combater a corrupção e outros males que brotam da direção burocrática.

Opomos ao plano da burocracia um programa que parta da defesa da nacionalização e centralização dos principais meios de produção como condição para enfrentar a restauração capitalista e planificar democraticamente a economia, revidando todas as medidas e concessões “de mercado” implementadas desde o “Período Especial” e sob o governo de Raul, e mantendo só aquelas necessárias e compatíveis com o fortalecimento estratégico da economia de transição, para restabelecê-la em função dos interesses dos trabalhadores. A continuidade do regime burocrático de “partido único” empurra ao desastre, afogando toda a possibilidade de vida política crítica entre as massas e dá lugar à demagogia imperialista e clerical da “abertura econômica” e da “democracia” burguesa.

A perspectiva política pela qual lutamos é a de um regime operário revolucionário baseado em conselhos de trabalhadores, camponeses e soldados, com plena legalidade para os partidos que defendem as conquistas da revolução e se reivindiquem anticapitalistas. O futuro da revolução cubana está em jogo. Defender um programa claro para o reagrupamento da vanguarda contra os ataques e manobras do imperialismo, como contra a burocracia e seu curso crescentemente restauracionista é uma tarefa para a qual devem contribuir com todas as forças todos os que se reivindicam das fileiras operárias e socialistas na América Latina e no mundo.

BLOG EM DEFESA DAS CONQUISTAS DA REVOLUÇÃO CUBANA

A partir do dia 4 de dezembro estará acessível esta página web da FT-QI, um instrumento de informação, debates, análises e política, pela defesa da revolução cubana e suas conquistas. O blog estará aberto ao debate e ao diálogo com tendências e autores da esquerda, cubanos ou do exterior, em torno aos problemas mais importantes da realidade cubana, e tratará de trazer informação sobre distintos aspectos da história, a vida econômica, social, política e cultural da Ilha. Não podia ser mais oportuna sua aparição: estamos em um momento politicamente muito importante para Cuba, pois o programa que o governo de Raul Castro, com o aval de Fidel, está implementando, busca aprofundar nos próximos anos, medidas que apesar do Partido Comunista Cubano apresentar como necessárias diante da crise econômica internacional que está golpeando a ilha e o assédio imperialista, o que fazem é minar ainda mais a economia nacionalizada, preparando o terreno para maiores avanços no caminho da restauração capitalista. Se abriu um debate em torno do documento apresentado para o VI Congresso do PCC que abarca problemas de fundo, econômicos, sociais e políticos que remetem ao futuro de Cuba e de suas conquistas revolucionárias. A iniciativa nasceu na VI Conferência da Fração Trotskista – Quarta Internacional há alguns meses com a participação dos camaradas de uma dúzia de países da América Latina e Europa. Discutimos amplamente a situação cubana. Entendemos que uma política correta para Cuba é uma “pedra de toque” para toda a corrente que se reivindique revolucionária hoje. Na Conferência votamos impulsionar uma campanha permanente em defesa das conquistas da revolução cubana, contra o imperialismo e contra os planos restauracionistas da burocracia, difundindo um programa que parta da revolução política, esperando contribuir para o reagrupamento da vanguarda para defender e desenvolver o que é a maior conquista das massas latino-americanas em sua luta contra o imperialismo e a exploração capitalista.

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